Sim, eu estava bravo. De novo.

Como aquela criatura conseguia ser tão... tão... Esfreguei minhas mãos no rosto e respirei fundo.

-Eu sei que está bravo comigo –disse Sherlock, entrando na sala e tirando as luvas de couro que estava usando.

-Deduziu isso sozinho? E convenhamos, eu não deveria estar? Sherlock, você é uma máquina! Você não tem o mínimo de sentimentos! –eu sabia que aquilo não era verdade. Afinal, os últimos dias tinham realmente provado isso para mim, que ele tinha sentimentos comigo. Mas só comigo.

Ele se sentou pesadamente na poltrona e me encarou enquanto eu fazia um verdadeiro monólogo sobre “importar-se com os outros”. E realmente, foi longo, foi chato, mas ele precisava ouvir. Precisava entender que as pessoas não gostavam de ouvir gritos quando tinham acabado de ser sequestradas ou assaltadas, que vítimas em choque não conseguiam pensar na mesma velocidade que ele e... e tudo isso.

         Depois de alguns minutos falando, Sherlock se levantou.

         -Eu ainda não acabei, sabe? –eu disse, mas fui interrompido pelo próprio. Ele se aproximou rápido, colocou uma mão em minha cintura e me puxou para perto, fazendo meu corpo bater contra o dele. Seus lábios selaram os meus e seus olhos me encaram. Minhas sobrancelhas continuaram franzidas, absolutamente não compreendendo o que acontecia ali. Sherlock estava me... beijando? Era isso? Ele...

         Pisquei algumas vezes, ainda fitando os olhos azuis do detetive. Senti, aos poucos, meu semblante se clarear. Então era isso. Sherlock Holmes, o homem máquina, estava apaixonado por... mim.

         Assim que consegui desgrudar meus olhos dos dele, fechando-os, ele se separou de mim. Olhei para ele e para sua face de mistério.

         -Você...

         -Eu tenho sentimentos, John. Você, agora, sabe disso.

         -Mas Sherlock...

         -Se você recomeçar aquele monólogo, eu vou te impedir... de novo.

         -Eu não...

         Me aproximei dele e envolvi a sua cintura com os dois braços, apertando-o contra mim e pressionando meus lábios contra os dele. Eu não sabia sobre ele, mas meus olhos estavam cerrados o mais forte que eu aguentava. Depois de alguns instantes, senti suas mãos pousando em meus ombros.

         Ah, Sherlock... Devagar, passei minha língua pelos seus lábios, pedindo, implorando, para que ele me deixasse beijá-lo de maneira mais profunda. A boca de Sherlock se abriu, abrigando-me lá dentro, e seu rosto tombou para um lado. As mãos dele subiram pelo meu pescoço e foram para os meus cabelos. Ele deu um passo à frente. Depois outro. E foi assim que perdi o equilíbrio, quando minhas pernas bateram na poltrona e eu caí sentado sobre ela, soltando Sherlock para que ele não caísse por cima de mim.

         Ele sorriu para mim e virou-se, indo em direção à cozinha. Segurei sua mão.

         -Depois disso você vai me deixar aqui?

         Ele riu, revirando os olhos.

         -Se você conseguir se manter em pé, venha atrás de mim.

         Assim que ele se foi, eu me levantei. Logo que dei um passo à frente, senti minhas pernas amolecidas.

         -Droga, Sherlock.

         -Fique aí sentado e eu já te farei companhia.

         -Como é que você consegue me deixar assim? –falei baixo, mais para mim mesmo do que para ele, sentando-me de novo na poltrona.

         -Elementar, meu caro Watson.