Comece a tocar, Tomi. Estamos só os dois outra vez no nosso universo paralelo secreto. Luzes piscam por todos os lados, flashes nos capturam e gritos de mil bocas diferentes se misturam em nossas mentes formando algo confuso que apenas traduzimos como barulho sem sentido.

Mas enquanto você está de olhos fechados movendo sua cabeça para cima e para baixo tão vagarosamente, sei que nesse momento somos as duas pessoas mais semelhantes do universo. Pois suas mãos calejadas ainda assim não param. Jamais param. Jamais tiram folga, ainda que lhe arrancassem sangue as cordas.

Suas mãos já são escravas conhecidas da melodia suave e hipnotizante que é emitida pela sua alma.

Mas você também escravizou a minha voz. Eu te acompanho.

Eu traduzo com palavras o que o seu sutil balançar cervical está dizendo enquanto seus olhos seguem fechados e o seu coração palpita forte. Estou frio observando você. Quero saber o que você sente. Mas tudo o que vejo ademais são apenas inibidos sorrisos doces.

Se fecho os olhos como você faz, estamos sozinhos. Todos somem. Menos você, a guitarra, o seu banco, o meu banco, o microfone, a minha voz e a nossa canção.

No escuro da minha mente todo o foco está sobre você. Segues tocando com todo o sentimento que você é capaz de expressar ainda que calado, distintamente de mim.

Me perco quando o refrão acaba e é a sua vez de trabalhar sozinho. Estou te olhando! Peço pra você, garoto bonito, tão sozinho e concentrado, perdido no escuro de meus olhos fechados e tão gravado no meu consciente e subconsciente; suplico a você! Por favor, não abra os olhos! Por favor, não expanda o seu sutil sorriso. Sou muito jovem para morrer.

Enquanto você obedece minha súplica, meu coração agora é tão lento quanto o que canto. Estamos os dois de olhos fechados, Tomi. Os dois embalados. Os dois deixando-se levar para longe de onde estamos e nos encaminhando ao nosso próprio espaço secreto.

Não importa se estou sonhando ou viajando, eu penso. Se quando fecho os olhos encontro apenas você, não duvido que você também só encontre a mim quando fecha os seus.

E eu sorrio sutilmente por essa conclusão. E então me lembro do sorriso também sutil que você estava emitindo antes de eu fechar os olhos. Você havia chegado a essa conclusão antes de mim, mas agora eu já te alcancei. Dez minutos mais novo, Tomi.

Canto com mais emoção. E canto só pra você ouvir. E canto bonito, porque é pra te fazer sorrir. Estamos sozinhos. Sozinhos, os dois. Escravos de nossa melodia, escravos das emoções que estamos sentindo quando a fazemos soar e escravos do encanto que temos pela imagem um do outro. Narcisismo, Bill. Diz minha consciência. Não importa, retruco. Ele é lindo. Mãos, olhos, corpo, emoções, pele, cabelo e movimentos. Ele é lindo. É o mais lindo que Deus pôde criar.