Terminei de me arrumar, peguei a pasta que precisaria para a reunião e fui em direção à cozinha.

“Rachel”. A chamei do corredor, mas ela não me respondeu. “Rachel”. Chamei de um pouco mais alto entrando na cozinha.

Ela estava com a frigideira na mão tentando virar uma panqueca no ar. Ela conseguiu!

“Eu sempre consigo”. Ela exclamou sorrindo.

“Consegue mesmo”. Concordei retribuindo o sorriso.

“Pronto pode comer”. Ela me serviu, mas eu já estava atrasada, não poderia ficar mais tempo. “Eu não me importo se essa reunião é importante, você vai comer Quinn”. Me disse em um tom de bronca.

“Não vai dar, eu estou sem tempo”.  Enquanto eu dizia isso, a Rachel segurou o bule de café distraída e acabou se queimando.

“AI”. Ela exclamou correndo até a torneira a colocando a mão debaixo d’agua. Eu fui até a geladeira e peguei um cubo de gelo.

“Espera, me deixa queixa eu ver sua mão”, ela estendeu a mão pra mim meio chorosa. “Esta melhor?” eu perguntei segurando o gelo na queimadura.

“Muito”. Ela me disse docemente.

“Que bom”. Foi impossível não sorrir pra ela.

...

Saímos de casa e fomos a pé para o trabalho, pois nossa casa ficava a apenas alguns quarteirões de lá, estava garoando então a Rachel segurava um guarda-chuva sobre nos duas, enquanto eu tentava decorar minha apresentação.

“Um dia o acesso à composição genética vai ter tão fácil quanto preencher um cheque. Esse conhecimento nos dará o poder de alterar nosso destino!”. Terminei com um sorriso.

“Alterar o destino, acredita nisso?”. Me perguntou sorrindo.

“É claro que acredito, e digo que nos próximos cinquenta anos...”. Ela não me deixou terminar

“As pessoas ainda vão morrer, vai chover depois que você lavar o carro... E os Rolling Stones ainda estarão em turnê”. Ela me respondeu com uma sobrancelha erguida convencida, mania que ela tinha pegado de mim. “Olha não se pode controlar isso, sabia. Você só pode controlar suas escolhas”. Ela continuou.

“Pera aê. Tenho outro ponto de vista, mas eu estou sem tempo pra debates. Eu tenho que praticar o meu discurso”. Desconversei apresando o meu passo, deixando a Rachel para trás.

“Olha por onde anda”. Escutei alguém falar pra Rachel e eu olhei pra trás. Um rapaz que havia trombado nela.

“Uou, você esta bem?”. Perguntei me aproximando.

“Eu estou sim, não foi nada”. Ela sorriu pra mim.

“Se nós não nos falarmos mais hoje, vamos jantar no tantra as sete em ponto”. Informei sorrindo de volta.

“Hoje as sete? Você esta brincando né?”. Ela me olhava estranha.

“Brincando? Como assim brincando?”. Perguntei confusa.

“Minha audição. Aquela que eu estudei por três anos. Lembrou agora?”. Que droga, eu havia me esquecido completamente dessa coisa, mas tentei disfarçar.

“É, a sua adição de formatura. Eu não esqueci, eu só...”.

“Então, é hoje! Às sete horas”. Exclamou.

“Eu sou uma idiota, olha me desculpa Rach, desculpa, eu não acredito que fiz isso. Me perdoa”. Eu estava realmente chateada comigo mesma.

“Boa sorte... na sua reunião, não que você precise, eu sei que você vai ser brilhante”. Ela me deu um selinho, se afastando rapidamente e eu percebi que ela ainda estava muito chateada.

“Me desculpa amor”. Eu falei enquanto me afastava.

Escutei uma buzina de moto e virei minha cabeça a ponto de ver a Rach ser atingida por um copo de alguma coisa.

“Mais que ódio”. Ela praguejou.

“Que droga”. Voltei a me aproximar. “Seu idiota”. Eu gritei para o cara da moto, mas ele já estava muito longe para escutar alguma coisa.

“Olha não se atrase ok, eu me cuido. Vejo você na audição”.

“Audição, qual audição?”. Perguntei tentando descontrair, mas parece que não deu muito certo, porque ela me olhou seria.

“Estou brincando, eu só estou brincando, porque eu tinha esquecido antes, você entendeu?”. Quanto mais eu tentava me explicar, mais eu me enrolava.

“Esse aí deve ser o humor britânico que eu tanto ouvi falar”. Ela me disse irônica.

“Oook, te vejo a noite”. Disse tentando sair dali o mais rápido possível.

...

“Senhores, nós da AGS não estamos somente à frente da biotecnologia, como também da...” Enquanto eu ensaiava minha apresentação andando pelas ruas de Londres, acabei me empolgando e batendo meu braço em um poste, quebrando o meu relógio.

“Que droga!”. O meu dia nem havia começado e já estava dando tudo errado.

...

“O que houve?”. Minha assistente Santana perguntou olhando para o meu relógio assim que cheguei à empresa.

“Quebrei essa manha”.

“Mas esta marcando onze horas”. Ela disse confusa.

“Olha só, os ponteiros se moveram”. Respondi um pouco irônica.

“Pelo menos vai ficar certo duas vezes por dia”. Ela me respondeu com o mesmo tom irônico. Eu sorri pra ela e fui em direção ao escritório com ela logo atrás de mim.

“Me faz um favor?”. Comecei uma conversa.

“O que?”.

“Liga para o Tantra e muda a reserva para as nove e compra alguma coisa pra...”.

“Para a audição de formatura da Rachel”. Ela completou minha fala.

“Como se lembra disso?”. Perguntei confusa.

“Eu não tenho certeza, mas talvez ela tenha dito ou mandado um convite que ficou na sua mesa e que você nem se deu ao trabalho de abrir ou talvez tenha sido...”.

“Tudo bem, eu já entendi obrigado”.  A interrompi.

“Não foi nada”. Eu odiava esse sorrisinho sarcástico dela.

“Eu prometi uma surpresa, então, que tal um suéter? Isso, um suéter vermelho que é sua cor favorita...”.

“Ela já tem um”. Santana me respondeu.

“Hã?”.

“Um suéter vermelho, ela já tem um”. Me respondeu indiferente.

“Como você sabe?”. Perguntei confusa e surpresa.

“Ela estava usando-o na ultima vez que esteve aqui, ela me disse que gostava muito dele”.

“Mesmo? E onde eu estava quando isso aconteceu”. Perguntei confusa.

“Ao lado dela”. Quando ela me disse isso eu fiquei sem reação, será que eu não prestava tanto assim atenção na Rach? Santana saiu da sala me deixando perdida em pensamentos.