Sendo Aline escrita por Bruna Carreira


Capítulo 17
Capítulo 17




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            Realmente foi bem divertido.

            Tá, confesso, me senti culpada pra caralho de ter largado o Marcelo no shopping vagando sozinho, mas depois o Igor apareceu pra ficar com ele, então não tem problema, não é?

            Tudo bem, foi meio horrível. E sabe qual o pior de tudo? Eu acho que nem ligo tanto assim. Até contei para a minha mãe o que aconteceu, e normalmente só conto pros meus amigos.

            Minha mãe ficou feliz de eu ter me dado bem com André, mas ainda estava meio estranha com a recente notícia de Marcelo não era um menino. Ou melhor, ele é um menino. Mas um menino que gosta de outros meninos. Enfim.

            Acho que só não rolou o papo de que eu deveria me afastar do Marcelo ou não sair mais tanto com ele ou não me misturar com os futuros amigos homossexuais que ele possa vir a ter porque de fato saí com o André e minha mãe ficou mais tranquila do que eu gosto. De qualquer forma acho uma babaquice tremenda ela e papai ficarem com essa neura.

            Eu acho que no fundo pessoas mais velhas tendem a demorar (ou nunca) a aceitar coisas que não existiam antes. É a mesma coisa quando quero trocar o dia pela noite, ou simplesmente ir a alguma festa em algum lugar diferente, ou mesmo a questão dos gays.    Espero que minha mãe não conte aos meus avós. Aí sim eu não verei o final do discurso.

            De qualquer forma o final do ano está chegando, então meus pais vão ter um tempo pra amadurecer a ideia e ver que não há nada demais nessa situação. Eu demorei um tempo pra aceitar tudo aquilo, claro que por razões diferentes, mas eu não estou mais tão desesperada quanto fiquei no momento em que ele estava contando tudo aquilo.

            Na verdade, depois de tudo, eu achei bom ele ter contado. Ele demorou mais porque sabia que tudo ia ser difícil, e por mais que eu tenha ficado sentida no início, respeitei as decisões dele. Não que eu tenha deixado de me achar estúpida por não ter notado antes, mas ele precisava do tempo dele.

            Agora ele está pronto pra aceitar o Igor de verdade, e encarar tudo que tiver de encarar pela frente. Eles estavam juntos, mas quando ninguém sabe, tudo fica meio cinza. Agora de fato eles vão estar num relacionamento e vão poder esbanjar tudo que eles são juntos na cara de todo mundo que não acredita nessa forma de amar. Eu não poderia invejá-los mais.

            Eu ainda estou triste por amar o Marcelo, mas devo confessar que a saída com ele e o André me animou de uma forma surpreendente. Eu acho que a partir de agora eu preciso sair mais com outros garotos e sentir tudo de novo. Preciso achar agora o meu cara, e continuar sendo mais amiga do Marcelo como jamais fui antes.

            Com esse final de ano e tantas surpresas que me apareceram, só posso desejar que tudo melhore e que eu descubra novas oportunidades no ano que vem. Fora que vou rever meus familiares, minhas primas e talvez até seja divertido. Só espero que eu possa levar o Marcelo comigo. Talvez o André venha também, se não tiver nada a fazer.

            Pelo que Marcelo me contou, ele mora com os próprios tios hoje em dia, por causa de alguma briga feia com os pais. Depois disso, não precisava, mas decidiu começar a trabalhar enquanto estuda para passar pra alguma universidade. E eu aqui, ainda indo pro terceiro ano sem ter a menor ideia do que fazer da vida.

            Só se passaram dois dias, mas eu não consigo parar de pensar nele. Ele tem um jeito bem descontraído, e é daquelas pessoas que parece simplesmente não ter problema algum.

            O mais engraçado é que ninguém nunca tinha me tratado daquela forma antes. Quer dizer, de agir normalmente comigo, de não ter aquele clima estranho ou silêncios constrangedores e coisas assim. Fora que ele pegou a minha mão e foi comigo. Ninguém pega na mão das pessoas no primeiro encontro ultimamente, fora que...

            Espera, eu tive um encontro?

            Meu Deus. Eu tive um encontro. Como você tem um encontro e não sente que foi um encontro, mesmo?

            Parecia que nós dois nos conhecíamos há muito tempo. Conseguimos conversar bastante (pelo menos em relação ao tempo que ficamos no shopping) e ele me contou muita coisa sobre o trabalho dele e até um pouco sobre os amigos dele. Ele trabalhava numa lojinha dessas de computadores – E entende essas coisas que só pessoas especiais entendem, na minha opinião – e os vende num pequeno estande, ali mesmo no shopping. Por isso ele topou vir com o Marcelo no outro dia.

            Os amigos dele aparentemente são tão nerds quanto ele. Não saem, não vão à festas e praticamente vivem de ficar jogando World of Warcraft no computador. Ele não é muito diferente, mas ele é fofo e pode pagar pelos seus vícios. PRINCIPALMENTE a parte do fofo.

            Eu nunca fiquei com um nerd antes. Geralmente fico com garotos que gostam de videogame e tudo, mas é só. Eu até jogo de vez em quando, mas prefiro jogar cartas a ficar na frente de uma tela até ficar com os olhos ardendo. O que é irônico já que eu não gosto de sair tanto assim. Eu supostamente deveria gostar.

            Não que a gente tenha FICADO muito. Tudo bem, foi um beijo. Tudo bem, foram alguns beijos, mas não demoraram tanto assim. Ou pelo menos não tanto quanto eu gostaria.

            Meus Deus, será que ele não gostou de me beijar? Eu não tinha pensado nisso até esse segundo.

            Se bem que, se ele não tivesse gostado, não teria tentado me beijar as outras vezes. Mas ele poderia estar tentando melhorar. Depois pode ter ficado a mesma merda. Puta que pariu, eu devo beijar mal pra cacete.

            Nesse momento, meu celular tocou.

- E aí minha garota favorita – Marcelo falou do outro lado da linha.

- Diga – Eu disse, meio apressada.

- Posso ligar pra sua casa ou você está ocupada?

- Pode ligar – Eu disse, já bolando um plano em minha mente.

            Esperei quase já falando com o ouvido colado no telefone.

- MARCELO! – Gritei – Eu PRECISO saber!

- Ahn... Oi filha – Papai falou do outro lado. – Você pode falar um minuto?

- Escuta, sua mãe está em casa?

- Não – Falei com pressa.

- Sabe onde ela foi?

- Não.

- Pode dar um recado pra ela?

- Não – Falei sem pensar.

- ALINE!

- Que foi pai?

- Dá um recado pra sua mãe, ok?

- Fala pai.

- Diga que vou demorar pra chegar em casa, porque vou ficar preso no trabalho.

- Tudo bem, beijo.

- Eu também te amo tá, filha? – Ele disse com sarcasmo – Você é a gracinha do papai!

- PAI! – Gritei – Alguém pode estar ouvindo!

- Todos os meus colegas de trabalho sabem que você é a gracinha do papai – Falou com tom de senhor óbvio. - Não adianta mais.

- PAI!

- Tudo bem, tudo bem. Vou te deixar com seus problemas de menina. Beijo.

            Colei no telefone novamente.

- MARCELO! – Gritei, ao telefone tocar.

- Tá morrendo por acaso? - Ele perguntou, meio confuso, com uma voz engraçada.

- Mais ou menos - Respondi, quase ofegante.

- O que foi?

- EU QUERO SABER! Eu gritava, imaginando que era ótimo ser filha única e estar em casa sozinha.

- Quer saber do que?

- Do que ele disse de mim!

- Você está parecendo aquelas menininhas querendo saber do carinha fofo que estuda com elas - Ele disse, terminando com uma gargalhada.

- Cala a boca!

- Nossa, você acordou inspirada hoje, hein?

- MARCELO! - Eu continuava - Me ajuda!

- Estou tentando - Ele disse, pacientemente -, mas você não está me ajudando com essas insformações.

- Tudo bem - Respirei. - Quero que você me fale o que André achou de mim.

- AAAAAAAH - Ele disse, finalmente entendendo. - Eu não sei não.

- Como assim você não sabe?

- Não sabendo, ué. O "AAAAAAAH" - Que ele repetiu, com a mesma intonação de surpresa - foi só pra te irritar mesmo.

- Você não serve pra nada!

- Nossa, obrigado - Ele disse, bufando.

- Ah, você serve sim meu melhor amigo mais fofo do mundo!

- Ah meu Deus, lá vem... - Ele disse, como se soubesse o que vinha em seguida.

- Liga pra ele! - Pedi.

- Não posso, Aline - Ele respondeu. - Não nos falamos tanto assim.

- Ah, faz uma forcinha! - Pedi com voz fofinha.

- Não vai dar não.

- Por favor - Continuei.

- Não.

- Por favorzinho?

- Sim.

- Sério? - Meus olhos brilharam.

- Não. Agora pare de insistir.

- Por que não, Marcelo?

- Já disse porque!  Fora que já ando alugando ele esses dias. E ele é mais do tipo reservado, não creio que vá passar muitas informações pro melhor amigo da garota com quem ele ficou.

- Nem se eu pedir muito?

- Nem se você pedir muito.

- Nem se eu implorar?

- Nem se você implorar.

- Nem se eu disser que eu te amo demais?

- Nem se você disser que me ama demais.

- Hunf - Bufei.

- Aline, posso falar agora?

- Claro que pode, né - Disse, fazendo birra.

- Hoje vou precisar fazer algumas coisas aqui em casa, no final da tarde. Mas queria passar aí depois. Tem como?

- Bom, não vou fazer nada - Respondi. - Mas creio que seja melhor ficarmos conversando ali na esquina, já que meus pais agora sabem e podem ficar enchendo o saco.

- Não, tudo bem - Ele disse, sério. - É que realmente preciso conversar com você.

- Aconteceu alguma coisa?

- Ainda não - E, com essa frase de efeito, ele se despediu. E o pior é que não me contou nada. Eu detestava quando ele fazia isso.

            Fiquei um tanto quanto apreensiva, já que ele raramente ficava sério daquele jeito. Ele sempre foi uma pessoa muito mais animada do que a maioria das pessoas que eu conhecia.

            Depois daquilo, resolvi ficar um pouco no computador e logo em seguida liguei para Débora. Ela, pra variar, estava como uma louca estudando para a prova final, já que a mãe dela provavelmente estava torrando a paciência dela, dizendo coisas que não se dizem aos filhos - ainda quando eles já estão nervosos o suficiente.

            De qualquer forma, conversamos um pouco e tentei tranquilizá-la. Era o mínimo que eu poderia fazer, de qualquer forma. Eu não poderia ir lá, já que Marcelo estava vindo, e também não poderia fazer com que ela viesse, por causa da mãe dela.

            No meio de nossa conversa, ouvi batidas urgentes na porta, e logo em seguida meu telefone a tocar. Resolvi atender a porta primeiro, e quando olhei pelo portão, era Marcelo.

            Tudo estava bem até que abri o portão e vi meu melhor amigo, sempre sorridente, com um braço encostado na parede, cobrindo parte do rosto. Vi aqueles olhos e eles estavam vermelhos. Ele estava chorando e corri para abraçá-lo.

            Não consegui ouvir o barulho do telefone enquanto este caía no chão.


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