The Both Sides escrita por auter_delacor


Capítulo 1
Capítulo 1 - A transmorfa




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/185652/chapter/1

Os pés de Renesmee tocavam o chão como gotas de chuva enquanto corria velozmente pela floresta úmida. Jacob a seguia de perto, logo em seus calcanhares descalços, e não conseguia - não podia - tirar os olhos da miragem que ela se tornara. Trajando apenas um diáfano e delicado vestido de verão, repleto de babados, ela havia se tornado uma ilusão celestial.

         -Está devagar hoje Jake! – ela debocha saltando por cima de uma pedra em seu caminho. Seus cachos flutuam em seus ombros como um véu de cobre líquido. Finos fios de luz se desprendiam das nuvens e refletiam em suas mechas como metal bem polido.

         O lobo castanho avermelhado salta parando ao seu lado e se movendo fluidamente entre as árvores. Resfolega em uma espécie de risada canina e a derruba com suavidade enquanto saem rolando e levando folhas em seus cabelos e pelos. Quando finalmente param, estão a poucos metros de uma encosta que delimitava o território dos quielutes.

         -Nunca mais faça isso seu lobo bobo! – reclama se levantando debilmente e lançando um sorriso brincalhão para o grande animal. Espana as folhas de seu vestido e tenta limpar a terra em seu rosto. Jacob gira as orelhas e ergue o focinho para o alto, como que captando algum cheiro diferente. Renesmee continua resmungando sem notar o comportamento diferente de sua companhia. – Rosalie vai arrancar seu couro e usar-lo de tapete na sala de estar, se bem que ela não gosta de seu cheiro, provavelmente vai pendurar em um lugar bem longe de seu nariz empinado, e...

         Para observando o amigo ganir baixinho e eriçar o pelo. Nessie franze as sobrancelhas e se aproxima dele repousando sua mãozinha pálida contra a pelagem escura. Inclina a cabeça na direção do focinho de Jacob e a ergue aspirando o ar da mesma forma que ele fazia.

         -O que está sentindo? – Jacob e Renesmee estavam a tantos anos juntos que já haviam aprendido a se comunicar sem palavras, era necessário saber decifrar seus gestos. – Ao oeste? Na reserva? – ela aponta para o outro lado da encosta. O lobo sacode a cabeça. – Não sei... Não sinto nada... – para se concentrando. – Cheiro de flor? Isso que está sentindo? Angélicas, ou damas da noite? Estou confusa, sei que é doce.

         Jacob bate as patas dianteiras duas vezes no chão.

         -Certo Jake... Não é tão doce quanto o dos Cullen. – revira os olhos. Funga piscando seguidas vezes. – Não cheira como vocês. Parece um cheiro mais... Suave. – dá dois passos em direção a vala. – Vamos ver o que é! – diz e não espera resposta, se lançando de vez na depressão.

         O lobo late e joga seu corpo atrás dela em uma eufórica corrida. Renesmee está há dois metros na sua frente, e suas longas pernas se movem cordiais seguindo o rastro perfumado. Vira diante de um carvalho largo, e por agonizantes segundos, some da vista de seu protetor. Jacob entra em desespero e força suas pernas a irem com mais velocidade.

         Uma exclamação baixa vinda da voz cálida da mestiça faz Jacob frear antes de dar um encontrão em seu pequeno corpo. Ela estava parada e as duas mãos cobriam a boca em visível surpresa, enquanto seus olhos, arregalados, contemplavam a frágil mulher a sua frente. Mulher talvez não fosse o exato termo a se usar naquela criatura, seu rosto não aparentava possuir mais que vinte anos.

         -Quem... É você? – a Cullen balbucia.

         A visitante olha nervosamente da mestiça para o lobo que rosnava na defensiva. Os grandes olhos cinzentos abertos ao máximo simbolizando seu medo latente. Ergue as duas palmas mostrando que não pretendia lutar. Os cabelos estavam modelados em uma trança elaboradamente lateral que parecia ter sido feita por hábeis mãos imortais.

         -Por favor... Não me machuquem. Eu... – gagueja arfando com dificuldade. Renesmee afasta as mãos de sua boca e anda em direção a desconhecida mostrando sua curiosidade. Passa os olhos pelo rosto de delicadas feições e sente vontade de tocar nos longos e ondulados cabelos feitos de ouro. Sente uma pontada de inveja do bronzeado no exato tom caramelo que a pele dela exibia, e que faziam um par perfeito com o corado de esforço em seu rosto.

         Mas algo aterrorizante puxa seu olhar para baixo do busto dela. Uma redonda protuberância despontava por baixo de seu vestido largo. Nessie levanta os olhos do ventre inchado e encara febrilmente a garota. Suas mãos douradas alisam a barriga protetoramente enquanto um sorriso singular nasce em seus lábios cheios fazendo as maças proeminentes se elevarem mais.

         -O que houve com você? – reformula sua pergunta mostrando seu terror com a nova descoberta. A gestante deixa um riso abafado e melodioso escapar, e toca com carinho o bebê. Seu vestido era verde, e parecia perfeito para se camuflar entre os arbustos. Ela própria parecia um arbusto. Havia galhos e folhas presos em suas pernas e braços formando uma crosta verde musgo, deixando apenas seu rosto e suas mãos em seu tom normal.

         Nesse meio tempo Jacob havia se transformado e vestido a bermuda velha. A garota abraçou a barriga possessivamente, como que com medo que ele arrancasse seu filho direto de dentro dela.

         -Sofreu algum acidente? – perguntou.

         -Não... Só... – parecia relutante em responder.

         -Quem é você? – Renesmee repetiu a pergunta.

         -Eve. Meu nome é Eve.

-Doutor. – a cabeça morena de enfermeira surge pela fresta em que abrira da porta logo após três batidas modestas. Seu par de olhos escuros estava apreensivo e sempre apontando para baixo. Mesmo trabalhando para ele há três meses, não era capaz de se acostumar com a beleza latente de Carlisle Cullen. – Seus sobrinhos estão aqui e... Exigem uma visita imediata. – fala com um fiapo de voz.

         -Ah... Mande-os entrarem. - gesticula com as mãos do lado oposto em sua escrivaninha enquanto recolhe os prontuários e os guarda em uma pasta de couro. Antes de poder guardar tudo, os dois ruivos entram de rompante no escritório. Os olhos dourados de Edward estavam arregalados e apreensivos, enquanto Renesmee parecia ansiosa e estranhamente excitada. – O que houve? – fica de pé em um gesto.

         -Temos um problema Carlisle. – sua voz, outrora sedosa, saiu estranhamente rouca e cansada. As sobrancelhas grossas se curvaram criando um vinco desesperado. – Um grande problema. – ressona como se apenas repetindo ele poderia transmitir sua mensagem. – Temos de ir para casa agora.

         Nessie estava quicando ao lado do pai, mas se mantinha peculiarmente quieta, seus olhos falando por si só. Carlisle inventa uma desculpa para a secretária e os três entram no Volvo que voa pela estrada, ninguém diz uma única palavra em todo percurso. Em menos de trinta minutos estavam entrando na mansão.

         Renesmee vai na frente, apressada, em seu andar deslizante. Jacob e Bella estavam sentados juntos na sala de estar, e quando notam a chegada deles, ficam os dois de pé e se calam imediatamente. O lobo ocupa um grande espaço com seu volumoso corpo, que parecia, milagrosamente, estar usando todas as peças de roupa.

         Bella torcia as juntas, irrequieta. Vai para o lado de Edward e entrelaça os dedos nos dele. Renesmee se senta onde a mãe estava e fica observando Jacob de baixo, parecendo peculiarmente indefesa. Jake trinca o maxilar e meneia a cabeça para Edward.

         -Doutor. – aquiesceu com a cabeça e lançou uma olhada para Renesmee ao seu lado. A jovem ruiva piscou longamente os olhos, como se o estimulasse a continuar. O lobo voltou a fitar os dois vampiros a sua frente e em um longo suspiro disse. – Encontramos uma garota na floresta, e ela diz que precisa falar com o senhor. – dá um pigarro embaraçado.

         -E porque isso seria um problema?

         -Não ouviu a melhor parte vovô. – Renesmee se prontifica cruzando as pernas e pondo em dúvida seus parcos sete anos. – È melhor que se sente. Dejá vu. – murmura mais para si mesma. Edward coloca a mão no ombro do pai e os dois se sentam. Bella fica acomodada no braço da poltrona. Jacob continua em pé, como que tenso demais até para poder parar.

         -A... Garota, ela... – gagueja coçando a cabeça. – Achamos no início que ela era uma metamorfa como nós, mas ela se mostrou diferente... – para de falar e fica sobre o olhar inquisidor dos vampiros. – Bem diferente na verdade. – puxou o ar gradativamente. Renesmee suspira consternada e fica de pé.

         -O que Jacob quer dizer, vovô... É que encontramos um novo tipo de imortal na floresta. Saímos para dar uma volta, e nos deparamos com uma mulher que cheirava diferente. Ela pediu refúgio, e Jacob levou ela para a casa do pai dele. – responde sucintamente lançando um olhar singular para o lobo. – Ela podia se transformar em animais diferentes. Como os lobos da reserva, mas sem a parte do lobo.

         Carlisle franze o cenho e fica pensativo.

         -Continuem. – Bella ordena duramente.

         Renesmee morde o lábio inferior enquanto Jacob larga o corpo pesadamente no sofá e esfrega os olhos mostrando cansaço. A híbrida abaixa os olhos e fita os sapatos de verniz vinho. Jacob suspira, todos sabiam que ele não deixaria Nessie na mão nunca.

-Eu e Ness saímos para correr um pouco, talvez tenhamos nos afastado da costa, e então sentimos um rastro diferente. Não soava como nada que tivéssemos sentido antes. Sei que foi irresponsável de minha parte permitir que Renesmee fosse atrás, mas...

         -Ela estava grávida. – a jovem fala de vez. Todas as cabeças se viram para ela enquanto a surpresa vai crescendo na face escultural de Carlisle. – Ou melhor... Está grávida. E a barriga está bem grande. O bebê deve nascer a qualquer momento.

         -Grávida? – a surpresa pintou as feições angelicais do Cullen. Por alguns instantes o silêncio deixou-o mudo, a boca semi-aberta. – Mas você não tinha dito que as mulheres de sua espécie são inférteis? – focou a atenção em Jacob. Ficou de pé andando de um lado para o outro.

         -Acontece que ela não é bem da minha espécie! Eu ainda não contei o pior Carlisle. – disse levantando o rosto para poderem se olhar nos olhos, os dedos de Renesmee se retorcem contra o tecido de sua saia. – O pai da criança, ele não é transmorfo.

         -Isso é bom ou ruim?

         -Nem humano. – prensou os lábios em uma careta.

         -Disse que era preocupante. – Edward sussurrou no canto onde estava. Bella continuava silenciosa, apertando a mão do marido com cada vez mais força. Recordando de quando era ela grávida, com a vida dela e de Renesmee em constante perigo. E depois imaginou aquela garota sozinha entre os quielutes. Uma agonia desceu por sua espinha inanimada.

         -Quer dizer que... – Carlisle teve medo de completar a frase. Medo do que estava por vir. Apertou os lábios em uma pressão agressiva, sua boca ficou mais branca do que antes.

         -O pai é vampiro. – Jacob olhou diretamente para Edward, como uma indireta, mas logo envolveu a mão de Nessie em um aperto acalentador, como que buscando apoio em seu impriting. Ness fez uma careta e balançou a cabeça. Pobre Jacob... Pensou intimamente Bella, mas logo se recompôs e fitou o sogro.

         -Uma criança meio vampira, e meio lobo?

         -Não é bem lobo. – Jake coçou a cabeça, desconcertado. – A jovem estava muito confusa e cansada, nos pediu abrigo, e como é uma de nós... Ou quase, demos a ela ajuda. Ela disse que precisava falar com Carlisle Cullen, que ouviu os rumores sobre vocês. – encarou a porta nervosamente.

         -Não deviam ter levado-a para os quielutes. – Bella grunhiu.

         -Estávamos no território deles. Sam chegou no segundo seguinte com toda a matilha, eles insistiram em escoltar-la para La Push. Eles não sabem que o pai é vampiro, ainda. Mas logo descobrira que há algo errado com sua gravidez. Da mesma forma que machucava Bella, também a machuca. Temos que descobrir o que fazer com ela.

         -Como assim o que fazer com ela? – Bella ergueu-se de lado do marido em um salto, os olhos dourados ferozes e as mãos presas em punhos cerrados, sua expressão materna mais parecida com a de uma leoa.

         -Bem... Ela... – Jacob não sabia o que dizer. De um lado a vampira perturbada, e do outro seu amor hibrido. Buscou ajuda com Edward, mas ele parecia tão passivo quanto ela. Carlisle ainda estava pensativo em demasia. – É um caso diferente. – encolheu-se.

         -Assim como acharam que Nessie era um caso diferente. – sibilou pondo-se de frente ao lobo. – Vocês vieram até nós com sangue nos olhos, e mudaram de ideia de última hora. Acho que a lei deve ser justa com todos, e não agradar apenas uma parte.

         -A lei e a bondade nem sempre andam juntas. Renesmee foi meu impriting, foi um caso a parte. – ele cruzou os braços emburrado. Renesmee remexeu a cabeça negativamente e andou até o lado da mãe, onde tocou seu rosto e começaram a conversar em intimidade.

         -Leve-me para ver-la. Se a criança deve estar a caminho é melhor que eu esteja por perto. – o instinto médico de Carlisle se acendeu como um fósforo riscado. Agarrou sua maleta e saiu em direção à garagem.

         Em menos de dez minutos estavam todos reunidos na sala de estar pequena e aconchegante da cabana de Billy Black. O homem servira Nessie e Seth com copos de limonada, e a mestiça bebericava vez ou outra do conteúdo amarelo. Quando Billy se distraiu com algo, Renesmee derramou todo o líquido em um vaso ao lado do sofá. Ela detestava comida humana.

         Bella e Edward estavam parados perto a porta, desconfiança pintando o mármore gélido de suas faces. A esposa estava com as costas prensadas no peito do marido, e abraçava o próprio corpo juntamente com ele. Carlisle havia sido levado ao quarto onde a estranha repousava, e já estava lá a um bom tempo.

         -Esse silêncio todo me enerva. – Nessie deu um salto começando a andar em círculos como seu avô costumava fazer. Seth havia vindo o mais rápido que pode quando soube da presença deles na reserva, e em um gesto de carinho esticou o longo braço e bagunçou os cabelos cacheados da menina.

         -Calma baixinha. Tudo ficara bem. – sorriu solarmente e voltou a assistir à televisão distraidamente. Edward apertou o braço de Bella e os dois se olharam nos olhos. Não acreditaria quem é o progenitor, murmurou quase sem mover os lábios

         Espero não ter que saber tão cedo, ela pensou com os olhos perdidos no corredor em que o vampiro desaparecera em companhia de seu amigo. Estou preocupada com o que querem fazer a criança. O instinto materno de Bella soava alto.

         -Pode ter certeza que depois dessa informação, as idéias ficaram mais desagradáveis. - Edward rangeu os dentes apertando o maxilar e prensando Bella em seus braços, tentando garantir que não fizesse nada de estúpido. Seth olhou de soslaio para eles. Estou com vocês. Sempre. Edward sorriu agradecendo o apoio.

         Carlisle foi conduzido pela casa até o último quarto no fim do corredor. Jacob fizera a menção de ir com ele, e antes mesmo de estarem perto, pode sentir o cheiro peculiar dela. Não era um odor ruim, somente algo novo, fresco.

         A porta foi afastada com um rangido, e logo os dois estavam em companhia da mulher que repousava de olhos fechados na cama, se é que poderia ser chamada de mulher, suas feições eram jovens e sobrenaturalmente belas, como se entalhadas por mãos delicadas. Sua pele tinha um suave tom de dourado, mas estava tão pálido que era possível ver suas veias por baixo da pele.

         -Ela piorou muito nessas últimas três horas. – cochicha para o vampiro. – Se apresse doutor, logo Sam voltara da ronda e checara porque vocês quebraram o limite imposto.

         -Esse cheiro. Conheceria de longe. – murmurou sem mal mover os lábios arroxeados. Parecia tão mal quanto Bella pouco antes de dar a luz a Renesmee. Os cabelos loiros se esparramavam pelo lençol em milhões de tons dourados.

         -Meu nome é Carlisle, vim te ajudar. – falou tenramente se sentando aos pés dela. Sua barriga tinha o perfeito formato oval, mas a magreza de seus ombros fizera-a parecer apenas pele, osso... E criança. A forma com que o feto afetava seu corpo era dolorosa.

         -Olhos dourados... – ela riu e depois tossiu. Seu riso era diferente, como o borbulhar de um riacho manso e suave como uma chuva de verão. – Não achei que poderiam ser tão belos quanto aquele rubro. Se bem que o tempo tirara o brilho que houvera em sua juventude.

         -De quem você esta falando? – Carlisle se aproximou sentando-se mais perto, a ansiedade corroendo-o por dentro. – Do pai da criança? Ele tinha olhos vermelhos?

         -Qual o seu nome doutor? – perguntou virando a cabeça devagar na direção dele. Seus olhos eram cinzentos como um dia nublado, talvez houvessem se parecido mais com uma tempestade e um mar revolto outrora, mas hoje eram apenas um dia calmo e nublado.

         -Carlisle Cullen. E o seu, qual seria? – perguntou apenas por educação, e pela gentileza ser parte de seu ser. Como os olhos dela deviam ter sido belos um dia. Ele quase podia ver-la antes daquilo acontecer. O olhar era como prata derretida, onde havia um nuance azulado em algum lugar.

         -Eve. Meus pais me chamavam de Eve. – disse segurando a mão dele em um aperto forte demais para alguém em seu estado. Olhou para os dedos apertados em volta do pulso dele. – Fazia tempo que eu não sentia esse frio contra minha pele.

         -Eve, preciso que me conte quem é você. O que exatamente você é.

         -Sou uma transmorfa. – sorriu fracamente.

         -Mas não como os quielutes. – insistiu.

         -Não... A minha raça é mais flexível. Podemos ser a criatura que queremos. Qualquer uma. – piscou os olhos como que se recordando de algo. – Minha mãe era francesa, e ela morreu quando eu tinha dez anos. Fui criada por meus avôs, e sabe que história eles me contavam para dormir? – voltou o olhar para ele. – A história de bruxas que roubavam o rosto dos seres, e que podiam ser o que queriam.

         -Quem dos seus pais era transmorfo?

         -Mesmo com todas as histórias de terror... Minha mãe. Papai nunca soube o que ela era, mas os dois se amavam. – parecia alegre, mas logo uma sombra desceu por seu rosto. – Quando descobri o que eu era... Tive medo, fugi. E na minha fuga, meu cheiro atraiu a atenção de um lobisomem. Achei que ele me mataria, mas um homem de capa preta me salvou. Ele matou o lobo e olhou para mim enquanto segurava o coração do monstro nas mãos, e partiu. Não vi seu rosto naquela noite, mas soube que era um vampiro.

         Carlisle teve suas dúvidas de quem era o verdadeiro monstro após o relato do coração, mas permanecia em silêncio, a atenção fixa em Eve. O rosto dela relaxou, continuou o relato.

         -Vaguei durante anos sozinha. Sem saber quem eu era, o que eu podia ou não fazer, em que mundo eu estava, até outro morfo me encontrar... Eles estão por toda parte, só que tão disfarçados que nunca os notamos... Adam era o nome dele... Passamos a viver juntos, Adam me explicou tudo sobre nossa raça, e durante bastante tempo tive paz, até descobrir que os lobisomens nos caçavam.

         Tossiu algumas vezes.

         -Por quê? – Carlisle tentou transmitir calmaria.

         -Nunca soube a verdadeira razão. Ouvi rumores, mas nenhum que se provasse verdadeiro. Só se sabia que as mulheres desapareciam, e dos homens só achávamos os corpos. – passou as mãos pelos olhos. – Um bando começou a nos seguir. Eles nos encurralaram em algum lugar na Espanha, e fomos obrigados a nos separar. Eu não sabia me transformar muito bem naquela época.

         -Sabe agora? – tentava coletar o máximo de dados possíveis.

         -Quando ainda não se está bem treinado, ao virar um animal, pode não conseguir fazer o caminho de volta, ou simplesmente se esquecer de quem você é passar a pensar como o ser que você se tornou.

         Suspirou piscando os olhos.

         -Nunca mais vi Adam, e me encontrei perdida, jovem, não estava treinada o suficiente, e sem nem mesmo um tostão no bolso. – parou como que se recordando de sua vida passada. – Foi quando eu conheci ele.

         Inclinou-se, essa devia ser a parte mais significativa de toda a história. Seus olhos âmbar brilharam com cuidado enquanto Eve tomava fôlego e recuperava as memórias em sua mente.

         -Disse que não queria me machucar, e algo no seu olhar disse que falava a verdade. Perguntou milhares de coisas sobre nossa espécie, e quando vi seu rosto o reconheci na noite em que me salvou. – desviou o rosto para o lado contrário e fitou a persiana aberta.

         -Lembra do nome dele?

         -Me deu dinheiro, e roupas, disse para que eu tomasse cuidado. – lágrimas cintilaram no canto de seus olhos, uma delas caiu e fez uma curva por sua maçã. – Ele estava para partir, sem pedir nada em troca. Sem encostar um dedo em mim, mostrando que queria apenas ajudar. – fechou as pálpebras enquanto gotículas se prendiam em seus cílios longos. – Disse para que ele não fosse, que eu estava cansada de ficar só... Preciso contar o resto?

         Fungou voltando a encarar-lo e limpando o nariz com as costas de sua mão direita, mostrando o quão humana era. Carlisle segurou a mão dela, sua pele morna como a de um humano, não queimando como a de Jacob.

         -Gostaria que você lembrasse o nome dele. Talvez eu conheça, talvez ele goste de saber que terá um filho. – Eve riu uma risada seca. Os dentes brancos brilhando como marfim.

         -Foi um amor proibido senhor Cullen. Não quero que pense coisas erradas de mim. Nunca imaginamos que resultaria em uma criança, mais assustadora que a mãe e o pai.

         -Não diga isso. Há alguns anos aconteceu à mesma coisa entre minha criação e uma humana a qual ele amava. Achamos que tudo estava perdido, mas nasceu uma linda menina saudável e especial.

         -Soube dessa história. Todos souberam. – murmurou.

         -Apenas preciso saber se você é venenosa, ou se tem resistência ao veneno vampiro, não creio que o parto seja normal, o mais provável é que você não resista. A esposa de meu filho teve de ser transformada.

         -Filho... – ela riu olhando a janela. – Bem que me contaram que esses clãs vegetarianos eram especiais. Todos se tratando como membros de uma família... Éramos assim. Como uma família. Até que os lobos nos massacrassem, e separassem cada um para um canto do planeta.

         -Eve. Diga-me o nome dele, você sabe?

         Ela fazia desenhos no lençol com a ponta do dedo.

         -Aro. O nome dele era Aro.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "The Both Sides" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.