Britânico escrita por Strauss


Capítulo 1
Capítulo 1




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Um novo dia despontava na capital inglesa e da minha janela eu observava o sol espreguiçar-se atrás dos prédios. Relutante, ousei por os pés no chão gelado e, quase num pulo, voltei a me encolher nas cobertas. O vento soprava suave, os pássaros cantavam alegres em júbilo ao amanhecer e também levavam de mim os resquícios de um sono conturbado. Logo em seguida, o som robótico e insistente do despertador do meu celular ressoava, vibrando em cima do velho criado mudo, atormentando minha mente e fazendo com que eu, finalmente, saísse da cama. Desliguei o despertador, agradeci por eu ainda ter uma hora e meia antes de ir para a Universidade.

Era meu segundo dia ali naquele apartamento. Sozinho, entregue ao mundo e, como qualquer adolescente empolgado, feliz por estar quase independente.Quase porque eu ainda não arranjei um emprego que satisfizesse meus gastos particulares e necessários. Mas era questão de tempo para que algo surgisse, pois levo em conta os cursos e experiências que tenho em meu currículo.

O dia tem tudo para ser maravilhoso! Tomei um banho quente, escolhi a melhor (e adequada, claro) roupa que havia em meu guarda-roupa, tomei um café fraco, pois planejava passar na Ladurée, uma franquia de uma das docerias mais famosas da França. Eu gostaria de ir lá não só para comprar minha bomba de chocolate, mas para escolher um bolo simples e gostoso, pois hoje é aniversário da minha tia-avó Angélique e, como eu adoro ela desde pequeno, resolvi presenteá-la da forma mais amorosa possível, tendo em conta o que posso gastar no momento.

Telefonei para Shannon, minha colega de classe da universidade, pedindo a ela que explicasse ao professor o meu atraso, ou desse alguma desculpa qualquer para justificar uma meia horinha que eu não estivesse lá. Saí do prédio e caminhei até a esquina. Ainda era cedo, mas já havia bastante gente na rua, abrindo suas lojas ou indo ao metrô. Ao longe consigo enxergar a adorável doceria, o letreiro dourado em caixa alta não chamava tanta atenção quantos as guloseimas expostas nas vitrines. A loja, de onde uma doce fumaça branca saía da chaminé de tijolo vermelho cru, ficava entre uma loja de brinquedos infantis e uma pequena casa de cosméticos. Entrei no lugar, o sino da porta acusou minha chegada e do balcão uma robusta senhora de bochechas rosadas surgiu segurando algumas caixas.

– Bom dia! - animada, a mulher deixou os caixotes coloridos no balcão e veio ao meu encontro - O que deseja?

– Bom dia! - estendi a mão àquela senhora, esboçando um sorriso agradável, tal qual o ambiente - Vou querer uma bomba média de chocolate e um bolo de frutas vermelhas com marshmallow. O bolo eu quero empacotado numa caixinha como aquela - apontei para uma caixa com desenhos campestres. Ela estava embaixo de todas as outras, mas seus detalhes simples e amorosos chamaram minha atenção de tal forma que não cogitei escolher outra. A mulher sorriu minusculamente, e voltou ao balcão, abrindo o vidro.

Fiquei impressionado com a diversidade de doces, bolos e quitutes que haviam ali. Bolos de framboesa, doce de leite, petit gâteau de chocolate, infinitos brownies, torta de limão, bolo de abóbora com recheio de beijinho...Eu me sentia no desenho da Moranguinho! Faltava ter uma fonte de suco de amora na cozinha. Espiei discretamente pelos ombros da mulher e depois sorri da minha ingenuidade.

Paguei pela mercadoria e saí contente da Ladurée em direção ao metrô. Não precisei esperar muito, logo estava chegando perto de onde Angélique morava.

Minha tia-avó era uma mulher reclusa. Preferiu a liberdade de viver como queria aos luxos garantidos de seu sobrenome. Meu pai um dia contou-me a história de sua tia e eu fiquei deslumbrado, pois parecia coisa de livro de ficção romântica. Angélique abandonou os bailes, os vestidos caros e as suítes pelo amor selvagem e inseguro de um bon vivant que conheceu numa viagem perigosa que fez sem o consentimentos dos pais. Ela se apaixonou e viveu uma intensa história libidinosa com o rapaz que, numa noite qualquer, abandonou-a num hotel portuário e partiu num calheiro chamado Kraken is My Dad.

Tendo superado o episódio, Angélique ainda preferiu continuar a ter a vida simples. Trabalhou como freelancer em vários estabelecimentos comerciais e empresários, ora como fotógrafa, ora como redatora. Era uma mulher inteligentíssima, dotada de vasto conhecimento, mas tinha uma coisa que ela possuía, no entanto, ninguém mais queria acreditar. Mas, para ela, não fazia diferença se pensassem que ela é louca ou coisa assim. Para ser feliz, tia Angélique precisa apenas do que ela tem e claro, companhia de gente que ela gosta.

Bati a porta algumas vezes até ser recebida por ela. Angélique completava hoje 65 anos bem vividos. Vestia um adorável pijama rosa com flores brancas e tinha em mãos uma fumegante xícara verde. O inconfundível aroma de chá vermelho penetrou nas minhas narinas, acalmando meu espírito de tudo que me aconteceu na vida até hoje.

– Feliz aniversário, tia Angélique! - abracei-a calorosamente, entrando na casa e em seguida entregando a ela a bonita caixa com o bolo.

– Oh! O que escolheu?

– Veja. Acho que a senhora irá gostar - sentei-me no sofá encouraçado marrom, afundando-me no estofado macio, enquanto o cheiro antigo da casa misturava-se com o cítrico do chá. Angélique abriu o pacote com as mãos levemente trêmulas, mas com a mesma curiosidade e alegria de uma criança. Ao mirar o conteúdo, sorriu instantaneamente.

– Meu filho, estou feliz que tenha lembrado de mim e ainda tenha comprado algo tão delicioso - Angélique deixou o bolo na mesa e depositou um beijo em minha face - Vou pegar chá para você, assim comemos juntos.

– Desculpe, titia - redargui - não poderei ficar o tempo que gostaria. Tenho que ir a faculdade.

– Oh sim... É o seu segundo dia, certo?

Assenti, minha tia se sentou novamente.

– Bem, quer saber como vai ser seu dia? - perguntou ela, dando alguns golinhos no chá e melando o indicador no glacê do bolo, para em seguida provar.

– Ah! Claro, é sempre bom

Estendi minhas mãos para ela e ela as segurou, ficou acariciando por alguns segundos e então começou:

– O céu está maravilhoso - começou - contudo, uma nuvem grande e cinzenta vaga solitária, movida ao vento suave do norte.

– O que significa essa nuvem?

– Um acontecimento repentino em sua vida. Não posso dizer exatamente o que é. A nuvem não é tão escura quanto de uma tempestade... Mas, ainda assim não é branca e bonita quanto deveria ser a nuvem de um céu bonito como o que eu estou vendo.

Após alguns minutos, ela disse que não teria nada de especial, mas avisou para eu não me atrasar para o ônibus de volta para casa.

Agradeci as informações e, levantando do confortável sofá, desejei mais uma vez os parabéns. Saí da casa da minha tia um pouco curioso. Afinal de contas, o que realmente significa isso que ela viu?

Espero que nada ruim. Estou confiante de que esse será um bom ano em minha vida e espero que isso perdure o resto do meu tempo aqui.


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Notas finais do capítulo

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