Bleeding escrita por caiquedelbuono


Capítulo 6
Sangrando.




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Não precisou de muito tempo para Logan perceber que a falsidade de Brian já havia repercutido negativamente por todo o internato. Logan não havia feito absolutamente nada e ainda não entendia o porquê de Brian ter aparecido repentinamente com um hematoma no rosto, e acusá-lo de ser um espancador. De bater em pessoas inocentes.

Pelo menos era isso que o povo da classe de química estava falando pela manhã. Logan podia ouvir comentários vindos de todos os cantos, inclusive dos melhores amigos de Brian, garotos com aspecto de valentões e todos com uma cara de mal, que apenas serviam para amedrontar criancinhas.

Logan agora era o vilão. Todos estavam virando a cara para ele e Brian se divertia com a situação. O hematoma ainda estava lá, brilhando bem ao lado dos seus olhos azuis, mas ele não parecia sentir dor. Aquele machucado parecia não incomodá-lo.

A única pessoa que estava o apoiando era Sophia. Ela sabia o que tinha acontecido realmente e tinha visto o quão agressivo fora Brian. Ela queria ir até Janeth e contar toda a verdade, falar tudo o que havia visto e livrar a barra de Logan, mas ele achou que isso não seria o melhor a se fazer. Dentro do pensamento de Logan, isso só faria com que ele se sentisse mais humilhado e se rendesse às vontades de Brian. Logan iria cumprir sim a sua punição, o seu castigo, ou qualquer outra coisa que Janeth determinasse, mas ele cumpriria com dignidade. Cumpriria com a cabeça erguida e com a consciência limpa de que não havia feito nada que merecesse a desaprovação de outras pessoas.

Logan não se importava com o que os outros diziam a respeito dele. Isso era a coisa menos relevante diante toda aquela história. Ele olhava para Sophia e percebia que ela sempre estaria ali, ajudando-o a se sentir melhor. Isso bastava. O apoio dela era o que ele mais precisava e ele já não mais se importava com o fato de ter acabado de conhecê-la. O que isso significava diante de tudo o que ela já tinha feito por ele? Absolutamente nada.

O sinal para o final das aulas da manhã tocara e Logan respirou aliviado por abandonar o laboratório de química e deixar de lado aqueles tubos de ensaio repletos de elementos químicos malucos. Sophia caminhava ao lado dele e eles estavam indo para a cantina, encontrar com Mark, Helena e Tommy, que estavam na classe de matemática.

— Foi engraçado quando a solução de ácido clorídrico começou a borbulhar dentro do seu tubo de ensaio. — disse Sophia, enquanto acrescentava tons de risos em sua voz aguda — Pensei que aconteceria aquelas cenas de filme, sabe? Quando tudo explode e você fica repleto de fuligem e com os cabelos arrepiados. Seria realmente engraçado.

— Você diz isso porque não foi com você. — retrucou Logan, que estava olhando de um lado para o outro, tentando localizar Brian.

Sophia logo percebeu e soltou um suspiro.

— Por que está o procurando? Ele não vai aprontar mais nada, eu o conheço.

Logan olhou dentro dos olhos verde de Sophia e quase pôde ver a sua alma. Desde então, ele passou a vê-la de um modo diferente e ele ainda se sentia estranho por isso.

— Tudo bem, não vamos mais perder nosso tempo falando de porcaria.

Sophia assentiu e eles caminharam mudos até chegaram à cantina.

Logan ainda não conhecia o cardápio semanal, mas Sophia já havia lhe dito que cada dia da semana era um prato diferente. Quando Logan percebeu que o cardápio de terça-feira incluía uma enorme panela repleta de risoto de camarão, ele lambeu os beiços e preparou o prato mais alto que ele já havia feito.

Logan e Sophia procuraram por Helena, Mark e Tommy e os encontraram sentados na mesma mesa de sempre. Era habitual que Brian também estivesse com eles, mas depois da chegada de Logan no internato, ele pareceu querer distância deles.

— Acho que mudar para Shavely foi uma das melhores coisas que já aconteceu na minha vida. — disse Mark, que já estava na metade do seu prato — Acho que não me lembro da última vez que comi risoto de camarão.

— Ficamos sabendo do que Brian fez! — indagou Helena, completamente impressionada — Achei muito cara-de-pau da parte dele.

Logan deu a sua primeira garfada e a comida desceu feito uma pedra pelo seu esôfago.

— Já percebi que o povo desse internato é mais fofoqueiro do que na minha outra escola. — ele observou.

Helena arqueou as sobrancelhas.

— Eu não tenho culpa das coisas que chegam aos meus ouvidos. — ela fez uma pausa — E além do mais, não queria que soubéssemos?

— Não é isso, Helena, é só que... — começou a dizer Sophia, mas ela se interrompeu. Ela parecia não estar confortável em falar sobre isso com Helena. E Logan também não estava. Ele poderia até gostar de Helena, mas não sabia se podia confiar piamente nela.

— É só que eu sei que Brian está mentindo. — disse Tommy de repente.

Todos que estavam à mesa olharam para ele incrédulos. Inclusive Mark, que parecia não estar prestando atenção à conversa, apenas concentrado no seu tão precioso prato de risoto de camarão.

— Depois da aula de matemática, — ele continuou falando quando percebera que todos esperavam pela sua conclusão — eu voltei para o dormitório antes de vir para cá. Eu já sabia que ele tinha encrencado Logan e tinha certeza que ele fizera isso desonestamente. Ontem, quando ele voltou da biblioteca, ele ficou o tempo todo no quarto. Hoje, quando eu acordei, ele já tinha saído e as suas coisas dentro do armário estavam remexidas. Aproveitei para vasculhá-las, e acabei encontrando um estojo de maquiagem escondido por entre suas roupas.

O queixo de Logan caíra. Brian era pior do que ele imaginava. Jamais se passara pela sua cabeça de que ele havia feito um hematoma falso. E para quê tudo isso? Logan não podia entender por que Brian o odiava tanto, sendo que já estava mais do que claro que Sophia não queria mais nada com ele e também nunca teria nada com Logan.

— Que cretino! — exclamou Sophia — Temos que mostrar esse estojo para Janeth. Ela tem que acreditar que Logan é inocente, ele não pode pagar por uma coisa que não cometeu.

— Brian é queridinho da Janeth. — disse Tommy, logo após tomar um gole de suco de uva — Todos nós estudamos aqui desde que somos pequenos e sabemos o quanto ela defende ele. Nada do que falarmos vai fazer com que ela mude de ideia.

E Logan não queria que ela mudasse. Não ia dar a Brian o gostinho de saber que ele estaria se humilhando cedendo às suas vontades.

— Mas ele não pode ficar impune, Tommy. Ele precisa pagar por tudo que está fazendo.

— Tommy tem razão, Sophia. — disse Helena — Janeth nunca cederá.

— Mas...

Logan colocou sua mão sobre a de Sophia e ela parou de falar instantaneamente. Eles se entreolharam novamente, os olhos verdes dela encontrando os olhos castanhos dele.

— Confie em mim. — ele disse e logo percebeu que ela se acalmara — Não tenho medo do que pode acontecer. Além do mais, eu apenas estou de castigo. Hoje à noite terei que ir até o escritório da Janeth para ajudá-la em uma faxina. Que mal pode haver nisso?

Sophia assentiu e logo em seguida engoliu em seco. Logan queria poder saber o que estava se passando pela cabeça dela naquele exato momento. Ele olhou para os outros sentados à mesa e percebeu que se entreolhavam.



A noite caíra rápido demais para que Logan pudesse refletir devidamente. Ele não encontrara novamente com Brian nas aulas à tarde e isso era uma coisa boa. Ter que olhar para a cara asquerosa dele não era uma coisa que o faria se sentir melhor.

Agora, Logan estava no dormitório, retirando as roupas suadas e grudentas do cansativo dia escolar e trocando por algo mais confortável. Ele tinha que cumprir o seu primeiro dia de castigo por ter supostamente dado um soco na cara de Brian. Aquilo era tão ridículo e tão injusto ao mesmo tempo, mas Logan não fraquejaria. Estava disposto a mostrar a Brian que ele o encararia de igual para igual.

Ele abriu a mala que Mary havia lhe enviado pela manhã e colocou seu básico visual: uma calça jeans larga e uma camiseta.

A tia havia sido tão legal em levar aquelas coisas para ele que Logan pensou em ligar para ela. Pensou em pegar o celular e agradecer por ela ter se lembrado da existência dele. No fundo, ele sabia que ela não podia cuidar dele. Toda aquela implicância que ele demonstrara quando chegara ao internato, era apenas a raiva a qual ele não tinha em quem descontar por tudo o que estava acontecendo.

Mas Logan não poderia fazer isso agora. Ele olhou para o pequeno relógio no criado-mudo e constatou que já eram oito da noite. Ele tinha que ir até Janeth, ajudá-la na faxina.

Mark não estava no quarto e Logan não sabia onde ele estava. Provavelmente, estava com o resto do pessoal na sala de estar. Ele não tinha que encarar uma punição injusta.

Logan respirou fundo, desligou o interruptor do quarto e começou a caminhar em direção à sala de Janeth.

Os corredores pitorescos emanavam um ar gélido, que fez com que os pelos dos braços de Logan se eriçassem. Um arrepio percorreu sua espinha e ele desejou sair de lá o mais rápido possível. Era estranho o fato de ele sentir esse tipo de coisa quando passava pelo corredor, como se existisse algo o observando, algo assoprando por entre seus ouvidos.

Ele afastou esses pensamentos quando chegou frente à porta do escritório de Janeth e bateu duas vezes. Ele pôde ouvir o barulho de salto alto se aproximando e logo viu o rosto redondo e enrugado da diretora por detrás da porta.

— Olá, Logan. — ela disse formalmente e abriu inteiramente a porta para que ele pudesse entrar.

A organização daquela sala que ele vira pela manhã havia sumido completamente. A mesa estava completamente revirada, com papéis espalhados em cada centímetro do lustroso móvel. Havia um aspirador de pó ao lado do sofá e um balde cheio de água e sabão também era visível.

Janeth deu um sorriso quando Logan olhou para tudo isso com desespero em seu olhar. Só de imaginar esfregar o chão daquela sala fazia os seus braços dormirem.

— Não se preocupe. — ela disse — Será divertido.

Logan imediatamente pensou que Janeth deveria mudar sua concepção de “divertido”. Ele estralou os dedos e não colocou nenhum pingo de entusiasmo em sua voz quando abriu a boca para falar:

— Por onde eu começo?

Janeth pegou o aspirador de pó e o entregou para Logan.

— Você pode começar aspirando toda a sujeira que encontrar pelo chão. Não se esqueça de olhar em todos os cantos e, depois que terminar, pegue o balde e retire o pano que está mergulhado dentro dele. Passe-o por todo o chão da sala e depois disso estará dispensado. — ela deu um sorriso e passou a mão pelos cabelos de Logan — Enquanto isso, eu vou arrumar aqueles papéis que estão sobre a mesa.

Ótimo. Logan havia virado o mordomo de Janeth e teria que limpar toda a sala dela como se fosse um escravo. E tudo isso por causa de Brian. Ah, como Logan estava com raiva dele... Mas ele já havia posto na cabeça que não iria se rebaixar ao nível dele.

Ele ligou o aspirador de pó e começou a realizar o trabalho. Cada canto daquela sala continha partículas de poeira. Ao lado do sofá, embaixo da mesa, por entre os vasos de planta, até mesmo nas paredes parecia haver algo que necessitasse ser aspirado. Talvez Janeth não fizesse uma faxina decente há meses.

Logan já estava quase terminando de aspirar quando ouviu a voz de Janeth por entre os ruídos do aspirador:

— Você sabe que eu não quero o seu mal, não é, Logan?

Ele desligou o aparelho e olhou seriamente para ela.

— Então por que estou aqui? — tinha amargura na voz dele.

Janeth parou de arrumar os papéis e cruzou os braços sobre o peito.

— Eu poderia tê-lo expulsado imediatamente. Eu criei um regulamento muito sério e prezo pelas regras. Está mais do que explícito que qualquer agressão por parte dos alunos será intolerável e virará um caso de expulsão. — ela falava aquilo com uma convicção profunda de que Logan tinha mesmo batido em Brian — Mas, eu tenho conhecimento do seu problema, Logan. Sua tia me alertou antes de fazer a sua matrícula. Ela me contou sobre os seus ataques de fúria e eu entendo claramente o que se passa na sua cabeça. Não posso te expulsar por isso, mas preciso que entenda que essa punição, se é que se pode chamar essa leve faxina de punição, é necessária.

Então ela apenas não havia o enxotado do internato simplesmente porque, no ponto de vista dela, ele era um garoto problemático que precisava de cuidados especiais.

Ele primeiramente ignorou-a e pegou o balde que estava ao lado do sofá. Abaixou-se e começou a esfregar o chão com toda a sua força. Estava com nojo de Janeth e queria sair dali o mais rápido possível.

— É isso que todo mundo acha que eu sou: — ele disse, sem olhar para Janeth — um menino problemático.

— Eu não quis dizer isso. Eu tenho um carinho muito especial pelos meus alunos e não quero que você pense que não é assim com você.

Logan revirou os olhos.

— Se você tivesse carinho por mim, eu não estaria aqui limpando o chão da sua sala.

Ele já havia esfregado quase o chão inteiro e ele não permitiu que as dores se espalhassem por seus braços. Já bastava a dor que ele estava sentindo internamente, como se ele fosse a última pessoa do mundo.

— Não encare isso como uma coisa ruim. É apenas um favor que você está fazendo a mim. Sabe como é, já tenho certa idade e não posso ficar abaixando.

— Não sou um empregado que está sempre ao seu alcance.

Janeth não respondeu. Ela apenas soltou um longo suspiro e voltou a arrumar os seus papéis.

Logan queria entender porque Janeth estava tentando se mostrar tão amorosa com ele. Ela havia sido tão dura na frente de Brian e agora que ele não estava presente, ela estava sendo legal.

Já não havia mais nada que pudesse ser limpo naquela sala. O chão estava brilhando e o pano que tinha em suas mãos estava imundo. As costas de Logan estavam lhe matando e tudo o que ele mais queria era tomar um banho e cair na cama.

— Terminei. — disse Logan, depois de levantar e esticar os braços e as pernas que estavam quase dormentes — Será que posso ir embora agora?

Janeth levantou a cabeça e olhou calorosamente para ele.

— É claro. Vá descansar, porque amanhã durante as aulas de educação física você irá me ajudar a colher as frutas no pomar.

Logan assentiu sem vontade alguma e saiu da sala da diretora tirana, comemorando mentalmente o fato de respirar ar puro ao invés de água e sabão.

Já devia ser mais de dez da noite e ele precisava descansar. Seu cérebro implorava por um banho quente e uma cama macia. Logan começou a andar pelos corredores gélidos e imediatamente tratou de pensar na pessoa que passou a dominar os seus pensamentos: Sophia. Ele mal havia a visto depois da conversa no almoço e ele sabia que ela havia ficado agoniada com tudo o que estava acontecendo. Logan sabia que ela se culpava pelo fato de Brian odiá-lo, mas ele não queria que ela ficasse sofrendo por causa disso. A culpa era da obsessão de Brian, e não dela. Ela era apenas mais uma vítima dele.

Logan parou diante da biblioteca, o lugar onde ele havia visto Sophia pela primeira vez, há dois dias atrás. Parecia que ele a conhecia por uma eternidade...

O fato de a porta estar entreaberta e uma luz fraca emanar de lá de dentro chamou a sua atenção.

Logan estreitou o passo e entrou dentro do cômodo quase escuro. Um silêncio estarrecedor se formara dentro da biblioteca e ela estava completamente vazia. Apenas algumas lâmpadas dos lustres centrais estavam acesas e mesmo assim dava para ver tudo com perfeita clareza.

Logan adentrou vagarosamente e tomou cuidado para que seus passos não pudessem ser ouvidos. Ele sabia que havia alguma coisa estranha ali dentro, porque a Sra. Strauss sempre trancava a biblioteca todos os dias às nove da noite.

Quando Logan chegou à sessão de livros reservados ele levou as mãos à cabeça e abafou um grito. Uma cena de completa balbúrdia estava bem diante dos seus olhos e ele não podia acreditar no que ele estava vendo: havia livros espalhados por todos os cantos e as prateleiras estavam quase completamente vazias. Um corpo morto estava por entre os livros abandonados, poças de sangue molhavam o chão e pingos do mesmo líquido havia respingado na parede e nas prateleiras.

Logan rapidamente retirou todos os livros que estavam escondendo o corpo do defunto e suas mãos logo ficaram ensopadas com o sangue que ainda estava fresco. Ele sentiu uma náusea profunda quando reparou que o peito do defunto estava completamente aberto e que o seu coração havia sido arrancado e não estava mais presente em seu corpo. Ele se aproximou do rosto e soltou um grito de terror quando percebeu que quem estava morto, com os olhos abertos em uma expressão aterrorizante, era ninguém mais, ninguém menos, que Brian.


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