Olhos De Sangue escrita por Monique Góes


Capítulo 39
Capítulo 38 - Meia Alma


Notas iniciais do capítulo

O Final!! o/
Eu gostaria mais uma vez de agradecer aqueles que acompanharam a fic até aqui.
Mas eu sinto muito se o final foi decepcionante.
Bom, tirando isso de mente, vamos ao cap!



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          Meia alma.

          Depois de contar tudo o que ocorrera, essa foi a explicação mais plausível naquele momento.

          A ligação de mentes era mais poderosa do que imaginávamos. Era por isso que também a chamavam de ligação de alma. Resumindo:

          De certa forma, minha alma e a alma de Yudai haviam se fundido com a ligação de mentes, então, um completava o outro. Resumindo mais ainda: Quando ele morrera, eu perdera metade de mim, por isso que eu voltara a ser ruivo. Por isso o vazio dentro de mim.

         Eu me mantinha vivo apenas com a metade de uma alma.

         E para completar, eu havia adquirido o Corte Imaginário, a leitura e supressão total de Auras de Yudai. Para que não se perdessem, as habilidades haviam se acoplado ao membro sobrevivente.

         Meia alma.

         Era tão horrível que eu desejava ter morrido. Seria muito melhor. Nada de buracos que ou doíam ou que demonstravam o quão tenebroso era vazio dentro de mim. Nada de estar incompleto. Nada de habilidades que não eram minhas.

         Toquei minha nuca. Era estranho meu cabelo não estar mais tão longo. Tirando pela franja intacta, ele estava extremamente curto, fruto de eu ter cortado minha nuca sem querer com o Corte Imaginário. Apenas para não ferir os outros sem querer, eu havia a suprimido, mas continuava a ser extremamente perturbador para mim. A supressão anormal que eu jamais tivera, e que agora me pertencia. Se eu pudesse jogar tudo fora para ser inteiro novamente, para que a culpa se esvaísse, para... Para que o meu irmão retornasse, eu com certeza o faria.

         Estávamos na caverna sugerida para nos refugiarmos. Não aparecera mais nenhum Despertado, não aparecera ninguém da Ordem, então recolhemos todos os corpos e os levamos para lá. Era tão cheia de galerias que parecia muito bem uma enorme mansão de pedra, ou até mesmo um castelo com dezenas de quartos.

         Apenas 11 sobreviveram. Anita, Alec, Nina, Maurice, Raquel, Susana, Diego, Larry, Alma, Ygor e eu. Talvez essas fossem as intenções da Ordem. Que todos morressem. 

         E talvez eu só estivesse dizendo isso porque não havia ninguém mais para se culpar além de mim.

         - Pega!

         Uma Aura de Despertado com cheiro de pêssego disparando em minha direção. Virei-me e uma bola peluda azul com asas bateu em meu peito.

         - Ai! – uma vozinha fina, que me lembrava as vozes usadas para se dublar personagens de desenho animado, exclamou.

         Quando o Despertado caiu ao chão, Larry exclamou o que se passou exatamente em minha mente:

         - Isso é um Despertado?

         Basicamente, o Despertado que batera em mim tinha a forma de um pequeno filhote de lobo com pelagem de um azul extremamente claro, como se chama... Ah sim, azul bebê. E tinha duas asinhas douradas e penosas, com olhos também dourados e uma cauda tão peluda que se parecia com a cauda de uma raposa. Era extremamente peludo, tanto que parecia mais uma bola de pêlos, completamente felpudo.  

         - Isso é um projeto de Despertado. – falei sem emoção. Simplesmente não conseguia senti-la.  

         - Ei! Mais respeito! – o Despertado, ou melhor, a Despertada exclamou.

         -... Isso vale a pena ser morto? – Diego perguntou.

         - Você acha?

         - Ei, eu estou escutando tudo o que vocês estão falando! – A Despertada protestou.

         - E... Daí? – perguntei. No estado em que eu estava, não me importava mesmo.

         Ela rosnou, mas sequer chegava à altura de meus joelhos, na verdade, mal chegava à altura da metade de minhas canelas. Ela deveria ter o comprimento de meus ombros. Seu rosnado pareceu-me mais o rosnado de um filhote de cachorro que o rosnado de um Despertado. Cutuquei-a com a ponta do dedo do pé e ela emitiu o som de um patinho de borracha quando apertado.

         - É, acho que matar ela seria perda de tempo.

         - Pra sua informação, eu me chamo Momoko!

         - Tanto faz. – retruquei. – Seria perda de tempo do mesmo jeito.

         - Você deveria ficar feliz, porque tecnicamente não vai morrer. – Larry observou.            

         Momoko, com um bater de asas, ficou da altura de minha cabeça, e me encarou por um longo tempo.

         - O que é?

         - Você é ruivo.

         - Fale algo que não sei.

         Ela pareceu ficar indignada, mas somente a ignorei, passando direto por ela. Fui para a galeria onde estavam os corpos, tentando ignorar a dor ainda viva em mim e sensação de estar vazio, mas era impossível. Vi Alma os regenerando incansavelmente. Havia alguns que estavam irreconhecíveis no campo de batalha, mas agora estavam perfeitos, como de quando eram vivos. Tirando que estavam com cabelos com cor, e mortos, obviamente. Alma olhou por cima de seus ombros e acabou saltando, assustada.

         - Ah, gatinho! – gaguejou. – Sinto muito, é que... Sabe, com esse cabelo vermelho, eu me...

         - Tudo bem. – falei, dispensando as desculpas e tentando não me irritar com a porcaria do apelido. Não poderia culpá-la por se assustar comigo. Apenas olhei para minha mão, discretamente. Era extremamente pálida.

         Com o cabelo e olhos vermelhos, não deveria ser uma boa combinação.

         - Seu cabelo é muito vermelho. – Alma disse, voltando a ajudar Maurice a regenerar seus ferimentos. Ele sobrevivera por pura sorte. – É comparável aos seus olhos.

         Maurice assentiu fracamente, concordando com Alma.  

         Jamais achara meu cabelo tão vermelho, embora não me importasse, mas pareceu que um dedo cutucou a ferida exposta e me encolhi, mas Alma nada percebeu, concentrada em regenerar o corpo. Respirei fundo, mas a dor pareceu apenas aumentar, a sombra da culpa ameaçando retornar. O corpo de Yudai estava a apenas alguns passos de distância, e se eu o visse, todo o esforço que eu tivera para, ao menos por hora, afastar a culpa de minha mente, iria por água abaixo.

         Antes que Alma me visse agachado constrangedoramente, levantei e saí da galeria, encostando-me na parede, respirando e expirando lentamente, tentando afastar aquela sensação. Escondi meu rosto entre as mãos, agarrando minha franja, minha cabeça começando a doer. A voz gélida da coisa negra que me perseguia parecia estar próxima, sentia isso.

         Sua culpa.

         Sempre era assim. Eu sentia sua presença, a voz ressoava em minha mente, para só então me atacar. Eu fora atacado por isso muito mais do que duas vezes, mas era algo que... Eu sempre escondia... Yudai só descobrira duas vezes por descuido meu, senão ele jamais saberia...

         Satisfeito por tirá-lo do caminho?

         Não...

         Escorreguei lentamente pela parede, até me sentar no chão.

         Está livre agora...

         A coisa gélida começava a tocar a ponta de meus pés descalços.

         - Hideo! – Raquel quase gritou ao meu lado.

         A coisa negra sumiu tão rapidamente que eu até me assustei. O... O que acontecera? Sempre ignorava quando alguém se aproximava, e se esse alguém se atrevesse a interromper, era atacado também, mas... Por que fora embora?

         Olhei em sua direção por entre meus dedos, e vi seu olhar preocupado. Como? Por que a coisa fora embora com o simples chamado dessa garota?

         Mas a dor retornara, ainda mais intensa, as lágrimas ameaçando a voltarem, mas fui forte. Aguentei silenciosamente a dor, concentrando-me apenas na respiração que parecia doer ainda mais, olhando para fixamente para o chão. No momento eu não achava que poderia olhá-la diretamente. Não do modo do que eu estava.

          Depois de um tempo, ela desistiu de tentar falar comigo e saiu da caverna, indo em direção aonde os outros estavam enterrando os corpos já regenerados. Talvez a Ordem quisera eliminar a todos. E nenhum de nós queria voltar até ela. Se aquela missão jamais houvesse existido, todos estariam vivos...

          Uma estranha sensação adentrou em meu corpo, passando por minha nuca e descendo por meu corpo. Minhas mãos coçaram e me senti inquieto. Era quase como se... Eu precisasse, urgentemente, ver o corpo de Yudai. E era justamente o que eu não queria fazer, porém, contrariando minha vontade, meu corpo se levantou sozinho, e adentrou novamente a gruta onde estavam os corpos.

          Haviam fechado os olhos de Yudai, e apesar do sangue seco que cobria seu rosto, o imenso ferimento em seu abdômen e a pele ligeiramente acinzentada, seu rosto estava tão sereno que poderia estar dormindo. Aquilo era perturbador para mim, mas...

           Silenciosamente, peguei seu corpo em meu colo, e somente para não cair, peguei o símbolo com o colar que ele sempre usava, enrolando-o em meu pulso. Saí de lá sem que Alma percebesse, o peso dele sendo nada para mim. Mas quando saí de lá, Anita me viu.

           - Hideo? – chamou, mas não respondi, deixando que minhas pernas me levarem para as galerias mais profundas da caverna.

           Fui até uma das últimas galerias, sem saber o porquê daquilo tudo. Adentrei-a, e parecia um enorme salão, com paredes extramente altas, com mais de cinco metros de altura. Escutei a movimentação indicando que Anita me seguira, mas havia algo errado.

            Eu poderia jurar que havia uma estranha energia saindo do corpo de Yudai.

            Ainda seguindo os instintos que movimentavam meu corpo, pousei seu corpo no chão, e logo vi que não enlouquecera. Realmente havia uma energia azulada saindo de seu corpo, fazendo-o se iluminar. Não era uma Aura, então o que era? Sua pele lentamente ficava azulada, da cor da energia, e então, a luz.

            Uma luz tão forte começou a rodear seu corpo que me cegou, e para evitar a dor excessiva de meus olhos, cobri-os com meus braços. Havia algo não natural ali, mas também me trazia uma estranha nostalgia, como se eu já houvesse visto algo parecido, embora jamais houvesse realmente.

            Depois de algum tempo, a luz diminuiu, não desaparecendo. Apenas diminuindo. Lentamente tirei meus braços de sobre meu olhos e vi...           

            Cristais.

            Cristais cobriam toda a caverna. Cristais azuis elétricos que pareciam ser iluminados por dentro cobriam toda a caverna com glifos e arabescos que pareciam com etéreas. Do topo da caverna saía-se um enorme cristal em formato de gota, com quatro aberturas em cada uma de suas extremidades, na altura do centro, e delas saíam espécies de ponte de cristal e conectando-se com os que cobriam o chão.

           - Ele... Era tanto assim? – Anita perguntou incrédula atrás de mim.      

           - Tanto o quê? – perguntei.

           - Dizem que cerca de sete números um foram tão... Poderosos, que quando morreram, seus corpos se cristalizaram. – explicou. – Somente sete vezes, então, isso quer dizer que...

           Ela não terminou, e também não quis entender. Yudai nunca demonstrara completamente sua força, e havia momentos que até assustava-se consigo mesmo. Não imaginava que fosse tão forte, e provavelmente ele também não... Mas agora, isso não parecia importar tanto.

          Escalei uma das “pontes”, adentrando na cúpula de cristal. Todo seu interior parecia com o de um enorme corredor, tendo à minha frente uma espécie de portais sem portas, com cristais pontiagudos ao seu redor. Andei silenciosamente pelo corredor, até transpassar os portais, deparando-me com o que poderia ser um enorme salão de cristal.

          A cada passo meu, a luz do cristal pulsava, tornando-se mais clara momentaneamente, quase branca. Bem em seu centro, havia, entre vários cristais, seu corpo. O corpo de Yudai não era mais orgânico, não era mais de carne e osso, não tinha cabelo ruivo ou ferimentos horrendos.

          Era feito de cristal.

          Aproximei-me de seu corpo. Estava ajoelhado no chão, a cabeça levemente direcionada para o chão, os olhos fechados, a mesma expressão serena. Eu jurava que ele poderia estar sorrindo, mas o piscar da luz realmente confundia meus olhos. Não havia roupas em seu corpo tirando a pulseira de número 1, mas não podia-se ver muita coisa, apenas as formas de seu corpo com os enormes cristais retangulares com as pontas pontiagudas ao seu redor. Ajoelhei-me no chão e encarei-o, pela primeira vez algo se passando em minha mente.

           Ele não iria querer que eu parasse minha vida por sua causa.

           Então eu iria seguir em frente.           


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Notas finais do capítulo

Bom, é isso.
Não sei muito bem o que dizer, talvez eu adie um pouco isso, pois ainda tenho o epílogo, que postarei mais tarde também.
Por favor, comentem.



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