Quando acordei, Rachel estava sentada ao meu lado desenhando o que provavelmente o professor de desenho tinha mandado. Olhei pro desenho meio sonolento ainda, e vi um prédio com linhas fortes e bem desenhado: 

– Você desenha bem – elogiei com a voz ainda meio rouca do sono que eu dormia.

– É o mínimo que uma arquiteta pode fazer – ela sorriu e me olhou – Não vai fazer seu desenho? 

– Eu não sei desenhar – eu me ajeitei na cadeira – Queria fazer outro curso, mas não sei do que.

– E pra que você está aqui, Justin? – ela riu baixo – O mínimo que você pode fazer aqui é desenhar.

– Eu estou aqui porque que eu precisava saber da...

– Sophia – ela completou e eu a olhei assustado.

– Como você sabe? 

– Ah Justin, eu não sou boba. Você me encheu de perguntas sobre ela, está fazendo arquitetura: o curso que ela fazia, e agora não pára de olhar pra Juliard que tem até alguns traços parecidos com a os dela.

– Você também acha? – Eu perguntei paralisado, não era coisa da minha cabeça então.

– Sim – ela deu mais alguns traços no desenho – Mas o estilo é totalmente diferente. Não que Sophia fosse a menina mais meiga na hora de se vestir, mas ela não andava assim toda de preto, tinha o cabelo maior, os olhos mais limpos de maquiagem e era bem mais comunicativa – enquanto Rachel falava eu olhava pra Juliard que estava entretida em seu desenho – Era uma ótima pessoa, falava com todos mesmo que fosse pouco – disse Rachel – e Juliard nem isso faz.

– Isso é muito estranho – eu falei baixo franzindo as sobrancelhas.

– É ela a garota que você amava, ou estou enganada? 

– Era ela sim – eu olhei Rachel – Eu vim aqui porque ela deixou de mandar cartas pra falar de como estava se saindo na faculdade, e iríamos nos casar agora nas férias.

– Casamento?! – ela falou a palavra como se estivesse perplexa – Estão doidos, isso sim.

– E amor não é sinônimo de loucura? – Perguntei e Rachel apenas sorriu pra mim.

Quando o sinal tocou, aos poucos as pessoas iam saindo da sala. Segurei no braço de Juliard e ela se virou, senti em minha mão nada mais que um braço frio, quente e... uma cicatriz. Eu olhei pro braço dela e vi um corte: 

– Como... como conseguiu isso, Juliard? – Minha garganta secou na hora, meus músculos gelaram e eu fiquei paralisado segurando o braço dela, olhando seus olhos.

– Eu... eu... n-não seei – Ela disse se contorcendo de medo, eu deveria estar assustando ela, mas ela tinha o mesmo corte que Sophia tinha no braço.

– Diz pra mim! – Eu apertei seu braço com os olhos ardendo e ela deu um gritinho aguniado. Logo dois rapazes chegaram em mim e me puxaram, um deles era o rapaz que tinha me emprestado a jaqueta.

– Ei cara, o que está fazendo com ela? – Um me empurrou.

– Nada – eu olhei Juliard ainda meio tonto sem nem saber como reagir – Eu só queria saber... - Juliard saiu correndo agarrada com os cadernos e chorando, eu olhei pro cara da jaqueta e suspirei: 

– Você estragou tudo.

                                                               ***

Na outra aula eu não conseguia prestar atenção em nada que o professor dizia. Eu olhava pra Juliard e me lembrava da sua cicatriz a todo momento. Rachel ruía o lápis ao meu lado, enquanto observava o professor: 

– Rachel... – eu a chamei baixo. Ela me olhou e cuspiu a tinta do lápis no chão. 

– Diz aê.

– Juliard... ela está no colégio desde quando? 

– Huum – ela mexeu os ombros pensando e depois paralisou, deu uma crise de tosses o que chamou a atenção da turma e do professor.

– Senhorita Mellux, você está bem?

– Oh meu Deus – ela ainda tossia, eu levantei e comecei a dar tapas leves em suas costas, ela tossiu um pouco mais e depois sessou. Seu rosto estava tão vermelho quanto seu cabelo.

– Vá beber um pouco de água. – Falou o professor

– Deixa o Justin ir comigo? – ela passou a mão nos olhos que lacrimejavam – Talvez ele possa me ajudar em algo.

O professor não discutiu. Então saímos de sala e eu me perguntava se Rachel tinha inventado toda aquela tosse pra ficar sozinha comigo alí, ao lado de fora.

– Quase perdi a garganta – ela suspirou.

– Fez isso de propósito? – Eu andava ao seu lado.

– Não, eu me engasguei com um pedacinho do lápis mesmo – ela pigarreou como se a garganta cossace – A pergunta que você me fez, Justin... Juliard entrou aqui semanas depois que Sophia saiu.

– O que?! – eu parei de andar – Você tem certeza disso? 

– Sim – ela franziu a testa. 

– E o que você pensa sobre isso? 

– Eu não sei o que pensar – ela balançou os ombros.

– E se eu te disser que Juliard tem uma cicatriz que Sophia tem no braço, a mesma cicatriz, no mesmo lugar? 

– O que quer dizer com isso? – Seu olhar estava confuso. – Que elas são a mesma pessoa? 

– Eu não sei, é confuso demais.

– Ah, claro – ela riu – Então a Sophia sofria de problemas de bipolaridade? Uma hora é uma pessoa e outra hora é outra? 

– Claro que não – eu me encolhi – Eu não sei porque ela está fugindo de mim.

– Ela não esta com cara de quem está "fugindo" de você, ela parece realmente não te conhecer, Justin. - Seu olhar transbordou de piedade.

Depois daquilo eu não voltei mais pra aula, eu fui pro meu quarto e me deitei na cama. Eu não sabia no que pensar, no que fazer, meu coração não sabia o que sentir. Eu estava totalmente perdido, inquieto. Andava pra lá e pra cá, mordia meu lábio, socava a parede de vez em quando... Quando me cansei comecei a fazer abdominal, flexão até me sentir exausto. Minha camisa estava enxarcada de suor, e eu ia tomar banho... claro que eu não ia ficar suado assim. Mas antes eu precisava ver a Juliard, eu já estava ficando aguniado com aquilo.

Saí do meu quarto correndo e vi Rachel conversando com alguns meninos no corredor: 

– Cadê ela? – Perguntei com a respiração ofegante, Rachel olhou meu peitoral suado onde deveria estar transparente, já que a blusa era branca, mas não me importei.

– Na quadra. – Ela respondeu.

Eu saí correndo sem nem querer saber o que ela estava fazendo lá, eu iria tirar essa história a limpo senão eu iria enlouquecer.