Dia após dia, um homem passava atirado ao sol. Tinha sempre um sorriso na cara e os olhos distantes. Uma canção decorada saia de seus lábios.

                Vivia sozinho em uma casa no campo. Sua única companhia era sua imensa lavoura, que começara cinco anos atrás. O mesmo tempo do falecimento de sua esposa.

                O homem bronzeado pelos anos cuidava da plantação como se, de alguma forma, pudesse trazê-la de volta. Você já deve imaginar a quem o ela se refere. Cuidava especialmente dos tomates. Ela gostava de tomates. Pensava sentir sua presença todas as tardes em que se deitava no meio dos tomates. Adormecia com um sorriso nos lábios e o chapéu a lhe cobrir a cara. Era solitário.

                De verde, para amarelo e finalmente vermelho. Ah! Que alegria era a hora da colheita. Acordava bem cedinho e ia carregando um imenso cesto de palha. Um chapéu na cabeça e as mangas arregaçadas.

                Seus olhos agora eram presentes e seu sorriso verdadeiro. E, como não podia faltar, um sol escaldante ardendo-lhe os ombros. Cantarolando, saiu de casa e foi em direção ao campo de tomates; temporariamente, o paraíso.

                Você fez um bom trabalho. Podia ser sua mente a lhe pregar uma peça, mas, na época da colheita, conseguia ver e ouvir sua esposa. Durava até todos os tomates serem colhidos. Horas de alegrias. Horas de saudades. Inferno e paraíso.

                Cantava para a aparição fantasmagórica de sua esposa, ou para os mais descrentes, para os tomates, porque estava sozinho na lavoura. Mas, não sou descrente. Ela com certeza estava lá. Não como antes, ele não podia tocá-la. Era apenas uma projeção. Não menos verdadeira do que a original.

                Ouvia-se a cantoria até o por do sol, quando o último tomate fora colocado na cesta. Com um aceno de mão e um sorriso a mulher desapareceu. Lágrimas aqueciam o rosto cansado do rapaz. A mulher retornaria a aparecer assim que os tomates voltassem ao seu tom avermelhado.

Mas, isso ainda levaria vários dias.

Por isso, o homem sentou e pernoitou por ali mesmo.  Era aquecido pelo manto da memória.  E, claro, pelos pés de tomates que o cercavam. Aquilo era o paraíso. Tão acolhedor. Querida memória que não nos deixam esquecer. Sua esposa sempre estaria viva enquanto cuidasse desses tomates. Pensou.