Um Desconhecido escrita por Daijo


Capítulo 1
Capítulo 1




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/20769/chapter/1

 

 

Rio de Janeiro, 1920.

 

Eu acordei com a luz do sol refletindo em meu rosto. Remexi-me um pouco na cama, e a contragosto me levantei.

Ao lado da janela estava minha mãe. Ela estava com aquele sorriso gentil de sempre. Os olhos verdes me fitaram.

- Bom dia. – disse ela, enquanto ia até o armário e pegava um lindo vestido. – Coloque este hoje. – pediu mostrando a roupa que escolhera.

O vestido era de seda, num tom violeta. Seu comprimento era um pouco abaixo do joelho; o decote era bem discreto. Um vestido para uma moça inocente, como eu era.

Minha mãe saiu do quarto.

Eu entrei na casa de banho e lá fiquei alguns minutos relaxando na banheira. Sai enrolada em uma toalha e vesti o traje escolhido. Olhei-me no espelho.

Lá estava eu, uma jovem de vinte e um anos. O corpo bem desenhado, os olhos pretos expressivos e o cabelo, também preto, na altura dos ombros.

Quando desci as escadas para a sala de jantar, encontrei meu pai e minha mãe a mesa do café. Sentei-me a mesa. A empregada serviu-me um pouco de suco de laranja; ofereceu também torradas, mas eu não aceitei.

- Irá conhecer seu noivo hoje, Ana. – disse o homem de olhos negros.

Eu engasguei com o suco.

- Como assim papai? – perguntei desesperada.

- Foi o que você ouviu querida. – ele sorriu. Isso me deixou irritadíssima. Como ele poderia me entregar a um homem que eu ao menos conhecia. Só porque ele era um velho amigo de infância e um importante empresário?

Sim, o meu futuro noivo era mais velho que eu alguns anos. Para ser exata, dezenove anos. A alguns meses meu pai me alertara do meu destino. Um noivado com seu querido amigo. Fiquei desolada.

Sua aparência eu ainda não conhecia. Sabia apenas seu nome. Henrique Moura; belo nome. Mas se ele fosse feio? Pior, e se eu não fosse com a cara dele? Deveria ser um senhor da meia-idade mal-humorado. Desesperei-me mais. Já estávamos no século XX, porque ele ainda queria me arranjar um casamento?  

- Ele chegará hoje da França. – disse meu pai, para minha mãe. – Organize um maravilhoso jantar Lúcia, querida.

- Certamente, meu amor. – respondeu ela, dando uma piscadela.

Ao terminar o café subi para meu quarto. Lá me tranquei. Distrai-me com um livro que a pouco tempo comecei a ler. Quando a hora do almoço chegou, avisei a empregada que estava sem fome e não desceria; mas mesmo assim ela ainda me trouxe a refeição no quarto.

Passei o resto da tarde enfurnada em meu aposento. Algumas horas eu era tomada por um acesso de raiva, outras de tristeza; sempre pontuadas com algumas lágrimas, mas não ao ponto que deixassem meus olhos inchados.

As seis e meia alguém bateu em minha porta.

- Querida trouxe seu vestido. – Era minha mãe. Que droga será que eu não podia escolher minha própria roupa? Afinal eu já tinha vinte e um anos.

Levantei-me e destranquei a porta. Ela estava radiante, segurando uma caixa. Afastei-me da porta para que ela pudesse entrar. Mamãe depositou a caixa, azul claro, em cima da minha cama e abriu-a.

Fiquei maravilhada com o vestido; simplesmente lindo. Era vermelho; o decote em “V” era um pouco maior do que dos outros que eu costumava usar. Seu comprimento ia até os joelhos.

O êxtase tomou conta de mim. Era a primeira vez que eu usaria um vestido mais ‘ousado’. Pena que tinha que ser numa ocasião como aquela. Voltei a me emburrar.

- É melhor tomar banho querida. – disse minha mãe já saindo do quarto. – Daqui a pouco eu voltarei para ajudar com o cabelo. – ela saiu então.

Ainda amuada entrei na casa de banho. Apesar da maldita ocasião, estava ansiosa para colocar aquele vestido no corpo e ver como ficava. Esperei uns minutos até a banheira se encher de água morna.

Quando a banheira estava cheia, tirei meu outro vestido e submergi. Fiquei com todo o corpo embaixo da água por uns instantes. Confesso que passou pela minha cabeça, continuar daquela maneira por mais tempo. Talvez no outro mundo não precisasse me preocupar com um casamento e um noivo arranjado. Mas eu desisti da idéia; os ensinamentos que aprendi na igreja, não permitiam tal ato.

Depois de me esfregar com o mais cheiroso sabonete que tinha em meu banheiro, sai enrolada na toalha. Com ânsia, vesti a roupa escolhida pela minha mãe. Olhei-me no espelho. Uma perfeição. Aquele vestido realçava tanto as minhas curvas de mulher.

Por hora tive que interromper minha admiração, pois minha mãe entrara novamente no quarto.

Eram oito horas quando ela terminou de arrumar meu cabelo e me maquiar.

Meus cabelos estavam presos em um coque à nuca, deixando alguns fios ondulados soltos. A maquiagem era bem leve.

Minha mãe saiu rápido, pois ainda tinha que dar um jeito no próprio cabelo. Após quinze minutos escutei a campainha tocar.

“Ele chegou.” – suspirei desanimada. No fundo ainda tinha esperança que ele não viesse.

Mamãe havia me avisado para descer a oito e meia em ponto; nem mais cedo, nem mais tarde. Então as oito e vinte nove, comecei a caminhar para o meu matadouro. A partir de um minuto, eu poderia considerar-me morta. Não em carne, mas em alma. Minha própria família estava me entregando para um desconhecido. Teria que me casar com um homem que eu ao menos conhecia; como podiam achar que eu o amaria um dia.

Quando terminei de descer as escadas, o relógio da sala marcava oito e meia. Dirigi-me até a sala de jantar. Minha mãe olhava ansiosa para a porta, e da porta para seu relógio de pulso. Meu pai conversava animadamente com o amigo.

Foi então que eu o vi pela primeira vez. Era extremamente belo. Os olhos eram de um azul profundo. Os cabelos lisos eram negros; havia um fio ou outro grisalho, tão charmoso. Prendi a respiração encantada.

Ele me olhou. Juro que estremeci internamente com aquele ato. Sorriu-me gentil. Meu coração acelerou. Que diabos estava acontecendo comigo?

- Filha? – chamou meu pai.

- Hã? – não tinha a menor idéia do que ele falava. Aqueles olhos azuis me tiraram toda a concentração.

Por que aquele desconhecido me provocava aquelas sensações? Isso eu não podia responder. Mas esse fato não me fez esquecer que daqui a alguns meses eu teria que conviver com aquele homem, contra a minha vontade.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Essa fic é um desafio para mim. Nunca tinha feito uma história na primeira pessoa, então decidi experimentar dessa vez. Ta ai... espero que esteja boa.
Até o próximo capítulo então...



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Um Desconhecido" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.