Eu estava completamente só. Era como se a multidão de pessoas a minha volta não existisse, como se naquele lugar só existisse a minha alma, abandonada, triste e obscura. Eu me sentia cansada de tudo. De todo trabalho e todas as missões. Cansada de ser alguém que eu não quero ser. Estou presa ao meu destino, ao destino que eu não tracei. Minha cabeça não está no lugar onde deveria. Ela voa em pensamentos, vontades e sonhos não realizados. Sonhos enterrados.

Por anos eu senti como se o tempo não passasse. Eu não me sinto viva. Não me sinto. Sou só um robô pronto para matar em minhas missões e salvar vidas no hospital. Irônico, não? Pois é... Minha vida é uma piada. E eu não tenho controle sobre ela. Estou cansada de tudo isso. Cansada de mais. E esses sons? São tão... Irritantes. Eles estão acabando comigo, sem nem mesmo chegarem a me tocar. Eles me ferem como se fossem agulhas envenenadas. Estou cansada desses sons. Eu não os ouço. Mas já ouvi antes. Há muito tempo... Enquanto eu, ainda tinha vida. Hoje... Sou só nada.

Um dos meus argumentos para não estar viva é que eu não lembro de nada da minha própria vida. Não depois dele. Eu me recusei a viver depois que ele foi embora. Nas noites que e eu passo em missão sozinha ou com meu time, são como se tivesse pelo menos um prazer. Matar pessoas. Criminosos, assim como ele. Agora, nas noites que passo sozinha em casa, são como sessões de tortura. Eu me torturo mentalmente, me culpando por ele ter me abandonado. Eu me odeio por isso... Sou assombrada pelo meu passado. Pelas coisas que eu não fiz e poderia ter feito. Pelas coisas que fiz. Sinto-me presa à luz da lua. Como se ela pudesse me tirar desse torpor. A Luz da lua cheia me prende a ela inexplicavelmente. E eu me tornei uma sombra. A sombra dos meus sonhos e sentimentos esquecidos. Esquecidos pela dor.

Quando eu era pequena, costumava pensar que as coisas que aconteciam conosco logo eram esquecidas, que elas sempre ficariam no passado, perdidas em momentos enterrados. Mas eu estava errada, tão errada... Quando perdemos algo ou alguém, dói. E essa dor nunca vai embora. E menos ainda, é esquecida ou enterrada. Essa maldita dor vem nos torturar. Ela faz um buraco em nosso peito e sempre que pode, o cava mais fundo. Essa dor me cegou. Mas eu fiquei forte, me fortaleci com a dor.

Há anos atrás eu queria um lugar para me esconder. Um lugar onde eu poderia sumir esquecer tudo e todos. Esquecer a dor causada por ‘ele’. Mas isso é impossível. Não há onde se esconder. Eu tive que aprender a sufocar minha dor, eu tive de ser forte. Aprendi a esconder meu sofrimento de todos, e talvez tenha sido por isso que me tornei seca, oca. Estou presa. Presa dentro de meu próprio corpo. Enquanto a sombra e a luz lutam para tomar conta de mim e de meus sentimentos. Aqueles que eu tentei enterrar. Hoje vejo o quão inúteis foram meus esforços. Eu o amo e nunca vou deixar de amá-lo.

Eu estive morta. Estive quebrada, totalmente abandonada. Durante muito tempo. Anos talvez... Não sei ao certo.