A Bordo Do Titanic escrita por Sara Matias


Capítulo 4
Capítulo 3 - O Cais de Southampton - Parte I


Notas iniciais do capítulo

Peço desculpa pela minha prolongada ausência mas tive uma crise momentânea de inspiração.
Mas para compensar-vos este capítulo é um pouco maior que o habitual :)
Neste capítulo faremos uma pequena viagem aos pensamentos e ao passado do Edward. :p
Espero que gostem. Deixem reviews ^^
Obrigado por tudo*
Beijo



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Edward

Como é que eu poderia ter forças para fazer prevalecer a minha opinião em relação a isto tudo? Odiei aquele olhar satisfeito que o Jasper me lançara nos jardins da Mansão, odiara a decisão do Carlisle… até mesmo odiara a forma serena com que Esme encarara os factos. Mas eu não pude fazer nada, apenas com o meu acenar leve de cabeça, numa concordância contraditória, anunciei a minha derrota que não deixou te ter o seu lado resignado. Regressei á Mansão, deixando de uma forma brusca o Jasper para trás, importando-me pouco se ele seguiria atrás de mim ou não. Para meu alívio ele deixou-se ficar por entre as sebes verdejantes, preferindo mais uma vez um bom momento consigo mesmo. Os pensamentos de Jasper eram indecifráveis, apesar de os conseguir ouvir eram pensamentos que estavam além da minha compreensão. Na maior parte do tempo eram pensamentos relacionados com a solidão, o silêncio, a questão da vida eterna. Eternas reflexões que eu achava que nunca iriam mudar. Debaixo daquele seu porte tranquilo e sereno, por raras as vezes satisfeito e alegre, havia aqueles pensamentos que só o próprio Jasper conseguia compreender… Os meus já eram para mim um motivo de grande reflexão e isso bastava-me.

   Entrei pela grande porta de vidro que dava acesso a uma das grandes salas de estar da mansão. Não se encontrava ninguém, aparentemente estava tudo calmo ali, mas eu conseguia ouvir as vozes vindas dos aposentos da Esme, a voz de Carlisle fazia-se ouvir com aquele tom de sempre, calmo mas firme, como um verdadeiro patriarca que era da nossa família. A voz de Esme por vezes soava naquele timbre gentil e maternal. Os pensamentos de ambos estavam focados na partida para a América e na questão de eu estar completamente fora do grupo que concordava com esta viagem. Para eles eram uma preocupação que tinha que ser resolvida e eles estavam precisamente a pensar no que haviam de fazer. Quanto a isso eles já não tinham com que se preocupar… a minha decisão estava tomada, seguiria com eles embora que fosse contrariado.

   Mas havia outros pensamentos que soavam mais altos nos aposentos de Esme. Revirei os olhos ao constatar o obvio, subitamente ouvi a porta do quarto a ser aberta, o som dos seus passos a descer a escadas com entusiasmo e depois a figura imponente do Emmet surgiu á minha frente.  

   Obviamente que o Emmet era o que tinha ficado mais feliz com isto tudo, para mal dos meus pecados, e eu sabia que em situações como esta as piadas não demorariam a surgir. De cada vez que ele mandava as suas típicas piadinhas, a minha vontade era de racha-lo em dois! Tentava controlar-me o melhor que conseguia, fazendo para o ignorar, o que deixava o Emmet pior que estragado, ele deixava transparecer aquela sua expressão carrancuda e desiludida. Mas eu nem sempre saía bem sucedido… por vezes sucumbia ao meu mau humor e correspondia às suas piadinhas com um rosnado a meia voz. Aí, Emmet parecia uma autêntica criança no dia dos seus anos que tinha recebido um arsenal de presentes. Os seus ombros faziam-se sacudir com as estrondosas gargalhadas que eu aposto que tinham a capacidade de atravessar Inglaterra de uma ponta á outra e levar as pessoas a cair no equívoco de pensarem que o fim do mundo tinha chegado.

   O Emmet era assim mesmo, com um humor incrível. Se o seu dom não fosse a força incrível que pertence ao seu corpo, com certeza que a comédia o seria… os seus olhos eram bastante perspicazes, não lhes escapava nada.

   Sentou-se numa das grandes poltronas de pele e observou-me com aquele olhar divertido, fazendo os meus nervos começarem a despertar.

- Se vens aqui para lançares mais um dos teus típicos conjuntos de piadas Emmet, bem podes ir já embora. – Rosnei-lhe, estreitando os olhos na sua direcção.

O Emmet deixou escapar uma valente gargalhada e olhou para mim com aquela expressão no rosto de “Já consegui irritar-te mais uma vez.

- Não sejas tão previsível maninho Edward… assim as coisas perdem a metade da piada.

Novamente aquelas gargalhadas zombadoras, meu Deus, até quando! Queria um pouco de paz! Já tinha de digerir aquela decisão de Carlisle em levar-nos para a América, não precisava de levar ainda em cima o humor do Emmet. Optei por não lhe responder, até porque não valia mesmo a pena faze-lo. Fiz a intenção de sair dali mas o Emmet fez prender-me ali com as suas palavras.

- Onde é que vais Edward? Caramba, és assim tão fraquinho a ponto de não aguentares uma piadinha tão fraquinha vinda da minha parte?

- Eu não as chamaria de fraquinhas Emmet, são de perder o juízo, isso sim. – Ripostei com azedume.

- Vá lá Edward, pensa comigo… vai ser bom mudar de ares! – Disse o Emmet, desviando o assunto precisamente para o que o levara ali.

- Fala por ti… - resmunguei baixinho.

- Caramba Homem… os ratos urbanos de Londres andam-te a fazer mal! Bem… pelo menos na América de certeza que haverá uma maior variedade de animais…

Fulminei o Emmet com o olhar enquanto ele dava largas a uma nova e estrondosa gargalhada que eu aposto que os vizinhos já pensavam que estava a haver um terramoto.

O Emmet levantou-se de onde estava e aproximou-se de mim, colocou uma mão sobre o meu ombro rígido, e olhou para mim com um olhar muito sério.

- Sê razoável Edward… A América vai renovar-te esse humor de velho rabugento. – Depois veio aquela expressão trocista. Ele estava a zombar comigo durante todo aquele tempo, o maldito! Os meus nervos começaram a aumentar e a paciência a chegar ao fim.

Libertei-me da sua mão enorme e afastei-me.

- Foi o Carlisle e a Esme que te pediram que viesses aqui? Tentar “persuadir-me” para que ache que é uma excelente ideia partirmos nesta viagem?

Encarei o Emmet que por segundos ficou calado, ainda que com aquele sorriso trocista ainda nos lábios, respondeu-me que não, mas os seus pensamentos traiam-no. É claro que ambos o tinham pedido para ter uma conversa civilizada comigo, uma maior insistência por parte de Esme, e o pedido de Carlisle para me chamar á razão…

- Escusas de gastar do teu tempo com isto… Eu já tomei a minha decisão Emmet.

- E então? – Perguntou Emmet com aquele brilho de esperança no olhar, quando ele queria era uma autêntica criança.

Encolhi os ombros de impaciência e respondi o que ele queria. – Eu decidi que vou com vocês para a América… - senti que aquelas palavras tinham suado azedas e talvez um pouco rudes. – Eu nunca deixaria a minha família... é a única que tenho.

Num segundo o Emmet já me tinha pegado ao colo e estava a festejar como um louco, rindo descontroladamente, mas afinal o que é que ele estava a fazer?!

- Larga-me Emmet!!! Pousa-me no chão! – Berrei-lhe zangado.

- OH MANINHO EDWARD! EU SABIA! EU SABIA QUE GOSTAVAS DE MIM! VAMOS JUNTOS PARA A AMÉRICA! – Festejou calorosamente.

Esbracejei para que ele me deixasse e me pousasse no chão. Depois de uns segundos de loucura desenfreada do Emmet, ele resolveu largar-me.

Quando me vi finalmente com os pés bem assentes no chão afastei-me o melhor que pude do Emmet. Boa, ele tinha-me amarrotado a camisa toda e as calças… tentei ajeitar-me o melhor que pude enquanto lhe dirigia um olhar de mau humorado até ao último grau.

- Novamente com essa cara de quem não recebeu um beijinho Edward… - Gargalhou o Emmet.

Não resisti em fazer-lhe uma careta de desagrado. – Nem penses aproximar-te novamente de mim. – Ameacei, apontando-lhe o meu dedo em sinal de aviso.

Do andar de cima veio até mim, os pensamentos aliviados de Esme e Carlisle por eu ter tomado aquela decisão de os acompanhar. O Emmet fez um gesto de rendição e saiu da sala aos risinhos o que me deixou novamente á beira da falta de paciência.

O seu pensamento mais coerente por meio de tanta risada foi que ele tinha cumprido com a sua parte, o tolo do Emmet ainda conseguia pensar que tinha sido ele o próprio a desencadear a minha decisão definitiva de ir com o resto da família para a América… realmente ele quando queria conseguia ser extremamente optimista.

    Deixei-me cair sobre uma das poltronas, fintando o nada. Carlisle surgiu subitamente, de sorriso largo no rosto, atrás de si seguia Esme igualmente feliz.

- Eu sabia que ias acabar por chegar a uma decisão sensata meu filho. – Exclamou gentilmente Esme, aproximando-se de mim com todos aqueles pensamentos maternais.

- Muito bem Edward… - limitou-se a dizer o Carlisle, deixando transparecer o seu orgulho por mim. – Agora só temos que fazer as nossas malas e muito em breve estaremos a caminho de Nova Iorque.

- Tu sabes o que eu acho em relação a isto Carlisle. – Ripostei.

- Eu sei Edward… mas neste momento é a melhor e a única de muitas soluções que temos disponível.

Concordei com um aceno de cabeça, esta era a dura realidade…

Dali a 2 dias deixaria tudo o que conhecia ali, da forma mais difícil do que me fora alguma vez capaz de ser… Era frustrante pensar que naquele dia presente já tinha sucumbido pelo menos 3 vezes á força maior dos factos que o resto da família encarava como uma mudança fácil. Mas tudo aquilo ia agora contra os meus ideais, ia contra a minha vontade de me instalar definitivamente num lugar e nunca mais me preocupar com alguma mudança que tivesse que fazer. Era nestas alturas em que me vinham á mente os pensamentos de que parecíamos fugitivos, quais criminosos que andavam a escapar á justiça humana. Isto era apenas só um dos lados da moeda, porque eu sabia que jamais escaparíamos á justiça divina. Às vezes, no silêncio da noite, pergunto-me se aos olhos de Deus deixamos de existir a partir do momento em que nos transformamos nos monstros que realmente somos. Apesar de os nossos corpos passarem pela transformação para algo semelhante ao mármore, uma pele fria e dura que jamais poderá  ser aconchegante e quente, pelo menos para os humanos… a nossa presença ainda ser visível a olhos humanos alheios, para Deus é como se não fossemos nada. Mármore esculpido de uma forma perfeita mas no entanto, que não contém alma… Sentimentos? Oh sim! Ódio, desejo, raiva, vingança, ganância, sofrimento… mas apenas esses. São assim os que são da nossa espécie, retiram vidas como quem retira dinheiro de um cofre, banalizando o gesto que cometeram, não se deixando impregnar de um sentimento de arrependimento por terem interrompido vidas que podiam ter seguido o seu rumo se um único pensamento racional lhes tivesse pesado na consciência. Porquê ignorar? Eu já o tinha feito, eu próprio já tinha interrompido vidas… Eu era um monstro sem alma, um demónio de mármore que não conhecia a absolvição dos meus pecados. Aquele desejo ardente de ficar ali em Londres para o resto da minha Eternidade era uma clara evidência disso. Talvez se me mantivesse no mesmo lugar as memórias do meu antigo eu fossem ocupadas por uma rotina diária que não fosse interrompida.

   Carlisle deu-me uma nova perspectiva da vida. Quando ele me encontrou, naquela noite fria de 14 de Janeiro de 1860, já eu era um vampiro á 105 anos. Durante esse tempo todo matara todos aqueles que se tinham cruzado no meu caminho, criminosos impiedosos que tinham a mesma vontade de retirar vidas, embora para fins diferentes. Criminosos que violavam jovens raparigas e depois as degolavam num beco sujo escondido dos olhares da justiça.

    Recordo-me de as ruas estarem cobertas de neve e a minha entrega ao desespero ser tão grande como a sede ardente na minha garganta. Sós os meus passos marcados sobre o manto branco de neve eram as minhas testemunhas da minha presença ali. Um odor delicioso tinha-me levado até ali, á borda de um passeio que se alargava mais além numa forma de jardim bem cuidado coberto pelo manto gelado. Erguia-se logo a seguir uma pequena mansão mas bastante austera e luxuosa. Observava com expectativa aquela janela ainda iluminada pela luz das velas e conseguia-me chegar aos ouvidos uma voz feminina, logo depois uma voz baixinha fez-se ouvir como pequenos resmungos. Quando me apercebi, descobri que aquele odor maravilhoso pertencia a um bebé. O choque foi tão súbito como inesperado, o meu lado predador dizia-me que não faria diferença retirar uma vida de poucas horas de existência, se já tinha sido capaz de retirar a Homens tão impiedosos quanto eu, seria muito mais fácil faze-lo com um simples bebé. Mas os pensamentos daquela mãe colidiram contra mim com uma tal brutalidade que eu não pude ignora-los. Aquela mãe repleta de amor maternal idealizava um futuro brilhante para aquele seu primeiro filho, um lar que o amaria e que lhe daria todo o amor que necessitava… aquilo… aquilo fazia voltar á superfície recordações que eu julgava perdidas para sempre. Caí em mim, e condenei-me por ter tido a ousadia de ter seguido o odor até ali. Eu não poderia retirar a vida a um bebé! Um bebé tão frágil e indefeso que apenas contava com a protecção dos braços da sua mãe… Carlisle encontrou-me naquele dilema, enfrentando uma batalha que eu aposto que nenhum outro vampiro teria-se dado ao trabalho de ter. Graças a ele consegui ter força suficiente para sair dali. Nunca pensei antes que pudesse conseguir deixar seguir o seu rumo uma vida que eu tivesse acabado de condenar ao fim abrupto em prol da minha sede. Naquela noite eu consegui deixar um bebé e a sua mãe viver…  

    Depois de aceitar o seu convite para me juntar á sua família, Carlisle perguntara-me quem é que me tinha transformado… eu nunca soube responder a essa pergunta. Apenas tinha na minha memória pequenos fragmentos da minha vida humana, tudo o que consigo recordar é que decorria o ano de 1772, tinham passado apenas 3 meses de eu ter feito 17 anos e eu estava feliz pelo meu pai levar-me pela primeira vez á caça com o Rei Luís XVI. Pertencíamos a uma das famílias mais importantes e ricas de França, uma das que tinha contacto com a corte e com a família real. Nunca me sentira tão feliz por poder finalmente falar com o Rei e mostrar-lhe como eu era bom na caça. Lembro-me de me afastar apenas um pouco do grupo que se encontrava mesmo á entrada da grande floresta conversando e aprontando os cães para o começo da caçada. Depois tudo tornou-se num grande borrão de escuridão. É nesta parte que a minha mente tem grandes colapsos, que se dividem nas recordações de dor intensa e inconsciência. Quando acordei estava num ponto distante da floresta, era de noite e constatei que havia luar… sentia-me diferente, quando finalmente encarei o meu reflexo num rio que atravessava a grande floresta constatei em pânico que me tinha tornado em algo que desconhecia. Aos poucos, fui reconhecendo e aprendendo, com um paladar de horror, que me tinha tornado num Vampiro… Há 157 anos que sou assim, e tudo o que eu faço é tentar agarrar-me àquela pequena recordação de quando eu era um jovem de 17 anos que ia conhecer o Rei e caçar com ele. O que eu não daria para poder retroceder o tempo e poder anular aquele acto insensato que me retirou tudo o que conhecia…

   

Jasper

    Naquela noite de 7 de Abril de 1912 todos nós andámos atarefados a fazer as malas, na incessante discussão do que seria apropriado ou não levar nas bagagens. Obviamente que não se poderia levar na totalidade tudo o que constituía o recheio da nossa mansão. Apenas o que necessitávamos, e nisso o Carlisle fora bem explícito: “apenas o que um humano levaria numa viagem.” Muitas coisas seriam deixadas para trás, talvez recordações. É certo que as malas, nem mesmo os baús são suficientes para as guardar a todas. Talvez o único lugar ainda suficientemente grande fosse apenas o nosso coração á muito adormecido... Toda aquela bagagem que se ia acomodando no grande salão de entrada da mansão fez-me reflectir naqueles simples humanos que apenas levavam uma trouxa, com pertences simples e de pouco valor aos olhos dos mais ricos. Sim, haveria por certo pessoas que se enquadravam na 3ª classe que iriam viajar no mesmo barco que nós, mesmo abaixo dos de classe mais importante, em busca de um novo começo numa terra estranha. A minha atenção dividia-se entre fazer as minhas malas e os sentimentos do Edward naquela noite que deixavam-me agitado e preocupado. Quando ele ficava assim só poderia significar que ele não estava bem consigo mesmo. O Edward ficava hirto, como uma verdadeira estátua, emerso numa confusão de sentimentos que me deixavam zonzo. Nessas ocasiões eu optava por afastar-me o mais que podia… mas naquela noite isso não seria possível, havia demasiadas coisas para se fazerem, uma família nobre e rica normal com certeza teria os seus próprios criados para fazerem toda a bagagem necessária para a viagem, os seus senhores só teriam que dar as ordens necessárias com aquela típica posse elegante e aristocrática. Mas nós não éramos uma típica família, não tínhamos criados por uma questão de máximo sigilo. Não podíamos contratar ninguém pois assim a nossa existência correria o risco de ser exposta… Eu conseguia sentir a preocupação de Esme por ver o Edward daquela forma tão perturbada, a calma do Carlisle por saber que aquilo era só apenas o típico desconforto que o Edward sentia sempre que nos mudávamos. A alegria do Emmet era o único sentimento feliz ali, o que parecia quase uma ofensa no meio de tantos sentimentos negativos. Uma das vantagens de se ser Vampiro era que não necessitávamos de dormir, logo combinado com a nossa incrível rapidez proporcionou-nos a vantagem de tornar esta tarefa menos aborrecida.

    O raiar da aurora ainda não tinha surgido e já toda a bagagem estava pronta para a grande viagem. A mansão pareceu-me estranha depois daquela noite atarefada… despida de mais de metade do seu recheio que a tornara confortável. Talvez um dia ela fosse ocupada por uma família que fosse humana, voltasse a ter aquele ambiente caloroso de uma família onde as gerações passariam, os jovens tornar-se-iam adultos e os adultos por sua vez idosos com uma vida repleta de ensinamentos e lições que seriam transmitidas aos que ainda tinham muito que aprender. Verdadeiros anciãos de cabelos brancos, com o seu porte sábio e sorriso gentil, rodeados pelos das gerações mais recentes, pronto a partilhar o seu conhecimento, pois a morte viria sem avisar… talvez em plena luz crua do dia, ou talvez por entre as sombras sinistras da noite, mas ela acabava sempre por vir. Num último suspiro abandonavam este mundo sem deixar uma última mensagem ou uma longa e demorada despedida. A nossa família nunca virá a saber isso, nunca passará pelo drama do que é de se despedirem do mundo para sempre…

Num último olhar conservei nas minhas memórias cada canto daquela casa, em breve teríamos de partir e deixa-la para trás.   

2 dias depois…

Abandonamos a mansão sem olhar uma única vez para trás, por 7 anos aquele tinha sido o nosso lar, o único lugar onde tínhamos podido ser o que realmente somos, agir de uma forma natural sem recear que estivesse algum humano a nos observar. Tomávamos o gosto por uma liberdade que não podíamos ter fora daquelas paredes, sem reservas e sem medos, sendo nós próprios da forma tal como éramos. Durante aqueles dois dias de espera interminável, os sentimentos de todos não tinham mudado muito. Os de Carlisle continuavam a ser de calma, os de Esme tinham mudado ligeiramente para uma preocupação que alternava com uma esperança optimista, os de Emmet não tinham mudado nem uma única vez, mantendo aquela sua felicidade de sempre. Quanto aos sentimentos de Edward esses também se tinham alterado. Agora já não eram aqueles sentimentos que tocavam quase o violento, os sentimentos impulsivos e tempestuosos de á 2 dias atrás tinham vindo a transformar-se em algo mais calmo mas no entanto mantinham-se resignados. Mas uma coisa o Edward não podia negar, no meio de todos aqueles sentimentos havia o de uma curiosidade insistente… Ele não era o único, tanto eu como o Emmet estávamos curiosos para saber em que navio partiríamos. O Emmet ainda tentara enganar a Esme, e quase conseguira, mas o Carlisle chegou a tempo de impedir que a Esme dissesse o nome do navio que nos levaria á América. O Emmet não achou lá muita piada mas não abriu a boca a protestar, ele ainda tinha a esperança de conseguir saber pelo Edward, dado o facto de ele conseguir ler os pensamentos de todos. Mas nem isso lhe valeu, pois o Carlisle relembrou a Esme para nem sequer pensar no nome do navio pois o Emmet poderia recorrer a Edward para obter a sua ajuda… e não se enganara. Saímos bem cedo naquela manhã, aproveitando as escassas horas que já tocavam o lusco-fusco antes da hora eminente do romper da aurora. As sombras ainda pertencentes á madrugada, as sombras da folhagem das árvores não me pareciam mais do que borrões verdes escuros em contraste da velocidade do carro em que eu, o Emmet e o Edward seguíamos. Carlisle e Esme seguiam os dois á frente, num outro carro tão luxuoso quanto o nosso. Eram dois carros magníficos que pertenciam á nossa família e Carlisle recusara prontamente a deixa-los para trás na ocasião em que Emmet lhe perguntara se os deixaria para trás, vendendo-os a um bom preço. Cada carro tinha o seu toque especial, as suas pinturas brilhantes e polidas, o branco e preto, o pertencente a Carlisle e Esme, o outro verde e branco, pertencente a nós os três. Havia em ambos aquele fio dourado e brilhante como o fogo que separava ambas as cores uma da outra, o que tornava ambos os carros distintos e elegantes, eram confortáveis por dentro, almofadados e forrados a veludo. O de Carlisle forrado a veludo vermelho escuro e o nosso a veludo negro.

   Seria lógico que Carlisle não quisesse desfazer-se deles. Por isso, optou por os trazer connosco. Questionei-me como é que isso seria possível… a não ser que o navio em que partiríamos fosse suficiente grande e apto para se encarregar dessa tarefa. Para esta ocasião, Carlisle decidiu contratar dois motoristas de ocasião para guiarem os carros. O facto de chegarmos a Southampton sem nenhum motorista, com carros tão luxuosos e a serem conduzidos pelo próprio dono seria demasiado estranho para os que assistiriam e com certeza levantaria suspeitas desnecessárias. As expectativas aumentavam á medida que estávamos mais perto de Southampton e quando chegamos por fim ao Cais Portuário, nenhum de nós conseguia disfarçar a ânsia e o entusiasmo. Os nossos carros pararam num ponto próximo ao local de desembarque e eu não consegui evitar que a minha boca descaísse em espanto quando tivemos a oportunidade de testemunhar o que estava á nossa espera. O Emmet fez um esgar de espanto desmesurado e o Edward olhou completamente sem palavras.

- Aqui estamos nós meus filhos… para embarcarmos no Titanic! – Exclamou mentalmente o Carlisle de sorriso nos lábios, de braço dado com Esme que sorria da mesma forma na sua pose aristocrática.

Em frente a nós e a centenas de pessoas estava o maior e mais imponente dos navios, pronto a partir rumo á prometida América de 1912.


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