Fireplace escrita por catalepsia


Capítulo 1
Capítulo Único




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A sala estava terrivelmente silenciosa a não ser pelo som de madeira crepitando na lareira. A iluminação vinda do fogo azulado reluzia na pele amorenada do garoto a minha frente, acentuando as curvas e dando brilho ao cabelo castanho, macios e perfumados por uma fragrância doce e nada enjoativa. Ele estava sentado em um banco de madeira – madeira como quase todos os móveis da casa – Ele não vestia nenhuma roupa, apenas um pedaço de pano jogado, cobrindo seu sexo. Seus cabelos estavam indisciplinados, jogados. Não havia lápis, não havia piercing. E era essa exata simplicidade que eu pedi que ele buscasse, e ele buscou. Era O garoto sem máscara, sem nada a esconder, pronto para ser transformado em arte, e seu rosto delicado teria adquirido um semblante sério se não fosse pelo ligeiro sorriso que brotava de seus lábios carnudos.

Então eu me posicionei de frente ao cavalete e após molhar o pincel na palheta de cores, comecei a pintar num ritmo lento e preguiçoso. Era um tempo precioso, bom demais para ser desperdiçado. E eu me lembrei de como tudo começou.

Estudávamos na mesma escola – para se mais preciso, na mesma classe – e meu professor de história da arte bajulava-me sempre por tirar notas altas. Então esse professor falou sobre ele, que mudaria parcialmente minha adolescência. Falou que ela estava passando dificuldades na matéria e que eu era um aluno qualificado para ajudá-lo, e se eu fizesse, ganharia pontos a mais para cursar minha faculdade de artes. Eu sinceramente odiava ajudar, mas fiz isso porque iria beneficiar meu futuro. Eu mal sabia que ia ajudar de outras formas.

Ele realmente era muito leigo em história da arte então eu fiz o máximo para que ele pudesse ter um bom rendimento na matéria. Frank – o nome do meu amor – começou a vir em casa para estudar. Um dia qualquer, expliquei sobre Dadaísmo. As caras e bocas que Frank fazia davam a entender que eu estava falando em alemão, porque ele não entendia – ou fingia não entender – nada. Fizemos uma pausa. Perguntei se ele preferia chá ou café. Ele disse “café, por favor” e eu disse “Ok” e então começamos a conversar e eu descobri que ele não era apenas mais um aluno medíocre daquele colégio cheio de serpentes. Ele era apaixonado. Não, não era apaixonado por nenhum garoto, mas sim pela vida. Assim como eu. Então começamos a nos encontrar sem ser por obrigação, só para um curtir a presença do outro mesmo, comentando sobre a lua, café, música – Misfits, nosso tema predileto-, ou qualquer idiotice que vinha em nossas cabeças alucinadas. Eu sabia que quem olhasse iria achar a coisa mais imbecil e melosa do mundo, mas para nós, era algo como “Hey eu não estou sozinho!”.

Então depois de muitos filmes assistidos, parques visitados e abraços compartilhados, meu coração começou a ganhar cor como nunca, e parece que com ele foi o mesmo. Foi bem assim que eu conheci meu namorado – e melhor amigo –.

Alguns anos se passaram, e nós nos formamos. Eu cursei artes, e ele música. Hoje como tarefa, eu deveria fazer uma pintura sobre simplicidade humana. Tudo estava andando bem, tinha pesquisado algumas fotografias na internet para tentar reproduzi-las... até que Frank chegou. E acho que todo mundo se sente meio assim quando está apaixonado: Viciado pela pessoa. Eu não poderia simplesmente pedir para que ele voltasse outra hora, meu coração não deixava. E também porque estava tendo um temporal horrendo lá fora, minha casa fica no fim do mundo – não tinha vizinhos e é cercada por mato –, e seria maldade mandá-lo voltar para casa.

Sendo assim, fiz tudo de improdutivo naquele dia, como me lotar de porcarias e jogar vídeo game com ele. Tudo menos o maldito quadro. Até que anoiteceu... e a luz acabou, por causa do temporal. Ficou aquele escuro total, e o pior de tudo é que eu não tinha salvado aquelas drogas de fotografia.

Então eu fiquei desolado no sofá, brincando com os cabelos de Frank enquanto ele estava deitado – e de olhos fechados – no meu colo. Só daí eu percebi seu rostinho delicado com as bochechas levemente coradas. E foi com essa visão que meu cérebro voltou a funcionar: Eu não tinha fotografias, entretanto eu tinha algo muito melhor! Eu tinha Frank.

Então tudo acabou bem, com uma lareira, um pouco de lenha, Frank sentado, gotas de tinta, um cavalete e um quadro. Era só o que eu precisava.

Até porque se a vida te der limões... faça uma limonada. Ou um quadro.


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Notas finais do capítulo

:D gente, tem como adicionar amigo no Nyah? Faz tanto tempo que eu não entro nessa coisa.
Enfim, obrigada quem leu, sério mesmo ♥♥ Quem quiser dar críticas ou alertar algo, também ^_^ ♥