Minha primeira lembrança daqueles dias vem da fila de atendimento da loja de música.

Faltavam umas cinco pessoas, quando uma figura familiar se aproximou. É sempre bom encontrar pessoas conhecidas quando se está sozinho, pelo menos essa é a opinião da maioria das pessoas, acho. Comigo funciona um pouco diferente, não sei se pela minha timidez ou pelo simples fato de querer estar sozinho.

Sei que Sarah apertou meu braço, falou meu nome em alto e bom som e, ao abraçá-la, senti seu piercing — o da orelha esquerda — roçar no meu rosto feito gota gelada de metal.

Ela estava linda e jovial como sempre, exalando um forte perfume, as tranças pendendo de um lado e a pele morena jambo contrastando com a blusinha pink.

Segurava numa das mãos um treco eletrônico esquisito, parecido com um canivete suíço, e que estava começando a ficar bem popular.

Eu só viria a ter um dez meses depois, o tocador de música digital. Ela olha pra minha mão, vê que seguro um CD de uma banda de rock e fala algo que nunca esqueci.

— Por que você tá levando esse disco? Eu posso gravá-lo pra você. É besteira gastar essa grana toda nele!

Engraçado ela falar assim, tão moderninha e ao mesmo tempo se referir ao CD como disco! Disco pra mim é uma terminologia advinda dos bolachões de vinil do tempo do meu pai — que ele ainda guarda no porão de casa, e que fui ter contato na década de 80.

Mas o fato é que fiquei sem palavras, me sentindo ridículo. Olhei pra fila e só vi adolescentes comprando o tal dos tocadores, e a sessão de CDs da loja praticamente vazia. 

Ofereci a minha vez na fila. Assim, de costas pra mim, Sarah podia se exibir ainda mais. Para meu deleite, havia uma grande borboleta tatuada acima do seu belo traseiro.

Em seguida voltei pra casa, ouvi duas vezes seguidas o novo CD e adormeci. Curiosamente, a primeira impressão não foi das melhores, não curti muito do que ouvi.