A Fera escrita por kushina-san


Capítulo 1
O Princípio do Adeus


Notas iniciais do capítulo

Tive muitas inspirações para este capítulo. A maior delas é a música "Amaashi", de Ikimono Gakari. Na lenda final, o ritmo é o mesmo da música.



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Havia um murmúrio vindo do rio. Um pequeno ressonar de águas tão calmas como aquele dia. Ela só deu-se ao trabalho de mexer os lábios em um sorriso. Sentiu o vento em seu rosto, levando seus cabelos para todos os lados. Fez uma careta. Nem queria imaginar o resultado daquilo. De olhos fechados, atirada na grama de costas, parecia até que não tinha tarefas a fazer.

No ritmo do vento, ela balançava a ponta dos dedos, como se quisesse dançar. Mexeu os braços. Criando uma ciranda com eles, ela permitiu voltar-se a sorrir.

– Eu pensava que você era a mais responsável de minhas irmãs.

Tentou abrir os olhos, mas a luz do sol era ofuscante. Ao se acostumar, deparou-se com os braços cruzados e a expressão marota do rosto de Hanabi. Não tentou evitar o riso que deu ao ver que sua irmã estava pintada de amarelo e azul.

– Você prometeu que não riria! – defendeu-se a garota.

– Me desculpe! Não pude resistir.

Ela ergueu-se para observar melhor o estrago. Hanabi, que sempre teve longos cabelos castanho-escuros e olhos claros como o luar, agora estava parecendo um pavão em fase de acasalamento. E já não havia vestígio de sorriso em seus lábios ou bom humor em sua face. Mas isso era apenas birra.

– Eles estão melhorando no quesito trote – e voltou a rir.

– Hinata! – reclamou indignada e deu uma simulação de tapa no braço da irmã mais velha. Porém, resolveu se contagiar com as gargalhadas.

Hinata já sabia que algo assim aconteceria. Quando fora sua vez de ingressar na escola de jovens, voltou para casa parecendo uma galinha, com ovos e farinha por todo o corpo. Lembra que seu pai naquela época disse que só faltava o bico. Ainda bem que tinha Sakura ao seu lado. Sua irmã tinha a mesma idade e passou pelo trote a calouros junto com ela. Sakura parecia uma arara aquele dia. Elas sempre riam quando se lembravam disso.

Konoha era uma pequena vila de um reino há muito tempo perdido. Envolta de florestas, era difícil o acesso a outros lugares. As lendas que circulavam sobre os arredores dificultavam ainda mais. E todas essas lendas, Hinata sabia de cor.

Hinata era uma adolescente que morava em Konoha com seu pai e suas duas irmãs. Hiashi, seu pai, era um comerciante e para trazer suas mercadorias aventurava-se pelas florestas e ia à procura de grandes centros, de onde sempre trazia o que de mais interessante havia na vila. Até mesmo as ideias, como pensava a garota. Porém, vivia mais tempo em suas longas viagens do que em casa. Mas sempre fazia questão de trazer um presente para cada uma de suas três filhas. E para Hinata, ele já aprendera que para fazê-la brilhar os olhos, tinha que ser um livro.

Hyuuga Hiashi perdera sua esposa muito jovem, ao nascer da pequena Hanabi. Naquele tempo, eles eram uma família muito abençoada, como ele mesmo definia. Foram presenteados com Hinata logo após o casamento e a pequena Sakura veio ainda bebê morar com eles. Seus pais eram dois jovens que perderam suas vidas nas florestas. Tudo o que sabiam sobre eles era que vinham de outro lugar e acabaram sendo atacados por lobos perto de Konoha. Quando os cavaleiros da vila os acharam, já estavam mortos, mas ainda protegiam com seus corpos a filha. A criança foi entregue ao clã regente, mas Hiashi, por insistência da esposa, que cuidara do bebê, pediu pela guarda, o que lhe foi dado graças à grande influência de seu clã. As três irmãs cresceram e Hiashi as considera seus maiores tesouros.

Elas não possuem grandes divergências. Na vila, cada uma é conhecida por suas personalidades totalmente diferentes.

Hanabi, a caçula, tem o gênio mais forte. Hiashi diz que ela é sua “versão feminina”. Exigente, nunca aceita um “não” como resposta. Às vezes, ela é muito dura com suas visões de mundo bem definidas. Mas Hinata sempre achou isso uma qualidade. Ela não é facilmente influenciável, como a maioria das crianças da vila. Sempre teve uma habilidade para luta muito aflorada, o que foi entusiasmado pelo pai. No físico, ela era uma típica Hyuuga. Cabelos longos, escuros e lisos. Corpo pequeno, mas bem definido e forte. E a marca registrada, os olhos cinza sem íris.

Sakura tem sua própria maneira de ser, como diz Hinata. Ela sempre se esforçou para ser reconhecida pela vila como igual. Uma das únicas coisas que seus pais biológicos portavam, era seu registro de nascimento. Por respeito, manteve-se seu sobrenome. Ela gosta de ser lembrada como Haruno Sakura e não como a ovelha negra do clã Hyuuga, como Konoha a vê. Têm grandes habilidades manuais e uma sensibilidade para entender sentimentos como poucos. Possui uma força física que Hinata nunca conseguiu entender para alguém com o corpo tão esguio, além da mental. Ela sempre defende suas irmãs, ficando sua força (juntamente com os cabelos exoticamente rosados) como marca de personalidade. Porém, os poucos que se aproximam, acabam descobrindo como pode ser carinhosa.

Já Hinata... Ela era... Ela. Não tinha muito como se definir. Em questão física, herdou os cabelos azulados e lisos de sua mãe, assim como o corpo frágil e pouco habilidoso. Aliás, Hiashi às vezes fica apenas olhando a filha, numa impressão que ela sempre achou como um déjà vu a seu pai, numa tentativa desesperada de rever sua esposa. Ela era, na maior parte das vezes, quieta. Uma garota da escola um dia a chamou de estranha. Naquele tempo, não gostou nenhum pouco. Hoje, é exatamente isso que qualquer pessoa de fora pode achar. Nunca se sentiu encaixada no local em que nasceu e morou. Sempre teve um fascínio pelo que outros chamam de “desconhecido”. Sempre se interessou pelas histórias da vila, principalmente as que envolviam a floresta do norte, onde os mistérios eram maiores. Já implorou a seu pai para levá-la em uma de suas viagens. Hiashi sempre desviava a conversa, para a infelicidade da garota.

Devaneou um pouco mais sobre sua vida e resolveu terminar o que viera fazer. Hanabi pulara no rio e já mergulhava para dissolver a tinta de seu corpo, como era sua ideia inicial ao ir para o rio e encontrar a irmã mais velha. Hinata ergueu-se e foi até a cesta onde estava as ervas que a anciã havia pedido para colher. Ela e Sakura eram aprendizes da Curandeira Chiyo e a irmã estava se dando melhor nisso, para variar.

Suspirou. Tinha colhido tudo o que precisava antes de deleitar-se com o dia e esquecer-se de seus deveres. Até a flor azul com espinhos vermelhos. Tinha quase certeza de que essa não servia para nada.

Avisou Hanabi que iria voltar para sua aula. Pegou seu exemplar de “A República”, de Platão, o último presente de seu pai. Já havia lido diversas vezes, então abriu diretamente no conto que mais gostava: “O Mito da Caverna”. Seguindo o caminho para a casa de Chiyo-sensei, passou pela praça de Konoha. Resolveu dar uma passadinha na biblioteca do Sarutobi Hiruzen, mais para conversar com o senhor do que pegar emprestado um livro. Já havia lido todos eles.

À medida que avançava para o centro da vila, mais os olhares repousavam em si. Estava acostumada com isso. Olhares reprovadores, com pena ou com indignação. Todos achando que ela deveria ser diferente. Todos esperando mais pela primogênita do líder do clã Hyuuga.

Fechou o livro e deu um longo suspiro. O quanto aquele fardo pesava? Todos os cortejos sem fundamento que já tivera. O preço tão almejado de ser o detentor de um grande poder político e econômico, apenas por se casar com ela.

– Hinata-chan! – a voz chamando-lhe era o exemplo mais claro disso. A garota virou-se para a mulher que estava à janela de sua casa como uma típica fofoqueira à procura de uma novidade. – Entre e tome uma xícara de chá comigo e com Shino-kun!

– Perdoe-me, Aburame-sama, tenho que entregar estas ervas para Chiyo-sensei ainda hoje – indicou a cesta em seus braços com o melhor sorriso que conseguiu forjar.

Era ridículo! Shino não gostava dela e a senhora Aburame sabia disso. Mesmo assim, a quantidade de investidas que aquela mulher já tinha feito para juntar os dois era incrível. Shino, para não decepcionar a mãe, fazia o que lhe era pedido. Mas ela era próxima de Shino o suficiente para saber que possuía sentimentos por Tsunari, uma garota muito inteligente e sensível, porém, pobre. Isso bastava para uma união entre eles ser impossível. Fúteis!

Pelo menos seu pai a deixara livre para escolher seu esposo. Não que isso fosse um grande consolo em um local onde não havia ninguém que lhe chamasse a atenção. Ou, pelo menos, quase ninguém.

Até chegar à biblioteca, passou por muitas pessoas que não gostava. Algumas garotas, colegas suas da época da escola de jovens, cumprimentavam-na com um sorriso falso. Sabia o que elas cochichavam quando viravam as costas. Como ela era diferente das pessoas que ali viviam! Pessoas corruptas e mesquinhas, com ideais mortos e sonhos pacatos e que não envolviam muito trabalho. Pensou em como seria diferente se o rei que deveria governar aquele reino realmente existisse. O fato era que, dentre todas as lendas que encobrem seu desaparecimento, nenhuma se encaixa na versão de Hinata para o sumiço. Para ela, era por pura vergonha. Uma pessoa fraca que não queria o fardo de ter que lidar com toda aquela responsabilidade. Derrotada, Hinata acabava percebendo que essa teoria se encaixava com ela.

E se o rei acabasse descobrindo que aquele não era seu lugar, que aquele não era seu dever e que sua vida não fazia sentido? E se todos os pensamentos platônicos de como a vida deveria ser passasse pela mente dele como passa na dela? Concluiu, enfim, que também fugiria. E como uma covarde também se sentiria.

– Boa tarde, Sarutobi-sama! – cumprimentou o senhor ao entrar na biblioteca.

Conversaram por um longo tempo, passando de filosofia para ficção numa velocidade que encantava Hinata. Como queria que os jovens se contagiassem com o entusiasmo daquele senhor, com as histórias que somente ele descreve com aquela perfeição e com o mundo de conhecimento que ele poderia passar em uma conversa.

Riram quando Konohamaru, neto de Hiruzen, entrou emburrado, sujo como Hanabi. Inclusive, ele fez questão de reclamar da irmã mais nova dela, contando como foi mais atacado que outros no trote por causa de uma discussão que tiveram e afirmou veementemente que foi ela quem começou. Logo, despediu-se às pressas resmungando sobre ter que tomar banho.

– Isso ainda vai acabar em casamento – ponderou Sarutobi-sama.

Hinata levou um pequeno susto interno ao ouvir isso. Não que não tivesse percebido que a amizade dos dois tinha evoluído para algo mascarado de ódio juvenil, mas nunca tinha pensando sobre Hanabi e Konohamaru. Não seria ruim ter ele na família, o garoto era um revolucionário por natureza, além de ter sido bem instruído pelo avô. Às vezes, era mais gentil com Hanabi do que ela merecia. Mas as brigas deles sempre ficaram na base argumentativa.

Ao despedir-se, Hinata tinha em seus braços “João e o Pé de Feijão” e “A Garota da Capa Vermelha” para reler por indicação de Sarutobi. Já estava indo embora, ao perceber que começava a escurecer, quando uma onda rosa adentrou no recinto.

– Chyio-sensei está furiosa com você. Disse que não repetirá as instruções que me passou – falou Sakura diretamente para ela – Boa tarde, Sarutobi-sama. Vim procurar minha irmã gazeteira.

Cortês, o velho senhor respondeu o cumprimento.

– Ela não está a fim de dar essas aulas a mim, Sakura. Eu percebo quando sou um incomodo.

A garota de cabelos rosa apenas revirou os olhos. As duas despediram-se do dono da biblioteca e andaram para casa.

– Você podia ser menos melodramática às vezes – comentou Sakura jogando os braços para trás da nuca.

Hinata a observou. Contra o pôr-do-sol, seu longo cabelo rosa parecia reluzir. Ela usava um vestido cor bege, já surrado por causa da aula prática que teve. Aquela aula era somente para ela, a Hyuuga ainda não estava apta a curar rãs. E pensando na rã, não sabia se sentia pena ou alívio pelo bicho, ao observar os respingos de sangue na roupa da irmã. Ela virou o rosto em direção à Hinata, os olhos verdes inquisidores sobre a observação.

– Não fui melodramática – resolveu defender-se, voltando seu olhar para o caminho – Apenas não estava interessada em ver sangue o dia todo. E Chyio-sensei não me queria por perto, percebi quando ela me pediu para colher isto – e apontou para a dita flor azul que, retirada sua dúvida com Sarutobi, não servia para nada.

– Você não leva jeito para isso – constatou o óbvio, Sakura.

– Eu não levo jeito para quase nada – constatou mais uma coisa óbvia. Na verdade, a única coisa que era realmente melhor que Sakura, era em ler. Mas não há prêmios para quantos livros lê-se na vida.

– Isso não é verdade! Você é a futura líder do clã, podia tentar aprender a administrar.

– Ah é, e para quem eu pediria ajuda? Anciões do clã?

Os anciões do clã Hyuuga eram os que realmente ordenavam as finanças, tomavam as decisões mais importantes junto ao clã principal de Konoha. E eles achavam-na uma idiota que servia apenas para ser casada.

– Certo, eles não. Quem sabe o Neji-nii-san?

Ela só deu-se ao trabalho de virar seu rosto para a outra, com a melhor expressão de negação que podia fazer naquele momento.

Hyuuga Neji é primo delas. Em questão de beleza, um dos melhores partidos da vila. Em questão de humor, o último da lista da Hyuuga de pessoas com quem rir. E ela já ria com poucas pessoas.

– Você não sabe se não tentar... – incentivou Sakura.

– Certo, vou pedir ajuda à Sasuke-san também – sua intenção foi alcançada; a garota de cabelos rosados parou de falar. Parou também de andar. Hinata percebeu que fizera besteira.

Uchiha Sasuke era, de longe, o melhor partido de Konoha. Conseqüentemente, o mais concorrido também. Havia motivos. Seu corpo bem definido de treinos militares juntamente com os olhos e cabelos negros tornavam a beleza do rapaz o primeiro atrativo. O segundo era sua personalidade misteriosa, evasiva. E para Hinata, ele era uma pessoa admirável já pelo fato de não ser fútil. Ele, ainda, era o herdeiro direto da liderança do clã Uchiha, que comandava Konoha. E parecia muito bom nisso. Enfim, o alvo mais cobiçado pelas moças casamenteiras da vila.

Todavia, ele nunca mostrou interesse por ninguém. Ou pelo menos, não socialmente. Mas Hinata sabia de coisas escondidas no passado dele. Coisas que envolviam sua irmã rosada.

Sasuke era da mesma turma do colégio de jovens que Hinata e Sakura. Sempre foi popular entre as meninas, que chegaram até a formarem o “clube das garotas que gostavam de Uchiha Sasuke”, como elas próprias denominaram-se. Para o horror da Hyuuga, a líder do grupo era Sakura. Foi uma fase passageira – apesar de parecer ter voltado – o grupo dissolveu-se quando elas acharam outros ídolos.

Para Sakura, porém, a admiração não se dissolveu. Ao contrário, ela cresceu até tornar-se uma paixão, e logo, um amor. Era um sentimento muito forte que Hinata nunca tinha sentido. Por isso, arrependeu-se da brincadeira.

– Você não seria capaz disso – Sakura fuzilou-a com o olhar.

– É. Não seria mesmo – Hinata resolveu não testar mais a precária paciência da irmã.

O clima voltou ao normal quando Sakura sorriu.

– Shizune-sempai apareceu durante a aula, quando você não estava – ela fez questão de frisar a última parte – e pediu nossa ajuda com a reunião de hoje.

Gemeu e fez careta. A “reunião” era de praxe todo último dia de lua nova. Era um momento de diversão e de avisos. Quem quisesse, poderia contar alguma novidade, assim como havia um momento próprio para declarações ou exposição de talentos. Mas o que deixava a garota estressada era com a parte que lhe cabia, sempre que faltava voluntários.

– Ela quer que você recite algum poema no momento das lendas – completou Sakura.

Hinata não respondeu. Não estava nenhum pouco a fim de fazer isso.

– E como você não estava eu respondi que você faria – ela jogou os braços novamente para trás da nuca, com um sorriso maroto nos lábios.

– Certo. Já que você me meteu nessa, vai tocar a harpa.

Foi a vez de Sakura gemer.

– Por que tem que ser tão cruel em suas vinganças?

– Aprendi com você – respondeu automaticamente Hinata, que reparara em algo e já descalçava os sapatos.

– O que vai fazer? - notou Sakura.

Mas não teve resposta, então se virou para ver Hinata colocando os sapatos na cesta e gritando “a última a chegar é a bruxa”. Revirou os olhos, mas pôs-se a correr. Que brincadeira infantil!

As duas chegaram em casa arfando e mesmo de sapato, Sakura quase venceu. Em questão física, sempre foi melhor. Banharam-se, e juntamente de Hanabi, divertiram-se escolhendo o vestido certo para cada uma. A mais jovem não se deixou convencer a tocar o violão, para infelicidade das outras.

Foram à reunião juntas e felizes depois de receberem a notícia de que o pai voltaria na próxima lua cheia.

Eram especialmente incríveis as reuniões para Hinata. Gostava do ar de alegria que ficava a vila, das pessoas conversando, das cirandas das crianças e das danças dos enamorados. Evitando conversar com algumas pessoas e não prestando atenção a certas conversas, o local ficava perfeito.

Ao passar pela roda de dança, as três irmãs foram chamadas a se unirem. Dançando, Sakura chamou atenção de Hinata quando Sasuke chegou. A Hyuuga sorriu. Afastou-se um pouco, procurou Hanabi com o olhar. Achando-a, pediu ajuda para puxar o herdeiro Uchiha para a dança. A caçula sorriu malandra, bolando um plano rápido. Colocando em ação, as duas conseguiram trazer o rapaz para a dança, meio à contra gosto. Mesmo assim, dançando entre as moças, percebeu quando as irmãs Hyuuga tentavam juntar ele à Sakura. Sorriu de canto e deixou que o som e o ritmo o levassem até ela.

O brilho esverdeado que notou nos olhos de Haruno Sakura quando enlaçou-a para a dança seria inesquecível. Sutilmente, puxou-a para fora da roda, onde queria conversar a sós.

Hinata e Hanabi sorriram ao perceber que o plano deu certo. Teriam novidades hoje, antes de irem dormir. A mais nova foi convidada a dançar por um Konohamaru mal humorado e a mais velha viu-se sozinha meio a casais que se formavam. Já estava dando um jeito de sair dali quando sentiu um toque em seu ombro. Virou-se e sorriu.

– Kiba-kun! – e abraçou-o com força. – Quando voltou? Por que não foi ver-me assim que pôde?

– Calma! Eu acabei de chegar! – respondeu o rapaz de aparência selvagem, retribuindo o abraço.

Inuzuka Kiba é um dos melhores amigos de Hinata, desde criança. Crescera e hoje é um mensageiro de Konoha, um dos únicos existentes. É do exército e Hinata é fascinada pelas histórias que ele conta-lhe sobre a floresta e outros reinos. Uma vez, perguntou ao amigo se ele a levaria em uma de suas saídas e ele negou com veemência. Eles afastaram-se da multidão e foram ao encontro de Akamaru, o fiel cão de Kiba. A garota sempre surpreende-se com a capacidade do cão crescer cada vez mais! Conversaram sobre suas vidas por um longo tempo.

– Eu conheci uma mulher no País do Trovão – confessou em uma voz mais baixa, depois de um breve período de silêncio – Mas ela nunca seria aceita em Konoha.

Hinata, que acariciava Akamaru, interrompeu o toque ao ouvir aquilo. Passou-se pelo menos dez segundos até que a informação fosse aceita e ela continuasse com o carinho.

– Ela tem uma personalidade forte, serve o exército de lá – ele continuou – É uma das únicas mulheres guerreiras, eu achei uma boa ideia para implantar-se aqui.

– Eu também achei – concordou baixinho.

– O nome dela é Karui... Ela corresponde meus sentimentos. Prometi que voltaria para ela assim que pudesse dar baixa aqui.

Hinata olhou-o.

– Veio para despedir-se, então?

– Sim.

Silêncio. O único som audível era o barulho da reunião. A garota já não tentava forçar um sorriso.

– O que você acha... Hinata-chan?

Ela respirou profundamente, fechou os olhos e disse:

– Será como perder um pedaço de mim, mas se é para a felicidade de meu melhor amigo, por que não aceitar e ficar feliz por ele? – ela o olhou, com um sorriso sincero, agora.

Kiba havia declarado seus sentimentos à Hinata quando eles ainda eram muito jovens. Naquela época, ela não podia corresponder. E, infelizmente, nunca pôde. Mesmo assim, possuía um amor especial por aquele garoto, algo mais parecido com o que sentia por Hanabi e Sakura. O problema é que para a garota, Kiba era o único que se encaixava como seu futuro marido. Estava, inclusive, pronta a conversar com ele sobre isso quando o visse. E agora, acabara de aprovar sua união com outra moça.

Que pensamento egoísta, pensou por fim. Ele estava apaixonado por alguém que correspondia. Muito melhor que um relacionamento platônico.

Ele respondeu seu sorriso, abraçando-a.

– Não aceitarão tão facilmente perder o melhor Mensageiro que possuem – ela falou, enquanto apoiava a cabeça no ombro do garoto.

– Então eu fujo – ela adorava a certeza dele. A admiração, inclusive, foi o mais perto de paixão que pode sentir por ele.

Era uma obsessão pessoal, inclusive. Gostava de rodear-se de pessoas com pensamentos fortes e inabaláveis, pessoas que não aceitavam facilmente. Primeiro seu pai, que superou a morte de sua mãe sem demonstrar, aturando as cobranças e desaprovações dos anciões quando decidiu abjugar sua condição de líder do clã. Hoje, Hinata acreditava que foi para ficar longe das dolorosas lembranças de sua mãe. Assim, Hiashi tornou-se viajante. Depois, Sakura, com sua postura firme quanto ao seu pensamento. Até mesmo Hanabi! Era como um contraste a ela, com sua personalidade pacata e, muitas vezes, submissa.

Então, Kiba, com sua fortaleza natural, sempre protegendo-a e amando-a, encantou-a. Mas não o suficiente para que sentisse tudo aquilo que Sakura descreve sentir por Sasuke.

Agora, o seu pilar sairia definitivamente de sua vida. Hinata tinha tudo planejado: como não podia fugir de seu destino, decidiu, por fim, escolher o melhor possível para se casar. Ele estava indo embora. Era como se o chão estivesse desaparecendo.

Ele falou mais algumas coisas sobre Karui. Pelo que ele descrevia, era alguém à sua altura. Ela permitiu-se sorrir mais uma vez pela felicidade do amigo. Esquecer suas mesquinharias por um minuto.

Hanabi apareceu avisando-a que logo seria sua vez de apresentar. Hinata perguntou se já havia avisado Sakura e a mais nova avisou, com um sorriso malicioso, que não a achou em canto algum. Hinata suspirou e Kiba ajudou a procurar sua irmã.

Os dois se separaram na busca e Hinata afastou-se do movimento em definitivo, isolando-se em uma grande árvore. Estava com o coração apertado. Não era uma decepção, mas uma quebra muito brusca de objetivos. Ficou atordoada em seus pensamentos até ouvir um pequeno barulho, como risadas.

Aproximou-se dos arbustos e lá encontrou sua irmã fujona em meio a um clima romântico com o futuro líder de Konoha. É óbvio que enrubesceu.

– Hinata – afirmou Sakura tão corada quanto a irmã, em tom desanimado.

Sasuke lançou o mais educado olhar de “saia” que pode. Quando recuperou a voz, Hinata avisou que era a vez delas apresentarem-se. A Haruno bufou. A Hyuuga deu as costas, sem esperar respostas. Ainda assim ouviu palavras de encorajamento do Uchiha.

– Quero ouví-la tocar.

Hinata foi em direção à multidão, logo sendo puxada por Shizune, que mostrava-lhe o poema. A garota chegou a diminuir os passos para ler melhor o papel que lhe fora entregue. Leu as primeiras linhas, fechou os olhos e continuou, movimentando os lábios sem emitir som, recitando as palavras que já conhecia.

Aquele era o lindo momento em que as pessoas reuniam-se em círculo, deixando no centro apenas o espaço para quem se apresentaria. Hinata sentou-se o mais próximo possível do centro. Sarutobi fez a introdução. Deixando todos praticamente sem fôlego com sua capacidade única de contar histórias, ele descreveu a criação do mundo. Estava tão entretida em sua apresentação que não notou quando Kiba sentou ao seu lado. O mundo só voltou quando Sarutobi terminou.

– Para dar continuidade a essa linda festa, chamamos as irmãs Hinata e Sakura para cantar a Lenda do Último Rei.

Olhou em uma meia careta para Kiba que sorriu e desejou boa sorte. Ergueu-se e Hiruzen beijou-lhe a testa, incentivando-a. Sakura, saindo do nada, veio atrás da garota com uma cara de quem preferia ter ficado namorando. Hinata sorriu singelamente para ela, que resolveu deixar a carranca de lado e sorrir para a irmã.

– Boa noite – Hinata começou – Sei que não tenho a mesma desenvoltura de Sarutobi-sama, mas farei meu melhor.

Sem observar a plateia, fechou os olhos e, no ritmo da harpa que Sakura tocava, cantou os versos com a voz aveludada que tinha:

Entre as florestas do Norte e do Leste

Ao cair das primeiras pétalas da Flor de Cerejeira

O Chegar da Primavera

Marca a Alegria de dois Reis

A vinda do Último Rei!

O Pai, com a felicidade dos pais

Abraçava a Criança tão esperada!

Deus abençoou a mãe, Fada

A ter o mais lindo bebê

O Reino, feliz por seu nascimento

Soltou balões com preces

Todos desejando “Vida longa ao Rei!”

Com todas as bênçãos, a criança cresceu

Tornou-se um jovem desbravador, guerreiro

Que da guerra não tinha medo

E da batalha jamais fugia

Com grandes virtudes, seus feitos heróicos foram contados

Pelos maiores Contadores

Em uma das histórias – dizem – ele lutou contra um dragão

Em outra, enfrentou sereias

Mas acontece que sua mãe adoece

E o príncipe, contra a vontade de seu pai

Parte para sua maior jornada, à procura do país natal de sua mãe

Na esperança de achar uma cura

Entre as lendas desse lugar, estão os perigos inacreditáveis

Anões das montanhas protegem suas portas

Grifos sobrevoam suas redondezas

As florestas possuem sentidos que desnorteiam

Em uma dessas florestas, um encanto o encontrou

E o jovem foi modificado por alguma estranha força

Quando voltou, não estava só

Conseguiu seu intuito: sua mãe foi salva!

Porém, Seu Reino, atacado por Bárbaros

Vinham provar a fortaleza que as histórias contavam

E, em uma árdua e duradoura batalha, os Exércitos se confrontaram

O Líder Bárbaro desafia o Grande Rei

Com sangue e suor, as espadas colidem

E o Destino, condutor de todas as vidas, arma contra o Grande Rei

Nos braços de seu filho, fecha eternamente os olhos

O príncipe, transtornado, convoca o Líder Bárbaro para um duelo

E o derrota, na frente de todos

Dando fim, assim, a Guerra dos Dois Fortes

Com a Coroa sobre a cabeça

O Último Rei volta para os braços de sua mãe

Porém, em uma rejeição ao remédio

A Rainha desfalece de alma

Deixando seu corpo, vivo, para torturar a alma de seu único filho

Levado pelo encanto obtido em sua Viagem ao País das Fadas

E renegando ao seu posto

O Último Rei parte para descobrir a cura de sua mãe

Deixando para trás todo seu Reino

Dividido, cada clã procura vidas melhores

Um desses clãs encontra um Formoso Rio em formato de Folha

Dando assim, início a Konoha

E, sem querer, o Último Rei desintegra

O Grande País do Fogo!


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Notas finais do capítulo

Ohayou Minna-san! Não tenho palavras para descrever minha emoção de ter conseguido terminar esse primeiro capítulo! Sei...Fui bem prolixa nele, no Word deu 11 páginas! Bem, vamos às notas:
1. Não tenho Beta Reader para essa fanfic, se alguém achar necessário, avise-me! Eu li e reli esse capítulo umas cinco vezes... Tomara que não haja muitos erros. ^^
2. Sei que logo perceberão, minha inspiração inicial foi um Conto de Fadas XD
3. O mistério da flor azul com espinhos vermelhos vem no filme "Shrek".
4. Tsunari é uma personagem que eu criei. Até mesmo o nome, então provavelmente não exista...
5. Existe um filme chamado "A Garota da Capa Vermelha". Indico, foi ele que me impulsionou à escrever essa fic.
6. Hinata estará bem diferente do convencional porque ela será um pouco de mim aqui. O seu não encaixamento na sociedade e até trocar aulas por uma boa conversa é típico meu. Além do ar aéreo e de quem não liga para nada nem para si mesmo. Ah sim, por esse motivo podem esperar ironias por parte da protagonista. Mas geralmente são ironias sorrindo...
Enfim, onegai, reviews? *-*
Kisses, arigatou por ler minha fic, ja ne. Kushina-san.