Now. escrita por Hello Stranger


Capítulo 7
No One, But Two.


Notas iniciais do capítulo

Soundtrack: http://www.youtube.com/watch?v=Q4FCLVYNd80



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Era final de novembro. Liesel havia recebido uma tarefa na escola, para ajudar na nota final. "Escreva sobre qualquer coisa em 20 linhas". Uma tarefa tão fácil, e ao mesmo tempo tão difícil. Liesel torceu o nariz.

— Algum problema aí? — Max disse, entrando na cozinha e vendo a garota debruçada sobre um caderno em branco, apenas com o tema escrito em letras garrafais no topo da folha.

Escreva sobre qualquer coisa.

E o que era qualquer coisa afinal?

Ela bufou.

— Escreva sobre qualquer coisa. Qualquer coisa. Que droga, o que é qualquer coisa? — ela disse, erguendo o olhar e gesticulando, indignada.

— Por que você não escreve sobre as maçãs que costumava roubar? Ou aquele dia do boneco de neve? — ele sugeriu.

Liesel não pareceu gostar das sugestões.

— E o que você acha que eu colocaria nas últimas linhas? É claro que acabaria falando sobre o bombardeio, meus pais, e todo mundo morto! — ela disse, aumentando o tom de voz durante a frase. Estremeceu ao ouvir a palavra "morto".

— Você que sabe, Liesel. — Max deu de ombros. — Que tal aquelas minhas lutas de boxe com o Führer?

— Porão, Führer, você, bombas, todo mundo morto! — Liesel tinha um tom de voz indignado. Voltou a cruzar os braços sobre o papel e esconder o rosto entre eles.

Ele riu baixo. Aproximou-se dela e lhe deu um cafuné.

•MAIS UM MOTIVO POR EU TER UMA ESPÉCIE DE FASCINAÇÃO PELOS HUMANOS•

O poder de um cafuné. As pessoas que o recebem parecem ter um tipo de cura, não importa qual seja o seu problema. 

— Mas como eu não pensei nisso antes?! — Liesel deu um berro na cozinha, levantando a cabeça.

Pegou sua caneta, e começou a escrever.

"Bem, eu... eu não sei realmente o que escrever, na verdade estou bem confusa. Pensei em escrever sobre várias coisas, mas, tudo parecia levar à um único caminho. Como você deve saber, meus pais morreram num bombardeio, onde tudo o que eu tinha foi completamente destruído. Tudo menos uma única coisa. Ele. Max Vandenburg. Bom, eu nunca falei isso pra praticamente ninguém, mas agora acho que não tem importância se eu contar. Max é judeu, e eu escondi ele no meu porão. Tem um judeu no meu porão. Sim, tem um judeu no meu porão! Eu sempre sentia que precisava dizer isso a alguém, mas nunca disse realmente. Por que? Porque eu o amo! Ele foi para um campo de concentração, Dachau, e eu vi quando ele passou junto com aquele bando de judeus, pela minha rua, andando em direção ao campo. E naquele momento, eu pensei que nunca mais o veria. Nunca senti tanta raiva e tristeza quanto senti naquele dia. Eu queria matar o Führer! Mas, depois que eu perdi quase todo mundo que eu amava, e achei que ele estava morto, ele voltou. Ele chegou, nós nos abraçamos e choramos, e naquele momento eu senti algo que nunca havia sentido antes. Agora nós estamos morando juntos faz um tempo. Ele é... meu melhor amigo. Não, mais do que isso! Ele é tudo pra mim. Eu queria dizer à ele o quanto ele é importante para mim, mas nunca encontro palavras suficientes para isso. Máxi Táxi. É assim que eu o chamo. Ele era chamado assim quando lutava com seus amigos na infância, e ele sempre ri quando eu o chamo assim. Sabe, tem dias que ele tem pesadelos, e ele fica triste. Porque quando ele estava no campo, ele era xingado de coisas horríveis! E ele não é nada disso. Eu acho que ele é a pessoa mais perfeita que já conheci. As vezes eu acho que ele deveria ter morrido, porque o mundo não merece alguém tão bom quanto ele. E nesse momento eu estou prestes a chorar, e torcendo para que ele não veja eu fazendo isso. Ele está na sala de estar, agora a pouco ele veio aqui e me deu um cafuné, só ele sabe dar cafunés desse jeito. Ah, Max, como você é importante para mim!"

Liesel releu seu texto três vezes. Sorriu. Em seguida Max entrou na cozinha, perguntando se ela já havia feito alguma coisa. Ela dobrou o papel e enfiou-o no bolso de seu casaco cor de mostarda.

— Nada ainda, Máxi Táxi. — ela fingiu a melhor cara de decepção que conseguia. — Vou dormir um pouco, quem sabe não tenho uma inspiração durante o sono?

Levantou-se e foi até o porão. Ela não percebeu que um pedaço de papel amassado caía de seu bolso. Ele percebeu. Pegou o papel, desamassou-o, leu o que a menina que roubava livros havia escrito e não conseguiu conter um enorme sorriso.

•A NOTA DE LIESEL MEMINGER•

Liesel tiraria nota máxima naquela tarefa.

Se a tivesse entregado.

Max escondeu o papel o melhor que pôde. Liesel procurou pela casa inteira durante dois dias seguidos, mas não conseguiu encontrá-lo. Toda noite, após Liesel adormecer, ele abria o papel dobrado e lia aquele pequeno texto mais uma vez. Fez isso durante anos, até o tempo apagar, pouco a pouco, aquelas palavras, para sempre.


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