Dor. Era tudo que Hiroto sentia no momento. Talvez não tudo, porém o mais forte sentimento que o peito do jovem de cabelos castanhos abrigava podia ser resumido por essa simples e impiedosa palavra.

A dor de perder um amigo.

~*~

Ainda se lembrava claramente das conversas, os risos, as brincadeiras com Kohara, aquele que podia considerar um de seus melhores amigos. Não que tivesse muitos, ou fizesse questão de tê-los. Pelo contrário, Hiroto sempre preferiu ter poucos amigos, e que se importem verdadeiramente consigo, a estar cercado de falsidade e palavras frias.

Não se conheciam há muito tempo, cerca de um ano? Pouco mais? Algo assim... Mas a amizade do mais alto era realmente importante para o pequeno, talvez por gostos semelhantes ou pela facilidade de Kohara em fazê-lo rir.

Quem soubesse disso, talvez achasse que Hiroto estava apaixonado, mas estaria completamente enganado. O sentimento do pequeno era a mais sincera amizade.

Takashi, seu namorado, não se cansava de lhe dizer para seguir em frente, se concentrar no seu trabalho, estudos, e em si mesmo. Hiroto sempre tentava seguir o conselho de Takashi, afinal, o ama, não quer magoá-lo.

Mas o buraco em seu peito pela ausência do amigo continuava ali.

Até o próprio reconhecia que soava como uma garotinha boba que foi chutada pelo primeiro namorado, mas só quem se importa com os amigos tanto quanto ele seria capaz de entendê-lo.

Esperava que Kohara fosse capaz.

A culpa de tudo era inegavelmente sua, Kohara havia se esforçado para agradá-lo, e devido a sua distração não havia demonstrado o devido interesse.

E então Kohara não acreditava mais em sua amizade.

Tudo aconteceu tão de repente que Hiroto demorou a perceber.

Mandava mensagens e emails para o outro e a resposta nunca vinha. Achava que fosse devido à falta de tempo, a profissão de médico era realmente exigente, ainda mais pelo outro ser um renomado cirurgião. Quase um mês depois, a ficha finalmente caiu.

Estava sendo evitado. Por aquele que considera tanto.

Após continuar insistindo, agora já tendo ideia do que havia causado toda essa situação, uma única mensagem de Kohara o deixou em cacos.

“De: Kohara

                               Sinto muito Hiroto. Você não se importou com a minha dedicação. Não consigo mais crer na sua amizade. E agora sou eu que não me importo.”

Não era possível que o amigo houvesse perdido a fé em si. Não conseguia acreditar. Continuou enviando emails, mensagens e até ligava para o médico que antes não passava um dia sem conversar com o jovem arquiteto. Como antes da mensagem que desolou o pequeno, não obtinha mais respostas.

Talvez só ele se importasse afinal...

Chorava, o peito ardia e a dor incomodava como se milhões de agulhas o atravessassem a cada segundo que tinha mais certeza da perda.

Mas a vida segue em frente. Independente da dor, do sofrimento, o mundo não iria parar por isso. Restava a Hiroto guardar as boas lembranças da amizade, e torcer para que Kohara pudesse ao menos lembrar de si com um sorriso no rosto.

~*~

Encarava a tela do computador, os olhos fixos no que acabara de digitar.

Havia dois anos que perdera a amizade de Kohara, finalmente havia criado coragem e colocado tudo para fora, do meio que considerava mais fácil, escrevendo a própria história como se fosse outra pessoa.

Sempre teve dificuldade em lidar com palavras, mas quando escrevia, era como se estivesse em outro mundo, um mundo que apenas ele tinha acesso, onde podia se expressar claramente.

Às vezes pensava se não devia ter cursado literatura ao invés de arquitetura.

- Ainda escrevendo amor?

- Takashi! Você me assustou! Quando você acordou?

- Há uns vinte minutos, não te vi na cama e quando cheguei em frente à porta vi que você estava aqui, concentrado, escrevendo algo. Achei melhor não atrapalhar e fui fazer minha higiene matinal. Assim que eu voltei, vi que você tinha parado e resolvi chamá-lo. Não se preocupe, não li nada do que escreveu.

- Você é incrível Taka, obrigado.

- Pelo que Hiro?

- Por estar ao meu lado.

Takashi sorriu e selou levemente os lábios do namorado, sussurrando quando o contato se desfez, porém ainda rente à boca de seu pequeno: “Te espero no quarto. Não precisa se apressar”.

Assim que o namorado se afastou, ele sorriu. Não havia malícia no convite de Takashi, apenas o desejo de confortá-lo e protegê-lo do mundo.

Olhou mais uma vez para a tela do computador e decidiu apagar tudo que havia escrito. Ninguém nunca leria, ninguém nunca saberia o que realmente sentia.

No final de tudo, seu orgulho ainda era maior.

Entrou no quarto, avistando seu Takashi sentado na cama do casal, recostado a cabeceira e lendo um livro qualquer sobre a constituição que nunca faria questão de entender. Advogados...

Sorriu docemente ao se aproximar e sentar ao lado dele, que imediatamente marcou a página do livro que lia avidamente e colocou-o sobre o criado mudo ao lado da cama. Abraçou seu pequeno e permaneceu assim, apenas sentindo a presença do outro.

Enquanto Hiroto desfrutava da sensação de bem estar que apenas o abraço de Takashi trazia, se permitiu pensar em Kohara, e em algo que havia escrito há pouco.

Torcia para que Kohara pudesse ao menos se lembrar dele com um sorriso no rosto.

~*~

Do outro lado da cidade, no corredor de um hospital, certo cirurgião pensava em um determinado arquiteto... E sorria.