Os Clichês de Rosemary escrita por Gabriel Campos


Capítulo 9
Derrubadora de forninhos


Notas iniciais do capítulo

Essa é a primeira parte, de duas, da "transformação" da Rose.
Quem quiser ouvir uma música enquanto lê, pra dar um clima, põe All About That Bass - Meghan Trainor.



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— Então... Rosemary, apresento-lhe o salto alto. Salto alto, essa é a Rosemary. Vamos lá, prazer. — Rubem meio que esfregava na minha cara um sapato vermelho com um salto tão fino quanto uma agulha.

Ele estava sendo um bruto comigo, como sempre, em qualquer circunstância ele era. Achei melhor parar e pedir para esperarmos a amiga dele:

— Você não acha que é melhor nós esperarmos a sua amiga? Aquela que você chamou pelo telefone? — opinei. — Acho que ela, por ser menina, vai me entender melhor.

— A Dóris?! — ele pousou as mãos na cintura e gargalhou — Aquela bocó só quer saber de livros. — Rubem foi até uma arara de roupas e retirou um vestido preto, com uma só alça. — acho que esse aqui vai ficar “spetacularperfect” em você. E combina muito com esse salto.

Ele me entregou o vestido e, socorro! Cadê o resto do tecido?

— Cadê o resto do tecido desse vestido?! — resolvi perguntar.

— Querida, você sabe o que quer dizer estratégia? Você pode deixar à mostra algumas partes do corpo. Vamos lá, Rosemary, pele! Eu quero ver pele! Pele! Decote, costas nuas, alça única... — ele começou a me empurrar em direção ao provador feminino da loja. — Eu sei, queridinha, isso tudo é muito novo pra você, mas acostume-se.

A Folk Basfond era uma das lojas de roupas mais badaladas da cidade. Eu nunca havia ido lá até então mas eu já tinha ouvido falar dela várias vezes nos corredores da escola e pelo que Rubem vivia dizendo lá em casa. Eu estava impressionada com o tamanho daquele prédio, tanto por dentro quanto por fora; havia roupas de todos os tamanhos, para todas as idades e para todos os estilos. E qual era o meu estilo? Com certeza não era aquele em que Rubem estava tentando empurrar para mim.

Fui até o provador levando o vestido e o par de sapatos de salto. Retirei meu vestido florido e vesti o que Rubem me dera. Olhei-me no espelho: aquela não era eu. Aquela não era a Rosemary que eu gostaria de ser.

Eu queria ser original. Isto é, muito normal aos olhos de quem me visse.

Beleza, calcei os sapatos, mesmo sabendo que não ficaria com nada daquilo. Eu tentei dar alguns passos para sair do provador, mas me desequilibrava sempre, me segurando nas paredes de gesso do local.

Ouvi uma voz masculina vindo ao longe e se aproximava cada vez mais. Peraê, eu estava num provador feminino, o que um cara estaria fazendo ali? Não, não era o Rubem.

Fiquei apavorada. Dona Solange sempre me falava de rapazes que gostavam de se aproveitar de moças, às vezes querendo vê-las sem roupa ou com roupas parecidas com aquelas que eu estava usando, que mostravam boa parte do meu corpo. No entanto, mamãe também sempre me dizia que, enquanto eu estivesse com ela, nenhum rapaz desse tipo iria tocar em mim.

Fiquei com saudades da minha mãe cada vez mais à medida que a voz daquele cara estranho se aproximava de mim. Eu, no provador, tentava me livrar da roupa, mas era difícil porque o sapato de salto não deixava.

Eu passei de galinha dos ovos de ouro do Rubem para a Galinha Desengonçada do Provador Feminino da Folk Basfond, desesperada, tentando fugir dali e tentando tirar aquele vestido e aqueles sapatos.

A voz do cara estava bem próxima ao provador onde eu estava. Eu bem que podia ouvir o som das cortinas dos outros provadores, provavelmente vazios, sendo arrastadas por ele.

Aquele cara estava procurando por alguém.

Eu quero a minha mãe.

Pude ver sua sombra por baixo da cortina do meu provador, bem como um par de sapatos marrons. Ele estava prestes a puxar a cortina. Eu tinha que pensar em algo antes que fosse tarde demais.

Eu puxei a cortina antes que ele a puxasse. Eu nem olhei para o rosto dele, mas lembro-me de lhe dar um empurrão tão forte, que eu ouvi o som de suas costas batendo na parede do provador da loja.

Então eu saí correndo (devo abrir um parêntese aqui e dizer a vocês que foi assim que eu aprendi a andar de salto) e gritando:

— SOCORRO! TEM UM TARADO NO PROVADOR FEMININO! TARADOOOOO!!!

As pessoas, que até então faziam suas compras tranquilas, ficaram olhando para mim, tentando entender o que eu berrava no meio daquela loja. Rubem e uma garota loira de óculos e cabelos curtos, que o acompanhava, perceberam que eu estava em apuros e foram até a mim.

— Rose, o que foi?! Calma, criatura! Se acalma! — ele sacudia os meus ombros.

— Ti-ti-tinha um cara lá no provador. — eu apontei para lá, ainda nervosa.

A garota que estava com Rubem foi até lá e deu uma olhadela. Depois suspirou fundo e disse:

— Achei ele. Meu Deus, esse garoto só não perde a cabeça porque ela é enorme! — então ela entrou no lugar onde ficavam os provadores.

Rubem me fitou com aquela cara de “basta eu te deixar sozinha e você me apronta uma merda” e me puxou até lá. A garota loira de óculos e cabelos curtos ajudava o suposto tarado que eu derrubei no chão a se levantar enquanto falava uma série de coisas a ele, mas eu nem prestava atenção porque eu estava uma pilha de nervos.

— Acho melhor você levar a Rosemary para tomar um pouco de água enquanto eu dou uma bronca no meu irmão. — disse a garota, puxando o rapaz pelo braço. Ela meio que o guiava, como se ele não soubesse por onde andava, mas eu nem prestei atenção.

Rubem me levou até a sala dele, onde na porta estava escrito “GERÊNCIA”, e me fez empurrar quase dois litros d’água pela goela. Meu irmão andava de um lado para o outro, nervoso, pousando a mão na testa. Eu ainda estava vestida como uma piranha com a roupa que ele me dera para provar e estava louca para tirá-la.

— Eu vou te dar um selinho da activia pra você usar de enfeite na sua testa. Ô menina pra fazer merda! — reclamou ele, finalmente.

Mas eu nem sabia o que eu havia feito de tão ruim. Havia um cara lá, num lugar onde mulheres se despiam para provar roupas. Eu tinha razão e ponto final.

— Que foi que eu fiz?

— Precisava armar aquele escândalo todo, criatura?! — Rubem gritava como se fosse o nosso pai. — Ainda bem que Dóris e eu chegamos a tempo, ou você poderia causar uma catástrofe aqui nessa loja. Ai, Deus, espero que isso não chegue aos ouvidos do meu chefe, ou adeus emprego.

Ainda não havia entendido a gravidade do erro que eu cometera.

— Ok, Rosemary.... tá mais calma? — ele perguntou, minutos depois.

— Sim. Acho que sim.

— Então vamos voltar às compras?

👯♡ 👯♡ 👯

Vesti minhas roupas normais e confortáveis e disse a Rubem que não queria saber de vestidos curtos ou qualquer tipo de roupa que mostrasse tanto a minha pele quanto aquele que, no que faltava de pano, sobrava de preço.

Encontramos a amiga loira de Rubem e o “tarado” que eu derrubara no chão do provador tomando suco sentados ao balcão de uma lanchonete interna da Folk Basfond. Ele usava óculos escuros e olhava sempre para frente, como se estivesse observando algo sempre à frente do seu nariz, quando na realidade não havia nada. Ele tinha a pele morena, escura, os cabelos enroladinhos e parecia ter a mesma idade da garota loira que o acompanhava, por volta de vinte anos.

— Olha quem está aqui. — Rubem brincou, quando nós nos aproximamos.

A moça sugou todo o conteúdo do suco de laranja do copo de uma só vez, levantou-se do banco onde estava de pé e ficou de frente para mim, estendendo-me a mão.

— Oi, Rosemary! Eu sou Dóris. — (então era ela quem falava ao telefone com o meu irmão logo cedo e seria a minha “consultora de moda”) — Eu acho que te devo desculpas pelo que meu irmão te aprontou logo cedo, mas eu sei que nem ele, nem você tiveram culpa. Foi só um mal entendido.

Então o garoto de pele morena também se levantou do banquinho da lanchonete interna e, estendendo-me a mão como Dóris fez, disse:

— Oi, meu nome é Sebastian!

Então eu percebi que ele usava uma guia em suas mãos. Foi quando me veio à cabeça a tamanha confusão que eu havia cometido: Sebastian era cego

Pude ver minha cara de abestada refletida nas lentes do seu par de óculos escuros.

Queria enfiar minha cabeça num buraco e nunca mais tirá-la de lá.

Cego. Cego. Cego. Eu bati num garoto inocente.


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Notas finais do capítulo

Comentários são importantes para o desenvolvimento da histórianey :3
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