O vento gélido soprava cada vez mais forte, levando consigo algumas folhas secas, enquanto esvoaçava os cabelos negros do homem que encontrava-se ali, sozinho.

Aquele toque frio deu a Severus Snape a desagradável sensação de perceber que ainda estava vivo. Quanto mais o vento tocava sua pele, mais ela arrepiava-se, mais forte seu coração batia, e mais, ainda, sua face se contorcia.

Sequer se lembrava da última vez que esboçou um sorriso, um que fosse verdadeiro, e sincero. Não tinha nenhum motivo para sorrir, e mesmo que tivesse, não se permitiria, ele não merecia.

Não merecia nem mesmo a vida que ainda pulsava dentro de si. Se ao menos pudesse ter sido ele, afinal, a culpa era dele. Não deveria ter dito sobre aquilo que não sabia... não deveria ter confiado em um coração tão destruído.

E agora, no presente, era trinta de janeiro, de novo. Era a data em que costumava comemorar como se fosse sua, com tanta alegria e satisfação, por finalmente ter encontrado alguém em sua vida, que valesse a pena.

Depois de trinta de janeiro sua existência tornou-se minimamente feliz, depois de encontrar a garotinha ruiva, sempre acompanhada por aquela irmã detestável. Depois de passar horas apenas observando o mundo junto a ela. Todo o seu mundo estava nos olhos dela.

Deu um longo suspiro imaginando o quanto de vida ainda lhe restava, por quanto tempo mais teria de sofrer aquele castigo, de certa forma sabia que sua alma jamais encontraria a tranquilidade novamente. Lily jamais o perdoaria. Poderia culpá-la?

Nem mesmo tinha certeza se conseguiria cumprir sua última promessa. Viver tornara-se útil apenas para tentar consertar o erro de seu egoísmo, nem isso conseguia fazer com maestria.

Olhar para aquele garoto era olhar para tudo o que havia perdido, bem como olhar para aquilo que mais odiava. O menino era ao mesmo tempo tudo o que mais desprezava, e tudo o que mais amava.

E agora, trinta de janeiro era apenas mais data dolorosa, não havia mais sorrisos, alegria ou agradecimentos. Havia apenas a lembrança permanente de que tudo o que significada vida, para ele, havia sido levado para longe de qualquer alcance. Ele estava sozinho, sem Lily, ele esteve sempre sozinho.

A primeira vez que a viu sorrir, e a última vez que a segurou em seus braços, eram duas imagens que misturavam-se constantemente dentro se si.

A impressão que teve naquele último momento era de que o mundo fosse parar, nada, jamais, voltaria a nascer, não haveria nenhuma vida em nenhum lírio que encontrasse, não haveria mais nenhum sentido em nada do que fizesse. O mundo havia morrido.

Mas, dolorosamente, a vida continuou, como se nada houvesse acontecido, a única pessoa que havia morrido junto era ele próprio.

Trinta de janeiro, e Severus Snape estava parado em frente a um pequeno monumento de pedra, apesar de tudo, toda a vida que conhecia havia iniciado em trinta de janeiro. Estendeu a mão e junto aos nomes inscritos na pedra fria, depositou um punhado de lírios. Diferentemente do que achava, os lírios ainda possuíam vida.

E num sussurro que somente as flores poderiam ouvir, desejou um 'feliz aniversário' , antes de permitir que as lágrimas deslizassem novamente pelo seu rosto, contorcido pelo tempo. Embora já não houvesse mais nenhum sorriso, ainda assim era trinta de janeiro, ainda assim, os lírios continuavam a florescer, mesmo depois de tudo, mesmo depois de tanto tempo. Sempre.

Life Goes On

But I'm Gone

'Cause I Die

Without You