Como descrever o que eu estava sentindo? Era uma mistura de saudades, solidão e enjoo, talvez. Por que eu aceitei comer aqueles nachos que Yoona me ofereceu? Não. Vamos reformular a frase. Por que Yoona teve que enfiar aqueles nachos na minha garganta? Não vou culpa-la, ela só queria ser gentil. Ela me deixa um pouco triste, mas não consigo ficar com raiva dela.

– Kkuk kkuk ee – A voz de Yoona invadiu o quarto, atrapalhando meu momento a sós com meus pensamentos. Olhei-a sem entender o significado daquele ‘apelido’.

– O que?! – Eu respondi me ajeitando na cama e fechando o livro que estava lendo.

– You know SeoHyun… - Ela sentou em sua cama, de frente para mim. – Você não fica brava com nada.

Sinceramente, não entendi onde ela estava querendo chegar. Ela pareceu bem frustrada quando disse isso. Eu tenho motivos para estar brava? Hm… Pensando bem, eu tenho.

– Eu estou tentando te irritar faz dias – Ela disse e se levantou, indo até a porta. Continuei olhando para ela, querendo entender tudo que ela estava dizendo. Odeio ser tão inocente.

– Eu não fico brava tão facilmente, unnie – Yoona revirou os olhos, e antes de sair me chamou atenção.

– Eu vou conseguir – Yoona sorriu esperançosa e piscou pra mim. Ela saiu do quarto e ouvi seus passos rápidos, descendo a escada.

Voltei minha atenção para a paisagem, atrás do vidro molhado e embaçado. Passei minha mão pela janela, tentando enxergar algo de maneira mais nítida.

Estava chovendo bastante e com um clima bem agradável. Eu só queria ficar sozinha por um longo tempo, ou até mesmo voltar para Coréia. Com meus dezesseis anos de idade, quando decidi fazer intercâmbio, não achei que seria assim. Vim parar na Califórnia, na casa de Yoona. Ela tem uns hábitos estranhos. Ela não para de comer besteiras, e pelo o que estou vendo, ela está gostando bastante de me irritar. Analisando isso tudo agora, depois que ela disse, me deixou desconfortável, qual é o problema dela? Qual é o objetivo em querer me deixar nervosa?

Enfim, o interessante, é que Yoona também é coreana. Ok, 50% coreana. Pelo o que sei, o pai dela se mudou pra cá logo que Yoona nasceu à procura de um emprego melhor. Ele é tão educado e me faz sentir como se eu estivesse em casa. É do tipo de pessoa que eu realmente admiro, criou a filha sozinho e não teve que fazer tanto esforço, pois apesar do que possa parecer, Yoona é realmente prestativa. Mas tenho a impressão que ela não gosta muito de mim.

Estou aqui faz três semanas e a duração de meu intercâmbio é de três meses. TRÊS MESES. Ainda não acredito que vou ter que aturar essa shikshin por mais tanto tempo. Que saudades da omma e de Tiffany unnie.

Continuei admirando a chuva molhando a cidade, até ouvir meu celular tocar. Corri, na esperança de ser unnie. Peguei meu celular e sorri com uma imensa felicidade e alívio crescendo dentro de mim.

– Tiffany unnie! – Eu disse entusiasmada com a ligação, e ela riu do outro lado.

– Hi my baby~ Você está bem, huh?

– Estou muito melhor agora que me ligou, unnie – Me joguei na cama e sorri, abraçando meu Keroro.

– Isso foi uma cantada, Seo?

– O-o que? N-na-não – Balancei minha cabeça freneticamente, ouvi Tiffany rir mais uma vez e bufei, ela estava zoando com minha cara, como o de costume.

– Eu só estava brincando, não precisa ficar nervosa

– Araso

– Eu só liguei pra avisar que estou indo pra casa, então quero que você entre no Skype, ok? Sinto sua falta – Ela disse a última frase de forma meiga e eu tenho certeza que ela estava com um beicinho fofo agora.

– Eu também, unnie – Apertei ainda mais meu boneco em meu peito e me sentei - Tudo bem, vou ligar o notebook

– Daqui a dez minutos, tenho que fazer uma coisa antes

– Pode deixar, até mais – Encerrei a ligação e pulei da cama. Coloquei meu Keroro em seu devido lugar e corri até ‘minha’ gaveta, na cômoda de Yoona. Eu anotei várias coisas em meu diário para não me esquecer de contar pra Tiff- CADÊ MEU DIÁRIO? Senti minhas pernas bambearem. Corri feito uma louca pelo quarto, à procura do meu perdido e valioso caderninho.

Eu não quero nem imaginar. Se alguém o achou e tiver o nariz de ler minhas coisas, eu… eu… eu morro, ok? De verdade.

Eu olhei em cada canto daquele cômodo e ele não estava lá. Respirei fundo e tentei me lembrar de onde eu o tinha guardado. Vamos lá, SeoHyun. Bati meus pés em frustração. Eu sei que eu havia o colocado na gaveta. Naquele instante, uma luz me ocorreu.

– Yoona!

Se ela pegou meu diário, eu vou ter que bater nela sem dó. Irei contra todos meus princípios.

Desci aquelas escadas devagar, tentando conter qualquer vestígio de raiva que estava nascendo em mim. Talvez não tenha sido ela. Fui até a cozinha e me deparei com Sr Im, pegando as chaves que estavam penduradas na parede.

– Olá SeoHyun, está tudo bem?

Apenas confirmei com a cabeça, dando meu melhor sorriso. Ele sorriu de volta.

– Eu estou indo ao mercado, quer alguma coisa de lá?

– Não não, muito obrigada – Ele acenou com a cabeça e fez menção de sair, mas chamei sua atenção. – Sr Im, onde está Yoona?

– No jardim – Após me responder, ele sorriu novamente e saiu de casa. Apenas corri até os fundos da casa e de longe pude ver que Yoona estava lendo alguma coisa. Meu rosto corou e respirei fundo mais uma vez, sentindo a paciência tomar conta de mim.

Fui até ela devagar, com passos curtos. Limpei a garganta para chamar sua atenção, e com uma extrema calma, ela olhou pra mim. Aqueles serenos olhos castanhos me encaravam com o maior cinismo do universo. Ela estava com meu diário nas mãos e agia como se nada estivesse acontecendo?

– Hey kkuk kkuk ee – Ela sorriu levemente.

Permaneci calada. Ampliei minhas narinas e expirei enorme quantidade de ar por elas. Fazendo um movimento rápido com meu queixo, apontei para meu caderno em suas mãos. Ela encarou o diário e depois me olhou, sorrindo novamente.

– É seu? – Ela levantou uma sobrancelha e continuou a me encarar. O que ela queria fazendo essas coisas comigo? Eu sou tão… legal, não sou?

– Me dê – Eu disse com um tom de voz autoritário, e ela deu uma gargalhada. Pisquei em confusão.

– Yonghwa parece ser um garoto legal – Ela me ignorou e continuou folheando meu diário. Eu não sei como ainda não pulei no pescoço dela. Yoona não parava de falar. – E é realmente lindo! – Ela puxou minha foto com Yonghwa oppa e a sacudiu no ar - Eu não sabia que você tinha namorado, até por que… - Ela apontou pra mim e levantou os ombros.

Mordi meu lábio e respirei fundo outra vez. Eu já não sei quantas vezes tive que fazer isso desde quando cheguei aqui. Umas trezentas mil, talvez? Eu tinha tanta coisa pra falar, mas como eu ainda não estou fora de mim, não disse nada.

– E-ele não é meu namorado – Eu gaguejei? Bravo Seo JooHyun, isso é que é mostrar ser superior.

– Imaginei – Ela sorriu de lado e voltou com a foto para dentro do caderninho. Ela o fechou e cruzou as pernas. – Me surpreendi com isso. Sabe, com o fato de você ter um amigo homem.

Eu nunca entendo o que ela quer realmente dizer. Qual é o problema de Yonghwa ser meu amigo? É o único que eu tenho, tirando Tiffany e Taeyeon unnie. Permaneci poupando palavras. Ela me observava, depois de uns segundos, Yoona bufou.

– Rebata, SeoHyun! Brigue comigo, venha pegar seu diário! Vai me deixar falar assim com você? – Ela se levantou e abriu os braços, me chamando para ir ‘para cima’ dela. Olhei-a sem entender. – Você me deixa com tédio, sabia? Você e esse seu medo de garotos.

Expirei pelo meu nariz mais uma vez. Se o objetivo era me deixar brava, ela estava conseguindo.

– Eu não tenho medo deles – Fechei meus punhos e Yoona sorriu vitoriosa, ela estava conseguindo o que queria.

– Eu posso ler o seu futuro. Vejo você morando com oito gatos, tcs tcs – Yoona bateu o diário na palma de sua mão e balançou a cabeça levemente para os lados. – Que triste

Senti meu rosto queimar e olhei para baixo para logo a seguir perder a paciência.

– Fique quieta! Você não me conhece, não tem o direito de falar assim comigo! – Ela continuava com aquele sorriso idiota no rosto. Ela não dizia nada, parecia que só queria ficar observando minhas reações, estava realmente satisfeita e sua expressão traduzia bem isso. Cheguei mais perto dela e arranquei o meu diário de suas mãos. Respirei fundo e olhei nos seus olhos.

– Aprenda a ser mais educada e tratar os outros melhor, porque se continuar assim, quem vai morar com gatos não vai ser eu.

Yoona olhou para baixo e fez um pequeno bico torto. Ela voltou a me olhar e abriu um sorriso lindo.

– Eu estava certa, você fica fofa até quando está brava

Corei fortemente. Eu não entendo mesmo essa menina. Ela consegue fazer meu humor mudar em segundos, tanto para ruim tanto para o bom. Muitas das vezes me deixa com muita raiva, mas quando ela sorri, eu esqueço. O sorriso dela é tão natural, até mesmo quando ela se torna cínica, me deixa feliz. Que estranho.

– Me esquece – Empurrei-a instintivamente e subi correndo para o quarto. Bati a porta com força e me joguei em minha cama. Puxei meu Keroro e o abracei com vontade. Senti uma lágrima escorrer pelo meu rosto.

Por que essa menina tem tanto ódio de mim? Desde quando cheguei ela pareceu gostar de me irritar. Gostar não, amar. Eu nunca fiz mal algum pra ninguém. A não ser quando atropelei um esquilo que atravessava a rua com minha bicicleta, mas foi totalmente sem intenção. Aquele foi o pior dia de minha vida.

Eu realmente gostei de Yoona, quando conversamos ela parecia ser uma menina interessante. Depois ela muda totalmente de personalidade e começa a me perturbar. Mas e se ela estiver certa? Se eu nunca arranjar um marido? Serei uma piada para minha família. E minha família vai virar piada em toda Ásia.

Meu celular tocou e eu voltei pra realidade. Foi quando percebi que eu estava soluçando. Aigoo Tiffanyah! Enxuguei meu rosto, levantei correndo, tropecei na cama, bufei e consegui pegar o celular.

– Yoboseyo?

– Cadê você?

– Desculpa, unnie. Já estou entrando

Joguei o celular no sofá enfrente a janela e peguei o meu notebook, o abrindo em meu colo. Uma chamada de vídeo do Skype apareceu na tela. Passei a mão em meu rosto mais uma vez e aceitei. O sorriso cativante de Tiffany apareceu na tela. Aquele sorriso que me deixava aliviada.

– My baaaby! – Tiffany aumentou mais seu sorriso, fazendo seus olhos se curvarem. Ela acenou pra mim.

– Unnie! – Acenei de volta e me ajeitei na cama. De um segundo para o outro, a expressão de Tiffany mudou.

– Vo-você andou chorando?

– Eu? Não – Abri um largo e falso sorriso, coçando a nuca.

– Seo JooHyun, você está mentindo pra mim? – Tiffany cruzou os braços e me olhou com reprovação.

– A-Anny- Ok, eu estava sim – Abaixei minha cabeça e suspirei

– Baby, o que aconteceu?

– Eu não aguento mais ficar aqui, unnie – Voltei a olhar pra ela, com meus olhos marejados – Yoona é uma menina malvada.

– What? O que ela anda aprontando com você? – Ela bateu com a mão na mesa do computador e me olhou indignada, esperando por uma resposta.

– Não fique brava com ela, ok? Não foi por querer…

– SeoHyun, você precisa saber que nem todos são puros e bons de coração como você – Tiffany deu um sorriso triste. Uma lágrima desceu pela minha bochecha. – Se essa menina continuar te fazendo chorar, você me avisa, ok? Porque eu apareço ai pra mostrar que ninguém mexe com meu baby.

Eu ri, enxugando minha solitária lágrima. – Ok, unnie, obrigada.

Ela sorriu brilhantemente, me transmitindo felicidade.

– Eu preciso ir agora, vou me arrumar para ir ao cinema com Taeyeonah. Fique bem, Seororo. – Ela acenou novamente, e mandou um beijo pelo ar.

– Diga para Taeyeon que estou com saudades. Eu te amo, unnie! – Foi minha vez de mandar um beijo e acenar.

– Eu também, Seobaby!

Eu fechei o notebook e encostei minhas costas na cama. Tiffany está sempre certa, talvez eu precise abrir mais meus olhos. Sempre levo tudo na inocência.

Coloquei o notebook na mesinha outra vez, e me deitei na cama, abraçando novamente meu pelúcia. Mais uma lágrima escorreu, e eu acabei pegando no sono.