Sendo Aline escrita por Bruna Carreira


Capítulo 23
Capítulo 23




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           Como eu poderia pedir pra que ele ficasse? Como eu poderia pedir pra ele ficasse se ele seria infeliz morando com aquele cara? Como eu poderia não chorar se tivesse que dizer adeus?

           Não havia o que fazer. Qualquer um saberia o certo a fazer, mas não dava pra dizer que seria fácil.

           Eu ainda não acreditava que tinha conseguido contar a ele que o amava. Eu não conseguia sentir minhas palavras saindo. A emoção foi tão forte que simplesmente não pensei, as sílabas simplesmente foram saindo. Como se fosse uma coisa inconsciente, como quando respiramos.

- Marcelo, faz algum tempo que estou sentindo uma coisa... - Eu comecei falando - Mas ainda não tinha tido coragem pra te contar. Na verdade, achei que não fosse.

- Obrigado, achei que fosse seu melhor amigo, Aline.

- Você é meu melhor amigo no mundo inteiro.

- Então por que não me contaria? - Ele ficou chateado - Achei que confiasse em mim.

- Não é questão de confiança, Marcelo.

- É questão de que então? - Ele seguiu com o discurso - Não estou te entendendo.

- É que eu te amo demais pra isso.

– Eu também amo você - Ele continuou, sem perceber -, mas "pra isso" o que?

– Pra te contar, eu quero dizer - Minhas mãos tremiam. - Você não está entendendo.

– Como assim me ama demais pra me contar?

– Eu estou tentando dizer que gosto de você.

– Isso, eu entendi, Aline. Eu também te adoro.
– Não, Marcelo. Eu gosto daquele jeito de você.

– What do you mean?

– Quero dizer que, desde algum tempo atrás, eu... - Minha voz falhou. Aquela palavra específica não queria sair.

– Você...? - Ele fez a entonação para que eu continuasse.

– Eu quero dizer que desde toda aquela história com o Bruno, eu percebi que estava apaixonada por você.

– Você o que? - Ele arregalou os olhos.

– Eu percebi naquela época que te amava mais do que isso. E logo depois...

– E logo depois eu te contei que eu na verdade não gostava de...

– É.

– E você descobriu que gostava de mim.

– É.

– Você tá brincando comigo, não tá? - Ele perguntou, ainda meio cético.

– Claro, é exatamente o que eu faria depois de receber essa bomba que você acabou de jogar em mim - Eu disse, meio grossa. - Brincar com você.

– Desculpa, Aline...

– Tudo bem - Eu disse, passando a mão no cabelo enquanto sentia aquelas informações saírem.

– Bom, então de qualquer forma vai ser melhor assim...

– Assim como? - Perguntei, voltando a olhar pra ele.

– É melhor a gente ficar um tempo longe, porque eu não quero fazer você sofrer - Ele passou a mão no pescoço, ainda com um vício do cabelo antigo.

– Marcelo.

– O que foi?

– PARA DE FALAR MERDA! - Eu gritei com ele.

– Você precisa gritar?

– Preciso quando você fala merda.

– Eu não falei merda, eu só fiquei...

– Ficou preocupado, eu sei - Tirei as palavras da boca dele. - Mas eu já me afastei de você alguns momentos.

– Aquela época que ficamos tipo umas duas semanas sem se falar?

– Sim, isso.

– Era por isso?

– Era mais ou menos por isso, mas não era pra ficar longe. Era pra organizar meus pensamentos e entender exatamente o que eu estava sentindo.

– E você conseguiu?

– Estou aqui te contando, não é? - Falei.

– Sim, mas...

– Marcelo, não precisa ficar preocupado.

– Mas é que eu...

– Marcelo, eu só estou te contando porque precisava de contar, já que isso tudo acabou de acontecer. Mas se eu sentir algo e precisar de um tempo pra mim, eu mesma vou te pedir.

– Eu acho que me acostumei - Ele disse, enquanto dava um sorriso torto.

– Se acostumou ao que?

– A cuidar de você.

– Eu me acostumei a ter você aqui.

– Desculpa não te dizer nada... - Ele falhava - Mas eu realmente não sei nem dizer pra mim o que preciso fazer.

Depois disso, no dia seguinte, eu estava ali, pensando no que fazer e no que dizer a ele. Em breve as coisas aconteceriam, e se houvesse algo a fazer, esse algo deveria ser feito agora.

Eu estava com medo de muitas coisas hoje. Medo de que Marcelo se assustasse com o que eu tinha dito. Medo de que ele tentasse me evitar pra não me fazer sofrer. Medo de que ele fosse embora.

Meu deus, como eu ia ficar se ele fosse embora?

Claro, ele morreria de saudades do Igor, e tenho certeza que sentiria a minha falta também, mas...

Fazem mais de 10 anos que eu vivo com o Marcelo e o vejo praticamente todos os dias, mesmo que seja só dando um "oi" enquanto o observo de onde estou. É muita coisa. É muito difícil. São muitas lembranças pra deixar pra trás e eu simplesmente não consigo lidar com essas duas dores - a de ver meu amigo partir e a de ver a pessoa por quem estou apaixonada também - agora.

O pior é que eu queria ter beijado ele ontem. Eu não sei porque, mas algo me disse que eu deveria ter ido no impulso de beijá-lo e dar a desculpa de que estava muito frágil e emocionalmente perturbada. Ele simplesmente não poderia ficar irritado comigo.

O fato é que eu simplesmente lembrei do Igor nesse momento. Ele não é meu melhor amigo e nem tive tempo pra de fato conhecê-lo e fazer dele um outro melhor amigo meu. Mas não tenho como explicar. É como se eu fosse magoar muita gente fazendo algo só para o meu corpo se satisfazer. E incrivelmente naquele momento eu não me importava nem um pouquinho com o meu corpo.

Pior do que isso é só a imagem mental de beijá-lo não ser nem um pouco estranha, apesar de todos os "poréns" racionais que minha cabeça me forçava a pensar. Ela era boa, suave, confortante. Como se tudo devesse ser da forma que eu gostaria que fosse. É claro que pra isso acontecer muitas coisas deveriam ser diferentes. E não são, então fico tentando me obrigar a não pensar nisso. Perceptivelmente estou conseguindo.

Acho me restava continuar vivendo.



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