Set Fire To The Rain escrita por Mary Black


Capítulo 1
Capítulo único




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Doía como facas cravando-se em sua pele. A cada vez que a cena se repetia em sua cabeça, parecia que um pedaço da sua alma escorria e se esparramava para fora do corpo.Ela nunca pensara que fosse doer tanto.Que pudesse doer tanto.Era muito,muito mais que uma dor física. E o tempo não parecia estar colaborando, já que, em vez de cicatrizar, as feridas só se abriam mais a cada dia que passava.Lembrar dele doía,vê-lo doía,escutar sua voz doía,achar alguma coisa em alguém levemente parecida com ele doía,até mesmo olhar para a mesa do outro lado do salão doía.


Ela não conseguia mais suportar tanta dor e melancolia. Nas últimas semanas,se fosse escrito um livro de sua vida,ele se encaixaria perfeitamente na pior das tragédias gregas.Todas as vezes que passava por lugares a que costumavam ir juntos,inútil e debilmente ela olhava para os cantos,procurando alguém que,ela sabia,já se fora há muito tempo.Alguém que nunca ia voltar.


Era como se estivesse continuamente agindo no piloto automático. Não havia emoção nas suas palavras,sentimentos em suas ações ou mesmo brilho nos seus olhos.As orbes chocolate estavam somente opacas e mórbidas,sem vida.Olheiras se acumulavam debaixo de suas pálpebras, das várias noites que virava em claro,completamente insone.Tentava se ocupar ao máximo, deixando sua mente cada vez mais sobrecarregada,tentando dar conta de muito mais tarefas do que qualquer ser humano normal seria capaz.Chegava ao fim do dia contra tudo e todos,extremamente esgotada.Mal se jogava na cama,sentia seus olhos imediatamente se fecharem.Todas as noites,ela rezava para que fosse acordar somente no dia seguinte – com o sol batendo contra seu rosto – mas suas preces nunca eram atendidas.Ela sempre lutava contra os mesmos demônios que assolavam seus sonhos durante a madrugada:a guerra,Harry, Hogwarts,as consequências,Voldemort,Draco e a marca que ela sabia que fora gravada a fogo em seu antebraço esquerdo.Querendo ou não,seus pensamentos eram sempre dirigidos a ele, sempre voltavam para o mesmo lugar onde começavam,num ciclo vicioso,torturante e interminável.


Enquanto isso, as palavras dele queimavam e martelavam seu cérebro. Não havia sentido em tudo aquilo. “Quem você acha que é afinal, Granger?” ele dissera. “Só mais uma sangue-ruim atirada, mais uma vadiazinha de quinta que se encontra em qualquer esquina por aí. Dando pra o primeiro que aparecer na sua frente, pra tentar sair desse lixo imundo do qual você vem”. Seu tom estava tão carregado do mais puro desprezo que ela não sabia como ainda conseguia conter as lágrimas, como elas ainda não haviam rompido seu autocontrole e jorrado absurda e incontrolavelmente.Era demais ouvir tudo aquilo,ser tratada como menos que nada por alguém cujas palavras doces ainda estavam frescas na memória da garota. “Más notícias pra você:não tem como mudar quem nós somos, Granger.E você vai continuar sendo a nerd sangue-sujo irritante e idiota,que dorme com a cara enfiada em um livro porque tem um complexo que faz você precisar ser melhor do que alguém, sendo que até o bastardo do Longbottom é melhor do que você.Pensando melhor,até um verme é melhor do que você.Você é patética e está contaminando o ar que eu respiro,então nos agracie com a sua ausência.De preferência,para sempre.Ninguém se importaria se você fosse raptada por um trasgo,morta por um basilisco ou algo assim.Não mesmo”.


Aquelas palavras doeram mais do que tudo.A mesma voz da qual ela escutara as coisas mais doces agora espirrava ácido na castanha.No dia depois que ele fora a seu quarto e a beijara. Não podia ter esquecido tão rápido,podia?Naquela hora,ela não teve outra saída que não virar-se e sair correndo,seu orgulho pisoteado,escondendo o rosto com as mãos numa tentativa inútil e fracassada de que ninguém notasse seu estado pra lá de deplorável, escutando os murmurinhos de perplexidade e algumas risadas da mesa da Sonserina.


Afaste esses pensamentos da cabeça,Herms,sua consciência insistia em dizer.Não que ela não tentasse.Mas parecia que,a cada vez que ela enterrava as lembranças mais e mais fundo,elas de algum modo voltavam,mil vezes mais potentes e nítidas.Ela voltara a vestir a máscara insensível e fria,distante.Esperava que,dessa vez,não falhasse como antes acontecera.


E,lentamente,muito mais do que de costume,o tempo passava.As tensões do período pré-guerra se tornavam cada vez mais evidentes.As casas começaram a tomar partido,não oficialmente, mas estava mais do que claro que toda alma viva – e até mesmo as mortas - naquele castelo sabia que a terceira guerra do mundo bruxo estava quase em seu estopim.Era questão de (pouco) tempo até que algo acontecesse.O Profeta Diário trazia notícias cada vez mais alarmantes dos atentados feitos pelos partidários d’Aquele-que-não-deve-ser-nomeado. O mundo trouxa era o que mais sofria.Ataques de dementadores já haviam se tornado rotineiros, e os “fenômenos inexplicáveis” eram cada vez mais constantes.Um povoado chegara a ser incendiado por inteiro, à noite, enquanto todos dormiam,no que foi considerado “um atentado criminoso da pior espécie” por um conhecido jornal trouxa.As listas de desaparecidos aumentavam cada dia mais,e mesmo os corpos nunca eram encontrados.O pânico já se instalara há muito,e a linha tênue que ainda mantinha o mundo bruxo equilibrado parecia que ia se romper a qualquer segundo.


E,a cada dia que passava,Hermione se sentia mais separada dele.À velocidade de uma lesma,a tensão entre eles voltara a ser,pelo menos superficialmente,a mesma de alguns anos antes, amigos de Harry Potter versus amigos de Draco Malfoy.Ela adorava se iludir com o fato de que não se sentia mais tão afetada com a presença dele,visto que chegara até a encará-lo uma ou duas vezes,sempre as chispas visíveis naquele pequeno confronto interno entre as orbes acinzentadas e as castanhas.Claro que não significava nada aquela vozinha irritante que palpitava dentro dela todas as vezes que cruzava,mesmo que de longe,com Malfoy.


Naquela sexta-feira em especial,o castelo estava sendo impiedosamente castigado,desde o alvorecer,com uma pesada chuva,gotas grossas que caiam incessantemente.A aula de Herbologia que a Grifinória teria com a Corvinal à tarde fora cancelada por motivos óbvios. Hermione sabia que os N.I.E.M.’s estavam próximos,mas estava completamente sem paciência para ler uma anotação que fosse.


Estava jogada de qualquer jeito numa poltrona vermelha com forro de veludo em seu quarto de monitora-chefe.As gotas faziam um barulho imenso ao se chocar contra a janela,só para depois escorrerem,devagar e em silêncio.Incrivelmente parecidas com lágrimas,as gotas. Incrivelmente parecidas com as lágrimas dela.No começo,chegavam barulhentas, acompanhadas por fungados,inchando seus olhos,infinitas,incontroláveis.Como no primeiro dia. Depois, passaram a ficar mais amenas.Não tinham hora definida para se derramar,desciam silenciosas pelas bochechas,para depois perderem-se enquanto Hermione tentava ignorá-las. Era mais fácil,com certeza.Ninguém mais notava – não que ela se importasse.Mas não deixavam de ser lágrimas,certo?Mesmo que numa intensidade bem menor,ainda estavam carregadas de um sentimento.Que ela sentia se esvair mais e mais a cada segundo que passava, mas ainda fazia questão de,por vezes,dar o ar de sua graça,como se só para provar que ainda estava ali,vivo.Como ela queria que já tivesse conseguido pôr um fim nisso.


Queria poder descer até os jardins do castelo,queria que a chuva lavasse sua alma,levando consigo todas as angústias da garota.Era demais.Ninguém devia ser obrigado a se sentir desse jeito,impotente diante do desenrolar das coisas à sua volta.Era exatamente assim que ela estava, e não há sentimento pior do que ver que você podia ter feito mais.Ou,no caso,menos, pensou ela.


Mas,afinal de contas,por que não podia?Não havia nenhuma regra que dissesse que era proibido tomar um simples banho de chuva.Uma possível gripe era o de menos,comparado à sensação de libertação que ela tinha todas as vezes que sentia as gotas escorrerem por seu rosto,ensopando sua roupa.


Decidida,ela desceu afobadamente as escadas do castelo.Como esperado,não encontrou absolutamente ninguém.Qualquer um que ainda tivesse um resquício de juízo estaria em sua sala comunal ou no quarto,dando uma pausa no ritmo frenético da escola e entrando em estado semi-letárgico.Mas não ela.Tinha sido tomada por uma êxtase vinda só Merlin sabia de onde,e não queria fazer outra coisa que não passar um longo tempo debaixo da torrente,até seus dedos ficarem engilhados e ela começar a sentir o nariz entupido.Era uma idéia insana, mas apareceu como a melhor que ela tivera em vários dias.


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POV Draco Malfoy (n/a:eu tenho pouquíssima experiência com DH’s (só leio um,na verdade),e menos ainda com POV’s do Draco.Então desculpem qualquer coisa a partir daqui).


Melancolia.Tristeza.Abatimento.Consternação.Aflição.Mágoa.


E,o pior de tudo,solidão.Um imenso vazio no lugar onde deveria estar localizado seu coração.


Não deveria ser assim,devia?Afinal de contas,não fora assim que ele programara.Era pra ser só mais uma.Então por que diabos ela continuava em seus pensamentos?Ela não era diferente das outras.Pelo menos,no começo,era o que ele pensava.Estava agora considerando reformular a sua opinião.Havia alguma coisa nela,alguma coisa diferente,especial.Ia contra todos os seus princípios básicos admitir esse fato,mas alguma coisa nela mexia com ele.


No começo,achava que fosse só o fato de ser uma coisa diferente e “proibida”.Não no sentido literal da palavra,mas era no mínimo estranho Draco Malfoy ter se envolvido com alguém que não passava em nenhum dos “testes de sangue” da família.Que,por sinal,nem sonhava com essa pequena aventura do garoto.Não seria uma situação que ele não pudesse controlar caso alguém viesse a saber de alguma coisa,mas ele preferia muito mais que aquilo continuasse na surdina.Já estava tudo enterrado afinal de contas.


Era besteira da sua cabeça pensar que ainda havia resquícios de alguma coisa,qualquer que fosse ela.Porque não havia.Não podia haver.


Não havia motivo para ele continuar comparando-a a todas as garotas com quem ficara desde então. Talvez alguma espécie de trauma ou paranóia.Ele não era o tipo de pessoa que ficava remoendo lembranças.Afinal,não havia reparação.Nenhum meio de voltar atrás.Era apenas pedir para ficar frustrado.Mas ele também não podia ir contra a realidade dos fatos e dizer que não sentira nada quando,bem da verdade,fora uma coisa nova para ele.Qual é,mesmo Draco Malfoy tem sentimentos e emoções.Mas admitia que masoquismo não era uma delas.Não gostava de sofrer.E,pior que isso,não admitia sofrer por uma garota.Elas que fizessem isso por ele.


Talvez fosse esse o motivo dele se sentir tão estranhamente atraído por ela. No começo,ela absolutamente não se importava.Fora como uma aposta contra si mesmo,algo como “consigo fazer a sangue-ruim da Granger se apaixonar por mim em X dias”.O problema só começara quando ele se viu na complicada situação de dar o fora na castanha.


Remexeram-se mais uma vez, impaciente, na cama king-size situada exatamente no meio do quarto. As tapeçarias cintilavam em verde e prata, e ele estava literalmente jogado em cima dos incontáveis travesseiros fofos e almofadas felpudas que havia na cama. Examinou ao seu redor,parecendo notar algo de diferente com o ambiente.Em outras épocas,coisas aconteceram naquele quarto.Era irônico pensar que,antes,ele perdia a conta de quantas eram. Uma garota diferente a cada dia, se ele quisesse. Era só jogar um pouco de charme e,se ele chamasse-a pra se jogar da ponte ou algo do gênero,a idiota aceitaria sem hesitar por um milésimo de segundo.


Não podia continuar desse jeito, não mesmo. Tinha que colocar um ponto final em tudo aquilo, e tinha que fazer isso urgentemente.Saltou da cama como se tivesse levado um choque, decidido.Não iria mais,de jeito nenhum,dirigir pensamentos ou palavras à sangue-ruim. A não ser que fossem provocações ou atestações de quanto ela era imunda e o Potter era patético e o Weasley era idiota. Abriu o guarda-roupa e vestiu a primeira roupa que pegou.não precisava ser um gênio pra saber que ficaria perfeito – mesmo que vestisse algo que misturasse estampas de animais,bolinhas,listras,polígonos,xadrezes e penas.Saiu do quarto,tendo o cuidado de trancar a porta,e se dirigiu à sala comunal,àquela hora apinhada de gente.


Sentiu-se reconfortado ao olhar para as paredes de pedra, agora um pouco úmidas e com pontinhos quase invisíveis de lodo. Na lareira,também de pedra esculpida,crepitava um fogo vívido,mas,ao mesmo tempo,bruxuleante.O ambiente estava pouco iluminado,porém com uma temperatura amena.Havia algumas pessoas ali,e ele conhecia todas.Reformulando a frase, ele sabia os podres de todas.Pansy Parkinson,assim que o viu,soltou um gritinho agudo histérico e começou a saltitar como um filhotinho de macaco (n/a:se não deu pra notar,eu odeio a vaca vadia da Pansy do fundo do meu ser),empurrando o outro garoto com quem estava conversando – muito animadamente,por sinal – para que Draco sentasse no sofá.Ali também se encontravam Zabini,Crabbe,Goyle e as irmãs Greengrass,Daphne e Astoria.Apesar da diferença de idade,elas andavam tão juntas que pareciam um ser só.Ambas possuíam grandes olhos azuis opacos,sendo que Daphne tinha os cabelos castanhos enquanto os de Astoria eram de um tom louro-claro meio acinzentado,ambos impecavelmente lisos.


Displicentemente, Draco meio se jogou e meio se sentou no sofá, obviamente, verde. Pelo barulho,dava para notar que uma chuva desgraçada estava açoitando o castelo.Também por isso,a sala comunal parecia um pouco mais sombria que de costume.


Naquele momento, Zabini discursava sobre o porquê de o Lorde das Trevas ainda não ter tomado o Ministério. Incrivelmente entediante.Crabbe murmurava algumas coisas ininteligíveis, talvez em trasgueano.Goyle babava.Daphne e Astoria suspiraram em uníssono quando ele estava prestes a começar outro monólogo de como faria se fosse ele no poder.Pansy revirou os olhos para Draco,que o cortou de imediato:


–Acontece, Zabini, que, graças a Merlin, não é você quem comanda. Não sei o que seria de nós se fosse. E, além disso, o Lorde das Trevas sabe o que faz. O que se passa pela cabeça dele, obviamente,não é de entendimento geral,mas,caso você tenha esquecido,seus planos sempre dão certo.Então,poupe-nos desse discurso.


–E quem é que você pensa que é afinal, Malfoy?A conversa que anda solta por aí é que a sua família tem tanto crédito com o Lorde quanto os traidores do sangue dos Weasley. Não venha falar assim comigo,como se soubesse coisas que eu não sei ou como se estivesse alistado no exército d’Aquele-que-não-deve-ser-nomeado.Não sei nem pra quê ele alistaria alguém completamente despreparado.


Ele quase acrescentou um “como você”, até perceber o olhar que Draco lhe lançava. Todos sabiam, de ler as entrelinhas,que Zabini nutria uma inveja mortal pelos Malfoy,uma vez que Lúcio recusara se casar com sua mãe e,pior,a chamara de “louca oferecida”.Como todo bom sonserino, porém,ele sabia ser cínico,e fingia ser amigo de Draco que,intimamente,ria de quão patético ele ficava,visto que não conseguia esconder sua irritação tão bem como pensava que fazia.Ridículo.


–Posso não saber tudo, Zabini, mas está óbvio que sei muito, muito mais do que você. E olhe que nem é preciso muito esforço para isso – ele terminou a frase com seu melhor sorriso convencido/sarcástico.


Zabini ainda abriu a boca para revidar, mas, no momento exato, sua razão o ordenou que ficasse calado, uma vez que não era vantajoso arrumar briga com Malfoy. Então ele simplesmente se resignou a mudar de assunto e fingir que tinha esquecido.Mas,algum dia,pensou,vai ter troco.

Mesmo estando focado na conversa, Draco não podia deixar de notar que, algumas (leia-se: muitas) vezes, Daphne lançava olhares para ele. E podia jurar que não eram olhares inocentes e aleatórios.Uma idéia começou a aflorar em sua cabeça,e,melhor parte,não era muito difícil botá-la em prática.E ele ainda sairia em vantagem.Juntando o útil ao agradável,ele forçou um longo bocejo:


–Meu Merlin, que tédio. Vou ver se pego alguma coisa na cozinha pra comer.


Fome uma pinóia. Ele simplesmente saiu da masmorra que era a sala comunal e ficou esperando do lado de fora,num dos corredores adjacentes. Sabia que, se tinha interpretado aqueles olhares corretamente, Daphne apareceria ali muito em breve. Então ele escorou-se despojadamente na parede de pedra fria,e esperou.


Não precisou corroer sua paciência. Em poucos minutos,sentiu um leve aroma de colônia feminina,e,quando a garota ia passando pelo corredor por onde estava “escondido”,puxou-a pelo braço,fazendo-a ficar a centímetros de seu rosto.Ela estava ofegante,sua respiração descompassada.Não que isso não fosse normal:ele costumava causar esse efeito nas pessoas do sexo oposto (e até mesmo nos indecisos do mesmo sexo,argh).


–Quer dizer que eu não estou ficando esquizofrênico, afinal de contas – Draco sabia muito bem o efeito que aquela voz rouca proposital causava.


–Malfoy... eu...eu... – primeiro sinal: dificuldade na articulação das palavras.


–Cale a boca. Só isso.


E a puxou num beijo,digamos,caliente. Muito caliente.As mãos dele,em questão de segundos, desceram de sua cintura para a bunda da garota,que sequer deu atenção ao fato.Se ele fosse classificar o beijo – que,na verdade,já começara sendo um amasso ao invés de um beijo – em uma única palavra,ela com certeza seria “pervertido” ou “depravado”.Muito,muito diferente dos beijos que ele costumava dar em uma outra castanha.Aqueles eram calmos e melosos,ou seja, completamente opostos a este.


Mas por que Merlin ele estava pensando na maldita sangue-ruim?


Voltou a focar no beijo, redobrando a intensidade. Podia sentir alguns gemidos ocasionais vindos do fundo da garganta de Daphne,que estavam deixando-o cada vez mais excitado.


O choque de realidade só veio quando ela abriu os olhos.


Quando olhou no fundo daqueles orbes azuis, foi como se o mundo tivesse congelado, para Malfoy. Alguma coisa estava errada.Alguma coisa não batia com a tonalidade daqueles olhos. Reformulando a frase anterior, por que eles não estavam castanho-chocolate, como de costume?


PÁRA TUDO. Como assim,como de costume?Não havia costume nenhum ali. Ele só beijara a sangue-ruim algumas poucas vezes.Então,não havia sentido naquilo tudo.Por que,afinal de contas,ela ainda estava em seus pensamentos,durante todas as horas do dia?Por que não conseguia simplesmente apagá-la de sua memória, como fizera com todas as outras?Por que, do nada, ele começava a ver detalhes do rosto de Hermione?Por que, Merlin, por quê?


Então, como uma luz acendendo em sua cabeça, a resposta veio do nada. Quatro palavras, simples, tão simples, mas às quais ele nunca tinha dado muita importância.Sequer pensara na possibilidade.


Porque ele a amava.


Já vira muitas pessoas apaixonadas. Elas agiam como idiotas,pensavam como idiotas,ficavam idiotas.E,agora,ele se sentia,mais que nunca,um idiota.Mas um idiota realizado.Descobrira, afinal de contas.Não tinha certeza,porém,do que fazer agora.Não podia simplesmente largar tudo e se envolver com a sangue-ruim.Ou será que podia?Afloraram em sua cabeça as palavras que ouvira de sua mãe, tantas vezes, mas às quais nunca dera o devido crédito. Achava até que era pura baboseira,moral de filmes infantis.Nunca tinham parecido tão relevantes e importantes como agora: “Escute seu coração”.


Do nada, empurrou Daphne, interrompendo bruscamente o beijo. Saiu afobado pelos corredores do castelo,sem sequer se preocupar em dar uma desculpa sobre o porquê de estar largando a garota assim,como se ela fosse descartável.Daphne ainda procurava algum nexo em tudo aquilo,a boca aberta num perfeito “O” de espanto.


Desceu correndo as escadas, pensando em onde Hermione poderia estar. Biblioteca?Salão Comunal?No seu próprio quarto?Por Merlin, onde?


Estava passando, ainda correndo, por uma grande janela que se estendia do chão até o teto de algum dos andares do castelo quando estancou de repente. O que era aquele minúsculo pontinho vermelho,no meio da chuva,nos jardins?Semicerrou os olhos, de modo que pôde focalizar e perceber os cabelos castanhos ensopados.


Tinha que ser ela.


Ao abrir as pesadas portas de carvalho a fim de sair para o jardim, foi açoitado por um vento carregado por uma chuva tão forte que arrepiou todos os cabelos de seu corpo, fazendo-lhe sentir um calafrio. Não deu a mínima para isso,e cruzou a soleira da porta com a cabeça erguida – mesmo que contra a força do vento -,para que pudesse achar o exato ponto do imenso jardim onde ela estava.


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POV Hermione


Sentia-se estranhamente liberta ali. As gotas de chuva,às vezes,caíam com tanta força que chegavam a fazê-la sentir uma pequena dor,mas ela estava pouco se lixando para aquilo. A chuva combinada ao uivar do vento, porém, pareciam, por vezes, gritar o nome de Draco. Ela sentiu suas últimas lágrimas caírem,misturando-se com a chuva,escorrendo e finalmente indo embora.Tudo aquilo clareara seus pensamentos.Ela não iria mais derramar uma lágrima sequer. Era a última promessa que faria a si mesma, visto que estava certa de que não iria quebrá-la. Nunca.


E qual não foi a sua surpresa ao notar um vulto andando em sua direção?O primeiro impulso da castanha foi o deu puxar a varinha; lembrou-se, porém, que estava em Hogwarts. Nada podia acontecer ali.Além do mais,aquela pessoa devia ser no mínimo tão maluca quanto ela,uma vez que também saíra e encarava a chuva,sem um motivo aparente/óbvio.


Seu coração deu um salto ao perceber quem estava ali. Os cabelos molhados pingando,roupas encharcadas,movendo-se com dificuldade contra o vento,os olhos acinzentados brilhando.Não dava, nem que quisesse,para confundir aquela silhueta.


–O que você está fazendo aqui, Malfoy?Virou mania me perseguir, foi?Pelo amor de Merlin, vá embora ficar com seus amiguinhos de sangue puro e me deixe em paz! – a castanha virou-se. Não planejara voltar para o castelo agora, mas também não iria ficar ali embaixo tendo ele por companhia.Resoluta,marchou em direção à entrada.


–Espera,Hermione – ele disse,segurando firme em seu braço – Não entra agora. Eu vim aqui pra te dizer uma coisa,e eu preciso que você escute.Por favor.


Seu braço formigava no local onde ele a segurava, mas ela não sabia se era devido à força dele ou a um simples instinto. Mas,pelas suas palavras,devia ser alguma coisa séria.Muito séria mesmo. Afinal de contas, 1)ele a chamara pelo nome e 2)pedira por favor.O que era aquilo,o fim do mundo? – Você tem um minuto, Malfoy. Porque eu estou me sentindo boazinha hoje. Desembucha logo, o que é?


Ele pigarreou antes de começar, olhando fundo em seus olhos – Eu estava pensando e... Cheguei à conclusão que eu amo você.


Ela riu com escárnio – E você realmente acha que eu vou acreditar nessa sua mentira deslavada de novo?Malfoy, você já tentou isso comigo antes, e, caso esteja esquecido, não funcionou. Deixe de ser ridículo e me solta.


–É porque, da outra vez, não era verdade. Eu falei aquilo porque foi a primeira coisa que me veio à cabeça.Mas agora,eu juro pela alma da minha mãe,Hermione,é a mais pura verdade.


Ela ficou sem reação. Primeiro,pensou que poderia ser um truque.Mais um.Que,a qualquer momento,os alunos da Sonserina iam sair de detrás dos arbustos,rindo escandalosamente da cara dela.Mas uma pequeníssima parte do seu ser queria acreditar que aquilo era verdade. Afinal, aquela era a declaração que ela sempre esperara. O único problema é que não sabia se podia confiar,de novo,nele.Era risco demais.


–E por que, afinal de contas, eu devia acreditar em você?Você já disse isso um monte de vezes, e, em todas elas, acabou me machucando. muito,por sinal.Por que eu devia admitir que, dessa vez,você está falando sério?Não sou idiota, Draco.


Um sorriso fraco apareceu no rosto dele – Draco. Você me chamou de Draco.Não de Malfoy.


Ela ficou sem resposta. Não podia acreditar que cometera aquele erro.Ah,Merlin!


–Bom, eu também não acreditaria em mim. Na verdade,eu achava isso tudo uma grande baboseira até uma hora atrás.O problema é que eu não conseguia me conformar com o fato de que eu não conseguia parar de pensar em você.Era como uma doença ou uma paranóia. Eu ficava te vendo por todo lado, ou vindo a sua voz, sentindo seu perfume... Mas você não estava lá. Eu comecei a achar que estava ficando louco ou algo do gênero. Meu inconsciente comparava todas as garotas a você,e todas elas,se exceção,falharam miseravelmente na comparação.É loucura,eu sei – ele completou quando ela abriu a boca para responder – e uma completa insanidade,mas...acho,ou melhor,tenho certeza que amo você.Não quero te perder outra vez, Hermione.Por favor,não.


Ela desviou os olhos dos dele antes de responder. Tinha certeza que não conseguiria formular uma frase com nexo diante do olhar penetrante dele -De todos os medos que eu imaginei que você tivesse, o medo de me perder foi o que eu mais desejei que fosse real. Mas você nunca teve. Sempre me tratou como lixo,e eu,de idiota,não percebia.Você sempre dizia aquelas coisas que machucavam,e de propósito.E isso não é nada mais que crueldade,simples e pura.Todos os seus joguinhos, o seu maldito orgulho por ter o sangue puro.Não quero e não vou passar por tudo aquilo de novo,Malfoy.Vê se entende dessa vez,ou eu vou precisar desenhar.


–Aquele não era eu – ele desabafou desesperado – Pelo menos, eu realmente espero que não seja. É nojento.


–Então você está querendo me dizer – e ela, sem nenhum pudor, puxou a manga esquerda das vestes do garoto, expondo a terrível marca que se opunha fortemente à sua pele alva – Que isso não é quem você é?Poupe-me, Malfoy!Você fez sua escolha, eu fiz a minha, e tenho total e absoluta certeza que ela não envolve matar e torturar pessoas.


–Mas eu não quis!Ele me obrigou! – chegara a tão temida hora. Era sua última chance.Teria que expor para ela o quanto era fraco e facilmente manipulável.Não havia outro jeito.Engoliu em seco e continuou – Você não tem idéia do quanto ele pode ser cruel,se quiser.Eu ouvi os gritos do meu pai,vi ele se encolher quando Aquele-que-não-deve-ser-nomeado lhe repreendeu por uma pequena falha.Ele disse que meu pai era um imprestável,inútil,que não sabia onde estava sua lealdade – outro fungado – Ele ameaçou minha mãe.E disse que eu podia reparar isso,se me alistasse e fizesse o que ele pedia.Eu vi o olhar de desespero da minha mãe,mas não havia outra saída.Ela podia morrer.E agora eu estou condenado pra sempre,com essa marca no braço! – ele puxou de volta a manga, a fúria latente e expressa no ato.


–Eu... não sabia - se o que ele queria era fazê-la sentir pena,conseguira.


–Ninguém sabia. Eu não posso ser fraco,e dizer isso é mostrar minha fraqueza.Mas também não podia deixar minha mãe ser torturada até a morte.


–Eu... – ela começou, muito embora não fizesse a mínima idéia do que iria dizer.


–Por favor, Hermione – ele segurou seu rosto entre as mãos, afastando gentilmente os fios de cabelo que pregavam em sua pele e encarando-a fixa e desesperadamente – Acredite em mim. Salve-me de tudo isso, Hermione. Por favor.


Aquele beijo foi como uma chama ardente e inapagável em meio a um temporal. Ela sabia,era verdade.Eles eram assim,como o fogo e a chuva.Num primeiro momento,não seria possível imaginá-los coexistindo em equilíbrio,mas,quando acontecia,era uma coisa maravilhosa de se ver.Eles estavam juntos,eles se completavam perfeitamente.no final,tudo ia dar certo.


E isso era o que importava, afinal de contas.



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Notas finais do capítulo

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