Parado escrita por Taka Ksc


Capítulo 1
xx




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Parado.  Dei um ou dois passos para trás para visualizar melhor. Parado. Fixei o olhar na figura que se encontrava na minha frente. Parado, estava parado. Aproximei-me novamente, ainda com o olhar fixo. Esperava ver uma contração involuntária de qualquer músculo, ou a movimentação do peito vinda da respiração, talvez até mesmo esperasse ouvir o batimento cardíaco devido o pesado silêncio que jazia naquela sala, mas nada. Parado.

Toquei de leve a mão que pendia do lado do corpo, esta estava gelada. Esperei um susto, talvez por agarrar minha mão, mas não. Parado. Fui passando a mão de leve por toda a extensão do braço, passei pelo pescoço e parei na bochecha, imaginando todos os calafrios que deveriam aparecer. Não apareceram, pois não sentia. Parado.

Retirei minha mão e fixei meu olhar nas pálpebras cerradas, estas acompanhadas de longos cílios. Perguntava-me qual seria a cor da órbita escondida por estas pálpebras, esperava ansiosamente para que elas se abrissem, mas permaneceram como estavam. Parado.

Passei a mão pelo cabelo negro e liso que descia até o ombro. Movimentei-a da raiz do cabelo até as pontas deste diversas vezes, até que parei, com medo de embolar os fios. E se o fizesse, teria que arrumar, mas e se arrancasse os fios? E se? Não. Parado.

Desci a mão pelo rosto, parando em cima do peito liso e pálido. Pálido assim como todo o resto. O peito não subia nem descia. Parado. Passei a mão pela cicatriz de sete centímetros em alto relevo que estava ali. Fora você? Talvez tenha querido estar ali mais cedo. Ali. Parado.

Arrastei minha mão mais uma vez pelo corpo, parando na boca entre aberta. Estava seca e roxa. Poderia tentar hidratar o lábio com a língua, não o fizera. Parado. Puxei levemente o lábio inferior e vi os dentes perfeitos escondidos ali. Eu teria me mordido, mas não levei mordida alguma. Parado.

Tirei minha mão e afastei-me mais uma vez. Uma última visualização antes de começar a me despedir, arrumá-lo para que voltasse aos braços daqueles que te esperavam. Esperavam para despedir-se. Parado.

O corpo pálido e gélido e os lábios num tom roxo não me tiravam certeza alguma: fora belo em vida. Poderia ter sido meu, assim como vários outros, mas ainda mais você. Se pudesse se levantar da cama de alumínio pegá-lo-ia para mim, roubá-lo-ia e fugiria daquela sala com cheiro de formol. Ainda estava lá. Parado.

Aproximei-me mais uma vez, arrumei-o e segurei sua mão. Procurei alguma reação. Parado. Levei meus lábios até sua mão e ali depositei um beijo. Um adeus. Sem movimento, sem emoção. Parado. 


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