Natasha - 1983 escrita por Carol Costa


Capítulo 10
Capítulo 9




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Aquelas eram as minhas opções, seguir o sistema ou não seguir. Carol levantou uma solução arriscada, mas ótima. Ao contrário dela, eu tinha uma família, mas até que ponto eu ia ser o fantoche deles? Quando que eles iam ver o quanto nossa família não é mais uma família? Será que um dia ela já foi? – Até hoje me faço essas perguntas – Meus pais nem me conheciam, e na maior parte do tempo eu me sentia uma estranha dentro daquele mundinho deles. Eu era jovem e estava cansada da minha rotina.

     Em algum dia da semana qualquer, na escola, Dinho e seus amigos estavam no mesmo local de sempre, quando passei por eles, senti os olhos de Dinho em mim. Meu coração acelerou de uma hora pra outra. Comecei a suar frio de tão nervosa que estava. Acho que essa foi à última vez que o vi. Que senti seu olhar em mim. Os dias passaram voando e um dia eu havia percebido que Dinho não estava mais indo pra escola e, aquele local reservado ficava vazio sem sua presença. Mas foi lá que passei meus últimos dias como Ana Paula. Viajamos na quinta-feira à noite e chegamos de manhãzinha no Rio De Janeiro. Aquela cidade era linda. Ela enfeitiçava qualquer um que fosse pra lá. Quando chegamos ao litoral do Rio, uma área bem reservada, os organizadores já estavam quase terminando com a decoração. Não estava animada para minha festa, – Minha própria festa – Peguei minha bolsa e subi para o meu quarto.

     Fiquei lá, vendo o pôr-do-sol através da parede de vidro que tinha no meu quarto. Uma das únicas coisas que me deixava feliz e em paz. Em algumas horas iria ouvir batidas na porta do meu quarto e uma voz dizendo para me aprontar, mas não tive presa pra ouvir essas batidas. Eu aproveitei aquele momento que o pôr-do-sol invadia o meu interior. Mas tudo que é bom, dura pouco.

O tempo passou, como eu imaginava havia chegado à hora, e todos já estavam chegando. Minha mãe bateu na minha porta umas cinco vezes, e na sexta vez eu tinha certeza que fora Bernardo, mas não abri. Esperei ver ele do lado de fora, junto com seus amigos. Quando deu meia-noite, eu desci. Todos me deram um feliz aniversário, ficamos um tempo à toa e logo bateram parabéns. Os presentes estavam guardados em uma caixa dentro da sala, que passei o mais longe possível. Como era de esperar Bernardo me puxou e me levou para um pouco longe da festa.

– Você ta diferente comigo. – Disse ele.

– O que aconteceu?

– Só estou um pouco cansada.

– É seu aniversário, não deveria estar assim.

– Hm… Dando uma de namorado preocupado… – Resmunguei baixo.

– Oi? O que disse?

– Ãh? Que? Nada.

– Deixa pra lá… Eu quero te pedir uma coisa – Ele se ajoelhou, tirou algo do bolso. Virei-me lentamente para sua direção. O vi segurando uma caixinha preta, e dentro da caixa havia uma aliança de prata.

– Ana Paula. Quero mostrar ao mundo que você é minha. – Ele pegou minha mão direita, e colocou a aliança no meu dedo anelar.

Fiquei encarando aquela aliança, sem alguma ação. Talvez procurando a careta certa pra fazer. Mas não encontrei.

– Diz alguma coisa…

  Olhei pra ele meio assustada, e estava pensando algo pra dizer. Quando eu ia dizer, Cláudia e as meninas estavam vindo, chamando por mim feito loucas.

– Ana Paula!

– Aninhaaaaaa!

– Vem, vamos dançar! – Claudia me puxou para longe dele e eu agradeci.

   Fiquei dançando com elas por um bom tempo. Essa era a parte boa das minhas festas, a dança. Por que quando eu dançava, não tinha ninguém que conseguisse me tirar da pista de dança. O mundo sempre parava naquele momento. Era apenas eu e a música, em uma só sintonia. Quando comecei a ficar cansada, o céu estava claro. Entrei na sala e já haviam algumas pessoas no chão dormindo. O sol estava clareando aos poucos o lugar, e todos estavam procurando um lugar para deitar e descansar. A música estava baixa e eu ouvi a porta do banheiro que ficava a direita no fim do corredor se abrindo. Olhei para os lados e caí no chão para me esconder. A porta se fechou e vi Bernardo saindo pela porta da sala. Logo depois de alguns segundos a porta se abriu de novo, abaixei-me e a porta se fechou, vi Beatriz saindo pelo mesmo caminho que Bernardo. Encostei-me no encosto do sofá e fiquei olhando o nada. Olhei para aliança e logo em seguida olhei para o relógio que marcava 06:50 da manhã. Levantei e subi para meu quarto, e peguei minha mochila. Nela eu coloquei algumas economias, algumas roupas, uma foto e algumas jóias de valor. Coloquei um jeans, uma camiseta preta e no pé, meu único e velho par de All Star vermelho. Peguei a chave do carro do meu pai e o relógio marcava 07h00. Olhei para todos na sala e disse:

– Eu não conheço a maioria de vocês…

     Entrei no carro, e fui embora. Liguei o radio e nele tocava Ainda é Cedo, da Legião Urbana. Coincidência? Uma banda nova de Brasília, que estava fazendo um grande sucesso no Brasil inteiro é a primeira música que ouço quando ligo o rádio? Talvez aquilo quisesse dizer alguma coisa, então segui estrada para Brasília. A noite havia chegado rápido e com ela a madrugada. No caminho de volta pra Brasília só fiz paradas necessárias, apenas uma foi fora do “plano’’. Lá na frente, dava pra ver a menina fazendo sinal de carona, fui reduzindo e logo a reconheci. Abaixei o vidro e era Carol.

– Carol? O que ta fazendo aqui?

– Ah! Eu ia pra sua festa e… Tá legal, eu fugi de casa e quero um carona.

– Tá falando sério?

– É isso ai.  E você? Tá sozinha, dirigindo a essa hora da noite…

– Entra ai que eu te explico. - Ela entrou e eu segui em frente. Éramos duas fugitivas do sistema.

– Ah! Meus parabéns.

– Obrigada.

– Então vai me dizer o que faz com o carro do seu pai a essa hora da noite? – Sorri e disse: – Estou fazendo a mesma coisa que você. Só precisamos achar um lugar por aqui e largar o carro em algum lugar.

– Não brinca! Nossa demais! Você é mesmo diferente do que eu imaginei. Tai! Podemos andar por aí. Ser uma nova pessoa nesse mundo e esquecer quem nós somos agora.

– E o que nós somos? – Ela me olhou pensativa. E disse: – Nada. Não somos nada. - Eu sorri pra ela e senti que ali seria um novo começo na minha vida.

– E como vamos ser outra pessoa? Precisamos nascer de novo e ter a sorte de cair em outra família.

– Não vamos precisar disso. Eu sei exatamente onde podemos nascer de novo. Mas primeiro temos mesmo que deixar esse carro em qualquer lugar.

 Fiquei pensando em um lugar deserto e tudo, mas não iria adiantar muita coisa. Olhei para ela e perguntei: – A onde é exatamente esse lugar?

– Na nossa, e amada Brasília.

– Então já sei onde vou deixar o carro. 

Dei um sorriso pra ela e segui em frente para Brasília. Carol estava dormindo enquanto eu ainda estava acordada dirigindo. Havíamos chegado a Brasília, quando Carol fora acordada pela luz do sol. O som do rádio estava baixo e já havia tocado várias músicas, mas outra música da Legião Urbana começou a tocar de novo.

– Bom dia.

– Bom dia. – respondi a ela.

– Onde estamos?

– Brasília.

– Foi rápido…

–…E agora com vocês Legião Urbana com a música Será.– Carol aumentou o volume da rádio.

 – Essa música é boa – Disse ela.

– É. Eles são bons mesmo.

– OOOOOOOOOOOOH! – Cantava ela. Sorri. Eu adorava o jeito dela. Ela era animada, feliz e nada parecia destruir aquele sorriso. Já estava quase na hora dando meio-dia e eu já estava em frente a minha casa. Parei o carro e desci.

– Vem, chagamos ao nosso destino.

– A sua casa? Tá de brincadeira né? Quando eu disse em fugir de casa, quis dizer pra gente ir pra bem longe, onde ninguém nos conhecesse.

– Esse é o destino do carro, o nosso eu não sei. – Ela abriu um sorriso e me puxou.

    Pegamos um ônibus e fomos ao centro da cidade. Paramos em uma rua onde havia um beco estreito. Pelo caminho haviam garrafas, cigarros, muros pichados e um cheiro insuportável. Ela bateu na porta quatro vezes e a pessoa do lado de dentro abriu uma janela que dava apenas ver seus olhos.

– Rodrigo está?

– Quem é sua amiga?

– Relaxa, ela é de confiança.

    Ele abriu a porta e nós entramos. Eu a segui e ela encontrou seu amigo Rodrigo. Eles conversaram em particular. Quando ela saiu, eu perguntei o que eles haviam conversado.

– Ele disse que temos que mudar o visual primeiro antes de tirar a foto. Só temos que dizer um nome e uma idade.

– Qual é o seu? – Perguntei.

– Brisa. 22 anos. E você qual que vai querer? - perguntou ela pra mim.

– Carol. Vocês têm lugar pra ficar? – Interrompeu Rodrigo.

– Ah, não.

– Se quiserem tenho um quartinho logo ai, é pequeno, mas acho que dá pra vocês.

– Valeu Rodrigo.

– Depois dessa estamos quites. E ai a sua amiga já escolheu o nome dela?

Os dois me olharam e eu disse: – Natasha. – Eles continuaram a me olhar e estavam esperando algo mais. – Ah! 23 anos.

– Duas semanas para ficarem prontas. Brisa me puxou para o quartinho no fim do corredor para passar aquelas duas semaninhas. Na primeira semana não saímos de lá, ficamos vendo quantos tínhamos de grana juntas. Até que não estávamos tão mal.

– Temos que aparentar cara de mulheres de 22 e 23 anos. Somos duas adolescentes com essas roupas, temos que mudar. – Dizia ela animada com a idéia.

– E o que você sugere? – Ela pegou o dinheiro e o exibiu.

– Compras. 


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