Implorando escrita por Fui embora


Capítulo 1
Potédia




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“When I left you I flew/ Did you fly too?” (Quando eu te deixei eu voei/ Você também voou?)

   Gabrielle ia pensativa. Estava indo para Potédia, para visitar seus pais e sua irmã. Sentia falta deles, mas nenhum deles fazia mais falta que Xena.

   Onde estaria? “Provavelmente”, pensou Gabby, “chegando em casa, abraçando Cyrene, visitando o túmulo de Lyceus...”

   Estaria pensando em Gabrielle? “Não sei. Espero que sim.”

   A distância entre Amphipolis e Potédia não era muito grande, mas as duas haviam decidido que cada uma visitaria suas cidades e depois voltariam a viajar juntas, rumo à Índia.

   “Que saudade, meu Zeus!” Parecia que havia dias que elas não se viam. Era só impressão, não havia mais que duas horas. Ficar longe de Xena era tão... estranho.

   Gabrielle começava a ver Potédia se formando no horizonte. Alguns minutos e ela estaria onde havia nascido e crescido.

   “Crescido? Não foi em Potédia que eu cresci. Durante todo o tempo que vivi lá, eu sempre fui a infantil e inocente Gabrielle. Foi ao lado de Xena que eu cresci, foi com ela que eu aprendi, foi com ela que...”

   -Gabrielle!

   Quem lhe chamava era Lila, sua irmã. Tão dispersa que estava, Gabrielle não reparou que já estava em Potédia.

   -Lila! Tudo bem?

“And nakedness befell my way/ Only seen in light of day” (E a nudez aconteceu no meu caminho/ Vista apenas na luz do dia)

   Hécuba e Heródoto ficaram felizes com a visita de Gabrielle. Na última vez que a filha estivera em Potédia, coisa terríveis aconteceram. Culpa de Esperança, neta dos dois: tão igual à mãe, porém, tão diferente.

   -Gabby, estamos tão felizes em ver você! Está tudo bem? Por quanto tempo você vai ficar? E cadê Xena?

   -Calma, mãe. Está tudo bem, eu vim fazer uma visita. Vou ficar só por hoje. Xena está em Amphipolis, visitando a mãe dela.

   Hécuba, meio desapontada, perguntou:

   -Só hoje? Gabrielle, por favor, fique mais.

   -Mãe, Xena e eu vamos para a Índia. Há tempos tento convencê-la disso e finalmente ela me ouviu.- Um brilho surgiu no rosto da barda, e um sorriso discreto iluminou seu rosto.

   -Se é por isso, eu aceito.

   A frase do pai pareceu muito enigmática para Gabrielle, mas ela não disse nada.

   Mais tarde, Gabrielle ajudava a mãe a preparar o almoço. Hécuba, cheia de rodeios, disse:

   -Gabby, você mudou muito desde que nos deixou e passou a viajar com xena. Você se tornou uma rainha amazona, você viajou por tantos lugares, você se casou e ficou viúva, teve uma filha, um neto...!Com certeza não é a mesma Gabrielle de 4 anos atrás. Mas foi só isso que mudou?

   Mais uma vez, as palavras soaram misteriosas, como se houvesse algo a ser falado, mas faltasse coragem para usar as palavras certas.

   -Mãe, eu não entendi a pergunta. Não pode ser mais direta?

   Hécuba suspirou. Disse, meio sem jeito:

   -É... Notícias chegam a Potédia, Gabrielle. Seu pai tem ouvido algumas coisas sobre Xena. Coisas que lhe deixam preocupado.

   -Preocupado? Com o que, exatamente? – Gabrielle sentiu um aperto no coração, não queria que fosse o que ela suspeitava.

   Dizem por aí que você e Xena... são... mais que amigas. Entende? - Não esperou que a filha respondesse. – Seu pai se preocupa com isso.

   As palavras da mãe agitaram o espírito de Gabrielle. Sentiu-se desprotegida, como se qualquer um pudesse ver seu coração e seus sentimentos. Era como estar nua, em plena luz do dia, com todos os olhos voltados para ela.

   Tentando esconder o tremor de sua voz, e ainda mais, esconder o que sentia, respondeu para a mãe, sem olhá-la nos olhos:

   -Não, mãe. Somos apenas amigas.

“I only want what I can’t have/ I only need what I don’t want/ I only want what I can’t have/ I only need what I don’t want” (Eu só quero o que eu não posso ter/ Eu só preciso das coisas que eu não quero/ Eu só quero o que eu não posso ter/ Eu só preciso das coisas que não quero)

   Mentir era fácil, mas enganar a própria mãe, isso era difícil. Gabrielle sabia que Hécuba se sentia como Atlas, agüentando o peso dos céus sobre seus ombros. Sua mentira havia libertado a mãe da tarefa titânica. Talvez valesse a pena.

   Contudo, estava claro que, se ela queria deixar as coisas como elas estavam, ela teria de sustentar a mentira, apagar os vestígios dos boatos que circulavam em Potédia. Era isso: teria que mentir. Mais uma vez, ela se esconderia.

   O problema era que ela não queria esconder o que sentia. Sua vontade era contar para os deuses e mortais tudo o que se passava em seu coração. Se pudesse, faria com que todos soubessem: ela amava Xena, era isso que importava para ela.

   “Não, não, não... Não posso fazer isso. Não me importo com as pessoas, mas meus pais... Meu pai se preocupa com o que os outros pensam. E ele odiaria isso. Odiaria a vida que levo, odiaria as coisas que aprendi, odiaria Xena e me odiaria...”

   Por que essas coisas eram tão difíceis? Queria uma coisa, tinha de fazer outra, exatamente o contrário. Precisava mentir, mas não queria...

   Era tudo tão difícil...

“And creativity it soaks my soul” (E a criatividade encharca a minha alma)

   Gabrielle pegou um pergaminho. Vinha trabalhando nele havia dois anos. Era um conjunto de poemas com coisas que ela queria dizer para xena, mas não tinha coragem. Mesmo depois daquele dia...

   Xena estava morta, mas através de Autólycus elas se falaram. Gabrielle queria dizer inúmeras coisas. De olhos fechados, via a princesa guerreira no lugar do rei dos ladrões.    

“Gabrielle, você não precisa dizer nada”

“Não posso te perder de novo”

“Gabrielle, eu sempre estarei aqui...”

   A partir daí, as coisas mudaram. Gabrielle podia dizer o que sentia, mas raramente encontrava os momentos para isso. E como sentia que explodiria se não dissesse, passou a escrever aquele pergaminho secreto.

   Começou a ler o que já havia sido feito. Ainda era tudo real, continuava a sentir aquelas coisas.

   Um novo poema surgiu em sua cabeça. Pegou a pena e começou a escrever.

    Diálogo

-Toda palavra não dita

   Me fere.

-“A distância não é infinita

   Me espere.”

-Meu coração desesperado grita:

   Me segue!

-“Por nós quero que insista

  Não desespere.”

É isso que me diria

Se aqui você estivesse

É isso que me diria

Se você soubesse

Tudo o que escondo

É o que eu quero revelar

Tudo o que escondo

É por tanto te amar.


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