O grupo avançou pelo pátio amplo da BLI, com passos incertos, mas rápidos. Precisavam ser ágeis, mas, ao mesmo tempo, atentos à procura. Não podiam deixar nem um detalhezinho passar, muito menos deixar Sunshine presa naquele prédio horrível.

Poison, que foi ficando cada vez mais para trás, tentava focar apenas na frente, mas não podia segurar as memórias que vinham com tanta força, desenterradas do fundo de sua mente, atingindo-a como mil adagas, relembrando-a de tudo o que fez, tudo o que causou.

–Exterminator 1907-3, você, por acaso, sabe por que está aqui?

–Sim, senhora.

–E por que está aqui?

–Não cumpri meu dever, senhora.

–E que parte você não cumpriu.

–Deixei o rebelde ir embora...

–Pior do que isso, você o AJUDOU a escapar!

–Peço perdão, senhora.

–Já é tarde demais para pedir perdão. Quero que traga o rebelde. Agora.

–... Não.

Poison Heart continuou lutando contra a enxurrada de lembranças que insistia em deslocá-la de seu objetivo principal, que era achar Sunshine e encontrar meios de destruir a BLI. Portanto, as lembranças eram mais fortes.

–Tenho notícias para você, Exterminator 1907-3.

–Sim, senhora?

–Lembra- se do rebelde que você deixou fugir?

–Sim, senhora.

–Pois bem... O Exterminator 5541-7 recapturou-o... E o rebelde cooperou conosco.

–Ele... ?

–Sim.

De repente, a menina soltou um berro de frustração por não conseguir conter as lembranças. Party arregalou os olhos e tapou a boca da menina.

–Você ficou maluca?! – sussurrou ele, irritado – Podemos ser descobertos!

–Desculpa. – murmurou ela, sem prestar muita atenção nas palavras dos outros. Ao perceber que havia se desculpado com o próprio aluno, Poison Heart pigarreou e disse – O problema é meu se eu quero gritar ou não, ok?

–É da sua vida que estamos falando. Você decide. – ele deu de ombros e continuou a andar. Em um certo ponto, os cinco resolveram ficar com as rayguns na mão, para caso algum Draculoid avise aos outros que eles estão ali ou coisa parecida.

Eles andaram por minutos que pareceram horas, enfiando-se por entre os corredores escuros, fracamente iluminados pela fileirinha única de círculos iluminados. Os corredores eram extremamente estreitos, ladeados por portas acinzentadas com números pequenos. Salas de teste. Era dessas salas que saiam as pílulas que controlavam as mentes de todos. Poison Heart lembrava-se muito bem delas. Por dentro, eram escuras, sem nenhuma luz a não ser uma única lâmpada pendendo do teto, onde uma pessoa, geralmente à beira da insanidade, era usada como cobaia. Eram usados principalmente Killjoys capturados, e, a maioria deles, acabava morrendo de fome, doenças ou simplesmente ficavam insanos. Poucos, muito poucos, conseguiram escapar das Salas de teste da Better Living Industries.

–Acha que ela pode estar em uma dessas? – perguntou Jet, tentando olhar dentro das salas.

–Acho que não. Eles não vão fazer isso. Não ainda. – respondeu Poison – Se estou certa, o que eu não garanto nada, ela vai estar na sala de controle da S/C/A/R/E/C/R/O/W, como da última vez.

–Mas aí seria óbvio! – protestou Fun – Pareceria que eles querem que nós a achemos!

–É exatamente o que eles querem. – grunhiu Poison – Mas andem, vamos entrar em uma dessas salas. Talvez tenha algo que nos interesse.

–Ok, mas como quer entrar? – indagou Jet, ironicamente. Ela lançou-lhe um olhar fulminante antes de tirar um grampo do cabelo e abrir a porta.

–Métodos antigos ainda funcionam. – respondeu ela, no mesmo tom de Jet Star. Ele arregalou os olhos, mas nada disse, simplesmente entrou na sala atrás de Party.

Como Poison bem se lembrava, era uma sala pequena, escura e levemente monótona. Porém, havia uma coisa diferente: ao invés de pessoas, havia duas enormes caixas de vidro, como se fossem gaiolas de vidro. Dentro das caixas, havia dois animaizinhos estranhos. O primeiro era levemente parecido com um lobo. Não era muito grande, mas grande o suficiente para atacar qualquer um dos cinco sem maiores problemas. Estava acordado e rosnou para os recém-chegados. Porém, havia algo de estranho em seus movimentos. Suas patas se moviam como se ele tivesse pulsos. E mais: a criaturinha podia, se quisesse, mover-se facilmente sobre suas patas traseiras. Além de suas patas, seus olhos também eram estranhos. Não eram parecidos com o de um lobo. Eram brilhantes, sentimentais...

... Humanos.

Poison franziu a testa ao examinar a criaturinha mais de perto.

–Esses olhos... Eu os reconheço...

–Claro que reconhece, são os olhos de um lobo. – disse Party Poison, franzindo a testa.

–Não, ela tem razão. – comentou Fun, chegando mais perto do bichinho, que começou a pular (bem alto) de um lado para o outro, rosnando ameaçadoramente – Parece que já vi esses olhos em algum lugar.

A mente de Poison estava funcionando a mil, tentando se lembrar de onde já vira aqueles olhos. De repente, ela se lembrou.

Static Cola.

–Meu deus! – disse ela, um pouco alto demais.

–O que foi?

–Já viram fotos de Static Cola? O que escreveu aquele livro?

–Sim, por quê? – Party estava cada vez mais confuso.

–Então... Esses... São os olhos dele!

Todos mergulharam em um silêncio profundo. Cada um pensando uma coisa diferente, mas todos concordavam em uma coisa: a BLI não era mais uma simples empresa que vendia pílulas de prazer. Havia algo a mais no plano dele, seja esse plano conectado com o que Static Cola escreveu, seja outra coisa. Eles estavam planejando algo.

Poison passou a atenção para a segunda caixa de vidro. Era um pouco maior que a outra, pois havia uma pequena árvore disposta em um canto. Pendendo de um dos galhos, encontrava-se um ninho que lembrava um ninho de vespas. Em torno dele, vários insetos voavam, zumbindo insistentemente. Poison franziu a testa e examinou as estranhas vespas mais de perto. Eram enormes, maiores do que vespas comuns, e tinham uma cor dourada e levemente metálica, mas eles sabiam que elas eram reais, não eram robôs. A menina bateu um dedo levemente na caixa de vidro, perto do ninho, e os insetos se voltaram furiosamente contra o vidro, tentando alcançá-la. Poison se encolheu e se afastou da gaiola, olhando para Kobra, que parecia ainda mais perplexo.

Todos ficaram ali, encarando as vespas que teimavam em bater contra o vidro, tentando alcançá-los. Fun foi o primeiro a mostrar algum tipo de reação, e foi para perto do vidro da primeira criatura, ignorando a horda de vespas que o seguiu de dentro do vidro. Fun Ghoul se aproximou da gaiola e viu uma pequena plaquinha.

–Cruzamento 13... Sem nome... – ele franziu a testa e foi para perto do vidro das vespas, tentando achar uma plaquinha parecida. Não demorou muito para Fun localizá-la e ler novamente – Cruzamento 16, Tracker Jackers. – mais uma vez, ele franziu a testa e se virou para o grupo – O que acham que são esses dois animais?

–Mutações. – disse Poison – Há rumores de que a BLI estava fazendo novos experimentos, cruzando tipos de animais. Vejo que é verdade, huh? – ela riu amargamente – Aquela mutação... A criaturinha-lobo... Com certeza tem algo de especial. Deve ser mais forte que um lobo, mais ágil por poder se mover nas patas traseiras... Algo assim. Mas com certeza há algo nela que a difere de um lobo comum. Quanto aos Tracker Jackers, bom, eu sinto que não quero descobrir o que eles fazem. – ela franziu a testa – Nunca gostei de vespas, mas as criadas em laboratórios me parecem ainda menos convidativas.

–Ah, que agradável! Descobriram nossas mutações! – disse uma voz vinda de algum lugar.