Bitter Taste escrita por Mary Black


Capítulo 1
Capítulo único


Notas iniciais do capítulo

Eles estão no sétimo ano,e a guerra ainda não começou.Enjoy!



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 Parecia que, apesar da grossa porta de carvalho e das paredes sólidas, qualquer um que passasse por aquele corredor podia escutar os choramingos da garota.Não que ela estivesse realmente se importando. Na verdade,estava num nível muito próximo ao de ligar o botão “dane-se” para qualquer indivíduo que ousasse bater à porta do quarto e interromper seu momento de solidão e tristeza.

Olhando-se o quadro geral,Hermione estava com total e absoluta certeza completamente deslocada no cenário alegre e exuberante de Hogwarts. A véspera do natal não podia ter amanhecido mais perfeita.A neve tinha caído durante a noite,e os jardins pareciam cobertos por um infinito tapete branco e felpudo.As árvores estavam salpicadas por flocos,e o Salgueiro Lutador vez ou outra balançava os galhos tentando se livrar da neve que invariavelmente voltaria a cair.A decoração do interior do castelo fora definitivamente terminada no dia anterior. Azevinhos foram pendurados em todos os portais.As costumeiras doze árvores de natal estavam devidamente decoradas com os laços,fitas e bolas.Grinaldas enfeitavam as paredes. As armaduras foram polidas até a exaustão por Filch,que ameaçava pendurar pelos calcanhares qualquer um que ousasse romper a distância de dez centímetros que ele dissera obrigatória.Os que não estavam aconchegados em frente às lareiras faziam guerras de bolas de neve nos jardins, ou simplesmente passeavam pela orla da Floresta.

Enquanto isso,a garota estava enfurnada em seu dormitório de monitora-chefe.Mesmo a decoração vermelha e dourada parecia terrivelmente mórbida e apagada.A neve da madrugada anterior se acumulara no beiral da janela,embaçando os vidros já translúcidos.A já escassa luz do sol praticamente não entrava no quarto,já que as pesadas cortinas de veludo estavam quase completamente fechadas, deixando apenas uma minúscula brecha por onde alguns raios de sol atreviam-se a entrar no recinto.Ela não parecia sequer nota-los, mesmo quando batiam em cheio contra seu rosto.Ali,jogada descuidadamente em cima da cama,ainda com as roupas do dia anterior e o rosto enfiado num dos travesseiros,aquela decididamente não parecia Hermione Granger.Ao menos,não a Hermione “normal”,a sabe-tudo fria e racional que todos estavam acostumados a ver e conviver.

Não parecia que tivesse forças para levantar,mesmo que quisesse fazê-lo, o que não era o caso. Não estava se importando se parecia uma idiota inútil enfiada no quarto chorando.Não ligava a mínima se Harry ou Rony ou mesmo Gina pudessem estar procurando-na.E decididamente não se importava com aquele ser humano desprezível que atendia pelo nome de Draco Malfoy.

Na verdade,não sabia nem mesmo o motivo para que estivesse se debulhando no que pareciam infinitas lágrimas.Talvez não fosse só pela humilhação do dia anterior.Disso ela estava quase certa. Provavelmente, chorava porque lembrava-se da promessa que fizera a si mesma, já perdera a conta de quantas vezes:não derramar mais uma lágrima por aquele ser. E também já perdera a conta de quantas vezes a quebrara.

Odiava-se por isso.Por não poder simplesmente deixar de ter todo e qualquer sentimento por ele.Por que não podia simplesmente se conformar com o fato de que eles nunca dariam certo? Já fora avisada sobre esse detalhe milhões de vezes.Então,por que,pelas barbas de Merlin, ainda insistia em acreditar que tudo podia mudar?Que ele podia renegar sua própria natureza? Seu próprio sangue?

Porque,acima de tudo,ele era um Malfoy,como sempre se orgulhava e inflava o peito para “casualmente mencionar”.Uma família onde há gerações só corria o sangue mais puro,da mais distinta e renomada classe da mais duramente selecionada elite do mundo bruxo. Aqueles que se achavam no direito de fazer tudo o que quisessem na hora que bem entendessem,e que não ligavam a mínima se precisariam manipular, usar ou até mesmo matar para conseguir o que queriam.

Hermione,se é que era possível,sentia cada vez mais nojo de si mesma todas as vezes que pensamentos como esse inundavam seu cérebro que,mesmo renegado e posto de lado desde que ela decidira se envolver com Malfoy,continuava inconscientemente mandando avisos e sinais de que,mais dia menos dia,ela iria se machucar.Muito mais sério e muito mais dolorido do que todas as outras vezes.

Quisera ela ter escutado enquanto ainda havia tempo.

Mas não,ela não ouvira.Parecia que gostara de se enganar.Como uma atitude masoquista e teimosa, insistir numa coisa que ela e todos sabiam que não tinha chance nenhum de dar certo.Mas ela insistira. Agora, percebia que pessoas apaixonadas tendem a ficar idiotas e com um julgamento comprometido.

E a conclusão mais indubitável a que ela pôde chegar era que não havia nada pior do que se apaixonar por seu pior inimigo.

Principalmente se ele fosse Draco Malfoy.

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Não via as horas passarem.Estava muito absorta nos próprios pensamentos para ter essa consciência.Não sentia fome – na verdade, diria que,se se forçasse a comer alguma coisa, vomitaria.Mesmo a bile parecia querer ser posta para fora,o que talvez explicasse aquela terrível ânsia de vômito que sentia perpassar sua garganta.Nunca na vida se sentira tão mal. Como se fosse apenas uma pequena estátua de porcelana, proposital e forçadamente arremessada no chão com a maior força possível,estilhaçada em milhões de pedacinhos que depois foram pisoteados até virarem pó.Era a melhor comparação que ela podia encontrar para se descrever.

E,como se tudo isso não bastasse,seu cérebro insistia em vislumbrar imagens dele.Seus olhos azuis-acinzentados penetrantes, encarando-a, fazendo-a corar,como se pudessem enxergar seus sentimentos mais profundos,seus desejos mais secretos.O cabelo quase branco de tão loiro, propositalmente bagunçado.O jeito como ele displicentemente passava a mão pelos fios, despenteando-os ainda mais. Sua mão quente segurando na dela,entrelaçando os dedos nos seus. O sorriso torto, especialmente reservado para ela.Até o jeito de andar,tendo certeza absoluta do que queria.Não,do que iria ter. Porque, quando ele se decidia,não havia nada que pudesse pará-lo.Fora assim com ela.E com todas as outras,pensou amargamente.

Mas isso tudo era nada se comparado a seu beijo.O mais doce que poderia existir,uma profusão de sabores e sensações. Calmo, instigante, possessivo, abrasador.Só o roçar dos lábios dele nos dela já era mais do que suficiente para fazer seu coração acelerar como numa corrida de cem metros. Ele batia descompassado, pulando alguns batimentos, para depois voltar a acelerar como um louco. Parecia uma britadeira descompassada, fazendo um barulho equivalente. A mão dele, instintivamente, escorregava para sua cintura, extinguindo a já minúscula distância,colando seus corpos. Ela se deixava levar,passando os braços em torno de seu pescoço, só para ter certeza de que ele estava mesmo ali. Seu paraíso particular. Seu.

O paraíso que,de uma hora para outra,se tornara o inferno.O pior que pudesse existir.

Era a última coisa que ela queria,o que ela nunca esperava.Nunca havia imaginado que,algum dia, iria encontrar o que encontrou.Ver o que viu. Na hora,estancou.Era muito impossível para ser verdade. Absurdo.

Impensável.

Mas era verdade.

Reconheceria aqueles cabelos loiros em qualquer lugar.

A cena lhe dava nojo.Seu rosto provavelmente se contorceu de imediato na pior careta que podia fazer. Subitamente,o ar lhe faltou. Não queria acreditar na cena que estava presenciando. Não queria,mas não parecia que tivesse realmente esse direito.A verdade estava ali, estampada, em letras garrafais num letreiro neon. Ele estava agarrado de um jeito naquela garota loira que seu cérebro não identificou que era até difícil saber quem era quem. Suas bocas estavam coladas de um jeito selvagem, animalesco. Não conseguia pensar em outra palavra para descrever o momento que não “nojento”.

Quando recuperou o controle dos seus movimentos,saiu correndo dali. Provavelmente fizera algum barulho, porque pôde sentir que ele largara a desconhecida e chamara seu nome.Mas ela sequer cogitara a possibilidade de parar.Seus instintos a guiaram automaticamente até o quarto. Não sabia nem como conseguira trancar a porta,os olhos encharcados de lágrimas.

Se jogara na cama,e praticamente não se mexera desde então.O gosto salgado das lágrimas no travesseiro se misturava ao sabor amargo de saber que tinha sido traída.Sabia que a culpa,em parte era sua.Fora ingênua demais para acreditar que alguém como Malfoy pudesse mudar. Pudesse deixar seu jeito galinha de ser por uma garota. Por ela. Por Merlin, como pudera acreditar nisso? Agora, estava muito mais do que óbvio que ela fora só mais uma.Como todas as outras. Era assim que ele fazia. O mesmo papinho. As mesmas palavras doces. Por que não se dera conta de quanto ele era cínico um pouco antes?Isso teria lhe poupado da dor e do sofrimento de agora. Mas não. Na hora em que mais precisara de seu cérebro, o coração comandara suas atitudes. E ela estava pagando caro por isso.

Queria ser o tipo de pessoa que conseguia afogar suas mágoas numa garrafa de uísque de fogo.Ou numa de absinto. Ou numa de qualquer outra bebida,bruxa ou trouxa.Queria apenas esquecer. Apagar da memória os últimos dias.Ou melhor,todos os momentos em que Draco Malfoy estivesse presente em sua vida.Mesmo que como parte da decoração de fundo.

Estava tão perdida em seus próprios pensamentos,trancada no seu próprio mundo particular, que não percebera que não estava mais sozinha no quarto.

Não fora difícil entrar.Em sua afobação,Hermione se esquecera de trancar magicamente a porta. Um simples “Alorromora” resolvera seu problema. Ou, talvez, criara um maior.

Do nada,sua voz sumira.Queria falar,chamar seu nome.Mas não conseguia. Também não parecia conseguir se mexer.E ficou lá, prostrado como uma estátua grega,sentindo-se mais impotente do que nunca.

Afinal de contas,o que iria dizer?Ela não se contentaria com uma simples desculpa.Pensando como ela,o que ele fizera era inadmissível.E talvez a decisão mais certa fosse sair do quarto,no mesmo silêncio em que ele entrara,e deixar as coisas como estavam.Não parecia haver conserto. 

Não conseguia entender,também,o que o levara a agir daquele jeito. Sempre se achara tão seguro de si.Sempre tão dominador.Ele conseguia perfeitamente se controlar,impor suas vontades, ser frio quando precisava e a pessoa mais amorosa do mundo quando queria.

E qual não foi a surpresa de Hermione,quando se forçou a levantar para ir ao banheiro e tomar um banho e o viu ali,parado,no meio de seu quarto? Ela trancara a porta.Como ele podia ter entrado?

Mas não era a hora apropriada para perguntas estúpidas. Resgatando todo o seu orgulho e coragem,ela se levantou,arrumando forças não sabia onde. Encarou-o de frente,os olhos castanhos, apesar de vermelhos e inchados,firmes.Pôde ver suas orbes turvas,um azul-opaco e leitoso, enevoado.Tinha algumas poucas olheiras sob as pálpebras, que deixavam seus olhos mais fundos e inquisidores.

Ela apenas se limitou a encará-lo,como se o desafiasse a falar alguma coisa. Não fazia a mínima ideia do quão mortífero e fulminante aquele seu olhar podia ser. Se soubesse,o encararia até reduzí-lo a pó.Ou a uma pequena mancha cinza no carpete vermelho.

Por fim,depois de alguns angustiantes segundos dessa amigável troca de olhares (que pareceram séculos), ele pigarreou:

-Eu queria...

Não pôde,contudo,terminar a frase;foi bgruscamente interrompido por uma voz alterada e um pouco mais estridente que o normal – O que é que você queria, Malfoy? – a última palavra fora pronunciada num tom tão frio e cortante que podia ser comparado ao da navalha mais afiada.

-Falar com você – sem perceber,ele suava frio.

-Ah,é mesmo?Porque eu pensei que você iria querer falar era com aquela sua amiguinha, aquela em cuja boca você tava enfiando a língua de um jeito super delicado.

-Não – ele conseguira,finalmente,controlar o timbre da sua voz. Empertigara-se, de forma a aumentar o máximo possível os poucos centímetros que era mais alto que ela – Eu queria, não, eu quero e vou falar com você.

-E quem foi que disse que eu quero te escutar?Cansei desses seus joguinhos, Malfoy.Cansei de esperar por você.Cansei de bancar o papel de idiota. Não quero que você explique nada.Nem ouse tentar.Isso absolutamente não é necessário. Já passamos por isso antes, eu já fui contra todos os meus princípios e te perdoei uma vez.Fazer tudo isso de novo é uma perda de tempo, e não vai adiantar de nada. Eu não sou completamente insensível,sabe? Meu único desejo agora é apagar a memória desse seu maldito rosto.Então,faça o favor de sair do meu quarto e de nunca mais olhar na minha cara, se for possível. Vamos voltar ao estágio de relacionamento que tínhamos alguns anos atrás. Vou me arrepender pelo resto da vida,mas não vou dizer que não foi bom enquanto durou. Mas agora acabou. ACABOU, entendeu? Então saia daqui, e saia agora – recolhendo os cacos de seu orgulho ferido, ela se encaminhou até a porta e a abriu quase teatralmente, segurando-a para que ele saísse.

Resignado,ou foi assim que pareceu para ela,ele se virou e caminhou uns poucos passos em direção à porta.Mas mudou bruscamente de direção no último segundo,e virou-se de súbito para ela.Num átimo, segurou seu rosto pequeno e delicado entre as mãos,e colou seus lábios nos dela.Pega de surpresa,ela automaticamente correspondeu. Aquele beijo parecia desesperado,como se ele estivesse em alto-mar e ela fosse uma bóia. Como se a vida dele dependesse daquele momento.

O cérebro de Hermione entrou num impasse.Deixá-lo voltar,recebê-lo de braços abertos. Eles podiam voltar a ser o casal perfeitamente imperfeito, porém, na medida do possível, feliz.Ela só não sabia se podia novamente engolir seu orgulho para aceitá-lo.

Recuperando a consciência mais rápido do que Draco gostaria,ela encerrou bruscamente o beijo. Pego de surpresa,ele não esboçou reação, e a força dela foi mais do que suficiente para empurrá-lo porta afora, não sem depois batê-la à sua frente.A última coisa que viu foi seu rosto – tão bonito,tão perfeito,tão dela – com uma expressão de completa incredulidade.

Fechou a porta muito antes dele fazer uma coisa que nunca pensaria que seria capaz:chorar por uma garota.

Dentro do quarto,Hermione se jogou novamente na cama,voltando a saborear o gosto amargo daquele momento.


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Notas finais do capítulo

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