Lua Cheia escrita por Akyra Briefs


Capítulo 14
8.2 Confusão




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Abri a porta do quarto de rompante e acendi o candeeiro para iluminar aquela divisão escurecida. Um envelope volumoso estava pousado em cima da cama. Empinei a sobrancelha, aproximando da borda da cama, onde me sentei. Com a curiosidade a formigar-me as palmas das mãos, peguei nele e abriu sem cerimónias. Um monte de fotografias era o que se encontrava lá dentro. Fotos de ontem.

-Quis lhe fazer uma surpresa. – Alice estava ao meu lado, sem que eu desse fé dela entrar. – Imprimi as fotos que estavam na sua máquina. Pensei que quisesse colocá-las no álbum novo.

-E pensou bem. Não me apetecia nada armazená-las no computador, onde só poderia revê-las quando o ligasse.

Com os dedos, corri com cuidado aquele molho de fotos, vendo cada imagem colorida expressa no papel macio. Até que uma foto minha com Jacob surgiu e me fez perder temporariamente o fôlego. Ele mantinha o seu peculiar sorriso translúcido e perfeito nos lábios. Aquele que aparecia nos meus sonhos cintilantes, quando me atrevia a pensar nele antes de adormecer. Aqueles olhos que hoje de manhã tiveram tão perto dos meus, exigindo de mim tudo e nada ao mesmo tempo. Um arrepio percorreu-me a espinha com essa memória. Ouvi um riso abafado de Alice ao perceber a demora que tive em mudar para a próxima foto.

-Jake tem um brio e uma presença esplêndida. E você um brilho especial de uma estrela cadente em céu aberto. Vocês são o oposto um do outro, mas quem os vê juntos, não diria que não foram feitos um para o outro.

-Tenho sorte de tê-lo em minha vida – adicionei corada.

-E Jake, de ter você na dele. – De modo modesto, estendeu a mão e pediu-me a foto. Ao lhe entregar, ela proferiu: – Linda demais para ser guardada num álbum. Por isso que tomei a liberdade de comprar um passepartout.

Como num passo de magia e uma rapidez indecifrável, Alice desencantou um porta-retratos de uma saca pousada na escrivaninha e colocou lá a foto, pousando-o de seguida na minha mesinha de cabeceira. Admirou-a por segundos e gesticulou seus braços ao soltar um: “Perfeito”.

-Só você mesmo. – Ri ao abanar a cabeça.

-Por falar em compras... – O entusiasmo dela era palpável no ar – Reformulei seu Closet. – Revirei o olhar. Sim, ela não desistia. – Comprei quatro vestidos, três casacos de combinação, cinco pares de calçados, que você vai adorar, e vários conjuntos para você dormir. Aqueles seus pijamas folgados já não são para o corpo de uma adolescente.

-Tiaaa…- grunhi com um tom mais arrastado.

-Não resisti. – Deu ombros, divertida com a minha expressão. – Eu só não te mostro agora tudo, porque não quero desarrumar o seu guarda roupa. – Chocalhei a cabeça. – Bom, e que plano temos para esta noite?

-Lamento se durmo durante a noite como todas as pessoas normais – uma entoação de sarcasmo escapou-me de mansinho, porém, ao vê-la parada à espera de uma resposta coerente, quebrou toda a ironia dentro de mim. – Primeiro vou tomar um banho, depois podemos assistir aquele filme que você tanto adora, que tal?

Esta seria a noite mais comprida de todas; tão cedo não ia conseguir pregar olho – pelo menos até alguém dar noticias.

Depois de entrar no banheiro, Alice invadiu a pequena divisão para me entregar uma peça lilás clara de seda bem dobrada, juntamente com uma roupa interior. No final do meu banho rápido, percebi que aquela peça de seda era uma das novas aquisições de Alice. Uma camisa de noite bem trabalhada, de alça fina e com um laço branco no decote, fez-me dilatar as pupilas e rir sem graça. Ela só podia estar brincando comigo. Passado alguns segundos, considerando se vestia ou não a peça – bonita, devo admitir – acabei por ceder. Ela deslizou pelo meu corpo até ao meio da coxa, colando-se a cada canto deste.

-Eu te mato Alice – rosnei ao me contemplar no espelho. Pelo menos me dava um ar mais feminino.

Na sala, a quentura da lareira que Alice tinha tido o cuidado de ligar, foi bem apetecível naquele momento. Lá fora, além do congelante frio, caía uma tempestade descomunal, onde o clarear dos relâmpagos iluminavam a penumbra sala e impetuosos pingos de chuva atacavam a janela.

Alice já se encontrava sentada no sofá a minha espera, com o controle remoto do DVD pronto a ser carregado no botão Play. Aconcheguei-me no sofá, e ela me cobriu com uma manta de algodão grossa, pondo por fim o filme a tocar. Apesar de já saber a história daquele romance épico e adorá-lo, hoje particularmente não conseguia prestar atenção a ele. Saber que Jake rondava os arredores desta casa, sozinho e sem proteção – embora soubesse que ele se desenrascava bem – tirava-me a vontade de estar ali, vendo um filme como se nada de anormal ocorresse. Ainda mais, quando uma tempestade reinava lá fora. Amaldiçoei novamente a minha condição meia humana. Já quase no final do filme, um pequeno ronco soou do meu estômago, despertando a atenção de Alice, que me fitou de soslaio.

-Você não jantou, não é? – Eu neguei, sem saber se realmente estava ou não faminta. -Eu vou te preparar algo…

-Nada contra os seus dotes culinários, mas apetecia-me tanto aquele empadão de carne da Esme. – Sim, agora sentia a fome a socar-me o estômago, e água na boca. – Demorará assim tanto? Com esta confusão toda, nem cacei.

-Se forem duas a fazer, não demorará muito. Só que não posso te deixar sozinha. – Ela cruzou os braços.

-Tia, tenho seis vampiros a rastrear Forks inteira, um lobisomem a rondar-me a casa. Você acha que o tal vampiro iria ser louco de aparecer aqui perto? – Pela sua expressão, pude vê-la ponderar sobre isso. – Além do mais, tenho certeza que em menos de cinco minutos você estará aqui. Posso garantir minha vida nesse curto espaço de tempo.

-Nessie…

-Não me obrigue a vestir-me e a ir com você para a mansão, com o manto chuvoso que cai lá fora, por favor – implorei ao ouvir um relâmpago a estremecer as paredes.

-Está bom, mas qualquer coisa me ligue e eu saio correndo.

-Não se preocupe, eu estarei bem. - Ainda com uma centelha de ponderação no rosto, ela suspirou rendida e acabou por sair num lapso de casa.

Pus o filme em pausa e peguei no meu exemplar: “Amor em tempos de cólera”, que ainda permanecia na mesa da sala, desde a ultima vez que o lera. Abri-o na página que marcara e mergulhei naquela linhas negras que me conduziam àquela maravilhosa história. Adorava aquele amor intemporal de Florentino e Fermina, que mantiveram a chama da paixão acesa mesmo quando ambos não tinham quase nenhum contato físico, apenas por cartas. Era engraçado como este livro me fazia pensar para além dos longos parágrafos. Principalmente, de como seria se algum dia tivesse de mudar de Forks. Como seria ter Jacob longe de mim? Amá-lo à distância, onde não o poderia tocar ou sentir o seu agradável calor... Estremeci só de pensar nessa possibilidade.

Mordi a pele tenaz de meu lábio e concentrei-me de novo no livro para me desunir da conduta que minhas reflexões me levavam. Enquanto pudesse viver perto de Jake, nada mais tinha importância. Nenhum pensamento meticulosamente arquitetado merecia tamanha consideração. Voltei a mergulhar na página preenchida com longas linhas pretas e recomecei minha leitura. Um novo relâmpago iluminou a sala. Por segundos, um reflexo irreconhecível ganhou contornos sólidos na janela da sala, assustando-me. Quando tudo ficou escuro novamente, não vi mais nada.

Meu coração acelerou descomunalmente. Que sombra era aquela? Pousei lentamente o livro no sofá, descobri-me da manta e ergui-me num pequeno pulo. Com passadas lentas caminhei até á janela. Com a respiração aos solavancos, com pequenas golfadas de ar, espreitei através da vidraça. A chuva continuava densa e o vento a soprar para noroeste. Apesar desse temporal, a floresta negra parecia pacata, sendo balançada pelo vento sonoro que soprava ruidosamente contra o vidro da janela. Não havia nada de suspeito. Estaria eu, tendo alucinações? De repente, vi os galhos à frente da janela oscilarem de forma oposta das fortes rajadas de vento.

-Jake! – clamei, julgando ser ele a rondar a casa. Não houve resposta. Pelo contrário, os movimentos deterioraram-se ainda mais.

Recuei sem tirar os olhos dos vastos galhos. O coração fazia um ruído desesperador, que me fez colocar a mão sobre o peito, com receio de ele querer me saltar de lá. Droga! E se fosse o tal vampiro? Supostamente um animal qualquer? Involuntariamente voltei as costas e corri em direção ao quarto. A escuridão não me incomodou desta vez. Quanto menos luz tivesse, melhor. O meu corpo tremia a cada milímetro enquanto procurava de modo atrapalhado o celular nas calças que usara hoje, achando-o. Passei as mãos trémulas pelo cabelo e pensei em quem ligar e o que dizer. E se eu estivesse errada? E se não fosse nada demais? Marquei o número de Jake. Três toques foi o que soou do outro lado até uma voz rouca e intensa atender.

-Nessie, o que houve? – a preocupação era patente no seu tom misturado com o vento lá de fora.

-Eu…eu não sei! Acho que vi algo pela janela, somente não sei se é algum animal. – Ouviu-o a tropeçar em algo, como se tivesse a vestir-se ao mesmo tempo que andava; praguejou alto.

-Os mesmos olhos? - minha voz estava perdida em algum lugar, mal conseguia proferir o que quer que fosse. – Pequena, fale comigo! – quase implorou - Peça a sua tia antes de eu chegar, para ir averiguar o que é…

-Estou sozinha. – soprei com dificuldade; ouvi um impropério ser pronunciado.

Outro lampejo penetrou indistintamente pela janela e preencheu o meu quarto como uma luz forte de candeeiro. Desta vez, pude apreciar uma figura alta e de feições escurecidas pela claridade do relâmpago, curvada sobre a vidraça, antes de a divisão mergulhar de novo na escuridão. Soltei um grito de terror e larguei o celular no chão para levar as mãos à boca, ouvindo a voz aflita de Jacob me chamar. Sem pensar corri para a sala e fechei a porta do quarto num baque seco – com medo que ele tivesse entrado pela janela. Peguei no tenaz da lareira e apaguei todas as luzes da divisória para me centralizar em algum movimento suspeito. Com o tenaz em riste, movi-me em pequenos círculos até alcançar a porta da rua.

Estava deixando os meus instintos humanos dominarem-me. Deixando-me fraca e irrefletida. Nos segundos seguintes, concentrei-me o suficiente para apelar ao meu autocontrole e deixar a aberração tomar conta de meus sentidos e instintos, como se estivesse pronta a caçar a minha presa. Tanto a respiração, como as batidas do coração aplacaram ligeiramente, não deixando transparecer o meu temor. Ouvi um movimento longínquo atrás da porta da entrada, que se aproximava numa marcha apressada. Um rosnado alto ecoou em meu peito; arqueei o corpo pronta a atacar, caso ele atravessasse aquela entrada.

Por fim, alguém acabou por arrombar a porta de rompante, invadindo a casa. Com toda a força possível e com a adrenalina a queimar impetuosamente em minhas veias salientes, saltei para cima do meu oponente e ataquei-o com o tenaz nas costas, quebrando a pequena barra de ferro a meio. O invasor soltou um urro de dor, porém não se abalou. Instantaneamente, respirei fundo e o cheiro de menta misturada com musgo entranhou no ar, apaziguando os instintos da aberração.

-Jake. – Deixei o resto do tenaz escorregar pelas mãos e encaminhei-as ao rosto, com sobressalto. – Me desculpe, eu pensei que…

-Boa pontaria. Acertou em cheio na minha coluna. – sem sucesso, ele tentou massajar as costas, voltando-se para mim.

Sem demora, adiantei-me para afundar nos seus braços quentes e longos. O seu corpo molhado, mas quente, fez-me encontrar a segurança que desejei durante toda noite. Senti ele enterrar o seu rosto nos meus cabelos, inalando-os com ânsia. Afastei com lentidão a cabeça do peito dele e olhei envolta para me situar, ainda incerta de que o vulto voltaria a fazer-se presente no próximo trovão.

-Vim a correr feito louco, quando ouvi o seu grito. – Ele me afastou um pouco de seus braços para analisar minhas feições. – Você está bem?

-Agora sim.

-Porque raios você está sozinha? Alice não devia de estar aqui? – Seu tom superficial podia ser rude, mas era a apreensão que reinava na sua sentença.

-Não a culpe! Eu é que pedi a ela para me fazer um favor.

-E com um sádico à solta, ela concedeu-lhe esse favor? Vou ligar para avisá-la que não precisa se preocupar em voltar. A partir de agora, eu tomarei conta de você.

-Jake, eu não preciso que tomem conta de mim – rebati completamente indignada.

-E pensa defender-se com tudo o que lhe aparecer à mão? – Um sorriso irónico ocupou-se da sua linha tensa.

Bufei impaciente ao vê-lo virar costas e pegar o celular do bolso. Lá se ia o meu empadão. Cruzei os braços e voltei para o meu quarto, contudo desta vez liguei a luz. Não ia mentir ao dizer que não estava aterrorizada com o que vira, somente não queria parecer indefesa. Não ia deixar que os instintos humanos aflorassem novamente em sua pele. Como prova disso, aproximei-me da janela com um passo leve e precavido para examinar o ambiente lá fora – enquanto ouvia a voz enfurecida de Jacob na sala. Nenhum sinal anormal foi visualizado, além da fúria da natureza a rugir em seus domínios.

Algum tempo depois, Jake apareceu com cautela no quarto – de cabeça cabisbaixa, à medida que passeava sua mão entre o cabelo ensopado - e parou a um passo de me alcançar, observando-me com pura estupefação. Estranhei a sua fisionomia de espanto, para depois um clique surgir em minha mente. A maneira como estava vestida para dormir era uma novidade para ele. Por isso a sua surpresa. Corei até à raiz dos cabelos e desviei o olhar de novo para a vidraça embaçada. Ouvi as passadas arrastadas dele até estancar a minha frente.

-Você vem crescendo de uma maneira esplendorosa. - Cerrei os olhos ao tentar ocultar o rubor que habitava minhas bochechas perante aquelas azeviches líquidas. – Nessie... – soprou num modo afável. – Você não tem noção de como me senti impotente e atormentado quando ouvi você gritar. Fiquei entorpecido de dor por temer não chegar a tempo de te ver com… - Meus olhos abriram-se devagar, recebendo os seus marrons martirizados. – …De te proteger. - Baixei a cabeça.

Agora que pensava com clareza, pude chegar a uma conclusão que talvez não tivesse muito fundamento. Esse ser, fosse ele o que fosse, parecia estar atrás de mim desde que me vira. Por curiosidade ou não, eu ficara com essa sensação desde o nosso pequeno encontro na floresta. Podia estar imaginando coisas, mas esse pensamento parecia ganhar novos contornos na minha mente. E o que me assustava, era o fato de ele ter a capacidade de ocultar o seu cheiro e ser imperceptível tanto na presença de lobisomens ou vampiros.

-Jacob, eu tenho medo. – Minha garganta estreitou e temi chorar quando senti os olhos arderem. Minhas defesas quebraram-se e deixei novamente os instintos humanos atuarem nas minhas emoções.

-Não tenha, eu estou aqui para te proteger.

Dois braços quentes envolveram minha cintura, e me trouxeram para mais perto. Eu sentia-o vibrar levemente, ao mergulhar no menta que me acolheu calorosamente. Coloquei a mão sobre o tórax dele e um coração acelerado dava sinais do desassossego que tinha passado.

-Odeio parecer fraca – murmurei ao mesmo tempo que Jake me balançava em seus braços.

-Você não é fraca, minha pequena. Nós é que te mimamos demais…- Depositou-me um beijo na bochecha e olhou o relógio da mesinha de cabeceira. – Já são horas de você estar dormindo.

-Não me deixe. Não hoje! – Apertei-o com mais força entre meus braços, temendo que ele se evaporasse dali.

-Não tenciono estar em lugar algum senão aqui, para te proteger, minha princesa.

Jake impulsionou minhas pernas em direção à cama. Sem se afastar de mim, arrastou os lençóis e cobertores para trás e fez-me um aceno para eu me deitar. Obedeci sem relutar. Começava a sentir as pálpebras pesarem – certamente a única batalha desta noite que eu ia perder, era contra o cansaço que se apossava de cada célula de meu ser. Deitei-me o mais à esquerda possível, deixando um espaço para que ele fizesse o mesmo, ao meu lado. Ele empinou a sobrancelha, relutante, mas suspirou devagar, consentindo. Atirou a camisa rasgada e molhada para o chão, afundando-se em seguida no colchão. Os lençóis foram arrastados para cima de mim, e sem demora, aproximei-me de Jake e acomodei a cabeça sobre o seu peito – quase jurei ver um certo desconforto no seu semblante, porém sua mão rodeou o meu pescoço, passeando ao longo do meu braço.

Quando estava quase cedendo às pálpebras pesadas, Jake me chamou:

-Nessie?

-Hmm?

-Você aceitaria me acompanhar nesse acampamento?

-Adoraria, Jake… Adoraria. – E, por fim, rendi-me ao cansaço.


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Notas finais do capítulo

Tenho conseguido, embora com alguma dificuldade, conciliar o tempo de trabalho e o de escrita.

Estou já finalizando o próximo capitulo, contudo não sei quando o vou postá-lo. Talvez na próxima semana.

Obrigada pelas vossas reviews. Fico realmente feliz por saber que ainda acompanham esta fic.

Até ao próxima capitulo.

Taty Black



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