A Flor Do Deserto escrita por Mary Ayumi


Capítulo 2
Pegamos você




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Ino sentia o cansaço pousado em seu ombro. Debruçada sobre o balcão da floricultura Yamanaka, os orbes tempestuosos admiravam o ir e vir de pessoas por detrás da porta de vidro. Os olhos da moça adornados com olheiras, provindas da frequente falta de sono. Oh, malditos pesadelos que a atormentavam! Queria tanto se livrar deles para assim conseguir dormir uma noite completa, sem a presença de corvos, homens misteriosos, e gritos. Ino podia jurar que mesmo acordada, no silêncio funesto, ela podia ouvir o júbilo de seu sonho. Aquele grito agudo de estourar tímpanos. Soltou um pesado suspiro, quando a movimentação da rua tornou-se mais fraca. A loja sentia falta de clientes. Algumas flores estavam lá desde que brotaram até as primeiras pétalas murchas começarem a cair. Ino não parecia nem perceber a falta de água de algumas, ou a necessidade de adubo de outras. Estava inerte, cansada demais pra se quer respirar. Dobrou os braços e deixou-se apoiar a cabeça sobre eles. O sol a fazia semicerrar os olhos. Pesados demais para abrir-se totalmente. O sino acima da porta anunciava a entrada de um cliente. A moça endireitou a postura de mal grado e olhou para o homem que sorria para ela, recostando-se no balcão e tamborilando os dedos na madeira. O homem olhou para ela em silêncio e analisou sua expressão. Ela continuava olhando para fora ignorando que ele estava ali. Ele inclinou a cabeça para o lado como um cachorro curioso. Sua pele tinha um tom pálido, os cabelos estavam presos para trás em um rabo de cavalo espetado, e os olhos castanhos estavam a encarando por detrás das pálpebras preguiçosas. Shikamaru Nara suspirou, inclinou-se sobre o balcão, e com o polegar acariciou a bochecha de Ino. O carinho a arrepiou e fez com que ela o encarasse.

– Você está horrível. - ele murmurou baixinho. - Hinata tem razão.

Ino estava quase tão morta quanto suas flores. Ele olhou em volta e viu qual era o motivo da falta de clientes. As flores não tinham a cor e o brilho habitual. O perfume não inundava a rua e puxava os clientes como fazia antes.

– Eu sei, Shika. - A Yamanaka deu um sorriso que saiu mais como uma careta. - Eu ficarei bem. Eu só preciso dormir um pouco.

O homem franziu as sobrancelhas. - Acho que você deve ir pra casa. Vamos, eu te levo.

– Não, eu não posso. - a loira protestou passando a mão no rosto. - Não tive nem ao menos uma venda hoje.

Shikamaru sorriu. - Isso me lembra do meu motivo pra vir até aqui. - mexeu no bolso lateral da calça e jogou algumas moedas no balcão. - Um buquê de rosas vermelhas, por favor.

Ino deu um sorriso fraco, abaixou-se para pegar uma tesoura de podar de baixo do balcão e caminhou até a prateleira com vasos de flores. - Bem, devido isso. Devo arriscar que Temari está aqui em Konoha? - ela disse enquanto cortava as rosas mais bonitas dos vasos.

Shikamaru corou quando Ino virou-se com várias rosas na mão - Ainda não. - ele sussurrou. - Mas ela chegará amanhã.

– Isso é ótimo. - Respondeu a Yamanaka com um sorriso no rosto. - Eu realmente estou com saudades dela. Temari demorou para vir nos visitar.

Shikamaru suspirou enquanto assistia Ino juntar os cabos das flores com um laço. - Acho que as coisas andaram difíceis em Suna ultimamente. Ela nem ao menos mandou-me uma carta. - ele disse e encarou a rua com um olhar perdido, e triste.

Yamanaka não pode deixar de notar.

– Não se preocupe, - ela disse entregando a ele o buquê pronto. - Temari-sama gosta muito de você, acredite.

Ele sorriu, tomando o buquê das mãos da moça. - Espero sinceramente que tenha razão, Ino, querida. Agora, que tal irmos? Você teve uma venda, não é? - levantou levemente o buquê em suas mãos e meneou a cabeça. - Levarei-te até em casa.


***


Dois toques roucos na porta de mogno chamaram a atenção de Gaara. Ele endireitou-se no trono imperial, desviando a atenção do pergaminho com o mapa de Konoha em suas mãos.

Uma voz feminina se fez ouvir do outro lado da porta:

– Majestade?

– Pode entrar. - O tom de voz de Gaara era forte. O timbre grosso, aveludado, com uma leve rouquidão acentuada de vez em quando. Era facilmente perceptível o modo esquivo com que Matsuri adentrou no cômodo. Parecia estar entrando em uma jaula de leões famintos. Usava um avental de renda por cima do vestido cinza simples. Suas roupas sempre eram as mais simples possível, sempre fora uma garota que estava longe de estar cercada de luxo, e tinha que contentar-se com os puídos vestidos que lhe eram dados.

– Com licença, imperador. - Inclinou-se levemente em um gesto de respeito. Suas pernas estavam bambas. Suas mãos soando. Seu corpo sempre reagia na presença do dono de Suna. - O desjejum já está servido na sala de refeições principal. - Comemorou internamente por não ter dito nada errado. Até ela se espantava pelo fato de estar tão nervosa. O que diabos estava acontecendo consigo? Ela desejava tanto aquele homem. Assustou-se com a própria excitação por debaixo das vestes. Juntou os joelhos, envergonhada.

Gaara a encarou, o olhar tão penetrante quanto um punhal afiado. - Traga-me o desjejum aqui. Quero comer em meu aposento.

– Sim senhor. – A moça fez um rápido aceno com a cabeça e já ia virando-se para sair. Bochechas adquirindo um leve tom rosado. Será que ele a achava bonita?

– E mais uma coisa. – Disse o imperador - Onde está Temari?

Matsuri juntou as mãos na frente do corpo.

– Senhorita Temari-sama partiu bem cedo, majestade. Antes de amanhecer. – Sua voz era doce e nervosa. Ela sabia que as palavras falhavam igualmente como suas mãos tremiam.

– Para onde foi? - perguntou, inclinando-se levemente para frente. O rosto inquisidor. Uma das mãos soltando o mapa, e acariciando levemente o próprio queixo. A barba impecavelmente bem feita.

– Perdoe-me meu senhor. Não sei lhe dizer. A senhorita Sabaku partiu sem informar a ninguém o destino. Ordenou para que a carruagem fosse preparada na hora.

O imperador soltou o ar mais fortemente pelas narinas e desviou o olhar da mulher franzina de cabelos âmbar. - Pode se retirar.


***


– Agora é minha hora de ir, querida. - Shikamaru depositou um carinhoso beijo na testa de Ino como uma benção. Fora difícil superar a paixão descontrolada que sentia por ela, mas não podia negar que continuava amando-a como antes. Ele só não sabia dizer se era apenas como amigo. Ino sorriu girou a maçaneta da porta de sua casa e virou-se para encará-lo novamente. - Poderia jantar comigo. Já devem ser quase dez da noite. Voltar para casa essa hora pode ser perigoso, Shika-kun.

Como resistir ao olhar adorável de Ino? Não conseguia negar nada a ela. - Admiro sua preocupação comigo, mas não é necessário. Eu sei me cuidar muito bem.

Ino encarou o chão cabisbaixa. Shikamaru limpou a garganta e continuou - Mas... eu ficarei para o jantar.

O olhar de Ino encontrou o dele novamente. Lembraram-se da infância. Quando brincavam juntos, e prometiam se casar. Ambos sabiam que isso não aconteceria, mas para eles era como uma promessa que ficariam juntos para sempre. Shikamaru era seu melhor amigo. Ele sempre se importou muito com ela e sempre conseguia fazê-la se sentir melhor. E era o que estava fazendo.

Jantaram e depois jogaram xadrez. Shikamaru ganhou três vezes, e na quarta deixou Ino ganhar. Ele ficava feliz em vê-la rindo e dizendo que havia derrotado o melhor estrategista de todos. Oh, doce menina.


***


O céu estava coberto por um manto azul escuro. A lua iluminava Konoha. Nenhuma movimentação na rua. Até aquele momento. Ao leste podia-se ouvir o trote rouco dos cavalos no cascalho. Uma marcha perfeita, disciplinada. Três cavalos negros adentravam pelo imenso portão de Konoha. Montado neles, três homens, todos usando longos mantos pretos. Um deles, o que se postava mais a frente, balançou as rédeas, e o cavalo aumentou a velocidade. Os outros fizeram o mesmo logo em seguida. As capas esvoaçando atrás deles como fantasmas. Correram até chegarem à bifurcação das três principais ruas da aldeia.

– E agora, mestre? - O homem que se mantinha um pouco mais atrás disse. Tinha a voz séria, tinha um forte tom rouco.

O da frente abanou a mão, e estancou. Olhou para as três opções. Um pano cobrindo metade de seu rosto. - Em frente. - com o calcanhar bateu no cavalo que relinchou, e correu. Foi seguido pelos outros dois.

– Parem! - O mestre gritou. - É aqui.

Puxou forte as rédeas quando chegou a uma casa simples, com tinta descascando nas bordas. Todos desceram de seus cavalos, sem a preocupação de amarrá-los. Um deles olhou em volta para assegurar que não estavam sendo vigiados, e depois disso, invadiram a casa.


***


Shikamaru entrou em casa. Fora bastante difícil resistir a vontade de aninhar a Ino desacordada do sofá em seus braços e só separar-se quando o dia amanhecesse. Era uma pessoa tão ingênua, apesar de ser extremamente bela parecia não ter conhecimento do sentimento que causava nas pessoas, principalmente nos homens. Tinha um corpo delicado, pálido, era tão frágil, em tudo. Parecia uma boneca, com a inocência de uma criança. Andou até sua casa, que, assim como toda a Konoha estava em completo silêncio. Não havia do que desconfiar. Não havia do que do correr. Abriu a porta e adentrou na sala, só a luz da lua entrava sem permissão pela fresta da cortina. Sem pensar duas vezes caminhou em direção ao quarto. Estava cansado demais para se quer se banhar. Entrou na penumbra de seu aposento sem a preocupação de acender uma vela. Já conhecia onde estava cada coisa. Poltrona à direita, pilha de livros à esquerda, dois passos a frente uma roupa que deixara jogada ali de manhã, três passos para o lado e... Um homem misterioso?

Aturdido pelo choque de seu corpo contra outro, correu em direção à fraca luz que entrava pela porta. Antes, sequer, de chegar à metade do caminho viu com um baque surdo a porta bater e ser agarrado por trás por um homem que prendia seus braços as costas. Maldição! – grunhiu raivoso.

Uma sombra alta caminhou em sua direção e forçou para que sua boca se abrisse, segurava seu queixo com força, apertando o máximo que podia. Shikamaru lutou, aumentando a força em seu maxilar para mantê-lo fechado. O homem forçou mais uma vez, sem sucesso. Parou de tentar por um momento e afastou-se um pouco. O homem cerrou os punhos, o braço tomou impulso para trás e com força voltou golpeando Shikamaru no estômago.

Com o soco Shikamaru arqueou. O golpe em seu estômago lhe trouxe a boca um gosto amargo de sangue. Tossiu e uma mancha de sangue fez-se vista no tapete. Uma risada ecoou no cômodo.

Pegamos você.

Depois disso, tudo ficou escuro.


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Notas finais do capítulo

Desculpe-me imensamente pela demora. Espero que tenham gostado, sinto muito se acabar ficando mais dramático do que deveria o decorrer do enredo, mas, será combinada com a áurea mórbida e desesperançosa que me tomou desses tempos pra cá. Espero que entendam e não se ofendam pela minha visão tradicional e por se dizer, 'falsa' do que é o amor, ou de que, no mínimo, deveria ser. Se cuidem.



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