As férias de verão passaram bem e as aulas recomeçaram. No primeiro dia de aula John levou todos aqueles papéis para a escola e entregou-os a Kyle.

-Isso... É da pequena Rose? - ele perguntou chocado, com o mesmo tom suave de sempre.

-Sim. - John respondeu tristemente.

Aquilo pareceu atingi-lo profundamente, suas mãos ficaram trêmulas e ele bateu na mesa em que estava sentado com toda a força que tinha.

-Rose... - ele sussurrou.

Em seguida sentou-se outra vez e escondeu o rosto nas mãos, ele parecia chorar.

-Kyle... Ela... Ela deve estar bem agora, não se preocupe... - tentou consolar Alice, mas ela não tinha sentimento algum por Rose e aquilo não ajudava na escolha de suas palavras.

-Kyle, me escuta! Fique feliz por Rose, fique feliz por nós! Vai dizer que seu coração não ficou cheio quando você leu que ela nos admirava? Mesmo que ela tenha... Ido embora, quando ela viveu, nós fomos importantes pra ela! E não se preocupe, Rose deve estar ouvindo tudo o que falamos aqui, e estar muito feliz! - John acabou chamando a atenção de alguns alunos ali presentes com o alto tom de voz, mas não ligava.

-É... É verdade... Mesmo... - ele soluçou e se levantou; segurou forte John pelos ombros e olhou fundo nos olhos dele. - Obrigado... Obrigado por me fazer ver isso.

-Precisamos continuar vivendo bem, para que Rose não fique preocupada lá no céu, né? - falou o outro com um sorriso.

Kyle abriu um sorriso triste e o abraçou forte. “Ok, sentimental demais.” - pensou John, chocado. Ele ficou alguns segundos assim - os mesmos parecendo algumas horas - e o sinal tocou logo em seguida.

-Ótimo saber que está melhor, acho melhor ir para sua sala, sim? - insistiu John, empurrando-o para fora da sala.

Kyle acenou e foi caminhando embora, e quando o outro voltou para sua sala encontrou Alice segurando o riso com lágrimas nos olhos e o rosto todo vermelho.

-O QUÊ? ME DEIXA! Ele... Ficou feliz, deixa ele. Coitado. - falou John envergonhado.

Ela não aguentou e com um som bastante estranho desvairou-se a rir. Só parou quando o professor entrou na sala, ainda por cima fora com muito esforço.

E conforme o tempo passou, tanto John quanto Kyle conseguiram superar e até esquecer tudo o que aconteceu. Depois daquele semestre, os três pareceram mais próximos; o único problema era que John estava estranhamente quieto e desligado: estudava pouco, conversava durante a aula inteira com Alice e suas notas baixaram. Tudo isso resultou uma bonita recuperação no final do ano, e a pior parte era que até mesmo Alice havia passado facilmente.

-EU NÃO ACREDITO! COMO ISSO FOI ACONTECER? - ele gritou indignado quando pegou o boletim.

-Ah John... Você não se esforçou nem um tiquinho de nada, não reclame. - xingou Alice.

Em seguida alguém passou rapidamente, puxou-a pela cintura e dispersando um beijo na face da garota. Ela olhou vermelha para os lados, confusa, e ficou assustada ao se deparar com Leon.

-Oras, muito bom! Seu boletim é todo bonitinho, nada a menos que 7, é? Muito bem. - ele elogiou passando a mão nos cabelos dela.

-Quer parar? Aposto como você tirou, tipo, 3 em tudo! - ela falou mostrando a língua em seguida.

-Pode apostar! - ele colocou o papel bem em frente aos olhos dela e de John.

O segundo sentiu seu chão desabar. “Eu... Perdi pro Leon? COMO ASSIM?” - pensou incrédulo. As notas dele não eram menores que 9, enquanto as de John não passavam de 7 ou 8. Alice também olhava chocada para o boletim do garoto. Outro menino, loiro e alto, apareceu e falou algo pra Leon, que assentiu com a cabeça e logo se pôs a falar.

-Bem, espero ter provado alguma coisa. Tchau pra vocês. - ele saiu rindo.

Ambos foram caminhando chocados para casa, mas logo passou. Quando chegaram à casa de Alice, John não conseguiu nem sorrir, imaginando a bronca que levaria dos pais.

-Então... Esforce-se! Caso precise, estarei em casa à disposição para ajudar você. - ela falou sorrindo e entrou pela porta.

Não se viram nenhuma vez durante duas semanas. Provavelmente John estava concentrado demais estudando, mas Alice sentia sua falta. “Talvez eu devesse conferir...” - ela pensou enquanto olhava para a casa dele pela janela. Pôs algumas roupas e caminhou até a casa dos Dodgson. Bateu à porta e depois de algum tempo alguém a abriu.

-Pois não? Oh, Alice! Entre, entre! - falou simpaticamente o pai de John.

-Olá, senhor Dodgson! O John está? - ela perguntou sorridente.

-Claro, ele está no quarto. Sabe onde é, não?

-Sim, claro. - ela começou a subir as escadas.

Caminhou até o quarto do garoto e encontrou a porta entreaberta.

-John? - ela chamou enquanto abria a porta.

Livros, cadernos, folhas jogadas e um quarto com apenas o abajur da escrivaninha ligado; ali no meio estava John, que escrevia alguma coisa compulsivamente.

-O que? O que foi?! Quem é? - perguntou ele irritado, sem se virar para trás.

-S-sou eu, Alice. - ela respondeu assustada, nunca o vira naquele estado.

-O que você quer?

-Queria saber se você estava bem.

-Não tem nada de errado comigo. Pronto? Agora pode ir para casa sossegada.

Alice tomou aquilo como um “não te quero por perto no momento” e foi embora. Faltavam três dias para que a recuperação de John terminasse, e junto à irritação do garoto - pelo menos ela esperava. E assim aconteceu, ele passou com a melhor nota e se acalmou. Jurou para si mesmo que nunca mais aconteceria e pediu desculpas a Alice.

Depois daquilo, o natal estava próximo. Eles o passaram juntos pela primeira vez, e ambos estavam muito felizes. No ano novo também, e seria na casa dos Tenniel.

-Estou tão empolgado pra saber como é o ano novo na sua casa, Alice! - falou John enquanto ajudava ela e a mãe a arrumar a mesa.

-É bem animado, eu gosto da minha família nessa época. - riu ela.

Os convidados foram chegando, a casa foi se enchendo cada vez mais e apetitosas comidas eram servidas na mesa. E o tempo foi passando, até que a contagem regressiva começou e bonitos fogos foram lançados no céu lá fora. Tanto Alice quanto John ficaram admirados com a beleza dos mesmos.

-É lindo, né? - falou ele com os olhos brilhando.

-Muito... Muito mesmo!

Alice sorriu e pegou na mão de John, ele a apertou forte e abaixou a cabeça.

-Alice... Eu... Preciso falar uma coisa pra você. Mesmo sabendo das consequências, eu preciso falar. Então... - ele começou, com o rosto vermelho.

-O que foi, John? - ela perguntou assustada.

Ele a abraçou forte e ficou assim durante alguns segundos. Alice, sem entender nada, acariciou sua cabeça em uma tentativa de ajudar.

-Alice... A verdade é que... - ele falou baixinho.

-Fala duma vez! - insistiu ela, segurando-o pelos ombros.

Ele sentiu-se explosivo: desvencilhou-se dos braços dela e colocou-a na parede, segurando-a pelos pulsos. Com o rosto bem próximo, começou a falar.

-Eu... Eu gosto de você, caramba! Muito mais do que como só amigos, eu te amo... Muito. Eu quero te beijar, te tocar, e todas essas coisas. Alice, você não entende? Não vê? Todo aquele tempo de recuperação que eu não conseguia falar com você me deixou péssimo e meu humor não podia estar pior! Eu te amo, é isso! Saco, por que você não percebe? - ele falou alto e, largando-a, deu as costas a ela.

Alice escorregou as costas pela parede e sentou-se na neve, chocada.