No centro da vila, o Parque Natural mantinha a sua vida nocturna bastante activa. Os animais da noite, como aves, insectos e alguns mamíferos, apareciam para realizar as suas tarefas. O ciclo da noite possuía de tudo… E era isso que o demónio Abaddon mais apreciava. Já há algum tempo que não caminhava num corpo, então, sentia-se radiante enquanto passava por entre as árvores e tocava em tudo, de modo a sentir que estava realmente ali. O corpo da jovem que possuíra não era muito forte, mas com o tempo, o demónio acabaria por adaptar-se. Agora que estava livre, precisava de achar os restantes demónios da ordem superior, para poderem realizar o “Grande Projecto”… Um plano ainda mantido em segredo, mas com todo o ar de ser maquiavélico e algo grande e poderoso. Mas tudo a seu tempo… Primeiro, queria aproveitar bem a sua estadia em Cila.

   Abaddon andava com firmeza, quase parecia deslizar. Os seus olhos estavam negros e o sorriso perverso que trazia consigo, desfiguravam as lindas feições que Vanda tinha. À medida que passava pela vegetação, Abaddon sentiu falta do antigo mundo, quando este era pouco povoado. Já tinham passado uns bons séculos desde a última vez que pisara a terra, com forma física, sólida…

   O som de um galho a partir atraiu o demónio, que foi obrigado a deixar de lado tudo o que estava a pensar e as boas recordações que estava lembrar. Olhou na direcção do barulho e deparou-se com uma rapariga de cabelos avermelhados. Os olhos dela eram iguais aos de um felino e brilhavam na noite escura… O demónio riu-se.

Abaddon - Ora, o que temos aqui?

Perguntou…

Carlota - Se és um demónio, sabes muito bem o que é que eu sou!

Respondeu Carlota com desprezo. Também ela andava pelo Parque Natural de Cila, mas com outro objectivo. Facilmente reconheceu-o como demónio pelos seus olhos totalmente pretos, invadidos pelas trevas.

Abaddon - Para uma metamorfo gosto da tua atitude! Sabes quem sou?

Carlota - Não sei, mas também não me interessa muito… Por acaso não viste um Wendigo por aqui pois não?

Abaddon riu-se sarcasticamente.

Abaddon - O que é que podias querer com uma criatura dessas? Eles são tão burros!

Carlota - Tenciono destruir a Night Watcher desta vila, juntamente com todos os humanos… Estou farta dessa raça!

Exclamou revoltada. Abaddon aproximou-se de Carlota.

Abaddon - Minha jovem… Não vais conseguir alcançar o teu objectivo com um Wendigo! Gosto da tua ambição! Eu próprio quero acabar com a raça humana!

Explicou à metamorfo.

Carlota - Se eu não consigo, o que é que te faz pensar que tu vais conseguir? Eles são uma peste, uma praga!

Abaddon - É hora de me apresentar… O meu nome é Abaddon! E sou um dos cinco demónios da ordem superior! Talvez isso faça algum sentido para ti…

Carlota ficou boquiaberta… Já tinha ouvido falar na ordem superior dos demónios e nos cinco correspondentes ao grupo. Sabia que eram bastante perigosos e que eram capazes de grandes feitos. Mas tudo o que tinha ouvido, eram histórias que pensou serem mitos. Até ao momento… Agora, tinha Abaddon à sua frente, o Destruidor.

Carlota - Vocês existem mesmo…

Dizia, com certeza.

Abaddon - Claro que sim… E devo dizer-te que foi muito bom nos termos encontrado! Talvez consiga ajudar no que tanto queres!

A metamorfo ficou atenta… O seu objectivo era o principal foco.

Carlota – Eu sou a Carlota… Explica-te!

Apresentou-se e pareceu interessada.

Abaddon - Como sabes, nós, demónios da ordem superior,  respeitamos bastante a nossa vertente e acabar com os Night Watchers e com os humanos é a nossa prioridade! Queremos de volta o que é nosso por direito… Este mundo! Livre de tudo, até de descendentes do bem!

Indicou o demónio. Carlota olhava para ele, curiosa.

Abaddon - Eu e os demónios temos algo em mente que nos dará exactamente o que queremos: “O Grande Projecto.”

Continuou Abaddon.

Carlota - O que é isso? O nome de algum grupo musical? Até agora ainda não percebi!

Informou.

Abaddon - Para já, não posso contar! Temos uma conduta a seguir e uma das regras é manter em segredo todos os nossos planos… Apenas posso garantir-te que varrerá com a raça humana deste planeta!

Carlota não gostava de segredos, mas ao fim de alguns segundos, concluiu que se precisava de ajuda, não haveria ninguém melhor que um dos cinco demónios da ordem superior. Não era que gostasse de demónios, mas este estava a convence-la. Na verdade, Carlota não gostava de ninguém a não ser de si mesma.

Carlota - Não gosto de andar desinformada, mas acho que vou aceitar a tua ajuda!

Abaddon sabia como jogar com a metamorfo. Tinha de ser ela a aceitá-lo a ele e não o contrário.

Abaddon - Uma decisão muito inteligente! Mas como deves calcular, para teres a minha ajuda também terei de ter algo em troca…

Mesmo assim, o demónio não deixava escapar uma oportunidade.

Carlota - Típico de demónios… O que é que queres?

Queixou-se.

Abaddon - Terás de trabalhar para mim… Estou a reunir forças! Quero ter o meu próprio exército! Cila será minha!

No escuro, presa, Vanda ouvia cada palavra do demónio… Aterrorizada.

Carlota - É só isso? Pensei que já tínhamos chegado a essa conclusão!

Abaddon - Fico satisfeito por ver que aceitas as condições… Agora, onde é que poderei instalar-me até estar preparado?

Perguntou o demónio, já à procura de casa… Carlota sorriu face àquela pergunta.

Carlota - Sei exactamente o sítio…

Avisou-o, fazendo um gesto para o demónio segui-la…

*

   Érica Rodrigues tinha saído cedo de casa, como pretendera… Já quase que tinha dado uma volta inteira à vila e ainda não vira nada de suspeito. A noite parecia estar calma… Tudo estava normal. A Night Watcher não fora até à floresta de Cila, não havia necessidade e além disso, nem tinha equipamento para tal. Concluiu que, fosse quem fosse o responsável pelos crimes, estava muito bem escondido.

   Naquela noite, Érica por mais que tentasse estar devidamente concentrada para tentar chegar a algum lado, não conseguia… O aviso de que Abaddon podia estar na vila era bastante alarmante. Até ao momento, o demónio ainda não tinha dado sinais de vida, mas assim que desse, Érica receava precisar de reforços. Quando tocava àqueles seres, a Ordem Secreta tinha o cuidado extremo em providenciar aos Night Watchers toda a ajuda que necessitassem. Principalmente, quando tratava-se de um demónio da ordem superior. Com as palavras que o Sr. Charters lhe passara, deu-lhe a garantia que tempos difíceis aproximavam-se de Cila…

   A Night Watcher desejou que algo acontecesse, de modo a conseguir livrar-se de pensamentos e ideias que ainda não tinham decorrido… E assim foi. A mulher começou a escutar o som de veículos dos policiais e de ambulâncias. E pareciam vir dali perto, do terminal de autocarros. Sorrateiramente, Érica aproximou-se do local e manteve-se nas sombras a observar o que é que se tinha passado. Detectives e paramédicos circulavam de um lado para o outro… A polícia parecia estar a examinar um autocarro enquanto os médicos colocavam um corpo em bastante mau estado dentro de um saco. A Night Watcher percebeu que mais uma vez tinha ocorrido um ataque e que chegara tarde demais. O responsável já devia estar longe e satisfeito, uma vez que naquela noite já tinha cometido a sua atrocidade.

   Todos estavam bastante ocupados nos seus trabalhos e a Night Watcher aproveitou o momento para sair dali, silenciosamente e com bastante cuidado, para não ser vista. Ia regressar a casa, sem nada ter solucionado… Tal e qual como nas últimas noites.