O dia que se seguiu a morte de seu irmão fora um tormento para Ricardo. O velório fora torturante. Vê-lo ali naquele caixão, envolto por coroas de rosas – que ele tanto odiava enquanto vivo – fora muito triste. Vê-lo ali era como ver a si próprio morto e prestes a ser enterrado.

Os cabelos negros e cacheados caindo nos olhos, o formato do rosto, a boca, o nariz, tudo... Tudo naquele rosto era igual ao de Ricardo, olhar para Richard sempre fora como se olhar no espelho, mas um espelho com personalidade diferente e que não reproduzia tudo a seu modo, e agora vê-lo ali inerte, frio, tão sem vida, sem estar contestando ou resmungando era muita tortura. Uma enchente de lagrimas turvou a visão do garoto e ele se distanciou do caixão.

Lá fora o dia era ensolarado como se nada tivesse acontecido, para Ricardo era como se alguém brincasse com o seu luto, o sol não podia mais brilhar para ele, não com aquela intensidade, o mundo deveria estar nublado, frio, sem vida... Como Richard, seu irmão.

_Sinto muito! – murmurou tio Ted.

_Sei que sente. – murmurou ele de volta em meio a lagrimas.

_Tente se forte, seus pais precisarão de você neste momento!

Uma pontada de medo o invadiu, tio Ted tinha razão, ele precisava ser forte para ajudar seus pais superarem a perda, mas não sabia se conseguiria, a perda era tão grande para ele quanto era para os seus pais, se não fosse maior ainda.

Tio Ted se distanciou e Ricardo continuou ali, sozinho, chorando desolado... Como pode isso ter acontecido? pensou olhando para o nada.

Um de seus vizinhos foi até ele e anunciou que o caixão seria levado para a cova. Limpando as lagrimas correu para ver os pais e tios levarem o irmão para o seu tumulo, em uma pequena procissão marcada por choros e um silêncio reconfortante por parte de todos, só se ouvia os soluços de todos que estavam ali.

Logo chegaram à cova onde o irmão seria sepultado, ao lado dos avós maternos que haviam morrido apenas dois anos antes.

O caixão ficou mais um tempo aberto para uma ultima despedida, enquanto mais flores eram arremessadas em cima do irmão, Ricardo apenas o fitava, embora soubesse que para lembrar-se de Richard precisaria apenas se olhar no espelho queria gravar a ultima imagem dele, queria prender aquela imagem no espaço mais obscuro da sua mente, e continuou a gravá-la até que anunciaram que o caixão se fecharia.

Ele não jogou nenhuma flor em cima do irmão, sabia que Richard não gostava de flores e não seria porque estava morto que teria de aguentá-las, antes de o coveiro fechar o caixão e o padre começar a oração apenas deixou que suas lágrimas caíssem sobre o ele e então deu alguns passos para trás e fechou os olhos.

Nos minutos seguintes o padre fez a oração e o coveiro foi abaixando o caixão, lentamente, como se fosse para tortura-lo ainda mais. A mãe e o pai choravam muito também, podia ouvir o soluço dos dois, de mãos dadas no lado oposto do tumulo de onde ele estava.

Antes de todos saírem para ir embora Ricardo fitou o rosto de todos, todos os rostos conhecidos retorcidos em dor e manchados por lagrimas. Vizinhos, parentes, amigos, colegas de escola, todos estavam ali, mas uma garota o chamou atenção.

Ele não a conhecia, mas ela estava ali, pensou que pudesse ser alguma namorada do irmão, mas conhecia todas elas e aquela ali com certeza não era uma. E ela era a única que não chorava ali, seu rosto não demonstrava dor e sim fúria, parecia estar furiosa com alguma coisa e não sofrendo pela morte do seu irmão.

Todos se viraram para ir embora e ele os seguiu. Não que quisesse sair dali naquela hora, mas queria saber quem era a garota. Queria falar com ela e saber o porquê de estar ali se não parecia sofrer com a morte do seu irmão, mas sua cabeleira ruiva sumiu no meio da multidão ele deixou o assunto de lado.

Resolveu ir embora para casa e refugiar-se no quarto de Richard.