Capítulo único: Rokutousei no Yoru

Nos conhecemos de uma forma bem distinta, eu nem sei o que estava fazendo na rua aquela hora da noite! Mas não me arrependo de tê-lo feito, caso contrário, talvez nunca tivéssemos nos conhecido, embora eu tivesse a esperança de que um dia isso viesse a acontecer. E bem, de fato aconteceu...

Eu não conseguia dormir, por mais que tentasse eu continuava apenas rolando pela cama sem conseguir pregar o olho. Olhei para o relógio, uma e quarenta, tsc. Levantei e fui até o guarda-roupas, peguei um cardigã qualquer e saí do quarto decidida a dar um volta pelo bairro. Peguei meu celular na mesa de centro da sala e saí de casa.

Faz quatro ou cinco anos que me mudei para Daehan-minguk, mais precisamente para sua capital, Seoul, em um bairro tranquilo. Moro com mais duas amigas em uma casa de estilo provence, com tijolos de cor clara, é facilmente reconhecível na nossa rua, já que a maioria das casa é em estilo tradicional coreano.

Andei pelas ruas indo para o parque que fica aqui perto, na verdade era mais uma pracinha com aquelas academias de velhinho, sabe? Eu gostava de ficar lá, sem fazer nada. Procurei pelo meu banco favorito, mas ao que parece, já tinha alguém lá...

Era uma rapaz, muito bonito. Os cabelos castanhos bagunçados e o rosto sereno o deixavam fofo, tinha um corpo um tanto, hã, musculoso -ele me parece familiar. Ele, assim como eu, estava de pijamas, não fosse a jaqueta que usava para se proteger do frio e os tênis, eu acharia que ele talvez pudesse estar dormindo na praça. Ele encarava o céu cheio de estrelas e com uma lua cheia, linda e brilhante.

Aproximei-me devagar, não queria assustá-lo.

– Posso me sentar? - perguntei cautelosa.

– Hum? - olhou-me por alguns segundos um pouco confuso - Ah, claro pode sim.

Sentei-me ao seu lado um tanto quanto constrangida, eu ainda estava de pijamas e ele era muito bonito, não era exatamente desse jeito que eu esperava ser vista por alguém como ele. Ficamos em silêncio, apenas observando os milhares de pontinhos brilhantes do manto escuro acima de nós.

– O que trás uma moça tão bonita a esse lugar às duas da madrugada? - indagou ainda encarando o céu.

– Eu, hã... Não conseguia dormir então resolvi dar uma volta. - ele soltou um "hm" e me encarou - Mas e você? O que te trás aqui durante a madrugada.

– Insônia. - respondeu simplista, mostrando um sorrisinho.

– Ah...

– Desisti de dormir e fiquei observando o céu da janela de casa, mas olhando daqui, é muito mais bonito.

– É lindo.

Ficamos em silêncio de novo, devo dizer que isso é um pouco incômodo, assunto nunca me faltou para falar com as pessoas, mas ele me fazia perder as palavras sem nem mesmo proferir qualquer que seja.

– DongHae.

– O quê? - fitei seu rosto confusa, ele riu.

– Me chamo DongHae, é um prazer conhecê-la...

– Thalia, meu nome é Thalia, mas minhas amigas me chamam de Lia.

– É um prazer, Thalia. - fiz careta quando ouvi-o dizer meu nome - Certo, Lia. Você mora por aqui?

– A três quarteirões de distância.

– Leste ou Oeste?

– Oeste. - vi seu sorriso se alastrar e tornar-se radiante.

– Moramos na mesma rua então?

– É o que parece. - sorri de volta.

– Mas, - sua expressão tornou-se pensativa durante alguns segundos - você não é daqui, quero dizer, não é coreana, não é?

– Não, eu vim do Brasil. Moro com duas amigas naquela "casa esquisita de tijolinhos", como dizem os nossos vizinhos. - ele riu, seu sorriso era tão bonito, na verdade, tudo nele era lindo.

– Moro na primeira casa da rua.

– Aquela com estátuas que me deram pesadelos quando as vi pela primeira vez? - meus pelos se arrepiaram só de lembrar delas.

– Não fale assim das estátuas de cachorro da minha mãe. - DongHae tentou parecer sério, mas riu dois segundos depois.

– Aquilo são cachorros? - sua risada era contagiante, agora eu já estava rindo também.

– Ela diz que são, mas sei lá... Aquelas coisas mais parecem um daqueles bichos de filmes de terror.

DongHae era realmente uma figura singular, um dos garotos mais engraçados e amigáveis com estrangeiros que conheci desde que me mudei. Os coreanos tem essa nóia com o nacionalismo que eu vou te contar, às vezes chega até a ser racismo. É realmente difícil achar alguém gentil e agradável como ele aqui em Seoul, todos são tão atarefados e apressados que não dariam um "oi" nem para a mãe deles, se bem que aqui o respeito com os mais velhos é algo que eu realmente admiro.

Passamos a noite inteira conversando sobre assuntos aleatórios, qualquer coisa que viesse a mente virava assunto. Tínhamos gostos muito parecidos, principalmente musicais, DongHae adorava ouvir músicas agitadas e alegres, esse tipo de música me agradava também, mas eu preferia músicas com batidas marcantes, influencia da minha unnie mais velha que é uma maníaca por dança. Para o meu espanto, DongHae também era e fazia até faculdade!

– Onde você estuda, DongHae oppa?

– Me chame só de Hae ou oppa. - seu sorriso era tão bonito... - Universidade de Myongji.

– Ah! Você estuda na mesma universidade da unnie! - falei alegre, meus olhos provavelmente brilharam.

– Ela também estuda por lá? - seu sorriso tornou-se mais radiante - O que ela está cursando?

– Unnie também está no curso de dança, acho que já deve ter ouvido falar dela, uma baixinha estrangeira e invocada.

– Daeyang saeng? Estamos no mesmo grupo para uma apresentação, não sabia que eram amigas.

–Unnie, - ri internamente, é bem do feitio dela esquecer das coisas - mas por que daeyang?

– Ora ela é calma e suave, mas também é nervosa e um tanto, perigosa. Assim como os oceanos. - refletiu voltando a mirar as estrelas.

– Que, hã... Poético.

– Não dê os créditos a mim, mas ao JunSu hyung, foi ele quem inventou o apelido.

– JunSu? - pensei um pouco, vasculhei os arquivos do meu cérebro para relacionar o nome JunSu à minha unnie e uma luz surgiu - Unnie vive reclamando dele lá em casa, diz que não o suporta e que detesta suas brincadeiras, sua risada, tudo!

– Eles se amam.

– Eh? Bem, pelo modo como a unnie fala dele quando não está explodindo de raiva, dá a entender que ela gosta dele.

– O hyung está perdidamente apaixonado por ela, - ele puxou o celular do bolso e me mostrou uma mensagem, o nome do remetente: Xiah JunSu.

– "Saeng, por favor, me ajude! Eu não sei mais o que fazer para tirar aquela garota da cabeça. Ela está me levando a loucura." - li em voz alta.

– Ele me mandou isso hoje, além as vinte vezes em que ele me ligou.

– Unnie me disse que começou a ignorá-lo, deve ser por isso.

– É deve, mas chega de falar de mim. Quero que me conte algo sobre você.

– Contar? Contar o quê? - senti meu rosto esquentar, bochechas de tomate em três, dois...

– Hmm, que faculdade você cursa?

– Eu, eu ainda estou no colégio oppa, último ano.

– Sério? Eu adorava ir a escola, gostava bastante das aulas de Educação Física. - disse-me sorridente enquanto eu fazia careta.

– Essa é uma das minhas piores matérias, prefiro aula de Artes.

E assim como ele, contei algumas coisas sobre mim, sobre o que eu gostava e não gostava, o que fazia para passar o tempo, minha comida favorita. Meu celular vibrou no bolso do cardigã, unnies mandando zilhões de mensagens perguntando onde eu estava. Olhei para o relógio digital no visor, seis e vinte da manhã. DongHae fez questão de me acompanhar no caminho de volta, disse que não teria mais graça ficar na praça sem ninguém pra conversar.

– Foi um prazer conhecê-lo, oppa. - disse quando chegamos na porta de casa.

– O prazer foi meu, pequena. - uma de suas mãos encontrou meu cabelo e bagunçou-os - Apareça qualquer dia na faculdade com daeyang saeng.

– Eu irei. - sorri enquanto ele se afastava e logo depois entrei em casa.

– Thalia! Onde você estava garota?

– Na praça, conversando com o seu oppa, Alice. - respondi sentando-me à mesa.

– Oppa?

– DongHae oppa, ele é muito gentil.

– Ele é engraçado não é? - perguntou.

– É sim, uma ótima pessoa.

– Você nos deixou preocupadas. - Louise unnie descia as escadas com uma toalha em mãos.

– Desculpem-me, deveria ter deixado um bilhete, mas não achei que fosse demorar tanto.

– Só não faça isso outra vez.

– Tudo bem.

~x~

Faz uma semana, uma longa semana desde que conheci DongHae. Talvez a semana mais tediosa de toda a minha vida. A cada dia da semana, Alice unnie chegada casa vez mais irritada da faculdade por conta de JunSu, Louise unnie vivia ocupada com os seus trabalhos na universidade e quase sem tempo para mim e para o namorado dela, Taemin - a coisa mais fofa que eu já vi em toda a minha vida.

Hoje é sábado, Louise unnie finalmente deu um break nos trabalhos e está passando algum tempo com Taemin, mesmo que eles estejam em casa vendo filmes e comendo porcarias, eles estão felizes só por estarem perto um do outro. Eu era a encarregada do jantar do dia e acho que só por causa disse, Alice unnie resolveu trazer o pessoal da faculdade para jantar aqui em casa.

– Estou em casa! - acho que eles chegaram.

– Bem vinda de volta, unnie. - Louise unnie respondeu.

– E como vai indo o jantar? - ela colocou a cabeça na porta da cozinha e piscou com olhinhos brilhantes.

– Yah! Sua morta de fome. Daqui a pouco sai, espere mais dez minutos e já poderá comer. - resmunguei.

– É bom mesmo.

– O que foi que eu fiz pra merecer isso? - escutei unnie brigando com alguém - Ai não, por que justo hoje ela tinha que trazer JunSu oppa aqui?

– JunSu hyung também é parte do grupo.

– Yah! DongHae oppa, você me assustou. - quase derrubei as panelas em cima do fogão e a colher de pau foi parar no chão.

– Desculpe. - esboçou um sorriso sem graça e coçou a nuca.

– Não foi nada, vê? Estou inteira.

– Então você é a cozinheira hoje?

– Aham.

– O que está fazendo?

– Alguns dos poucos pratos coreanos que eu aprendi, kimchi, bulgogi e Louise unnie disse que queria comer carangueijo, então eu comprei alguns.

– Adoro frutos do mar. - de novo aquele sorriso estonteante.

– Dá pra ser ou 'ta difícil de sair esse jantar?

– Está pronto sua gorda, pode vir comer. - retruquei colocando as coisas na mesa.

Tinha umas cinco pessoas da faculdade da unnie, DongHae, JunSu, duas garotas, Hyoyeon e Bora, e mais um garoto chamado KiKwang. No total, tive que fazer comida para nove pessoas! O triplo de pessoas para quem eu estava acostumada a cozinhar. Por ironia do destino, só para fazer a unnie sofrer um pouco, praticamente obrigamos JunSu oppa a sentar-se ao seu lado, mas eles não brigaram, na verdade, Alice não disse uma só palavra o jantar inteiro, diferente de JunSu que falou pelos cotovelos com os garotos.

Louise e Taemin se ofereceram para lavar a louça, não protestei, apenas fui até a sala e me joguei no sofá onde antes, ambos estavam sentados. Alice e o pessoal da faculdade sentaram-se no chão ao redor da mesa de centro da sala, espalhando inúmeros papéis. Eles discutiam sobre a apresentação que seria feita na próxima terça-feira durante a semana dos esportes da faculdade.

– Já sabe em que palco e a que horas nos apresentaremos? - Bora perguntou, ela mais parecia uma boneca do que uma dançarina.

– O coordenador disse que seria no palco Oceana, mas não especificou um horário.

– Certo, provavelmente amanhã sairá o cronograma, não há com o que se preocupar. - eu não conseguia mais distinguir as vozes, meus olhos estavam pesados, o sono estava se abatendo sobre mim.

– Thalia, não durma no sofá. Ficará com dores nas costas depois.

– Estou acordada, Alice. - bufei.

– Não vou dizer duas vezes.

– Aish! Já disse que estou acordada, vê? Estou conversando contigo.

Fui pra cozinha e bebi um copo enorme de água gelada, voltei para sala e sentei-me no sofá, atenta a conversa que se desenrolava. Eles ficaram discutindo até sei lá que horas e do nada resolveram afastar os móveis da sala e ensaiar. Fiquei surpresa ao ver que minha querida unnie estava dançando com JunSu, ela podia estar fazendo cara feia, mas mesmo assim suportava. DongHae tinha Hyoyeon como par, devo dizer duas coisas: Primeiro, eles são excelentes dançarinos. Segundo: Eu não gostei nadinha desses sorrisinhos bestas deles. Se eu 'to com ciúmes? É eu 'to, algum problema com isso? Tudo bem que nós não somos nada além de amigos, mas e daí?

Saí da sala e fui para o quintal dos fundos, sentar no balanço da macieira que fizeram pra mim no dia das crianças. O céu estava mais bonito que naquele dia, lotado de pontinhos brilhantes, um querendo brilhar mais forte que o outro em volta da majestosa lua prateada que completava aquele espetáculo noturno, digno de ser imortalizado em uma pintura ou foto.

– Admirando as estrelas outra vez, pequena? - a voz de DongHae me tirou de meus devaneios sobre as estrelas.

– Estão ainda mais bonitas.

– E vão ficar ainda mais a cada vez que olhá-las.

– Já pararam de ensaiar?

– Alice torceu o tornozelo, JunSu está com ela lá na sala e os outros acabaram de ir embora.

– O quê? A unnie está bem, ela, ela...

– Ei, calma. - Shisus por que esse garoto tem que ser tão perfeito? Alguém faça ele parar de sorrir antes que eu desmaie - Ela está bem, só está sentindo um pouco de dor, mas está perfeitamente bem.

– Hmm, isso é bem a cara dela. Dançar até que se machuque, estou começando a achar que ela é masoquista.

Ficamos em silêncio durante alguns segundos, quando uma pergunta atravessou-o.

– Por que veio aqui pra fora?

– Por que? Hmm, eu quis... Tomar um ar. - respondi forçando um sorriso.

– Quero o motivo verdadeiro.

– Quis ver as estrelas?

– Por favor... - não faça olhinhos de cachorro pidão, não! - Pode confiar em mim.

– Promete que não vai achar ridículo?

– Prometo.

– Senti, hmmm...

– Ciúmes da Hyoyeon?

– Aigoo. - abaixei a cabeça e fiz um bico enorme nos lábios.

– Por que?

– Porque ela é bonita, dança bem, tem um ótimo senso de humor e... Porque vocês estavam sempre sorrindo um para o outro. Você prometeu! - meus olhos se encheram de lágrimas ao ouvir sua risadinha baixa, ele se ajoelhou na minha frente e gentilmente secou-as.

– Ouça bem pequena, Hyoyeon é apenas uma grande amiga e meu melhor amigo é o namorado dela, ela pode ser tudo isso que você disse e milhões de coisas mais, porém eu só tenho olhos pra uma garota, e na minha opinião, ela é muito mais bonita que Hyoyeon.

– Ela deve ser uma garota de muita sorte, Tiffany é o nome dela se não me engano, unnie me disse uma vez que...

– Alice tinha razão quando disse que você era meio devagar, - meus lábios novamente se torceram em um bico - você fica tão fofa assim. Tiffany foi meu porto seguro durante muito tempo, mas eu conheci outra garota e ela é a coisa mais fofa desse mundo.

Acho que eu devo ter feito uma careta muito engraçada, sua risada graciosa atingiu meus ouvidos assim que viram minha expressão confusa.

– Ainda não ligou os pontos?

– Mas...

– Nós não escolhemos por quem vamos nos apaixonar, essa tarefa cabe ao coração e se eu pudesse escolher, ainda assim teria escolhido você.

– Oppa, eu... Realmente não sei o que dizer.

Meu rosto estava ensopado pelas lágrimas quando abracei o pescoço de DongHae. Senti-me nas nuvens quando seus lábios encontraram os meus em um beijo delicado, mas fui trazida de volta a terra firme por uma enxerida de nome Alice.

– DongHae, não tire a pureza da minha maknae, entendeu? Se não eu te castro garoto, ouviu bem!

– Yah! Unnie. - senti meu rosto ferver, que raios ela pensa que está fazendo?

– Alice, pare de constranger a menina.

– Quem você pensa que é pra me dizer o que fazer, JunSu?

– Hyung, você é outro lerdo. - reclamou DongHae, me fazendo rir.

– Hã? Outro? Por quê? Achei que só a Thali fosse lerda.

– Olha o respeito, que coisa bonita não? - resmunguei.

– Deixa eles pra lá, alguma hora vão se acertar.

– Prepare-se porque você acabou de arrumar um escândalo. - brinquei aproximando-me outra vez.

Seus dedos enroscaram-se em meu cabelo e minhas mãos, que antes seguravam a corda do balanço, seguraram seu rosto de forma delicada, como se fosse feito de porcelana. Escutei alguns gritos, mas não duraram muito tempo, JunSu oppa tinha arrastado Alice para dentro de casa, não sei o que aconteceu lá dentro, Louise unnie disse que ouviu alguns barulhos na sala, mas quando eu entrei os dois estavam dormindo.Uns meses depois, quando fui a faculdade com DongHae, vimos os dois aos beijos dentro da sala de prática, no fim esses dois acabaram mesmo juntos.

Quanto a DongHae e eu? Digamos que graças aquela noite de estrelas, eu tenho um lindo anel em minha mão esquerda.