He needs a quiet room

With a lock to keep him in

It's just a quiet room

And he's there...

Tudo naquele cômodo era silencioso. Silencioso demais. Toda aquela atmosfera quieta em nada me lembrava dos dois rapazes que eu conhecera horas mais cedo, e eu não conseguia deixar de pensar em como aquele loiro magro e aparentemente tão frágil conseguira, há pouco, castigar uma guitarra e rasgar sua garganta de forma tão vibrante como eu vira Kurt Donald Cobain fazer. Agora, ele estava sentado a um canto, cercado por uma aura etérea que parecia manter do lado de foram tudo além do violão castigado em suas mãos. De alguma maneira, quando estava no palco Kurt parecia tão intocável que eu me recusava a acreditar que ele tivesse de repente se transformado no homem quieto à minha frente. Era como se, a julgar por seu desempenho nas apresentações, todo o mundo em volta de Kurt fosse barulhento e agitado, como ele próprio parecia ser. Eu logo perceberia o contrário: Ele possuía uma urgente necessidade do silêncio, de afundar-se em seu íntimo, mergulhar em sua própria mente tida por muitos como perturbada. Aquilo era parte de Kurt, uma parcela de seu processo criativo; e, quando você aprendia a conviver com esse seu hábito, entendia uma parte de sua quase esquizofrênica genialidade. Quem mais podia tocar um violão velho e emprestado com uma moeda gasta encontrada ao acaso, e ainda fazer isso parecer a coisa mais extraordinária do mundo? Kurt conseguia, e eu e Krist, assim como outros que durante anos tiveram o privilégio de ver as performances dele, tínhamos sorte por sermos parte daquilo. Era como uma manifestação da fantástica energia da música, na forma de alguns acordes lançados no ar. Quando ele tocava, ninguém dizia nada.

           He plays an old guitar

With a coin found by the phone

It was his friends guitar

And he played...

[...]

He thinks he drinks too much

Cause when he tells his two best friends

"I think I drink too much"

No one speaks.

- Você acha que eu bebo demais? - A voz de Krist era sonolenta e cansada, e ele falava olhando para a garrafa de uísque em sua mão direita. O baixista estava sentado no chão, e parecia falar mais consigo mesmo do que conosco. Eu me sentia um tanto acuado pela presença dos dois, como se de alguma forma eu não fizesse parte daquilo. Como se eu fosse um completo estranho. Então, como responder? Limitei-me a olhar para o guitarrista, mas Kurt simplesmente virou-se para o amigo, suspirou baixo e voltou para o violão.- Eu acho que bebo demais... - disse Krist, tão cheio de desânimo e conformismo quanto antes. A frase morreu naturalmente, ninguém disse nada, e assim seguiu-se a noite quase inteira.
• • •
          He's never been in love

But he knows just what love is

He says: "Nevermind"

And no one speaks...

Há pessoas que você conhece esabe que não viverão muito. E a única coisa que você pode fazer é se preparar para quando sua partida se tornar realidade. Eu realmente sempre desejei que você não fosse uma dessas pessoas, Kurt, mas no fundo eu sabia que era em vão. Nós tínhamos medo de te perder, de perder o que tínhamos, os três. Mesmo nos muitos momentos em que parecia que tudo estava prestes a ruir e eu me sentia como um estranho mais uma vez, você era o símbolo maior de tudo o que havíamos construído, e do porquê de estarmos fazendo o que fazíamos. Eu sei que isso pouco importa agora, mas como explicar o quanto eu fiquei triste quando soube de sua morte? Essa lembrança é algo que me assombra até hoje. Você começou apenas como o amigo de um amigo, e no entanto, o que se tornou? Um companheiro de quarto, de banda, de vida. Você, Kurt, e aquilo que você representava se tornou essencial. Sim, sei que nossa perda em nada se compara à de Courtney, ou, principalmente, de Frances. Mas, assim como elas e todas as pessoas que conheceram quem você era, mesmo sabendo que jamais o compreenderiam por completo, Krist e eu perdemos uma parte de nós que ninguém poderá substituir. Nunca. Quando você dizia “deixa para lá”, se fazia silêncio, lembra? Ninguém te contradizia, ninguém falava. Assim como quando você tocava.Nós realmente não vamos esquecê-lo, Kurt, e nunca vamos esquecer as coisas que você fez. As canções que você escreveu, tudo aquilo que você nos falou, cada ato seu ficou guardado e será lembrado para sempre por aqueles que te conheceram. Eu ainda sonho com você às vezes, sabe. E é como se você simplesmente fosse aparecer, sorrir e dizer com orgulho que conseguiu enganar a todos nós esse tempo todo. Você perdeu tanta coisa, cara... Esses anos todos, eu sempre imaginava o que você diria se estivesse aqui. Para mim, para Krist e sei que para muitas outras pessoas, foi como se o mundo jamais tivesse sido o mesmo depois de você, Kurt Cobain. Sempre que essas memórias me vêm à mente, e esses sonhos me acendem esperanças que eu devia abandonar, é como se você jamais tivesse partido.