Seven Reasons escrita por SumLee


Capítulo 5
Destrua-me


Notas iniciais do capítulo

Hey! Como vocês estão? Eu espero que bem. Nossa, faz tempo que eu não posto um capitulo de SR. Bem, esse é um dos meus favoritos. Aliás, todos são, amei escrever cada um deles. Mas chega de blábláblá e vamos ao que interessa.



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Is anybody out there?

(Tem alguém aí fora?)

Is anybody listening?

(Tem alguém ouvindo?)

Does anybody really know?

(Alguém realmente sabe?)

Is the end of the beginning

(É o fim do começo)

The cry a rush a one breath

(O choro, a corrida, uma respiração)

Is all we waiting for

(É tudo o que nós estávamos esperando)

Sometimes I want my taking

(Algumas vezes eu quero o que foi me tomado)

Changes everyone before

(Muda todo mundo antes)

Holding On And Letting Go – Ross Copperman

4. Destrua-me

Port Angeles, Washington;

 Emmett's POV

 A forma como ela se movia era como se flutuasse pela cozinha. Seu corpo delicado parecia pequeno naquele lugar tão grande. As mãos com unhas pintadas pegavam bandejas e pratos, colocando em cima da grande mesa de madeira cor de mogno. Os cabelos negros como breu dançavam junto com ela, lentos e deslizantes. Ela cantarolava uma canção animada, como um indie rock que eu provavelmente nunca tenha ouvido falar. E seus olhos azuis brilhavam tanto quanto a claridade que entrava pelas enormes janelas de vidro, assim como a pele clara como a neve. O sorriso era de quem tinha ganhado o dia, sendo que ele mal havia começado. O rosado em suas bochechas lhe dava um ar angelical, assim como as pequenas rugas de expressão se formavam nos cantos dos olhos ao sorrir. Como ela podia ser tão feliz?

 Eu dei um passo para trás e me sentei no grande e enorme sofá de couro negro que estava na sala. Encarei a grande TV de LCD, que passavam um programa matinal qualquer sobre tudo. O volume estava baixo, quase no mudo, e com isso eu ainda podia ouvir sua voz de sinos soando na cozinha enquanto preparava o café da manhã. Junto tinha a batida dos talheres, e o espocar do bacon fritando. E eu só conseguia pensar na noite passada e em como conseguiria pegar a loira dos anos 60.

 Ainda não conseguia entender se ela bipolar ou estava se fazendo de difícil, porque da forma que tinha agido comigo no parque, ela só podia querer o que eu queria. Todas elas queriam. Todas mesmo. Porque aquela loira seria diferente? Ela só agia como uma mulher antiga – como a minha mãe -, mas isso não podia muda-la de ser moderna. Mas tudo bem, eu me conformo com isso. Só preciso agir como ela quer, e assim consigo tê-la na minha cama. Simples... E fácil. Nenhuma era complicada ou redutível demais para mim. Eu tinha todas na palma da minha mão, até as namoradas dos meus amigos. Mark é um bom exemplo disso. Como será que ele descobriu? Ah, tanto faz.

 Peguei o controle que estava ao meu lado e troquei de canal, colocando em um que passava Tom & Jerry. Eu deixei ali, gostava daquele ratinho esperto. Aumentei o volume, o que fez que ela parasse de cantar na mesma hora. Fingi que não me importava com sua presença quando ela adentrou a sala ainda sorridente.

 – Bom dia, querido. – falou animada, mas encolhendo um pouco os ombros como se esperasse pela patada.

 Eu tinha a resposta na ponta da língua para o seu meloso cumprimento que me irritava até o ultimo. E pode ter a certeza que não era nem um pouco delicada e não estava no conceito de boa educação. Era curta e grossa, como qualquer palavra que eu referia a ela e ele. Só que minha mente que se deliciava com um desafio novo não me deixou fazer tal ato que a magoaria. Eu precisava dela para poder ser o que Rosalie queria, então tinha que ser um filho falso, escondendo meu verdadeiro interesse.

 – Bom dia. – falei alto, ainda olhando para a TV, ignorando sua expressão de surpresa.

 Ser legal não significava que eu deveria chama-la de mãe ou abraça-la. Era só não falar nada que a magoasse.

 – O café já está pronto. Quer me acompanhar? Seu pai saiu para o trabalho... – ela encolheu os ombros novamente e eu me segurei para não revirar os olhos.

 Era sempre assim, ele nunca ficava em casa para acompanhar ela em alguma coisa. A única hora em que sentava a mesa com ela era no jantar e isso porque ele chegava do trabalho àquela hora. Eu ainda não entendia porque ele veio se da uma de pai que manda sendo que não tem presença aqui para fazer isso.

 – Tudo bem. – murmurei, abaixando o som da TV e levantando.

 Passei por ela, que olhava para o lugar do sofá que eu ocupava antes. Sua expressão era de surpresa e perplexidade, a boca meio aberta, os olhos arregalados, uma cena digna de desenho animado. Eu a ignorei novamente e segui para a cozinha e me sentei em uma das cadeiras. A mesa estava repleta de coisas, tinha frutas, iogurte, um bolo de chocolate, bacon, ovos, torradas, panquecas... Hoje ela estava inspirada. Depois de alguns segundos, Catherine entrou na cozinha, com o mesmo sorriso animado. Pegou o suco e o leite na geladeira e colocou na mesa, se sentando bem na minha frente.

 Eu peguei panquecas e coloquei no meu prato, jogando a calda de caramelo por cima. Não olhei para ela para constatar o óbvio: que me encarava. Coloquei um pouco de leite no copo e tomei um gole. Cortei um pedaço da panqueca com a mão mesmo e levei a boca, me segurando para não fechar os olhos em apreciação. Fazia quanto tempo que eu não comia daquelas panquecas? Eu evitava fazer qualquer refeição dentro de casa, porque eu sabia que quando sentasse nessa mesa, ela iria fazer como estava fazendo agora, e acharia que eu estava mudando. Rá, eu mudando, que ironia. Isso me fazia querer rir. Sua cabeça precisava de volta do parafuso que perdeu, porque ela era louca em pensar uma coisa dessas.

 Assim que terminei minhas panquecas, eu fui para o bolo, pegando um pedaço grande. Estava tão ou mais delicioso, e novamente me segurei para não demonstrar que tinha gostado. Foram exatos três pedaços grandes de bolo, bacon com ovos, e três copos de leite. Um bom e café da manhã reforçado que eu precisava tomar todos os dias por causa do boxe. Ainda estava comendo uma maçã. 

 – Está gostando, querido? – ela decidiu abrir a boca, depois de passar praticamente todo o tempo me olhando.

 – Hm. – fiz, mastigando um pedaço da fruta.

 Ela deu um sorriso e tomou do iogurte com frutas que tinha preparado para si, nem se importando com a minha falta de resposta para sua pergunta. Ela parecia tão anestesiada e feliz que eu poderia xinga-la e nada a abalaria. Isso tudo só porque ontem a chamei de mãe? Que coisa mais idiota e tosca. Eu não entendia porque ela dava importância a isso, já que eu não a considerava uma mãe, e nem ele um pai. Para mim eram dois conhecidos que tinham a obrigação de me sustentar por tempo indeterminado. Afinal, era só isso que eles achavam que precisava fazer.

 Mordi a parte interna da bochecha ao sentir a raiva me consumir, e me forcei a continuar mastigando. Olhar agora para seu sorriso e seus olhos tão brilhantes estava me dando náusea e eu não conseguia engolir a maçã. Tive que desviar meu olhar para a mesa, e controlar minha respiração que acelerava. O ódio tomava conta de mim, e se eu não tivesse o controle de mim, acabaria por socar aquela mesa – melhor a mesa do que a cara dela.

 Eu odiava os sorrisos dela. Odiava o carinho que ela me lançava mesmo eu sendo a pessoa mais idiota que existia. Eu odiava também vê-la com ele, os dois sorrindo felizes. Odiava principalmente o amor que tinham um com outro. Não conseguia ficar no mesmo cômodo que ele ou ela estivessem, e se os dois estivessem juntos, era ai que eu me mantinha longe. Me sentia claustrofóbico, como se o amor que eles sentissem preenchessem tanto o lugar que chegava a me sufocar. Nojento.

 Eu me forcei a engolir a maçã que mastigava e levantei da mesa rápido fazendo a cadeira arrastar no chão. O barulho acabou por assustar ela, que me olhou confusa. Lhe dei as costas e subi para meu quarto, não maneirando na forma pesada que pisava no chão. Assim que entrei, tranquei a porta na chave e fui até o saco de areia, começando a socar sem luvas mesmo. Eu precisava extravasar ou então acabaria por quebrar alguma coisa, e não queria aquele velho irritante nos meus ouvidos novamente falando que eu não sabia controlar minha raiva. Era bem capaz de eu não controlar mesmo e ser preso por bater nos pais. Sem exageros, porque já senti vontade de fazer isso.

 Sentia o suor descendo pela minha nuca, pescoço e torso, assim como meus braços protestarem pelos movimentos repetitivos. Minha pele nos nós dos dedos ardia, e eu podia ver respingos de sangue na capa de borracha do saco que eu tinha machucado eles. Mas eu não podia parar, porque eu ainda fervia de raiva. Muita raiva. Eu estava borbulhando por dentro, queimando no meu próprio ódio. Eu nunca ia conseguir deixar de ser assim se eu convivia com o motivo da minha raiva. Eu tinha que olhar para cara deles todos os dias, e engolir tudo. Não tinha como mudar essas coisas.

 – Mas que porra! – esbravejei, dando um soco de direita, fazendo o saco ir e voltar.

 Peguei-o com as duas mãos e encostei minha testa ali, ofegante. Minha respiração estava rápida com o esforço a mais que fiz fora o fato da raiva. Olhei para meus dedos e vi ali pequenos rasgos na pele dos nós, que sangravam um pouco. Soltei um palavrão e deitei no chão para descansar e o sangue esfriar. Minha cabeça rodava com vários pensamentos: a garota do parque, o olhar que a velha me lançava, e até minha derrota no jogo, que eu tinha que recuperar. Ainda estava encabulado com o fato que havia perdido para aqueles três trapaceiros. Mas eu ia ter a revanche, e destroçaria todos. Eles não esperavam para ver.

 Mas meu ponto principal não era esse, e sim a garota do parque. Eu não tinha me importado com seu fora, só que ver a satisfação no rosto da garçonete e do casal naquela espelunca atiçou meu pior lado, o que fazia tudo pelo próprio orgulho. Não ia admitir eles rirem de mim. Ia era mostrar para eles que eu conseguia pegar aquela loira que se mostrava tão dura na queda. E para eu fazer isso, teria que colocar uma máscara no garoto que sou, e me mostrar um verdadeiro cavalheiro, que era o que ela procurava. Só que eu não sabia como fazer isso tão perfeitamente que não me fizesse parecer um... Cafajeste como ela me chamou. É hilária a forma como ela fala. Isso até me deixa curioso para saber como devem ser os pais dela, pois para a garota ser assim só pode ter sido bem educada por eles. Ou talvez pelos avós ou bisavós?

 Bem, isso realmente não importa. A minha única saída para conseguir o que eu queria era falar com a velha, o que seria uma grande prova de sobrevivência... Para ela. E para mim também, eu admitia, porque ter que olhar toda vez para aquele sorriso e ver fios de esperança passar por seus olhos quando eu agisse fora de mim para um bem maior – meu orgulho – seria extremamente nauseante. Porque não adiantava ela tentar, ou até mesmo eu, nunca conseguiria deixar de ser o que sou: o garoto insensível. Mas se eu quisesse não fracassar, teria que pedir a ajuda dela. Nossa isso ia está tão fora... De tudo que já imaginei fazendo.

 Levantei do chão e rumei para o banheiro, precisava de um banho antes de ir colocar o plano em prática. Tremi em antecipação ao imaginar o que teria que passar. A água quente contra minhas costas era boa e relaxante, o que eu realmente precisava naquela hora. Eu gemi de dor quando os pequenos rasgos na pele da mão queimaram, mas como sou homem forte, ignorei e tomei meu banho. Vesti uma calça jeans e uma camiseta polo, deixando os cabelos molhados da forma que estavam. Não era de usar essas roupas assim, mas acho que precisava começar pelo visual, certo?

 Com um suspiro de encorajamento e vendo se meu estomago estava pronto para o que viria, eu sai do meu quarto e desci as escadas. Catherine estava sentada no sofá, assistindo o jornal da tarde. Me sentei ao seu lado, não a olhando nenhum momento. Eu estava nervoso e não sabia como começar a falar, como chegar a pedir. Eu me sentia com treze anos ao invés de dezoito. Até parecia que eu iria chamar uma garota para meu primeiro encontro. E porra, eu já tinha chamado mais de vinte para um encontro que no final daria ou ela na minha cama, ou eu na dela. Só que a questão não era essa, e sim que eu não conseguia proferir as palavras por orgulho. Pedir algo a alguém era a mesma coisa que eu cortar minha própria mão, porque eu sabia fazer tudo sozinho... Menos conquistar aquela garota.

 Era como se eu fosse um inexperiente desarmador de bomba, que se cortasse o fio errado, tudo iria pelos ares. Eu só tinha uma única chance para conquistar Rosalie, e se fizesse errado, se tirasse minha fantasia de cordeiro, eu iria pagar como um fracassado para ela, a garçonete, a garota do sorriso falso e o garoto do cabelo arrepiado. E eu não iria passar por isso, não mesmo.

 – Você quer me perguntar algo, Emmett? – sua voz doce soou aos meus ouvidos.

 Eu ia arregalar os olhos por causa da surpresa dela saber o que eu queria, mas isso seria uma demonstração de sentimentos, e eu não demonstrava nenhum para ela e ele. Para os dois, eu era uma pedra que só pensava em mim mesmo – e estavam completamente certos. Eu pediria ajuda da Catherine, mas não iria sorrir ou demonstrar qualquer coisa. Pedir, ela aceitar e nós fazermos é uma coisa, agora pedir, ela aceitar sorrindo e eu retribuir era outra diferente.

 Não vamos exagerar, por favor.

 – Quero. – falei firme, para não parecer um menino acuado.

 – Então fale, querido. – ela abaixou o volume da TV e se virou para mim.

ARGH! TAMPE MINHA BOCA QUE EU QUERO VOMITAR!

 – Eu queria pedir... – engoli a saliva que se acumulou excessivamente na minha boca. Era como se eu estivesse engolindo meu orgulho. – Pedir a sua ajuda.

 Ela ficou surpresa, o que era de se esperar por causa das palavras que proferir virem de mim, em um momento da qual eu nem sequer olhava na cara dela. Piscou três vezes consecutiva e rápida como se não acreditasse em que seus ouvidos escutaram. Eu coloquei minha melhor expressão de quem não sente nada, mas que está impaciente. Catherine arregalou um pouco os olhos, e olhando para mim, viu que eu falava mais que sério, então ela pigarreou e sorriu de forma doce. O mesmo sorriso que Rosalie havia me dado quando lhe mostrei meus pais em uma de suas cenas melosas.

 Tive que balançar a cabeça para afastar a loira sendo encantadora.

 – Ah... Claro. – ela fez, ainda procurando se manter normal e espantar a surpresa. – Em que?

 Ai que está velha, a pior parte desse pedido. Eu dei o primeiro passo, e consegui de boa, mesmo querendo me socar por estar fazendo isso. Mas ainda tinha a segunda parte, que era no que ela precisava me ajudar. Como eu falaria para a Catherine que eu precisava da ajuda dela com uma garota, se ela já tinha me visto entrar com várias aqui? Isso era constrangedor demais, e muito sem noção. Só que eu tinha que fazer, pelo bem do meu maldito orgulho.

 – Eu conheci uma garota ontem... – comecei, olhando-a direto nos olhos azuis. Isso significava que eu não me importava e não tinha vergonha de falar aquilo, mesmo que fosse o contrário. – E ela é diferente das garotas que eu estou acostumado sair.

 – Como assim diferente? – perguntou quando parei de falar.

 – Ela gosta mais de cavalheiros do que dos homens atuais. Uma verdadeira lady, se você me entende. – dei de ombros.

 Catherine balançou a cabeça, como se concordasse com o que eu tivesse dito, e pensasse no assunto. Eu olhei para a TV fingindo desinteresse, e a ouvi estalar a língua.

 – Isso é realmente impressionante. – murmurou, apertando os lábios em uma linha fina. Aquele sorriso encantador, e a expressão feliz passaram para uma avaliadora. – Você querendo conquistar uma garota... Estou muito, muito impressionada.

 – Pois é. – dei de ombros.

 – Eu não sei se posso fazer isso. – falou, me fazendo encara-la na mesma hora.

 – O que? – a pergunta saiu como um rosnado.

 – Eu não sou idiota, Emmett, e não vou cair nessa de que você está mudando por causa da garota. Não agora. E se eu acabar por lhe ensinar como ser um verdadeiro cavalheiro, o que me garante que não vai quebrar o coração dessa lady? Eu tenho o meu todos os dias por você, e me doeria imaginar que uma garota tão doce possa ter o dela também.

 Senti meu queixo cair, e a perplexidade me tomar até estampar na minha face, só que daquela vez não parei para pensar que não podia mostrar o que sentia. Estava atônito demais para isso. Cadê aquela sonsa que sorria para mim mesmo se eu lhe mostrasse o dedo do meio? Estava adormecida em algum lugar, só pode! E agora a mulher realmente esperta que deveria ser assim há anos atrás, apareceu para atrapalhar minha vida.

 – Eu não faria isso. – menti.

 – Claro que não. – ela revirou os olhos. – Emmett, fui eu quem te carreguei na barriga por nove meses, e fui eu quem cuidou de você por todos esses anos, e apesar de odiar a pessoa amargura e fria que se tornou, lhe conheço como a palma da minha mão. E não vou lhe ajudar a se tornar uma pessoa pior do que já é.

 Ela levantou do sofá e me deu as costas, me deixando com aquela cara de otário. Eu não podia acreditar... Eu não conseguia acreditar que ela tinha tentado me dar uma lição de moral e ainda tinha levado meu plano por água a baixo. E eu não acreditava que ela estava protegendo uma vadia que ela nem conhecia.

 – Isso é realmente irônico. – levantei do sofá em um rompante, seguindo ela, que parou na metade do caminho para a cozinha. – Eu me pergunto onde estava essa mulher que protege as pessoas oito anos atrás... Escondida?

 – Eu sempre estive aqui. – ela se virou para mim, seus olhos tristes e magoados. – Você sabe disso...

 – Oh, como eu realmente sei. – soltei com sarcasmo. – Você me deve uma, Catherine, por tudo, e deveria me ajudar.

 – Eu não quero destruir o mundo de uma garota, Emmett!

 – Ah, qual é! – joguei as mãos para cima. – Ela tem que saber como é a realidade, se é que já não sabe. E fala sério, o que tem "destruir" o mundo dela? Destruíram o meu e eu não reclamei.

 – Não, você não reclamou. Fez pior que isso, virou um destruidor. – lágrimas rolavam de seus olhos azuis. – Eu já disse que não vou lhe ajudar nisso, e se quiser ser o pior pesadelo dela, faça isso sozinho.

 Novamente Catherine me deu as costas, mudando o rumo do seu caminho para o segundo andar. Ela subiu as escadas lentamente, como se estivesse cansada. No topo, ela parou e soltou um suspiro, ficando parada ali.

 – Porque isso é tão importante para você? – perguntou com a voz mole.

 – Isso não lhe interessa. – ataquei quase que cuspindo as palavras.

 – É um desafio novo, certo? Só pode ser...

 – E se for, o que você tem haver com isso? Já que não vai me ajudar, não se intrometa.

 Novamente eu estava sendo tomado pela ira demoníaca, e tive que cruzar meus braços para não fazer qualquer besteira que destruísse a casa. Catherine ficou parada lá em cima, e eu me perguntei quando aquela idiota iria sumir para que eu pudesse extravasar quebrando algo dela, que a ferisse internamente. Seria tão prazeroso...

 – Se eu lhe ajudar Emmett, me promete uma coisa? – perguntou, fazendo e voltar minha atenção para ela.

 – Porque eu deveria prometer algo para alguém que adorar quebrar promessas? – subi os degraus, ficando uns três abaixo dela, mas quase na sua altura.

 – Se eu lhe ajudar Emmett... – ela se virou para mim. – Me promete uma coisa? – repetiu, me ignorando.

 Olhei para o lado, ponderando o que poderia ser que ela queria. Que eu lhe chamasse de mãe? Nunca! Que eu mudasse meus hábitos e personalidade? Nem a base da tortura isso poderia acontecer. Que eu não quebrasse o pobre coração da garota? Ah, fala sério, isso dependia dela, não de mim. Mas se fossem essas coisas, Catherine deveria saber muito bem que eu não poderia cumprir, porque esse era eu, e ela tinha que me aceitar, querendo ou não.

 – Manda.

 – Promete ou não?

 – Pelo amor de Deus! – bufei. – Tanto faz, eu prometo. Agora fala logo essa porra.

 – Tem que me prometer que enquanto eu estiver lhe ensinando sobre como ser o cara perfeito para a garota, não poderá ser a pessoa que é. E... – levantou o dedo me fazendo parar o protesto. – Não é uma mudança de personalidade que eu quero, só não vou aguentar ensinar um garoto ignorante que só sabe soltar ironias. Eu sei que forço uma boa convivência aqui, e fracasso, e também não mostro que me incomodo, mas me incomodo, e muito, então...

 Eu bufei, revirando os olhos. Ótimo, da nojenta que dá diabete por ser tão doce ela virou a bruxa que não aguenta o próprio filho. Que boa evolução! E tudo por causa da lady.

 Mas o que ela pediu não era grande coisa, seria apenas enquanto ela me ensinava a ser a porra do idiota do cara perfeito. Depois, Byebye Emmett estupido e Oláaa Eu. Realmente isso não era nada demais, e eu podia fazer isso. Quantas vezes eu tinha encenado uma pessoa que não era? Muitas, e me sai muito bem como em todas as coisas que faço. Eu só não sabia ser o que Rosalie pedia o que é uma grande merda.

 – Ok. – falei por fim.

 Catherine deu um pequeno sorriso, e desceu dois degraus, ficando bem na minha frente.

 – Então tudo bem, Emmett, eu te ajudo a conquistar a garota. – ela falou e passou por mim, descendo as escadas.

 Eu dei de ombros e a segui. Começava a desconfiar que ela fosse bipolar, porque até certo momento não concordava que eu fosse um destruidor de mundinhos perfeitos, e agora, depois de eu fazer uma promessa tosca, ela aceitava. Promessa essa que não faria nada que pudesse impedir de eu ser o que sou no final com Rosalie. Como eu disse bipolar e louca.

 – Como começamos? – perguntei me sentado na poltrona para assim ficar longe dela, que estava no sofá. Catherine segurava nas mãos uma pequena agenda e uma caneta.

 – Emmett, a primeira coisa e a mais crucial de todas é bastante simples e fácil: você precisa ser educado. Sem palavrões, cantadas, ou qualquer coisa do gênero que possa a fazer perder o encanto. – me olhou como se avaliasse que eu estava aprendendo, e quando viu que sim, que eu prestava atenção, ela se focou no bloquinho de notas, escrevendo algo. – Tente falar mais cordialmente, como se estivesse falando com a Rainha da Inglaterra, porque é realmente assim que sua lady é.

 – Espera. – levantei as mãos. – Ela... Ela não é a minha lady, ok? Eu só a quero... Bem, ela não é. – franzi o cenho.

 Catherine negou com a cabeça, um sorriso divertido no rosto.

 – A partir do momento que você decide conquistar ela, a garota se torna uma parte sua que você está focado. Então, querendo ou não, ela é sua. Não de uma forma possessiva, ou um premio que você é obrigado a ganhar. Uma conquista, que você está disposto a fazer de tudo para ganhar seu coração.

 Era isso que me matava! Essa coisa de coração, paixão, amor, carinho e essas babaquices todas não eram para mim, me davam vontade de vomitar como as palavras tinham um tom enjoado. E Catherine não facilitava essas coisas para mim, porque ficava falando, falando e falando de tudo isso. E mesmo que se não falasse, seu timbre de voz carregado de doçura fazia esse trabalho.

 Queria pedir para ela parar com a idiotice, mandar logo tudo na lata, mas a promessa piscou na minha cabeça como um letreiro em neon, e eu bufei contrariado. Pelo menos um dia eu tinha que fazer o que ela pediu para não perder minha chave para a porta do paraíso.

 – Continua. – pedi, me controlando para não soar rude.

 Pelo menos por hoje.

 – A trate bem, como se fosse uma preciosidade. Em um encontro ou uma saída, abra a porta do carro para ela. No restaurante, puxe a cadeira para ela. Se a ver triste, mostre-se preocupado com isso. É tão simples que você não deveria estar me pedindo ajuda. – balançou a cabeça e anotou mais alguma coisa no bloquinho. – Querendo resumir tudo que eu falei aqui: você tem que agir como se a garota fosse o seu mundo. Não digo apaixonadamente, mas é quase isso. O primeiro encontro é crucial que se mostre encantado com ela, que preste atenção em tudo que ela diz mesmo se for sobre cabelos ou roupas. Ela tem que se sentir querida, amada, e saber que sua atenção está focada nela.

 Balancei a cabeça, captando o que ela falava.

 E mesmo achando uma completa idiotice a entonação que dizia em cada palavra, não podia negar que estava tendo uma aula melhor do que podia esperar. Era besta essa coisa de se sentir querida, amada, e blábláblá, porque eu fazia todas elas se sentirem assim quando estávamos entre quatro paredes. Rosalie que não quis me dar à chance de mostrar isso, querendo fazer doce para o meu lado. Agora, eu tinha que aguentar aulas sobre "Como ser o cara perfeito" com a mulher que queria porque queria que eu também me transformasse naquilo.

Não via a hora de ela perder as esperanças.

  – Emmett, só palavras não vão te ajudar. Você precisa ter um exemplo de como as coisas devem ser... – ela jogou para mim o bloco de notas e levantou, seguindo para a estante, do lado que havia milhares de DVDs.

 Olhei para sua caligrafia perfeita e fina na folha, lendo o que ela tinha escrito.

 Transformando o idiota do meu filho em alguém... Melhor

 Esse era o título, e eu me segurei para não rir. A hesitação na parte "melhor" mostrava que ela não era tão esperançosa como parecia. Havia uma lista feita ali, separadas por pequenos pontos. O primeiro estava assim:

 • Ser educado e cortar os palavrões. Tem que aprender a falar de forma cordial.

 Isso eu sabia desde sempre que deveria mudar. Não culpava ninguém meu mau vocabulário, apenas era uma coisa de garoto, ter um palavrão em cada frase. As garotas gostavam, e passavam a sensação de ser homem!

 • Aprender a se comportar em um encontro.

 Eu sabia me comportar em um encontro... Com uma garota do colégio. Tinha que me acostumar que de alguma forma Rosalie era um pouco diferente – mas só um pouco. Era difícil ter que colocar em mente que as coisas com ela seriam diferentes. Ok, agir diferente não estava sendo tão fácil como eu imaginava. 

 – Pega isso aqui, Emmett. – Catherine voltou, trazendo alguns DVDs nas mãos. – Esses filmes vai lhe ajudar um pouco com o que eu quero dizer. Afinal, nada melhor do que visualizar, hum? – sorriu de canto.

 Peguei os DVDs das mãos dela e olhei os títulos: Um Amor para RecordarA Dama e o VagabundoRomeu e Julieta e Dez Coisas que Odeio em Você.

 – Esses são filmes que lembram o que você quer e o que deve aprender. Romeu e Julieta é a melhor versão, de Zeffirelli, e mostra como eles agem antigamente. A Dama e o Vagabundo é porque você precisa de um pouco de romance.

 Olhei dela para os filmes em minhas mãos. Ela só podia estar ficando louca, é seio.

 – Eu não vou assistir essas porras!

 – Ah, você vai. – sorriu maldosamente, me fazendo arregalar os olhos. – Se quiser ficara com a lady você vai assistir.

 Oh, merda!

Orfanato de Port Angeles; Washington

 Alice's POV

 – Hey, Selly, não corre! – eu falei para ela que corria nas escadas do orfanato.

 O dia estava incrível e horrivelmente frio. A chuva que caiu a madrugada inteira tinha virado gelo, e o chão de concreto que cercava o prédio era uma arma mortal para as crianças. E mesmo elas sabendo disso, não se importavam, nem mesmo com o frio de congelar a bunda, elas só queriam brincar. Deviam ter couro de sapo para aguentar isso, porque eu me sentia congelar. Minhas pernas chegaram a paralisar por causa do frio.

 – Tia Alice, vem logo! – ela chamou, pulando no lugar.

 Eu não conseguia olhar em seus olhos sem lembrar-me de Bella. Antes já era difícil olhar para Selly sem sentir pena, agora as coisas tinham ficado piores, porque eu imaginava a pequena loirinha com um futuro igual o de Bella: infeliz. As duas tinham buracos fundos e escuros nos olhos, perdidas dentro de si próprias, em um mundo só seu. Eu sentia ódio ao olhar para as duas garotas, porque eu me negava a acreditar que poderiam existir pessoas assim que as maltratassem. Que abandonasse...

 – Tia Aliceeeeee! – Selly chamou novamente, mais impaciente.

 – Eu já estou indo, apressadinha. – resmunguei, começando a andar.

 Nós duas entramos no prédio, e fomos atingidas por uma onda quente de calor, como um bafo. Eu soltei um suspiro de alivio por ter saído daquele inferno congelado, pois se ficasse mais lá com certeza vivaria um cubo de gelo. Odiava Washington e tinha a promessa de que quando pudesse me virar, eu iria embora para Phoenix viver no calor de todos os dias que lá era cercado. Ganhar uma cor, porque eu sinceramente precisava sair desse pálido doente.

 Selly me puxou para o grande sofá e me fez deitar, com ela embalada em meus braços. Toda vez que estava com sono, Selly fazia isso, pois queria que eu a protegesse dos pesadelos que a atormentavam desde... Sempre. E não apenas nos cinco meses que estava aqui.

 Eu me lembrava de cada pequeno detalhe que aconteceu no dia em que a vi pela primeira vez aqui no orfanato. Estava tendo uma daquelas fortes tempestades de verão, com muito vento. Algumas crianças tinham tirado o dia para dormir naquela tarde, enquanto outras estavam na sala de estar brincando. Eu estava no meu quarto, pensando em como o trabalho seria entediante novamente, quando ouvi a porta da sala bater. Esperei pelos gritos animados das crianças, porque eram assim que elas ficavam quando alguém entrava, mas não ouve nenhum barulho sequer, entrou em um silêncio profundo. Estranhando, levantei e fui ver o que tinha acontecido, dando com a irmã Marielle parada na porta. As poucas crianças na sala olhavam estranho para ela, me deixando ainda mais confusa.

 – Que chuva! – a irmã falou, sorrindo amavelmente como sempre fazia. – Do carro até aqui foi como se eu tivesse passado mais de dez minutos no chuveiro.

 Eu sorri em retribuição para sua piada sem graça e sem sentido lógico – como qualquer outra que ela soltava, mas meu sorriso morreu ao perceber que ao lado havia uma pequena mala preta e surrada. E meus olhos rápidos captaram um movimento atrás de suas pernas. Olhei questionaria para Marielle, que assentiu lentamente respondendo minha pergunta silenciosa. Tínhamos mais um integrante na nossa casa.

 – Ela é tímida. – Marielle falou sem som para mim, que entendi na hora.

 Caminhei lentamente até elas duas, tomando o total cuidado para não assustar a pequena criança. Marielle, com a minha aproximação deu um passo para trás, me fazendo estancar no lugar e arregalar os olhos. Aquela garotinha... Deus, ela tinha o olhar mais triste que eu já tinha visto em toda a minha vida. Era como se ela com apenas aquele tamanho tivesse visto o mundo inteiro, e o carregado nas costas, porque sua inocência parecia perdida dentro dela. Seu corpinho magrinho parecia frágil e quebradiço, e a pequena mochila rosa que carregava nas costas parecia pesar, mesmo mostrando que não tivesse nada ali. Eram olhos verdes sofridos, que por si só imploravam por ajuda. E olhando-os tão indiscretamente, eu senti vontade de chorar por ela. Mas me controlei, e continuei o que ia fazer.

 – Hey, linda garotinha, como é o seu nome? – perguntei, me abaixando para ficar na sua altura.

 A garotinha deu um passo para trás e balançou a cabeça, como se estivesse com medo de mim. Olhei para Marielle, que balançou a cabeça em uma confirmativa. A garota estava mesmo com medo de mim. Mas eu não ia desistir, tinha dado a minha primeira tentativa.

 – Meu nome é Alice... E eu sou a maior criança daqui. – sorri para ela, que me encarava. – Nós agora seremos uma família, e eu vou adorar saber mais sobre minha nova irmãzinha. Que tal me falar seu nome, hum?

 Não obtive nenhuma resposta, o que me chateou. Será que era alguma coisa comigo? Com a irmã Marielle ela parecia buscar proteção, e já comigo ela parecia querer fugir. Seus olhos não se fixavam em mim, ou em qualquer lugar, iam da irmã para as crianças e depois para mim.

 – Que cheiro é esse? – a irmã Marielle falou, cheirando o ar. – São biscoitos? Eu não acredito! Vamos comer?

 As crianças, que até tal momento estavam quietas por causa da curiosidade da nova integrante, saíram correndo e rindo na direção da cozinha, sendo acompanhadas pela irmã. Eu senti o desespero tomar conta de mim, porque ela não podia me deixar ali sozinha com uma criança que parecia ter medo de mim!

 Eu me virei para a garotinha branquinha de cabelos amarelos cor de areia. Ela agora só me encarava, sem demonstrar nada. Senti-me ainda mais desesperada.

 – Er... Você quer comer biscoitos também, sweetheart? – perguntei carinhosamente.

 – Meu nome não é esse. – ela fez uma careta. Sua voz era baixinha e fininha.

 Sorri por ter conseguido um progresso.

 – Eu não posso saber se você não me falou ele ainda.

 – É Selena. Mas... Vovó me chamava de Selly.

 – Oh, que nome lindo. – elogiei, ganhando um sorriso em resposta. – Então, Selly, o que me diz de comer biscoitos?

 Ela olhou para baixo e suas bochechas já rosadas ganharam ainda mais cor a deixando ainda mais uma pequena criança do que já era. Deu um pequeno aceno com a cabeça, envergonhada.

 – Hmmm, você vai ver como os biscoitos da irmã Lucy são deliciosos. – falei, tirando sua mochila das costas.

 – Vovó fazia biscoitos deliciosos também.

 Eu sorri para ela, curiosa para saber o porquê dela estar ali, e também de falar tanto de sua avó. Mas deixaria para perguntar isso depois porque a garotinha não precisava ficar lembrando o porquê de estar aqui. Levantei do chão e estendi a mão para ela, que pegou. Eu me surpreendi com o gelo em que sua pele se encontrava. Assustada, toquei suas roupas – que eram poucas – e seu corpo. Estavam gelados também, e a roupa úmida. Ela precisava trocar urgentemente.

 – Hm... Selly, que tal você tomar um banho antes de comer biscoito e tomar um copo grandão de leite quente?

 Ela me olhou e assentiu. A guiei para o meu quarto – levando a sua mala também -, a deixei sentada em cima da minha cama e comecei a vasculhar suas coisas em busca de roupa quente. Port Angeles era frio, mesmo sendo verão. Assim que encontrei perguntei se ela queria ajuda para se banhar e ela negou, corando. Então, eu a guiei até o quarto da irmã Marielle – a diretora do orfanato – que era aonde tinha uma banheira. Selly precisava de um banho quente e gostoso. Enchi a banheira, coloquei sabão, fazendo espuma e a deixei lá para tirar a roupa e tomar o banho. Desci para a cozinha, e agora só estavam à irmã Marielle lá, comendo dos biscoitos. Me sentei na sua frente, pegando um da bandeja.

 – Porque Selly está aqui? – mandei direta.

 – É uma história triste... – a irmã fez careta. – O conselho tutelar me ligou hoje de tarde avisando que tinha uma criança lá com um caso urgente. Eu me preocupei, porque a maioria das crianças que são chamadas assim é por que...

 – Sofre agressão física. – completei, sentindo um caroço se formar na minha garganta.

 – Exato. E é isso que aconteceu com Selly... Os pais além de brigarem entre si eles ainda batiam na criança. Foram encontradas nela cicatrizes de corte, queimaduras de cigarro, e nos Raio-X que fizeram ossos quebrados e hematomas internos. Alice, ela tinha marcas desde quando tinha poucos meses de vida...

 – Meu Deus... – murmurei.

 Era esse o motivo dos buracos vazios em seus olhos. Sua alma estava machucada como a de uma pessoa adulta, e ela não era culpada por isso.

 – Eram dois adolescentes irresponsáveis que foram expulsos de casa quando descobriram que a garota estava grávida. A mãe do garoto, uma boa senhora e que Deus a tenha, foi contra o marido e comprou uma pequena casa para eles, para poderem fazer seu futuro, mas foi completamente ao contrário. Eles eram drogados, e sem os pais... Bem, deu para entender. Faltava comida em casa, roupa para Selly, e... Resultou no que os exames que fizeram indicam: anemia aguda.

 Tão magrinha... Era óbvio que ela teria isso.

 – E Alice... – Marielle balançou a cabeça, deixando algumas lágrimas rolarem por seus olhos. – Se não cuidarmos dela direito, Selly está perto de ter leucemia. Os glóbulos brancos dela são poucos, por que essa anemia é desde bebê.

 – Mas e a avó dela? O que fez todo esse tempo antes de morrer?

 – Eles não a deixavam cuidar de Selly por estarem magoados. E também, o marido dela proibia de ver a criança. Os pequenos encontros que tinham eram rápidos... Mas recordáveis. Selly só fala dela, em tudo que citamos. A avó dela morreu faz menos de dois meses, e as agressões na criança pioraram ainda mais. A mulher do conselho tutelar fazia umas visitas a casa deles, mas sempre encontrava em perfeito estado, então não desconfiava de nada. Mas hoje... Eles apareceram lá, os dois chorando, e falando para tirarem a filhinha deles, porque eles eram monstros. Acho que não estavam drogados...

 Eu balancei a cabeça, horrorizada que pessoas tão irresponsáveis podiam fazer isso com um anjinho como a Selly. Eu nunca teria coragem de encostar um dedo sequer nela, com medo de quebra-la... E eles faziam pior do que bater. Quantas vezes ela deve ter apanhado? Quantas vezes ela foi queimada com os cigarros? Me doía pensar que a garotinha que parecia ter quatro anos no máximo tivesse sofrido. Eu parecia entrar em um sofrimento ao me colocar em seu lugar.

 – Eu sei, Alice... Eu sei. – Marielle pegou minha mão com a dela.

 Abaixei a cabeça, me perguntando se aquilo também aconteceria comigo se não tivesse sido largada nesse orfanato quando ainda era bebê. Era doloroso e sofrido sequer imaginar, então imagina viver isso na pele...

 – Preciso tirar Selly do banho. – levantei rápido. – A água deve ter ficado gelada.

 Marielle entendeu e assentiu com a cabeça, também levantando e me acompanhando até as escadas. As subi correndo, entrando logo no banheiro, e assustando a pequena Selly. Ela brincava com a espuma, e quando me viu, deu um sorriso constrangido. Eu caminhei lentamente até chegar perto da banheira, e cai sentada do lado. Selly me olhava questionaria, sem entender minhas ações, mas eu estava perdida em pensamentos.

 – Está tudo bem, Alice? – perguntou com a voz baixinha.

 Assenti com a cabeça, sentindo as lágrimas escorrerem pelos meus olhos. Peguei o sabonete que tinha ali e passei nas costas dela, sentindo nos meus dedos as costelas. Olhei para a pele translucida e vi hematomas. Muitos hematomas. Se contasse, podia apostar que deveria ter mais de dez enormes. E vi também as pequenas marcas queimaduras: redondas e deformadas. Tive que engolir a bile, mas não consegui controlar as lágrimas. Selly olhava para a água, talvez entendendo o porquê de eu estar daquela forma. Ela tinha quatro anos, mas não parecia. Ela era inteligente, claro que era!

 – Isso vai passar, sweetheart. Isso vai passar. – prometi em um sussurro, com a voz entrecortada.

 – Eu sei. – ela assentiu com a cabeça e se virou para mim. – Acredito em você.

 Ela abriu os bracinhos magros para me abraçar, e eu tive os vislumbres de cicatrizes de cortes. Muitos cortes. Era como se eles a torturassem...

 Chorando audivelmente, eu a apertei em meus braços, como se eu precisasse de apoio ali, e não ela. Queria arrancar suas dores, apagar aquelas marcas, lhe tirar as memórias dolorosas para que ela crescesse feliz e sem nenhum trauma, mas eu não tinha essa capacidade. Eu não era Deus para poder fazer tal ato de amor, e isso fazia eu me sentir uma impossibilitada. O abraço era desconfortável, e para evitar que ela sentisse mais dores, entrei na banheira, embalando-a no meu colo. As duas chorando...

 – Eu vou cuidar de você, Selly. Ninguém nunca mais vai lhe machucar... – passava as mãos em seus cabelos, onde meu rosto estava enterrado. – Ninguém machuca a minha vida.

 Era doloroso lembrar-se de como ela tinha aparecido aqui, o estado deplorável que se encontrava. Mesmo o orfanato não ganhando uma boa verba e não tendo muito dinheiro, eu procurei trabalho e conseguimos junto ajudar Selly. Passamo-la no médico, compramos remédio, vitaminas e agora ela não sofria mais risco de ter leucemia. Ainda era pequena, magra e frágil, mas isso era o resultado da mãe – se é que ela pode ser chamada assim – usar drogas durante toda a gravidez. Mas fora isso, seu estado de saúde era ótimo. Graças a Deus!

 Quando eu vi Bella atrás de Edward na quinta-feira chuvosa que estava, foi como se eu revivesse a cena de Selly. Ela com medo, tão frágil, e os olhos... Tão perdidos. Buracos profundos que pareciam não ter fim. Ao olhar para ela, me questionei se Edward conseguiria mesmo salva-la porque sua alma parecia tão ferida quanto à de Selly. E eu não estava pensando demais... Bella também sofria da mesma forma, por mais tempo. Quando entrei no quarto e a vi sem roupa, com todos aqueles hematomas, foi como se visse flashbacks do passado e previa o futuro. Em vez da garotinha de cabelos cor de areia, era a garota dos cabelos cor de chocolate que apanhava. E ao invés de Bella tendo aquelas marcas naquela idade, era Selly ali, linda, loira e machucada. Era tão triste tudo isso que chegava a doer em mim até fisicamente.

 – Ela dormiu? – Marielle apareceu do nada, me assustando e me tirando dos meus pensamentos.

 Olhei para Selly, que ressonava tranquilamente em meus braços. Assenti para a irmã, que sorriu docemente e se retirou do local, avisando que ia dar quatro horas da tarde. Sabendo do meu próximo compromisso, eu peguei Selly no colo e a coloquei na sua cama, depois pegando uma roupa e seguindo para o banheiro coletivo.

 Eu adorava parques de diversão, era um local que passava tanta energia positiva que se pudesse, viveria ali. Era fácil conviver ali, fingir sorrisos e agradar a todos. Era mais fácil do que dormir, porque mesmo estando triste ou com raiva, se visse uma criança feliz ali, ou um casal de namorados, você iria sorrir. Parque de diversões à moda antiga – aqueles que contem aquelas brilhantes rodas gigantes, montanhas-russas de madeira e carrossel – tinham uma mágica. Eu era fascinada por coisas antigas, e ficava feliz que meu trabalho me fazia me sentir bem. Mesmo entediada eu adorava estar ali. Dentro de tudo que desejava na minha vida – só desejava mesmo. Uma felicidade branda, um amor adolescente, um choro infantil... Todos precisavam disso em nossas vidas. Ter seus momentos de felicidade, com sorrisos sinceros, lágrimas de alegria, gargalhadas espontâneas... Coisas que aquecessem nossos corações. E o amor... Ter alguém que lhe proteja que lhe diga que esta linda, que sussurre bem baixinho um "eu te amo" no ouvido, enquanto os corpos se aquecem um no outro... Não era muito, não era caro, não custava nada além de ser verdadeiro. Mas apesar dessas coisas boas, ter seus momentos tristes para levar da vida um chute na bunda ou um tapa na cara, para assim não cometer os mesmos erros, aprender coisas que as pessoas não podem ensinar.

 Ter essas sensações que se viam em um parque de diversão. Eu queria me sentir em uma montanha-russa, o frio na barriga. Queria sentir a calma da roda gigante. Ah, eu queria sentir tanta coisa, mas não podia. Estava presa dentro de outros sentimentos: a rejeição, a angustia, o sofrimento. Apesar de terem se passado dezessete anos, eu ainda sofria ao saber que meus pais não me amavam, ou não queriam cuidar de mim. Mesmo que eu tenha recebido todo o carinho e atenção que uma criança poderia receber no orfanato ainda sentia falta de um amor materno, uma proteção paterna. Era normal para uma criança que desde que se conhecia por gente sentisse isso. Tão normal que essa criança crescesse extremamente carente e infeliz.

 – Alice! – ouvi me chamarem altamente feliz.

 Eu sorri ao reconhecer a voz, e pude sentir meu coração acelerar como sempre fazia quando eu o via. De alguma forma, mesmo presa nas minhas profundas negatividades, eu conseguia submergir por alguns minutos quando conversava com ele. Era como se eu tivesse um bote, que só aguentasse por pouco tempo o peso do meu corpo, e logo afundava. Eu não entendia isso, as reações e sensações que tinha diante do homem sorridente. Acho que era isso, o fato dele ser feliz que me enchia de alegria também. Olhar para o sorriso dele tão aberto era a mesma coisa que olhar para o parque com as luzes acesas: iluminado. Seus olhos cor de avelã pareciam não dar espaço para nada além de alegria, como se não existisse tristeza no mundo, como se as crianças da Etiópia pudessem ter esperanças, que elas teriam alimentos todos os dias. Ou que nunca mais haveria guerra. Era como se ele fosse imortal e não existisse morte ou sofrimento.

 Jasper era a pessoa perfeita para acabar com a tristeza de alguém... Menos com a minha.

 – Hey, Happy Boy. – o cumprimentei, continuando a andar na direção do pequeno trailer que Harry transformou em lanchonete.

 Ouvi os passos de Jasper aumentarem o ritmo, e logo ele estava ao meu lado, seu braço longo e um pouco forte passando por cima dos meus ombros. Ele era alto, e isso fazia em me sentir pequena demais – ainda mais do que era.

 – Como passais a vida, minha linda e doce donzela? – perguntou sua voz soando sedutora.

 Parei no mesmo lugar, o encarando. Jasper tinha uma expressão de malicia com divertimento. Seus cabelos loiros e enrolados como um de um anjo caiam-lhe os olhos, e seu sorriso era tão largo que fez duas pequenas fendas se formarem em suas bochechas. Os olhos azuis estavam ansiosos.

 – Quem é dessa vez? – perguntei.

 – Porque tem que ser alguém? Eu poderia estar tentando algo com você, Alice. Você é linda e doce... – ele tocou minha bochecha que nesse momento eu já sentia quente.

 Sabe quando eu falei que meu coração acelerava quando via Jasper? Yeah, eu dei a desculpa de ser porque ele passava uma adrenalina de felicidade, mas acho que me esqueci de mencionar que Jasper era um metido a galanteador e jogava suas cantadas para cima de mim. Ele sempre me tratava dessa forma, me elogiando, fazendo carinho em mim, mas no final eu descobria que ele apenas estava "treinando" para seu próximo encontro que ele conseguia por trabalhar no parque. E mesmo sabendo disso, eu ainda sentia essas coisas estranhas... Que...

Eu estava completamente ciente do que eram. 

 – Jasper, você não me enrola mais. – sussurrei e lhe dei um tapinha na bochecha. – Deveria parar de brincar de Romeu com essas falas. São lindas, mas para o século XVIII, e nós estamos em pleno século XXI.

 – Eu sei, Alice. – ele sorriu de canto e me fez continuar andando. – É por isso que estou falando assim, porque ela é do século XVIII.

 – Espera! – parei novamente. – Você vai sair com uma múmia? – arregalei os olhos.

 – Claro que não! – ele gargalhou alto. – Não precisa ser uma múmia para ser antiquada.

 – Yeah, mas da forma que você falou... – balancei a cabeça e voltei a andar.

 – Mas não, ela não é antiga assim. Nem chegou à metade da vida.

 – Que bom pelo menos isso quer dizer que não está saindo com pedófilas que gostam de citações de Romeu e Julieta. Sabe aquelas fanáticas...

 – Deus me livre! – ele fez uma careta. – Você está viajando, querida Alice.

 – Ok, então quem seria tão antiquada assim como você diz? – questionei e ele levantou uma sobrancelha. Eu captei logo. – Ela aceitou sair com você?! – arregalei os olhos, surpresa e triste ao mesmo tempo.

 – Não... Ainda não. Mas logo Rosalie não irá mais resistir aos meus encantos.

 E era isso que eu tinha mais medo, porque de alguma forma, os dois eram perfeitos de um jeito diferente. Rosalie procurava a felicidade, e Jasper era a felicidade. E se os dois se... Apaixonassem, iriam ficar juntos, e Jasper não treinaria mais suas cantadas comigo, o que significava que eu não teria mais as sensações de estar numa montanha russa com os pés no chão. Era como se... Eu tivesse mais medo de perder essa coisa boa do que ele. Se eu tivesse esse poder, tirava esse lado dele e o guardaria para mim, assim ele podia fazer o que bem quiser e eu ainda teria as sensações. Mas eu não tinha, e Jasper Galanteador com as sensações eram um pacote só. Esse que eu queria esconder comigo.

 – Acha que eu tenho chance, All? – ele perguntou esperançoso.

 – Quer saber o que eu acho? – perguntei e ele assentiu. – Que você deveria ir cuidar dos seus patinhos e me deixar em paz.

 Jasper gargalhou alto e realmente me deixou, indo cuidar da barraca de tiros dele. Eu sempre usava os patinhos como piada, porque uma vez Jasper admitira para mim e para Edward que ele tinha dó dos pobres patinhos de madeira, e que iria denunciar para a policia florestal de Port Angeles o que faziam. Eu ainda me perguntava como ele conseguiu arranjar aquele emprego, se tinha tanta dó de peças de madeira.

 O trabalho foi entediante novamente, e eu tive uma pontada de esperança que Edward e Bella aparecessem ali, me assustassem como eles fizeram ontem, e eu tivesse algo a mais para fazer, alguém para conversar. Mas não apareceu nenhum dos dois ou algum conhecido. O movimento estava alto, mas mesmo assim conseguia ficar entediada. Depois de um tempo, o movimento foi diminuindo, e eu fui tendo mais tempo para ficar sem fazer nada. Isso me dava ao luxo de poder olhar para as pessoas. Do trailer que eu ficava dava para ver uma boa parte do parque, e os bancos aonde as pessoas gostavam de ficar. Lá pelas oito eu avistei Rosalie passando por ali, e como sempre, ela parecia à bonequinha saída dos filmes.

 A primeira vez em que a vi aqui, mesmo eu tendo dezesseis anos, desejei que ela fosse a minha boneca, empacotada em uma caixa aonde eu não deixava ninguém encostar. A cintura fina, delineada pelo laço do vestido azul claro, e as sapatilhas brancas eram o que chamava a atenção ali. Ela sempre estava de sapatilhas. Pelo frio de Port Angeles, usava meias brancas, que pegavam as pernas todas. Os cabelos loiros dourados soltos, caindo ondulados em suas costas e indo até a cintura curvilínea. Carregava nas mãos um guarda-chuva, e eu imaginei como Mary Poppins, que era um dos livros que eu lia para as crianças do orfanato. Só faltava o chapéu. Ela era perfeita. Tão perfeita que não tinha como eu competir.

 Hoje ela usava uma saia rodada clara, e uma blusa de lã em um amarelo apagado. E como sempre, usando uma sapatilha. Nas mãos carregava o tão conhecido guarda-chuva, a espera de uma chuva que algumas vezes apareciam. Meias grossas e brancas cobriam suas pernas altas. Eu ainda ficava deslumbrada com a sua perfeição. Só tive chance de falar com ela uma única vez, e eu fiquei mais encantada se é que era permitido. Como eu podia querer guardar Jasper para mim quando ele podia ficar com ela?

 Eu mantive meus olhos na boneca humana que vagava pelo parque, mas ainda prestando atenção ao meu trabalho. Perto das onze eu vi Jasper, indicando que o trabalho dele havia terminado. Tinha outro garoto que ficava naquela barraca de vez em quando, só para Jazz poder dar as suas escapadas. Ele se aproximou lentamente dela, sorrindo, e a boneca sorriu de volta. Ficaram conversando por algum tempo. Os dois tão perto me fazia ver ainda mais quanto eram perfeitos um para o outro. Dois loiros, altos e lindos. Um procura, o outro tem. Eu nunca poderia ir contra isso. Eram peças que se encaixavam, sorrisos que iluminavam juntos, olhos que se encontravam todos os segundos. Diga-me... Como eu podia imaginar que o único que me deixava feliz, iria ser para mim o meu amor adolescente?

 Vi quando Jasper estendeu a mão para Rosalie, que aceitou. Ele estava sendo tão cavalheiro... Tão Romeu, e ela era uma Julieta perfeita. Os dois, sorrindo, saíram andando, e eu fiquei olhando para eles até sumirem das minhas vistas. Ele havia conseguido. Jasper tinha conseguido o que muitos não conseguiram, e eu assisti tudo, vendo mais um sonho meu se esvair diante dos meus olhos, como tantos outros.

 – Alice! – ouvi a voz de trovão de Harry me chamar, e me virei para ele. O velho arregalou os olhos. – O que aconteceu contigo, garota?

 – Harry... Posso dar uma volta?

 Ele sabia que quando eu pedia para dar uma volta, era que eu referia a ir ao banheiro. Foi uma forma de deixar menos constrangedor para mim porque não gostava de falar isso. Trabalhava para ele desde um ano, mas mesmo assim não me sentia confortável a ponto de falar assim. Não importa quem fosse, dependia da sua aproximação e quando você é abandonado, sente a dor horrível que é, tem medo de repetir novamente. E eu não me deixava aproximar das pessoas por causa disso.

 – Claro, vai lá, menina. – ele balançou a mão.

 Tirei meu avental e sai rápido do trailer, caminhando pelo parque sem rumo. Não tinha vontade de ir ao banheiro coisa alguma, só queria sair um pouco daquele lugar pequeno e sufocante.

 Eu sentia algo se afastando de mim, me dando um adeus, e eu sabia que eram meus poucos momentos de felicidade. A montanha russa que Jasper me fazia sentir estava sendo fechada... Para sempre. Meu amor adolescente tinha me abandonado sem nem mesmo vir me dar um Oi, e agora eu só podia sentirsentir sentir. Sentir muito, sentir dor, sentir as saudades de algo que não tive. E eu não queria sentir.

 Quando percebi, estava parada em frente à montanha-russa de madeira, e sem pensar duas vezes, eu pedi ao garoto dali que me deixasse dar uma volta, que depois eu pagaria. Ele me conhecia porque ia comer no Harry, então deixou. Sentei no primeiro carrinho e desci a trava que prendia apenas a minha cintura. Olhei para a subida na minha frente e soltei um suspiro. Quando estava cheio os carrinhos – eu sozinha no primeiro -, eles começaram a andar. Já tinha andado uma vez de montanha-russa, e por ironia, com Jasper. Tinha medo, mas dessa vez não fecheis meus olhos. Eu queria ver os trilhos de frente.

Holding on and Letting Go – Ross Copperman (http://www.youtube.com/watch?v=kw_IlvJihT0 )

 Eu podia ver tudo lá de cima... Eu podia me ver lá em cima. Era como estar falando com Jasper, só que agora sem os pés no chão. Quando o carrinho desceu, eu não fechei meus olhos, só deixei as lágrimas saírem. Meu corpo magro se debatia nas viradas, como se fosse meu coração batendo no meu peito. Eu me sentia livre e presa ao mesmo tempo, e queria que tivesse apenas a liberdade para não sofrer. As pequenas dores, as lágrimas grossas, a dor pesada que me consumisse me deixavam fora de foco, e se eu conseguisse fechar os olhos, poderia achar que estava voando. Mas eu não conseguia, e via minha vida fracassada passar pelos trilhos como uma fita de filme. Eu podia ver meus pais me abandonando – a cena que criara na cabeça -, meu crescimento no orfanato, a irmã Marielle me amando como se fosse sua filha. Meu primeiro e único emprego. Eu conhecendo Jasper... Rosalie... Edward, que levou Bella lá... E até o garoto grande que parecia ser uma pessoa horrível. Eu sentia pena de todos nós, porque eu sabia que não éramos felizes. Nem mesmo Jasper, que eu disse ser a pessoa que mais sorria no mundo. Ele só sabia se camuflar. Eu tinha aprendido que a vida não era feita apenas de sorrisos, e que os baques viam, o mundo pesava, o corpo pedia descanso... E apenas alguns continuavam lutando. Jasper? Rosalie? Eu sabia que Bella e eu já havíamos desistido. A partir do momento que meus olhos caíram nela, eu vi que era Edward seu ponto de apoio. E... Como eu queria ter o meu.

 Só para me dizer que tudo ia ficar bem, que ele iria lutar comigo ou por mim, dependendo do meu estado. Que passaríamos por tudo juntos. Mas era tudo querer, nada ter. Eu sempre seria só, teria que caminhar com minhas próprias pernas, sofrer sozinha. Eu tinha que lutar para não morrer na minha própria angustia. Tinha que lutar para não odiar a vida, como ela queria que eu fizesse. Não queria odiá-la por apanhar, mas queria mostrar para ela que podia supera-la. Só que como, se estava cansada e querendo um colo? Assim as coisas só se tornavam ainda mais difíceis. Só pediam para que eu parasse de tentar. E eu estava por um fio.

Forks; Washington

Bella POV

  – Posso lhe perguntar algo, Edward? – murmurei, olhando para seu rosto tão perto do meu.

 Edward assentiu levemente com a cabeça, dando um pequeno sorriso.

 Estávamos no meu quarto, deitados na minha cama. Eu pedi para ele que ficasse comigo hoje, por causa de Charlie, porque hoje era o dia em que eu seria uma completa invisível na casa. Era um dos poucos que eu tinha paz, e queria compartilhar esse momento estando perto dele. Precisava disso. Edward ficou relutante no começo, mas depois de eu dar uma pequena implorada, falando que precisava estar com ele, aceitou e entrou pela janela.

 – Claro. – sussurrou.

 – Eu nunca... O vi aqui em Forks, e... Você não parece daqui... De onde você é?

 Edward deu apenas um pequeno sorriso e me puxou para perto dele, ignorando minha pergunta. Era como se ele não fosse responder nada sobre si, e que a única vida que iria ser revelada ali era a minha. Talvez fosse seu plano me deixar às escuras sobre ele, assim eu não me sentiria tão próxima para que não fosse muito doloroso quando precisássemos nos despedir.

 Despedir... Dar adeus... Nunca mais se ver...

 Droga, isso era realmente doloroso de pensar, porque eu não via mais minha vida sem Edward ali, insistindo para continuar lutando, tentando me mostrar que eu posso vencer. Eu não conseguia mais pensar que não veria mais os olhos verdes dele. Eu não sabia qual era essa necessidade desse garoto misterioso e desconhecido para mim, mas era como se ele preenchesse uma parte que ninguém conseguiria. E se pudesse, alcançava até um pouco a parte em que mamãe preenchia, completando uma ao outro. Porque eu sabia que Edward estava fazendo por mim o que ela faria. Ela não deixaria sua garotinha sofrer, pois não deixou morrer mesmo nem me conhecendo. Mesmo que fosse óbvio que se ela tivesse sobrevivido, minha vida não seria assim, eu sabia que ela me protegeria com unhas e dentes. Renée era forte, eu sei.

 Senti quando Edward começou alisar meu braço desnudo da regata, seus dedos subindo e descendo. Eu me aconcheguei ao lado dele, apoiando minha cabeça em seu ombro. Podia não o conhecer a muito tempo – nem fazia uma semana – mas eu me sentia tão bem, tão próxima a ele que era como se nos conhecêssemos há anos, talvez a vida atrás.

 – Acho que está na hora de eu falar o segundo motivo, não é? – perguntei em um murmúrio baixo.

 Dar mais um passo no jogo para se aproximar do Gran Finale em que ele falaria "É, já fiz meu trabalho, então tchau, Bella" e se despediria com um beijo na testa... Como fez nesses quatro dias.

 – Se você quiser, Bella... – ele falou seus lábios quase se encostando ao topo da minha cabeça. – Eu tenho o tempo do mundo para você.

 Só enquanto eu não falasse todos, só enquanto ele não me ajudasse, ele teria esse tempo para mim. Era só por isso, enquanto não acabasse com a minha vontade de dar um fim em tudo. O engraçado era que eu não queria morrer quando estava perto dele, porque tinha medo de acabar com tudo isso ainda mais rápido.

 – Está na hora. – eu peguei a gola de sua camiseta entre meus dedos. – Edward, você já se sentiu como se nada em você fosse agradável para... Você e todas as pessoas que te veem?

 Era uma pergunta idiota, porque uma pessoa tão perfeita quanto ele, nunca iria ter esses sentimentos. Só idiotas sem amor próprio como eu que passavam por isso.

 – Já... – ele alisou meus cabelos e eu fechei os olhos. – É isso?

 – Uhum. – assenti lentamente com a cabeça. – As pessoas me odeiam, e eu sei que não é só pelo que eu fiz. Elas odeiam a pessoa que eu sou. Essa sem graça, tanto por fora quanto por dentro. Sem atrativos, que consegue apenas com a presença expulsar as pessoas... Eu vejo as outras garotas tendo suas vidas de adolescente normais, sendo perfeitas, e eu... Eu não tenho nada disso. E nunca vou ter... Nunca vou ser boa, perfeita como elas.

 Edward ficou em silêncio, e eu o acompanhei nisso. Tinha falado o motivo, e estava curiosa para saber o que ele iria fazer agora para mudar isso – que eu achava impossível. Eu nasci assim, estranha demais: branca demais, magra demais... Feia demais, e nada podia mudar. Queria saber aonde ele ia me levar, mas não tinha nenhuma ideia.

 Soltei um bocejo, sentindo o cansaço da noite mal dormida que tive bater na porta.

 – Durma Bella... – Edward falou suavemente, fazendo um cafuné nos meus cabelos. Eu me aconcheguei nele como fazia em um travesseiro, e fechei os olhos, deixando o sono me levar. – E não diga que você não é perfeita, porque você é. Da sua forma... Única e fascinante.

 Eu sorri e mesmo quase adormecida, lhe dei um beijo na bochecha.

 – Obrigada, Mister Smile. – murmurei, fazendo-o soltar uma risada baixa e rouca.

 – Mister Smile? – questionou.

 – Yep. – assenti. – Porque você só sorri. E o sorriso mais lindo que já vi... Por isso Mister Smile.

 Edward soltou a mesma risada e continuou o cafuné, me fazendo adormecer e entrar no mundo dos sonos leves, como nunca havia tido.

(...)

Sometimes we're holding angels

(Algumas vezes nós estamos segurando anjos)

And we never even know

(E nós nunca sequer sabemos)

Don't know if we'll make it, or we know

(Não sei se nós vamos fazer isso, ou se nós sabemos)

We just can't let it show

(Nós só não podemos deixá-lo a mostra)

t's everything you wanted, it's everything you don't

(É tudo o que você queria, é tudo o que você não queria)

It's one door swinging open and one door swinging closed

(É uma porta balançando aberta e uma porta balançando fechada)

Some prayers find an answer

(Algumas orações acham respostas)

Some prayers never know

(Algumas orações nunca sabem)

We're holding on and letting go

(Nós estamos segurando firme e deixando ir)


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Notas finais do capítulo

E então, o que vocês acharam do capitulo? Emmett se mostrando um babaca empenhado em ser uma pessoa ruim com Rosalie. Alice tendo uma paixão platonica por Jasper. Ela é uma pessoa complicada de entender, mas essa tristeza dela tem apenas um motivo. Um ressentimento. O próximo capitulo vamos ter bastante Beward e umas loucuras vindas da parte da Bella.
Agora eu queria me desculpar com vocês por estar demorando a postar, mas é que nessas férias minha mente trabalho muito e eu acabei que por entrar em uma fic nova, essa que só vou postar quando estiver toda pronta porque nao quero fazer como estou fazendo com SR e AG. E queria também me desculpar por nao responder os reviews, é que tudo fica corrido aqui e acabo não conseguindo, mas saiba que leio todos e eles são como inspirações para mim.
Obrigada as que aguardaram pacientemente por esse capitulo e espero que tenham gostado. Beijos



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