Signal Fire escrita por Fernanda Redfield


Capítulo 32
Tempos e sentimentos distintos


Notas iniciais do capítulo

Boa madrugada aos cheios de insônia!

Como vocês estão?
Eu estou bem, um pouco receosa com esse capítulo... Mas, vou esperar pela opinião de vocês antes de qualquer discurso!

As músicas desse capítulo são "Run" (Snow Patrol), "Secret Love Song Pt. II" (Little Mix) e "Hold Back The River" (James Bay).

Espero que gostem!



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New York se fazia ver imponente e iluminada através das janelas do avião. Os membros do New Directions que estavam mais próximos uns dos outros começaram a cochichar excitados e sorridentes, outros, acordavam seus companheiros que haviam dormido durante o voo. Existia uma energia favorável, boa e leve ocupando o ambiente fechado do avião, sorrisos companheiros se percebiam em meio a passageiros diversos e olhares conhecidos se encontravam... Encontravam-se e repeliam-se.

Christine não estava com os olhos nas janelas, até porque, estava sentada na poltrona do corredor. Por isso, seus olhos claros estavam nublados, tanto pelo cansaço quanto pela melancolia que era sua mais fiel companheira desde que negara Claire. E, ainda negando-a, Christine a procurou naquele instante em que tudo ao redor delas revestia-se de calor e felicidade... Christine a procurou e foi repelida, viu quando os olhos escuros de Claire enxergaram os seus, observou o sorriso radiante dela minguar nos lábios que tantas vezes beijara e, principalmente, sentiu a rejeição atingi-la e engoli-la.

O que sentia não precisava ser explicado por Claire, a morena era feita de sentimentos - tão diferente da própria Christine que sempre trajava o bom senso e a racionalidade - e tudo que ela fazia revelava muito do que ela sentia. E Christine não sabia conviver com a hipótese de que Claire não enxergava nada além da decepção, não conseguia mais ignorar o fato de que o que os outros pensavam deixara de ser importante no instante em que Claire lhe deu adeus... Chris não conseguia conviver com o peso de suas decisões erradas e de sua mentalidade presa à razão.

Ela queria sentir, ela queria o real.

Ela queria Claire.

O avião aterrissava e taxiava pela pista, Christine tinha os olhos em suas mãos apertadas uma contra a outra numa tentativa sem sucesso de disfarçar o tremor que estava sempre presente desde que outra mão deixou de lhe segurar. Naquele instante, nessa mesma cidade, talvez, Rachel Berry estivesse passando pelo mesmo que ela... A incapacidade de viver com o que escolhera e com o que achara ser necessário. As duas achavam que podiam viver de pouco depois que experimentaram o muito, achavam que poderiam viver do que haviam sido no passado quando os seus presentes tinham sido tão brutal e intensamente mudados por duas pessoas que o seu futuro exigia as presenças.

Miss Berry também achara que poderia viver de si depois de voltar a ser quem era junto a Miss Fabray e Christine achara que poderia voltar caminhar sozinha quando Claire a transformara a ponto de transformá-la dependente... De amor, de companheirismo, de verdades e de infinitos.

Christine voltou a olhar para Claire - que estava algumas poltronas a sua esquerda, sentada à janela com Arthur risonho ao seu lado, os dois pareciam ter feito as pazes -, a morena também tinha a cabeça baixa e suspirava. A loira não conseguiu tirar os olhos dela até que o avião finalmente terminasse a aterrissagem e a voz do comandante soasse nos auto-falantes.

Jamais tivera a chance e a coragem de dizer a Claire que ela era maravilhosa, a garota mais bonita que conhecera, por dentro e por fora. Christine, na verdade, gostaria de ter gritado que amava e era retribuída pela garota mais perfeita do universo... Entretanto, teve medo de gritar alto demais e ver tudo que tinham se esfarelar em suas mãos e teve um pavor ainda maior de ser julgada pelo que sentia. Christine podia saber que amava, mas, por maiores que fossem seu orgulho e seu amor por Claire, algo dentro dela fraquejou. E a loira a negou, negou a sua felicidade e, no mesmo ato, o seu amor. Não somente o amor por Claire e sim, por si.

A palavra “não” tirou muito de Christine e agora, enquanto ela observava Claire, tudo que ela queria era ter dito “sim”. Ela só soube as conseqüências de suas palavras quando Claire saiu de sua vida e outras pessoas, indesejáveis, voltaram a sua vida. Christine não queria os parentes de seus pais, muito menos, os de sua mãe. Ela queria somente Claire, apenas a pequena era capaz de satisfazer todas as ânsias de seu coração e todas as necessidades de sua alma. Claire era dona de seu querer, do seu ser e de tudo que a compunha.

Parecia absurdo que algo tão intenso surgisse com duas pessoas de tão pouca idade... Mas, tudo que Christine queria agora era poder fazer tudo que negara a Claire. Queria que a pequena morena sentisse orgulho dela, da mesma forma que sentira quando finalmente admitira o que sentia em relação ao aborto, aos seus pais e, essencialmente, à própria Claire.

Christine não queria aquele olhar cheio de melancolia e tristeza, ela queria o brilho caloroso e aconchegante. O brilho que a guiava dentro da sua própria escuridão.

Ao redor da ex-cheerio, os demais passageiros começaram a se levantar. Arthur não fez por maldade quando tirou apenas a própria bagagem de mão do compartimento acima das poltronas, ele estava muito excitado, falando alto com Ryan para perceber. Porém, Christine enxergou Claire franzir a testa para ele e cruzar os braços, antes de bufar e erguer-se na ponta dos pés para tentar alcançar a sua própria bagagem de mão.

Christine não conseguiu não sorrir para aquela cena, a morena não era alta enquanto a estatura da loira era suficiente. Por isso, a ex-cheerio apanhou a sua própria bagagem e atravessou o corredor, chegando atrás de Claire, ainda na ponta dos pés. Enquanto também se esforçava para apanhar a bagagem da pequena, a frente do corpo de Christine encontrou-se com as costas de Claire. A onda elétrica foi inevitável e o afastamento provocado por passos apressados de Claire trouxe tristeza ao rosto de Christine.

Depois de dias, horas e minutos, os olhos escuros finalmente voltaram a encontrar os olhos claros. Christine engoliu em seco porque, próxima a Claire, ela enxergou além da decepção e foi surpreendida pela raiva e pela frustração, a morena a acusava com os olhos... E o afastamento, não somente físico como, também, emocional, era a pena imposta às duas. Claire não esperou que Christine estendesse a alça de sua bagagem de mão, apanhou-a rudemente e grunhiu desconfortável:

— Obrigada, não precisava.

— Não é como se você fosse alcançar. - Christine respondeu envergonhada, conseguindo sorrir através do temor e, principalmente, da dor. Doía ser a razão de todos aqueles sentimentos desagradáveis dentro dos olhos de Claire e machucava ainda mais ser a causa de toda a desilusão que ela assumira para viver. Naquele momento, a loira quis poder voltar ao passado e dizer as palavras certas, não apenas para si, como para Claire. Mais do que um coração, Christine destruíra os sonhos da pequena.

Claire poderia parecer intransponível e inalcançável, mas, ela não se sentia daquela forma. Diferentemente de Miss Berry, essa morena ainda não dominava a arte de não sentir e, muito menos, o ato de abandonar. A distância entre ela e Christine era enorme, só que ainda não existia um abismo entre elas, o fim sentenciado a esse casal parecia menos crível do que o causado ao outro casal. De alguma forma, parecia ainda existir uma chance para Claire e Christine.

Ou, talvez, fosse apenas a esperança de Claire gritando agressivamente contra sua razão e acordando o sentimento que habitava seu peito.

A morena não sabia a resposta para aquela frágil chama que ainda queimava dentro de si, sequer procurava entendê-la. Porque, assim como aquela chama queimava, ela também ardia e machucava... Mesmo que seu coração sentisse, sua cabeça também se lembrava de muito. Da negação de Christine, do fim que ela sentenciara sem sequer dar-lhe uma chance de tentar. O egoísmo da loira que amava batalhava contra tudo que fizera Claire se apaixonar por ela.

E aquela guerra, naquele momento, não tinha vencedores. Claire encontrava-se acuada pelos seus sentimentos e sua razão, sem saber para onde fugir e apenas agarrando-se às asas de seus sonhos, estes que nunca a decepcionavam porque dependiam apenas de seus esforços. Claire também usava do egoísmo para continuar distante e permaneceria daquela forma porque a dor, infelizmente, ardia mais que a chama e cegava mais do que o fogo iluminava. Ela precisava distanciar-se, ainda que não soubesse abandonar.

— E não é como se eu ainda precisava de você para me alcançar as coisas mais altas, Chris... Eu acho que posso me virar sozinha. - A voz de Claire soou diferente de tudo que Christine escutara a partir dela, a vivacidade dera lugar à regularidade, a morena soava tão comum sendo que era tão especial... Mais uma vez, a ex-cheerio sentiu o peso de suas ações e as conseqüências do que infligira a Claire. De certa forma, assassinara e drenara a melhor parte dela, como um parasita sedento. - Só... Só vamos agüentar esse final de semana, ok? Depois, vamos nos formar e tudo que tivemos vai ficar oficialmente no passado.

— E se eu não quiser que tudo fique no passado? - A pergunta veio em forma de um sussurro porque Christine temia fazê-la, temia a resposta que viria de Claire. Os olhos claros não fraquejaram quando os escuros a encararam, dessa vez, curiosos.

Porém, a calmaria por parte da morena durou por pouco tempo, Claire passou por Christine e esta se virou para olhá-la, esperando pela resposta que poderia despedaçar tudo em que se agarrara naqueles últimos dias. Um sorriso entrou em cena e surpreender a loira, não o seu sorriso e sim, um novo... O sorriso triste, decepcionado e, principalmente, desesperançoso. Os olhos escuros brilharam e Claire levou a mão direita ao rosto, secando um tímido filete úmido. A morena respirou fundo e, ainda sorrindo, sussurrou:

— É tarde para isso, não acha?

Christine foi deixada para trás com algo ainda pior do que o arranhão sentido da primeira vez. O arranhão lhe revelara a dor que, por sua vez, foi a sua forma de entender que jamais esqueceria Claire. Mas, aquela pergunta revelara uma verdade que Christine circundou, jamais enfrentou e recusou-se a aceitar até então.

A verdade de que Claire já estava no caminho para esquecê-la.

A dor que Christine sentiu ali, naquele instante, foi maior do que a sentida antes, tanta que a cegou e ela teve que apoiar-se em uma das poltronas ao seu redor para manter-se em pé. Uma dor pior do que o olhar decepcionado ou a distância, esta dor tornava o pior realidade e a fazia se questionar se, o que estava disposta a fazer, valia a pena...

Entretanto, esse questionamento não durou por muito tempo. Porque Claire valia à pena e Christine precisava deixá-la ir com, pelo menos, a certeza de que ela soubesse o que sentia de verdade.

E que isso não era vergonha e sim, amor.

# # # # #

Quinn não conseguira dormir desde que chegara a New York, aquela cidade lhe tirava o sono e o que ela representava lhe tirava o controle. Diferentemente da primeira vez que estivera na metrópole, Quinn não se deixou seduzir pelas luzes ou pela sensação de poderio que New York inspirava. A professora sentia-se sufocada pelos prédios, o trânsito, os nova-iorquinos, a Broadway... Estar na mesma cidade que Rachel sem saber onde ela estava a incomodava e tirava-lhe o sono.

Por mais que se esforçara para não pensar na morena desde que conversara com Santana, não era nada fácil manter a sua cabeça longe de Rachel quando estava dividindo a mesma cidade com ela naquele final de semana. Tampouco, os seus sentimentos. Estes estavam diminutos dentro de si, quase calados e assim se mantinham, por mais que estivessem arranhando a superfície de seu autocontrole. Desde que se comprometera a esquecer Rachel, Quinn nunca os sentira tão descontrolados e tão inquietos... A proximidade, ainda que não fosse física, estava enlouquecendo-a.

Não se sentia uma boa professora, tampouco, uma treinadora suficiente para levar o New Directions ao primeiro campeonato nacional em anos... Mas, ali estava ela, em frente aos seus alunos, observando-os nervosos enquanto ela mesma lutava contra o sono, a irritação e contra o seu coração partido. Poderia ter se revestido de uma frieza e insensibilidade superficiais, mas, o seu interior ainda pulsava pela hipótese de encontrar Rachel em alguma esquina ou, até mesmo, naquele teatro em NYADA.

Aquela incerteza e, principalmente, essa esperança de encontrar Rachel incomodavam mais do que qualquer coisa que pudesse sentir naquele instante.

Quinn rangeu os dentes, era inadmissível que Rachel ainda representasse algo para si depois de algum tempo e do que fizera. Compreendia tudo o que levava Rachel de volta para àquela cidade, entretanto, essa compreensão não queria dizer que aceitava e que não se importava. Santana mostrara a ela que precisava se importar, que precisava se amar antes de se entregar tão cegamente a Rachel... Aquela devoção não precisava ser inconsequente e por isso Quinn se esforçara para dar razão a todo assunto relacionado a Rachel.

Só que aquela angústia, que poderia muito bem ser traduzida para saudade, sentida desde que pisara em New York era inexplicável e Quinn não queria entendê-la e, muito menos, senti-la.

Tudo que queria era um segundo de sua vida sem pensar em Rachel Berry e em tudo que sentia em relação a ela. E fazer isso em Lima era fácil, porque a morena deixara aquela cidade para trás... Agora, New York era onde Rachel estava e, desde que ela partira, Quinn nunca se sentira tão próxima.

E a proximidade estava sufocando-a, maltratando-a, torturando-a...

— Muito bem, garotos, aproximem-se! - Quinn vociferou animada, tentando colocar o melhor de seus sorrisos em seus lábios e batendo palmas, chamando os garotos para próximos de si. Eles se aproximaram lentamente, cheios de caretas de desânimo e nervosismo, trêmulos da cabeça aos pés e pálidos como papel. Quinn olhou um por um, tentando deixar seus olhos falarem as palavras que ela estava momentaneamente incapaz de dizer e, quando seus olhos chegaram por último em Claire, sua expressão contorceu-se em dúvida. - Onde está Christine?

— Ela disse que precisava resolver um problema de última hora. - Richard respondeu inquieto, ajeitando os cabelos, ele não parecia ter achado a atitude da colega suspeita, mas, Quinn franziu a sobrancelha instantaneamente. Christine não era de deixar problemas para o último instante, muito menos, se atrasava... Ela fora a head cheerio antes de tudo acontecer e Sylvester não tolerava que suas capitãs fossem desleixadas com os próprios compromissos.

— Da última vez que eu a vi, ela corria para a mesa de som. Deve ser algo relacionado com o solo dela, logo ela estará aqui... - Arthur respondeu apaziguador e Quinn notou que ele colocara as mãos nos bolsos da calça social preta que usava. Claire sorriu para ele e mandou-o agachar para ajeitar a gravata lilás que ele e todos os garotos usavam, a morena ainda ajeitou o tecido da camisa social também preta. - Não precisa se preocupar, Miss Fabray.

Essa última fala de Arthur deixou Quinn ainda mais desconfiada. A forma como ele estivera próximo de Claire desde que chegaram à cidade e o fato de ele explicar mais do que deveria sobre as atitudes de Christine apenas deixavam claro que ele sabia algo e que não estava disposto a revelar. Quinn semicerrou os olhos para o seu aluno, ameaçadora e inquisitiva, Arthur sabiamente desviou os olhos e fez alguma piada a respeito do cabelo de Claire naquela noite.

Nesse momento, a porta do camarim voltou a se abrir e todos se viraram para quem chegara. Christine tinha um sorriso extasiado nos lábios enquanto ajeitava os cabelos longos e enrolados nas pontas e, depois, amaciava o tecido lilás do vestido. Mellody acenou para ela e Christine aproximou-se, a colega ajeitou a faixa preta em sua cintura e Christine disse ofegante:

— Mil perdões, Miss Fabray. Aparentemente, alguém da equipe do som passou a cifra errada do meu solo à banda e eu estava corrigindo esse mal entendido.

— Por que não pediu a Claire ou a Arthur que resolvessem? Os dois são os capitães, afinal... - Quinn inquiriu impaciente, deixando que o péssimo humor que escondera nos últimos dois dias viesse um pouco à tona. Além disso, ela tinha se irritado profundamente com Christine por tudo que relacionara a garota, Claire e Yale. Repreendia-se mentalmente por descontar tudo em sua aluna, mas, Christine não parecia deixar-se ofender por seu tom ou suas palavras, ela continuou a sorrir e respondeu radiante:

— Eles eram necessários, no camarim, caso algo desse errado com o figurino ou com algum dos outros membros. Além do mais, eu conversei com Arthur antes de resolver tudo, ele estava ciente...

Christine olhou para Arthur que, sendo pego de surpresa, agitou a cabeça afirmativamente de forma frenética que só aumentou ainda mais a suspeita de Quinn. Claire olhou do co-capitão para Christine e cruzou os braços, irritada. Não havia mais tempo para aquilo, a primeira luz preparatória já se acendera e Quinn tinha pouco menos de dez minutos para dizer algo para seus alunos. A professora pigarreou e o grupo voltou a se reunir, todos se abraçaram e ela respirou fundo, antes de começar:

— Eu realmente não sou a pessoa mais indicada para dizer algo nesse momento. Na minha época de New Directions, eu era a que ficava calada e sorria o tempo todo enquanto Mr. Schuester falava sem parar... Eu não sei fazer discursos motivacionais, então, me perdoem por qualquer palavra mal empregada.

A falta de jeito de Quinn provocou risadas contidas no grupo e até mesmo deu um pouco mais de tranqüilidade a ela. Os olhos de cada um deles refletiam o nervosismo e, também, a esperança de serem bastante bons para levarem aquele título para Lima. O New Directions daquele ano era tão ou mais desajeitado que o último grupo do McKinley, que vencera aquele título há anos. Eram um grupo disforme, diferenciado e, acima de tudo, especial.

Afinal, Quinn os acompanhara de perto para saber as mudanças cataclísmicas que o Glee provocara em cada garoto e garota naquele camarim. Ela vira, através dos olhos de Will e, até mesmo, de Rachel, o quanto a música transformara as vidas de cada um. Muitos que estavam presentes talvez não admitissem que o Glee era a melhor parte dos seus dias, mas, Quinn sabia.

A professora sabia por que o brilho nos olhos de cada um de seus alunos era o mesmo que ela, um dia, surpreendera em seus próprios olhos quando se olhou no espelho pela última vez antes daquelas Nationals. Era o brilho de quem amava o que vinha para fazer, o brilho daqueles que se divertiam e que riam enquanto colocavam um pouco de si em cada música que cantavam.

A música tinha o poder de tornar qualquer coisa especial. Ela apaziguava mentes inquietas, reconstruía corações partidos, colocava sorrisos em rostos chorosos... A música fazia acreditar, mudar, transpor, amar e, até mesmo, emocionar.

A música era tão de Rachel que Quinn jamais pensara nela daquela forma, porém, as palavras eram suas, muito antes de se tornar professora. Como dissera antes, Quinn fora a garota calada que lia o tempo todo entre as lições do Glee... Na época em que cantava, Rachel até mesmo cobrara uma participação maior de sua no coral. Porém, a loira jamais dissera que aquela era a sua maior participação. Quando se permitia ler na frente de todos os seus companheiros de Glee, ela mostrava a eles uma parte de si que se escondia nas saias, nas piruetas, nos slushies...

As palavras eram especiais para Quinn assim como a música era para Rachel. E, talvez, por uma viver de livros e a outra, de melodia, não tivessem dado certo...

De qualquer forma, estar no Glee era fazer parte de algo muito especial e era aquilo que Quinn queria que cada um sentisse. E eles sentiam. O nervosismo de cada um entregava o sentimento de felicidade que os preenchia, porque só ficava nervoso quem temia não ser sentido através do que fazia. Quinn apertou seus alunos mais próximos de si e riu roucamente, algumas lágrimas embaçavam sua visão e ela, emocionada, continuou:

— O que vocês precisam saber, nesse instante, é que vocês são bons. Na verdade, ótimos. Se não fossem ótimos, não teriam chego até aqui e nem estariam enfrentando os melhores corais do país. Sei que a classificação de vocês não foi como esperavam e também sei que essas Nationals não estão como imaginavam... Mas, nada deu muito certo no New Directions, isso é uma sina que vem desde o meu ano. Porém, eu também nunca tinha visto um grupo tão talentoso desde então. Vocês podem ser excelentes e ganharem esse título... Mas, muito mais que isso, eu quero que vocês se divirtam e se esforcem para mostrar quem são para a plateia lá fora. Eles não acreditam em vocês, então, mostrem a eles! Eu quero que deem o melhor de vocês naquele palco e deixem os juízes decidirem se vocês são os melhores do país, certo?!

Conforme Quinn falava, as expressões se endureciam concentradas e os sorrisos explosivos brotavam nos lábios dos componentes do New Directions. Quando ela terminou, a maioria gritou e eles bateram palmas. Um por um, eles se abraçaram - exceto Christine e Claire que se cumprimentaram de longe - e, quando a terceira luz se acendeu, eles correram para se posicionarem no palco.

Quinn deixou que algumas lágrimas caíssem e as limpou enquanto caminhava até o seu lugar na platéia. O teatro já estava escuro e os espectadores, aos poucos, voltavam aos seus lugares e se silenciavam. A professora olhou ao seu redor e, imersa na escuridão e no silêncio que começava a se fazer presente no ambiente, ela novamente se sentiu próxima de Rachel.

Daquela vez, surpreendentemente, não se sentiu sufocada. Aquele momento era da morena e representá-la era assustador ao mesmo tempo em que também era acolhedor. Uma podia pertencer a New York e a música enquanto a outra pertencia às letras e a Lima... Porém, tratando-se daqueles garotos que estavam posicionados por detrás das cortinas, elas sempre caminharam na mesma direção.

Quinn, no fundo da sua mente e na profundidade de seus sentimentos, perguntou-se se o mesmo não podia ter ocorrido em relação ao que sentiam uma pela outra e, essencialmente, Quinn perguntou-se se não poderiam ter sonhado na mesma freqüência assim como se amavam na mesma intensidade.

Talvez, a sensação de proximidade era mais real do que Quinn esperava ser. Rachel Berry chegara a pouco no teatro, mas, não conseguira chegar aos camarins assim como não conseguira ver Quinn em canto algum. As luzes se apagaram e o desespero da morena aumentou, na verdade, triplicou porque alguém a puxou para o hall de entrada do teatro. A morena se debateu e, quando conseguiu visualizar quem a segurava, paralisou.

Finn Hudson a olhava duro, as feições contorcidas em seriedade. Rachel não abaixou o olhar para ele, assim como fizeram ao deixá-lo sozinho no restaurante. Ele a soltou e a morena desamassou o tecido de suas roupas antes de vociferar:

— O que você está fazendo aqui?

— Eu é que lhe pergunto, Rachel! - Finn manteve o tom de voz baixo, mas, essa atitude não escondia a fúria que latejava por todo o seu corpo. Ele ainda remoía a negativa de Rachel e não estava disposto a aceitá-la com tanta facilidade, na verdade, o que motivava suas atitudes tratava-se muito mais do seu medo de perdê-la de novo do que qualquer indignação pelo que Rachel podia sentir por Quinn. - Você acha que vai correr de volta para ela e ela vai lhe aceitar?

— Honestamente? Eu tenho certeza que não, mas, não custa tentar... Ainda mais, porque eu não tentei quando a deixei em Lima! - Rachel fora intensa em suas palavras, era como se todos os seus sentimentos falassem por si e seu cérebro apenas se encarregasse de iniciar os comandos para que ela pudesse transformar os seus sentimentos em palavras.

Mais do que isso, era o amor quem falava e, principalmente, a esperança.

I’ll sing it one last time for you

Then we really have to go

You’ve been the only thing that’s right

In all I’ve done

 

And I can barely look at you

But every single time I do

I know we’ll make it anywhere

Away from here

Finn encontrou algo dentro dos olhos de Rachel, algo que ele jamais vira dentro dos olhos dela, nem mesmo quando ela dizia que o amava. Dentro daquela profundeza castanha que ele conhecia tão bem, residia a fagulha de algo que já queimara tão intensamente a ponto de manter-se vivo depois de tanta mágoa.

A morena não escondia que seus olhos refletiam a sua alma e que ela revestira-se de coragem para chegar ao teatro. Ela estava disposta a entregar o que restara de si a Quinn, estava comprometida a dar seu coração para a loira e não se surpreenderia se, daquela vez, era o quebrasse... Honestamente, ela já estava quebrada porque tudo o que fizera a Quinn ecoava dentro de si.

Rachel sentia-se parte dela e esperava que Quinn não tivesse destruído o pedaço que costumara ocupar. Ela tinha esperanças de que a loira pudesse perdoá-la, ainda que, racionalmente, sabia que não havia muito lugar para o perdão dentro de tudo o que fizera.

Porém, Rachel sempre fora uma garota que viveu através dos seus sonhos... E, o único sonho que fazia sentido, naquele momento, era aquele que tinha com Quinn. E não conseguia sonhar muito longe sem ela, não sabia diferenciar quais eram os seus sonhos e quais eram os dela.

Através das paredes, a voz de Arthur ecoava poderosa na música. O coração de Rachel se acelerou enquanto a insistência de Finn fraquejava. A morena virou o corpo em direção à música que não somente ecoava através das paredes como, também, a partir de seu coração... As palavras que queria e, talvez, não pudesse dizer a Quinn.

— Nós dois sabemos que vai ser difícil... Então, por que insistir nessa probabilidade e não na certeza dos seus sonhos? - A voz de Finn se fez presente através da melodia e, por mais que ele tivesse sido um excelente cantor, ela soou fora de lugar. A voz dele era cheia de decepção, medo e temor. Tudo o que Rachel não queria sentir. A morena voltou-se para ele e seus olhos castanhos não mais resistiam com fagulhas e sim, queimavam, ela sorriu para ele e murmurou:

— Eu não posso sonhar sem ela. Ela é a dona dos meus sonhos, Finn... Ela me tem, de todo e por completo. Eu a amo!

Light up, light up

As if you had a choice

Even if you cannot hear my voice

I’ll be right beside you dear

 

Louder, louder

And we’ll run for our lives

I can hardly speak I understand

Why you can’t raise your voice to say 

— Rachel... - Finn a chamou como se quisesse tirá-la daquele cenário.

Na verdade, ele não sabia mais o que fazer. Ele precisava admitir que perdera Rachel para sempre. Ou, talvez, devesse ser mais sincero e assumir que ela, de fato, nunca fora sua.

Mesmo no passado, o melhor de Rachel sempre esteve destinado a Quinn e, naquele futuro confuso e conflituoso que todos eles - incluindo Kurt, Karofsky, Sam, Santana e Puck - passavam, o melhor de Rachel ainda pertencia a ela. O que Rachel tinha de mais especial e de mais maravilhoso era justamente aquele brilho nos olhos, ganancioso e flamejante, que refletia o que o coração dela desejava com mais intensidade.

E a morena não escondia esse brilho quando falava de Quinn e da necessidade que possuía de ainda lutar, mais uma vez, pela loira. Talvez, Rachel tivesse entregado o pior de si para Quinn em um péssimo momento, mas, aquela disposição dela, de tentar mais uma vez e, provavelmente, se machucar mais uma vez, era invencível.

Finn entendeu que ele nunca teve um lugar na vida de Rachel Berry. Ela jamais estivera disposta a quebrar-se por inteira por ele, assim como jamais se definira por amá-lo. Com ele, Rachel sempre precisava de mais e com Quinn, ela sempre tivera o que precisava e estava satisfeita.

Rachel não mais queria New York e Finn não deveria ter lhe oferecido os sonhos quando tudo o que ela queria era o amor.

O rapaz voltou os olhos para Rachel, ela estava novamente imersa na música. Finn suspirou e, contido, sussurrou:

— Espero que não se machuque.

— Eu nunca estive mais machucada como eu estou agora... Só que, talvez, eu deva me machucar mais um pouco para voltar a merecer o que eu tinha. - Rachel também sussurrou como se essas palavras fossem uma verdade proibida para ela. Finn sorriu de lado para a morena, o sorriso dele que dizia “vai ficar tudo bem”, o sorriso que lhe dera esperanças no passado. Ele se aproximou e Rachel recuou um passo, ele franziu a testa, dolorido e segurou-lhe a mão, beijou-a e disse:

— Se cuide, Rachel.

Inacreditavelmente, Finn Hudson lhe deu adeus. E o quaterback mal se virara quando a primeira lágrima rolara em sua bochecha.

Ele era aquele que podia realizar os sonhos de Rachel Berry, mas, deixara de ser aquele por quem o coração dela se acelerava. Sentiu-se, novamente, com 18 anos. Rachel tornou a partir e, dessa vez, ele não mais a veria.

To think I might not see those eyes

Makes it so hard not to cry

And as we say our long goodbye

I nearly do 

Rachel não conseguiu tirar os olhos dele conforme ele caminhava em direção às portas do teatro. Ele parecia ter deixado de ser o homem confiante que se tornara para voltar a ser o garoto inseguro pelo qual ela se apaixonara. Entretanto, Rachel não sentiu nada ao voltar para aquele passado.

Todo o seu corpo, a sua mente e seu coração estavam presos aquele presente, procurando remediar todos os seus erros imperdoáveis. Ela somente conseguia pensar em Quinn e em todos os pecados que deveriam confessar a ela antes de pedir perdão e ousar voltar a amá-la.

É claro que o sentimento jamais mudara em seu coração, apenas se tornara ainda mais intenso conforme os dias se passavam em New York e a certeza de sua péssima escolha se fazia presente em seus choros, em sua insônia e em seus sonhos povoados por Quinn.

Rachel Berry sempre esteve conectada a Quinn Fabray, de uma forma ou de outra, do ódio à amizade, da amizade ao amor, da distância à proximidade... Do quebrar de um coração aos sonhos. Rachel definia-se por orbitar ao redor de Quinn, por ser apaziguada pela gentileza da loira que contrastava intensamente com a turbulência assumida por sua vida nos anos distantes dela.

A morena precisava que Quinn voltasse para a sua vida e voltasse a arrumá-la, Rachel precisava voltar a ser quem era... E só Quinn a traria de volta.

Sempre fora assim, elas funcionavam como guias uma para outra. Uma era o que a outra buscava e uma sempre representava o que a outra deixara irresponsavelmente para trás. As duas eram sinais de fogo em meio à escuridão que cada uma carregava.

E juntas, elas queimavam.

Light up, light up

As if you had a choice

Even if you cannot hear my voice

I’ll be right beside you dear

 

Louder, louder

And we’ll run for our lives

I can hardly speak I understand

Why you can’t raise your voice to say

A música ecoava através das paredes do teatro e preenchia o hall de entrada. Contudo, tudo que Rachel conseguia escutar eram as batidas desenfreadas e desesperadas de seu coração, assim como tudo que sentia era o medo.

Naquele instante, era como se toda a coragem que vestira e que a impulsionara até ali tivesse se fragmentado em pedaços pequenos, tão pequeninos que ela não era capaz de juntá-los. E a sua esperança também vacilava porque ela sabia que tudo estava contra ela.

Rachel apertou as mãos, fechando-as em punhos duros, em tentativas falhas de canalizar todos aqueles sentimentos desanimadores e transformá-los, de alguma forma, em algo bom... Em algo que ela pudesse entregar novamente a Quinn. A loira já vira muito do seu egoísmo, dos seus ressentimentos e de sua amargura e, por isso, Rachel não podia entregar o medo e, muito menos, a ausência de esperança.

A morena sabia que depois de tudo que provocara as duas, ela teria que entregar tudo e o melhor de si. A sua insistência, a sua coragem, a sua força... Precisava retornar ao passado, cavar em meio a sua mágoa para encontrar a pessoa que Quinn vislumbrara naquele presente e se apaixonara. Rachel precisava fazer as pazes com o seu passado, com os seus sonhos destruídos e com os pedaços de seu coração que estavam em suas mãos.

Ela se reconstruiria e se entregaria para Quinn, tornaria-se submissa a ela para que a loira fizesse o que quiser consigo.

Rachel não faria exigências e sim, pediria desculpas. Era o mínimo que poderia fazer e não podia esperar, nem pelo melhor e nem pelo pior... Naquela altura de sua relação com Quinn, não poderia exigir nada dela. Nem a sua atenção.

Não sabia o que Quinn faria ou o que ela decidiria e não saberia se não tentasse... A batalha poderia estar perdida, mas, Rachel ainda levaria o seu exército. Ela ainda tentaria.

Uma última vez.

Uma última corrida em direção a Quinn.

Uma última tentativa de ser feliz.

Slower, slower

We don’t have time for that

All I want’s to find na easy way

To get out o four little heads

 

Have heart, my dear

We’re bound to be afraid

Even if it’s just for a few days

Making up for all this mess 

E naquele momento de fraqueza, Rachel se apegou a única coisa que, nos últimos dias, não tinha a decepcionado.

Agarrou-se às batidas desenfreadas de seu coração e elas a impulsionaram para dentro do teatro. Não conseguiu vislumbrar Quinn à meia luz, entretanto, seus olhos encontraram o New Directions em cima do palco. Arthur liderava o grupo que, divinamente, dançava e envolvia-se pela música.

Pessoas estavam em pé na platéia e muitas cantavam junto com o grupo. A energia que ocupava o teatro era intensa e inexplicável e Rachel também se agarrou a ela para reencontrar a sua coragem e a sua esperança.

As luzes que acompanhavam o ritmo da música subitamente acenderam-se e Rachel, finalmente, encontrou o que procurava em uma pessoa. Na única pessoa que fornecia o que ela precisava, ainda que não pedisse e nem merecesse.

Light up, light up

As if you have a choice

Even if you can’t hear my voice

I’ll be right beside you dear 

As luzes iluminaram Quinn Fabray e os olhos de Rachel Berry brilharam como se ela tivesse reencontrado a esperança depois de tanto tempo caminhando sozinha. Ao redor da morena, as pessoas aplaudiam e assoviavam e tudo que ela podia ver (e até mesmo ouvir) era o sorriso de Quinn. Os olhos dela, mesmo distantes, pareciam esmeraldas lapidadas raríssimas.

Rachel se perguntava como fora capaz de deixá-la para trás quando, tudo que sempre quis, foi ela. Seus sonhos não eram nada perto do sentimento avassalador que a tomou no instante em que a viu... A saudade misturou-se à dor, assim como o amor envolveu-se pela tristeza de ter dado um fim no que era para ser eterno. E, dessa mistura, Rachel bebeu intensamente e amargou cada aspecto ruim que dera a relação que as duas possuíam.

A morena sabia que era culpada e sabia que merecia ser punida... Entretanto, tudo que pedia era que o seu carrasco fosse misericordioso. Porque a sua pena já estava dolorosa demais para ser enfrentada sozinha.

# # # # #

As primeiras solitárias notas no piano soaram frias e sôfregas no silêncio abafado que se instalara no teatro. Essas notas alteraram magicamente uma atmosfera que estava repleta de sentimentos desconexos, intensos e inexplicáveis. Claro que Christine estava eufórica pelo ato inicial da apresentação do New Directions, mas, não conseguia impedir o nervosismo que tomara conta de seu corpo ao escutar o início daquela melodia.

Diferentemente do que Miss Fabray havia planejado, Christine mudara a música seu solo, arriscando toda a equipe nessa decisão. E, diferente do que a sua professora dissera no camarim, ela não entregaria o seu melhor naquele momento e sim, mais do que isso...

Ela entregaria o seu coração. E, nesse ato, ela realmente esperava que Claire o apanhasse de volta.

Christine respirou profundamente e colocou a mão esquerda sobre o seu diafragma. Fechou os olhos e não se preocupou com a sua técnica, aquele momento não exigia perfeição e sim, a verdade dos seus sentimentos. E ela sabia muito bem que não era a pessoa mais perfeita do mundo quando se tratava de lidar com todos eles.

We keep behind close doors

Every time I see you, I die a little more

Stolen moments that we steal as the curtain falls

It’ll never be enough

As you drive me to my house

I can’t stop these silent tears from rolling down

You and I both have to hide on the outside

Where I can’t be yours and you can’t be mine 

Claire que estava nos bastidores, aguardando o momento de sua entrada na coreografia, sentiu todo o seu corpo imobilizar-se. E nesses segundos, parada na escuridão dos bastidores, o seu coração acelerou enquanto a sua mente repetia, agressivamente, que estava tudo errado e que Christine não tinha o direito de tirar as Nationals dela com mais uma decisão egoísta. A pequena capitã olhou ao redor de si, procurando apoio em seus companheiros, porém, todos eles sorriam compassivos em meio às sombras.

Sorrisos de quem sabia, desde o começo, o que Christine faria.

Claire desvencilhou-se de mãos que tentaram agarrá-la e correu para as cortinas que separavam os bastidores do palco, não sabia o que poderia fazer em relação a Christine, só que queria ver no rosto dela os motivos que a levaram a fazer aquilo. Os olhos escuros encontraram a figura de Christine que, diferentemente do que imaginara, não estava imponente e satisfeita pelo que fazia. Pelo contrário, a loira estava de olhos fechados, respirando com dificuldade, segurando as notas como se segurasse a si mesma entre os versos da música que cantava.

Uma música que Claire reconheceu. Uma música que falava a respeito de um amor que, talvez, elas não mais dividiam.

O aperto delicado fechou-se sobre o punho de Claire e ela se virou para quem a segurava. Arthur a olhava intensamente, pedindo em silêncio para que ela ouvisse. E, mesmo que tudo o que Claire queria, naquele instante e nos últimos dias, fosse nunca mais escutar os argumentos e pedidos de desculpas de Christine... Ela não conseguiu se segurar em si mesma quando a voz da loira, mais uma vez, ecoou no teatro.

O tom quebrado e frágil atingiu Claire por completo, entretanto, foi o olhar abrupto e surpreendente de Christine que fez a pequena engolir em seco. Naquele olhar, a loira entregou-se por inteira. E Claire enxergou o medo, a vergonha, a tristeza e... Principalmente, o amor. 

O amor desengonçado e que mais machucava do que curava, o amor que Claire acreditava ser a única imperfeição que Christine carregava... Aquela imperfeição real, visceral e tão forte que extrapolava os limites do material, atingindo, finalmente, o coração de Claire.

But, I know this, we got a love that is homeless 

No instante em que Christine negou Claire, a própria loira colocou-se ao relento em uma tempestade que a pegou e a revirou por completo. A sua negativa em relação a Claire e a tudo que a morena representava em sua vida não mudou o que passara com a sua mãe em relação ao seu pai e ao restante de sua família.

Os julgamentos continuavam assim como as ofensas, os olhares reprovadores e a exclusão. Christine, sem Claire, ficou ainda mais perdida em meio às palavras que diziam que o seu amor errado e que a Claire - quem permanecera e se estabelecera em sua vida - não era digna para o que ela sentia.

Em sua tentativa de proteger Claire de sua família, Christine não permitiu que a morena ficasse onde, de fato, ela queria estar. A loira a privou de sua companhia, de seus beijos, de seus abraços e, principalmente, do amor que ninguém mais compreendia além delas.

Desde então, o amor de Christine perdeu-se porque ele não mais tinha o seu lar... A jovem ex-cheerio não tinha mais onde descansar o corpo após suas batalhas diárias porque os braços que a protegiam foram obrigatoriamente afastados de si e os beijos que eram capazes de curá-la foram julgados e sentenciados proibidos. A exaustão finalmente a fez entender que não cabia a ela decidir se Claire precisava de proteção.

Na verdade, Christine assumiu que era frágil e que, talvez, não fosse mais o que Claire necessitava.

Esse pensamento entorpeceu a mente de Christine e ela deixou que as lágrimas caíssem enquanto a sua voz gritava desesperada por um por que, pelo seu amor e por Claire.

Why can’t I hold you in the street?

Why can’t I kiss you on the dance floor?

I wish that it could be like that

Why can’t it be like that? ‘Cause I’m yours

Why can’t I say that I’m in love?

I wanna shout it from the rooftops

I wish that it could be like that

Why can’t it be like that? ‘Cause I’m yours 

Quinn assistia a apresentação com os olhos úmidos e as mãos sobre a boca. Não conseguia acreditar no que Christine entregava com aquele solo, ainda mais porque não esperava que ela ainda pudesse fazer aquilo. Talvez, o que acontecera entre ela e Rachel tivesse a deixado pessimista em relação ao amor, mas, não achava que Christine fosse capaz de jogar tudo o que, até então, prezava, por Claire.

Se Rachel a deixara pelos sonhos que possuía, Christine não poderia tentar mais uma vez pela solidão que a envolvia?

A professora, silenciosamente, viu-se no lugar de suas alunas. Em seu íntimo, por mais que tentasse e afastasse, ainda existia a esperança de que Rachel pudesse dar-se conta do erro que cometera ao terminar o que tinham... A parte juvenil de sua alma acreditava, assim como Christine acreditava, que o amor poderia ser mais simples e com menos mágoa.

Essa porção sonhadora e apaixonada pediu por Rachel, assim como Christine pedia por Claire.

E Quinn, depois de tantas decepções e abandonos, não esperava que ainda pudesse ser atendida... Mas, ela foi.

O magnetismo inexplicável novamente as atraiu e Quinn viu-se confusa ao enxergar, do outro lado do teatro, olhos castanhos desejando-a de forma exigente e insaciável. Quinn reconheceu aquele rosto antes mesmo de seus olhos percorrerem-no.

Ela jamais esqueceria aquele rosto, muito menos, aqueles olhos.

Os olhos de quem quebrou o seu coração e o rosto pelo qual se apaixonara.

Quinn jamais se esqueceria dela.

It’s obvious that you’re meant for me

Every piece of you, it just fits perfectly

Every second, every thought, I’m in so deep

But I’ll never show it on my face 

O castanho encontrou o verde e nele se afogou.

Naquela troca de olhares, as duas se entregaram, ainda que a mágoa pelas palavras não-ditas e pelas decisões não-tomadas as sufocasse e as arrastasse para o lado mais escuro do amor que dividiam.

Quinn tentou desviar os olhos, mas, estava surpreendentemente saudosa para abandoná-los agora que os encontrara. Ainda que a visão de Rachel ardesse as feridas que, sequer, cicatrizaram, Quinn precisava vê-la. Algo dentro dela, irracional e incontrolável, impedia que ela se afastasse mesmo que a dor a impulsionasse na direção contrária a Rachel.

Era loucura demais permanecer tão intensamente ligada a quem a abandonara. Não era certo depender de uma pessoa de forma tão doentia e tão necessitada. Aquela necessidade queimava como tudo entre elas... O fogo que ardia entre as duas destruía, mas, também, curava.

Eram os dois lados de um mesmo amor.

Rachel não deixaria que Quinn se afastasse dela, ainda que fosse apenas uma troca de olhares e, muito menos, voltaria a dar às costas ao seu amor. No momento em que entrara naquele teatro, ela decidiria que não se afastaria sem tentar e manter os olhos de Quinn nos seus era uma forma de, delicadamente, dizer a ela que estava de volta. Mesmo à distância, Rachel leu a confusão e a mágoa dentro dos olhos verdes que tanto amava.  E, ao ver esses sentimentos tão expostos nos olhos em que, um dia, encontrou esperança, o seu peito choramingou ferido e ela se culpou mais do que fizera nos últimos dias.

Ela questionou se merecia Quinn e se era certo insistir daquela forma quando Quinn tinha todo o direito de não mais querê-la... Porém, o seu egoísmo insistia em dizer que Quinn era sua, que Quinn a completava e que elas, por mais que estivessem disfuncionais e separadas, eram para ficar juntas.

Rachel enxergava o lado bom daquele amor enquanto Quinn, que fora deixada com as conseqüências do abandono, enxergava apenas o lado ruim.

Mais uma vez, dois lados de um mesmo amor.

A solidão abraçou Rachel quando Quinn, finalmente, conseguiu desviar os olhos dela. E foi a ausência de esperança que envolveu os ombros de Quinn quando ela fechou os olhos e deixou que uma lágrima solitária escorresse por sua bochecha.

But we know this, we got a love that is hopeless    

Quinn apertou as mãos nos braços de sua poltrona. A falta de ar ardeu seus pulmões e essa ardência a trouxe de volta para a realidade. A dor, infelizmente, era a única coisa que ocupava seu presente e ver Rachel, novamente, fora o golpe necessário para que as muralhas que ela erguera caíssem debilmente diante de seus olhos.

Nunca fora forte o bastante e sim, maleável.

Quinn adaptara-se ao que a vida oferecera a ela, entretanto, quando Rachel caminhara para fora da sua vida, não fora o destino que sentenciara isso e sim, a própria Rachel. Por isso, ela não foi capaz de adaptar-se à verdade implícita de que não era o necessário e, muito menos, o essencial para Rachel ser feliz... Não conseguia deixar de pensar que, enquanto a morena significava tudo para si, ela mesma era somente mais uma parte na vida dela. Inevitavelmente, o questionamento da reciprocidade veio e Quinn demorou a dar-lhe uma resposta.

Essa resposta assustava porque Quinn enxergou-se, depois de tanto tempo, questionando o valor que tinha na vida das pessoas que amava... E, no caso de Rachel, da pessoa que mais amava.

O amor que oferecera - tão real e tão determinado - era mais fraco do que toda a sedução proporcionada pelos sonhos que poderiam ser realizados. Quinn entregou o seu presente e o seu futuro e Rachel, ainda assim, deixou-se seduzir pela possibilidade de realização quando tinha a certeza de um sentimento inabalável em suas mãos.

Talvez, fosse mesmo egoísmo querer Rachel ao seu lado enquanto ela ainda podia sonhar, só que, de alguma forma, Quinn sabia que aqueles sonhos a destruiriam. Porque, desde que Rachel voltara a Lima, tudo que Quinn viu na morena foram as conseqüências trágicas dos sonhos que se perderam na crueza da realidade.

Quando deixara Rachel voltar à New York, Quinn acreditava que estava dando a ela a oportunidade de ser feliz... Porém, a morena levara muito dela quando fechara a porta para o que tinham. E Quinn estava recuperando, aos poucos, o que perdera e não mais acreditava que Rachel tinha o direito de tomar tudo de volta. Não tratava-se de merecimento e sim... Das feridas. Rachel não teria tão facilmente o que negara.

Porém, negar também doía.

Quinn estava negando a Rachel o que ela também ansiava ter de volta. Já não mais sabia se era certo manter essa decisão, não sabia se estava vingando-se ou dando, realmente, voz ao que sentia... Quinn estava perdida dentro de suas mágoas e não sabia se reencontraria quem era, ainda mais, agora que Rachel reaparecera em sua vida.

O que, um dia, fora o seu sinal de fogo, hoje, queimava-lhe dolorosamente por inteira.

Rachel não desviara os olhos de Quinn, nem mesmo quando o verde dela abandonou o seu castanho. Observou a postura da loira se encolher diante do peso do que dera para ela carregar, o coração de Rachel apertou-se porque Quinn não estaria tão fraca se ela tivesse ficado e dividido aquele fardo com ela.

A morena amaldiçoou o seu egoísmo, mesmo que ele tivesse a trazido de volta, fora exatamente ele quem começou toda aquela série de decepções. A sua ânsia por algo que não mais lhe pertencia e o seu apego pelo passado só acrescentaram aspectos ainda mais negativos a tudo no que se transformara desde que voltara a Lima.

Em todos aqueles anos em New York, ansiava por reencontrar Quinn para que pudesse ter explicações, desculpas ou o que quer que fosse. E, quando tivera tudo ao seu alcance e, principalmente, quando tivera muito mais do que pedira, Rachel teve a capacidade de abandonar... Quebrou um coração em Lima e carregou os pedaços deste e do seu por toda a New York. Essa cidade não era mais o lar de seus sonhos e muito menos, de sua luz.

O seu brilho e o seu sonho - o mais especial, simples e verdadeiro - estavam em Lima, personificados em Quinn Fabray. A sua melhor amiga, a sua confidente, a dona dos seus sonhos e o amor de sua vida. Rachel trocara Quinn por sonhos juvenis e, somente na ausência dela, entendeu que, desde que voltara a Lima, os seus sonhos eram todos habitados por ela.

Rachel sabia que não só errara como, também, ferira. A si mesma e a Quinn. Não se achava capaz de consertar cada um dos danos que causara, mas, estava disposta a entregar o melhor de si se Quinn permitisse.

Rachel abaixou a cabeça, algumas lágrimas molharam o tecido de sua calça... Isso porque tudo o que Quinn fizera desde que se viram novamente foi deixar claro que, provavelmente, não havia esperanças para um amor que fora deixado para trás.

Why can’t I hold you in the street?

Why can’t I kiss you on the dance floor?

I wish that it could be like that

Why can’t it be like that? ‘Cause I’m yours

Why can’t I say that I’m in love?

I wanna shout it from the rooftops

I wish that it could be like that

Why can’t it be like that? ‘Cause I’m yours 

Os questionamentos eram os mesmos, ainda que as respostas divergissem completamente.

Enquanto a juventude de Claire e Christine perguntava para o mundo por que o amor que dividiam era errado, a maturidade de Rachel e Quinn perguntava a si mesmas se valia à pena, novamente, tentar. Amores que dividiam apenas o mesmo significado e não o mesmo tempo, muito menos, os mesmos problemas.

Existia certa esperança para o que Claire e Christine possuíam porque, felizmente, o que as separava vinha de fora e não delas mesmas. Isso ressaltava a impossibilidade da volta para o que Rachel e Quinn tinham, até porque, ninguém mais invadira o universo delas a não ser, elas mesmas e seus defeitos.

E, por mais que existissem diferenças, ainda era o amor... Em sua forma mais juvenil e em sua forma mais adulta. Ainda era o sentimento que se definia pela necessidade da pessoa para a qual era destinado; ainda era o mesmo sentimento que feria e curava; a mesma sensação de sobriedade em meio à embriaguez de sensações físicas e emocionais... Os corações acelerados iguais, as pupilas dilatadas idênticas, o tremor familiar nos corpos em que ele habitava...

Então, por que de um lado existia um abismo enquanto, do outro, construía-se uma ponte?

Enquanto Rachel e Quinn afastaram-se além da distância que já as separava, Christine olhou intensamente para Claire e aproximavam-se. Era a primeira vez que a solista abria os olhos claros na apresentação e, como tudo nela, dedicou-os exclusivamente a quem amava.

Claire apoiou-se no ombro de Arthur que sorriu para ela. A pequena solista estava boquiaberta, incrédula e Christine sorriu para ela antes de elevar a voz e seu amor cantar as mais belas notas musicais da noite.

I don’t wanna live love this way

I don’t wanna hide us away

I wonder if it ever will change

I’m living for that day, someday

When you hold me in the street

And ou kiss me on the dance floor

I wish that we could be like that

Why can’t we be like that? ‘Cause I’m yours, I’m yours 

Na voz de Christine, Rachel escutou o amor.

O amor cambaleante, trôpego e machucado que voltava para casa depois de uma longa e teimosa estadia nos cantos mais obscuros de um mundo em que era cada vez mais difícil sentir total e verdadeiramente. O amor de Christine por Claire era jovem e puro, entretanto, o que as suas duas alunas possuíam tinha muito a ser comparado e, principalmente, desejado por Rachel.

Será que, um dia, Quinn voltaria a ser capaz de olhar em seus olhos da mesma forma apaixonada que Christine e Claire se olhavam? Ainda era possível que Rachel pudesse cantar um solo exclusivamente para Quinn? Um dia, as duas poderiam voltar a resolver seus problemas com palavras? E se essas faltassem, com atos?

Existia tanta dúvida e tanto mistério no caminho que se estendia diante delas... E Rachel temia que fosse enfrentá-lo sozinha. Uma história que fora primeiramente concebida para ser vivida a duas parecia estar cada vez mais próxima de tornar-se a história de apenas uma mulher, sozinha e solitária, caminhando infinitamente em uma direção que só alcançaria acompanhada daquela que abandonara.

E, exatamente como uma profecia, Rachel encontrou-se sozinha quando, novamente, ergueu os olhos para procurar por Quinn.

A morena desesperou-se e seus olhos castanhos colocaram-se à procura de quem demorara tanto a reencontrar. Rachel visualizou Quinn saindo do teatro, rumo ao hall pelo qual entrara e, evitando pensar no medo que sentia, colocou-se a caminho do que poderia ser o adeus a tudo que se segurava.

No instante em que Christine e Claire se olhavam e, silenciosas, selavam o seu sentimento com sorrisos lacrimosos e emocionados, Rachel caminhava e tropeçava na escuridão, procurando por Quinn na multidão.

A morena chegou do lado de fora e encontrou Quinn parada, cabisbaixa e de costas para ela. A loira abraçava o próprio corpo e a música, tão especial, ecoou a pergunta que elas ainda não fizeram verbal e claramente.

Why we can’t be like that? 

Rachel não ousou tirar mais aquele momento de silêncio de Quinn, esperou pacientemente que Quinn concedesse a atenção que, desesperadamente, ansiava, mas que não se achava no direito de pedir.

Contudo, Quinn ainda era dona da gentileza mais sutil que conhecera e dela veio o primeiro movimento. Rachel fez menção de abrir um sorriso, só que ele se perdeu à caminho de seus lábios e foram seus olhos que lacrimejaram.

Nada mudara nos olhos de Quinn e ela ainda refletia a solidão, a mágoa e, agora, a fúria.

Wish we could be like that... 

# # # # #

Dentro do teatro, existiu uma explosão de felicidade e de movimento devido à mudança para a terceira música do último ato do New Directions. Entretanto, fora dele, no hall de entrada do teatro, nada mudara.

Na realidade, a fúria fazia-se em casa, ao lado da mágoa e da tristeza que existia entre Rachel e Quinn. As duas permaneciam caladas, mas, ainda se olhavam. Os olhares sempre foram uma forma de comunicação extremamente importante em todas as etapas do relacionamento das duas. Os olhos de ambas, por mais tristes ou eufóricas que tivessem, sempre possuíam belezas ímpares quando se focavam uma na outra.

A máxima sempre deixava claro que os olhos eram os reflexos da alma e, no caso de Rachel e Quinn, eles sempre refletiam o amor que uma sentia pela outra, ainda que elas não soubessem ou, admitissem o que sentiam.  

Entretanto, naquele momento, os olhos castanhos de Rachel eram os únicos que ainda pareciam capazes de enxergar dessa forma. Dentro dos olhos escuros, ainda existia o amor escaldante e sedutor que dragara Quinn para toda aquela loucura enquanto os olhos verdes estavam frios e distantes.

Quinn não entregava nada enquanto Rachel tentava entregar tudo.

O coração da morena se perdera há muito nas batidas violentas que quase arrebentavam suas costelas. Rachel também sentia que tremia da cabeça aos pés, como se aquela frieza que vinha de Quinn se instalasse e se proliferasse dentro de si. E ela sabia que merecia aquilo tudo, na verdade, Rachel só queria ter algo de Quinn, ainda que fosse toda aquela violência e distância.

Ela, loucamente, precisava de Quinn de qualquer forma.

Por isso, mais pela necessidade do que pela coragem que tentava nutrir, Rachel deu um passo à frente. Instantaneamente, Quinn recuou na mesma proporção. A loira fechou os punhos e logo cruzou os braços em frente ao peito, defendendo-se e apertando-se em seu próprio corpo, tudo para recuar e não lembrar-se do quanto Rachel ainda lhe atraía.

As duas tinham feridas provocadas por elas mesmas, pela vida e até mesmo pelas pessoas que se entremearam entre o que tinham. E aquele parecia ser o ponto de decisão, a última chance que teriam para consertar tudo e caminhar para frente.

De um lado havia a esperança nos sonhos e, do outro, a frieza terrena. O coração versus a razão de um coração machucado. O medo de quem amava contra a coragem de quem queria se recuperar.

Sempre, entre elas, a dualidade.

Tried to keep you close to me

But life got in between

Tried to square not being in there

But think I should’ve been 

A melodia da música novamente mudara, acelerando-se enquanto, entre elas, o tempo parava. Rachel engolia em seco, procurando as palavras que ensaiara e apenas contrastando que elas se perderam em todas as sensações saudosas e apaixonadas que a envolveram desde que vira Quinn de novo.

Raros eram os momentos que calavam Rachel Berry e, por serem raros, eles eram especiais. E este era um daqueles momentos em que ela encontrava-se calada e que, também, a sua coragem se perdia.

Quinn era uma das pessoas que a conheciam melhor e até teria rido se essa ausência de palavras de Rachel não significasse tão pouco diante do que queria. A loira queria que ela se explicasse porque queria entender... Quinn queria abandonar as suas conclusões solitárias que a reduziram ao nada para a vida da Rachel. A loira queria saber qual o valor que ainda possuía na vida da morena para, só assim, saber o que queria.

Quinn queria ter a mais absoluta certeza de que, naquele tempo todo em que estiveram juntas, não amara sozinha. Porque a desculpa de ter o seu coração quebrado em Lima para que Rachel reconstruísse o dela em New York não funcionava mais. Quem amava não fazia isso, Quinn não fizera isso desde que, conscientemente, admitiu que amou e ainda amava Rachel Berry.

A risada até veio, mas, ela não era leve e sim, pesada, resultante de todos os fardos e bagagens que Quinn carregou durante aquele tempo em que estivera sozinha. E, assim como era pesada, ela também era feita de sarcasmo - a arma de quem se feria - e Quinn, munindo-se de toda a sua mágoa, grunhiu:

— É muita arrogância sua acreditar que eu vou iniciar essa conversa.

— Não há arrogância alguma aqui. - Rachel sussurrou apressada, sentindo cada palavra de Quinn perfurar-lhe o coração enquanto o tom de voz ferido que a loira usava castigava a sua esperança de um final feliz. A morena deu um passo à frente e Quinn arqueou a sobrancelha, minimamente interessada e muito machucada. - Qualquer arrogância que ainda restava se perdeu no instante que eu lhe deixei sozinha em Lima.

Hold back the river, let me look in your eyes

Hold back the river, so I

Can stop for a minute and see where you hide

Hold back the river, hold back 

— Muita coisa se perdeu naquele dia, Rachel. - Quinn completou fria e seus olhos, contradizendo toda a sua postura defensiva, mais uma vez entregaram seus sentimentos. Os olhos verdes arderam e lágrimas cairiam se a loira não estivesse tão magoada quanto forte, ela não daria mais nada a Rachel.

Muito menos, as suas lágrimas. Quinn Fabray chorara mais do que muitas pessoas em uma vida inteira... E desde que se livrara dos seus pais, desde que tivera Beth tirada de si pela segunda vez e desde que os seus próprios sonhos foram massacrados pelos problemas mundanos e reais, ela pesava e equilibrava as situações que mereciam aquele pedaço tão especial de sua alma. E Rachel, naquele momento, não merecia.

A morena perguntou-se silenciosamente se o amor que dividiam se perdera naquele dia, ainda estava debilitada demais para ter uma certeza tão assustadora revelando-se tão cedo. Rachel também pedia em silêncio para que o tempo fosse o aliado das duas daquela vez porque, no passado, ele quase as sentenciara ao fim.

Era inútil pedir a uma entidade tão incontrolável que zelasse pela felicidade delas quando Rachel bem sabia que a maior culpada daquelas nuvens nubladas dentro dos olhos de Quinn era somente ela mesma. E justamente por isso que Rachel pedia a tudo e a todos porque, enquanto olhava Quinn, ela só conseguia ver as nuances da head cheerio que a torturara no primeiro ano.

Só que, dessa vez, Rachel merecia qualquer tortura, inclusive, a partida de Quinn.

A morena suspirou e desviou os olhos de Quinn, diferentemente do momento que dividiram no teatro, essa troca de olhares não trazia benefício algum. Quinn fortalecera-se para enfrentá-la e os olhos verdes atacavam farpas, compostas de dor e solidão, em direção aos seus. Os olhos castanhos que refletiam a saudade não eram tão fortes porque também existia a culpa dentro deles. Rachel abaixou a cabeça e sussurrou:

— Espero que nem tudo tenha se perdido naquela noite.

— Você espera por coisas demais, Rachel... Pela fama, por seus sonhos, pela Broadway... - Enquanto Rachel demorava a formular as respostas, Quinn as tinha na ponta da língua, frutos de diálogos ensaiados em sua mente no momento em que seu coração mais amargava o abandono. Era a sua forma de consolo. Rachel escutou os passos de Quinn perto de si e também sentiu o cheiro do perfume dela em seu olfato, embriagando-a como a mais viciante das drogas. - Já pensou se, em vez de esperar, você devesse, apenas, ficar?

Once upon a different life

We rode our bikes into the sky

But now we’re caught against the tide

Those distant days all flashing by 

Se Rachel não estava disposta a dar voz as suas dúvidas mais perigosas, Quinn falava por ela e, principalmente, respondia. Ainda que a loira tivesse acabado sua fala nessa pergunta, ela acabara respondendo e, também, levantando milhões de hipóteses na cabeça da morena.

Rachel pensou em tudo que aconteceria se tivesse dito não à proposta de seu agente.

Teria permanecido em Lima, continuaria a treinar o New Directions, seus pais não estariam tão magoados com o seu desaparecimento e, principalmente, estaria com Quinn, dentro daquele teatro, ao seu lado. Nada de Finn em seu pé, muito menos Tony, apenas Quinn.

E, quanto mais pensava, mais Rachel via o tamanho da ingenuidade egoísta de sua escolha. O martírio que passara sozinha nem se comparava ao que Quinn estava expondo-o naquele momento. As probabilidades de felicidade que pensara, sozinha, em seu quarto de hotel, não se comparavam ao que vivia naquele momento, com Quinn.

Porque, com Quinn próxima a si, Rachel estava tendo um pouco do que poderia ter adquirido se tivesse ficado em Lima. Era pouco escutar Quinn tão próxima, assim como sentir o seu cheiro depois de tanto tempo... Mas, a presença de Quinn, por si só, já a lembrava vivamente do que tivera no passado e do que, provavelmente, havia perdido no presente.

Rachel finalmente ergueu o rosto e viu suas lágrimas refletidas no olhar verde e gélido de Quinn. Um lampejo de fraqueza passou pelos olhos da loira, mas, ela não deixou que essa saudade tomasse o lugar de sua dor.

Quinn tinha dificuldades para manter-se distante e fora por isso que se aproximara. Agora, tudo o que queria era correr para longe de Rachel, para um local em que aqueles olhos castanhos fossem apenas lembranças em sua mente e não mais acelerassem o seu coração, assim como queria correr para um refúgio em que as memórias do que tivera não a machucassem tanto.

A melhor parte da sua vida era, ironicamente, a que mais doía naquele momento.

Discretamente, Quinn recuou e desviou os olhos de Rachel. Foi a sua vez de amargar o que a relação entre elas se tornara, entretanto, a loira já fizera aquilo tantas vezes que se tornara entediante pensar nos motivos, nas explicações e nas desculpas que levaram a morena a se afastar.

Quinn sequer tinha certeza se ainda queria algo.

— Desde que eu pisei em New York, meu único pensamento foi o que teria acontecido se eu não tivesse me voltado aos meus antigos sonhos... - Rachel explicou, de início, insegura e adquirindo força conforme as palavras saíam de sua boca. Era um desabafo, eram as palavras que ela sempre quis dizer e nunca conseguira. E, agora que começara, não vacilaria. Quinn escutava, só que não mais olhava. - Se eu tivesse ficado, se nós ainda fôssemos nós e não isso que somos agora. Eu pensei milhões de vezes e me arrependi da minha decisão em todas elas, Quinn.

— Então, por que não voltou?! - Era o primeiro sinal emocional que Quinn dava naquela conversa, seus sentimentos a traíram e ela pediu por respostas, da forma mais necessitada e saudosa possível. Os olhos verdes voltaram a brilhar e as lágrimas chegaram à superfície, seguradas bravamente por um suspiro corajoso. Rachel aproximou-se de Quinn e, mais uma vez, foi recusada.

Quinn colocou uma mão entre elas. Uma mão que, em outros momentos, já aproximara aqueles dois corpos para se amarem.

Hold back the river, let me look in your eyes

Hold back the river, so I

Can stop for a minute and see where you hide

Hold back the river, hold back

— Eu demorei um tempo para encontrar algo bom em mim depois do que eu fiz... E, quando eu procurei, eu encontrei você. - A voz tranquila de Rachel desafiava a intensidade de suas palavras. Todavia, a calma que a morena transparecia era fruto da verdade e da certeza que, agora, ela tinha em relação aos seus sentimentos. Quinn piscou os olhos várias vezes e, aos poucos, as lágrimas desapareceram e ela mesma não soube o por que. Rachel, por sua vez, deu um sorriso acanhado enquanto sentia seu coração se acelerar. - A melhor parte de mim é aquela que ama você... Os sonhos que me definem são aqueles que têm você. Eu te...

— Por favor, não diz isso, não agora. - Quinn pediu debilitada e as lágrimas que sumiram apenas voltam, mais intensas, finalmente escorrendo pelas suas faces. Rachel engasgou, imóvel e assustada pela súbita mudança de comportamento que se abateu em Quinn. Os olhos da loira voltaram a mudar e a fúria voltou, escaldante, violenta. - Naquele dia em que você foi embora, eu precisei dessas palavras e eu as disse a você, silenciosamente. Assim como eu disse em vários dias depois que você se foi. E as minhas respostas sempre foram o silêncio e a solidão, você não pode voltar e exigir que eu as escute e as responda...

Rachel voltou a se aproximar desesperada e, dessa vez, ela ignorou qualquer barreira que Quinn pudesse erguer entre elas. Sendo assim, as pequenas mãos morenas alcançaram os pulsos pálidos e aquele toque, depois de tanto tempo, iluminou toda a escuridão em que o amor das duas residia desde então. Só que a luz era frágil, trêmula e vacilante... E ela se apagou quando Quinn afastou Rachel delicadamente de si e sussurrou:

— Assim como você esperou por seus sonhos durante esse tempo todo, eu esperei que você voltasse e que dissesse que tudo era um engano. Porém, eu não fiquei no mesmo lugar porque a minha vida estava bagunçada demais para que eu me desse ao privilégio de ficar parada... Eu tive que ir, Rach... E, agora, eu tenho que estar em outro lugar e não com você.

Lonely water, lonely water, won’t let us wander

Let us hold each other

Lonely water, lonely water, won’t let us wander

Let us hold each other 

Os aplausos que ecoaram através das paredes do teatro foram a pior trilha sonora que Rachel ouvira em vida. A explosão de alegria não combinava com a imagem de Quinn lhe dando às costas.

A morena se perguntou qual o som que Quinn escutou quando a deixara por New York... E a resposta imediata foi os sons de um coração partido. Exatamente o que ela mesma escutava, naquele momento. Os sons abafados pelos aplausos que há muito não eram mais essenciais em sua vida.

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Notas finais do capítulo

E entãooooo? Eu tinha os meus motivos para ficar receosa?

Espero que não tenha ficado muito cansativo pela quantidade de músicas no capítulo... Mas, elas foram extremamente necessárias porque todas elas apresentam significados importantes para os relacionamentos abordados.

Finalmente tivemos as Nationals, acham que o ND ganha?
Esperavam essa atitude do Finn?
E a Rachel? Subiu no conceito de vocês?
E Christine e Claire?

Bem, aguardo o feedback de cada um de vocês... Para aqueles que queriam a Rachel sofrendo, esse capítulo com certeza agradou Hahahaha

Aguardo os comentários, nos vemos na próxima!
Fernanda Redfield (@RedfieldFer)



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