Charmed escrita por Bella P


Capítulo 13
Capítulo 12




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/168745/chapter/13

Capítulo 12

Ryuichi

- TATSUHA! - o grito de Mika doeu em meus ouvidos sensíveis por causa da transformação.

Aliás, tudo agora estava sensível. Os meus olhos viam até mesmo as minúsculas partículas de poeira que preenchiam o ar. Meus ouvidos conseguiam escutar ao longe o som das patas de um inseto andando sobre o chão e o meu olfato captava nos mínimos detalhes todas as essências que permeavam aquele buraco no submundo. Desde as cinzas do demônio incinerado, ao cheiro enjoativo de corpos decompostos, enxofre e suor.

Mas o cheiro que mais se destacava, que me fez perder a compostura e torrar aquele Caçador assim que Tatsuha livrou-se das garras do mesmo, era o cheiro metálico de sangue. Sangue do Tatsuha. O mesmo que tinha acabado de desmaiar nos braços de Eiri.

- Faça alguma coisa! - ouvi Eiri rosnar para a irmã enquanto ajoelhava-se suavemente no chão, trazendo Tatsuha consigo e o acomodando em seu peito em uma posição mais confortável. Mika rapidamente o imitou e estendeu as mãos sobre o ferimento na barriga dele. Elas brilharam em um tom dourado por alguns segundos, mas à medida em que o tempo ia passado, o machucado permanecia inalterado e Tatsuha ficava ainda mais pálido.

- Eu... - Mika soluçou, sacudindo a cabeça em negativa como se para espantar qualquer emoção que estivesse prestes a tomar conta de seu corpo, e franziu as sobrancelhas, lançando um olhar determinado ao corpo inerte de Tatsuha e estendendo as mãos sobre o ferimento novamente.

Me remexi, ouvindo as juntas dos meus ombros estalarem enquanto tentava me virar no espaço apertado que comportava muito mal a minha forma de dragão. Sabia que seria muito mais confortável se eu simplesmente retornasse a forma humana, o problema era que eu não sabia como. A transformação havia sido instintiva, algo que se apoderou de mim no momento em que vi Tatsuha em perigo. Mas, agora que a adrenalina tinha abaixado, não fazia a mínima ideia de como reverter esta situação.

- Mika? - a voz de Eiri veio em um tom preocupado quando depois de dois minutos os poderes de Mika não surtiram nenhum efeito sobre o ferimento de Tatsuha que agora tremia nos braços do irmão.

- Não está funcionando. Por que não está funcionando? - pela primeira vez, desde que fui apresentada à ela por Tohma, vi Mika perder a compostura. Os olhos dela estavam vermelhos das lágrimas que já rolavam pelas suas bochechas e o seu rosto continha uma expressão de puro desespero.

- Não. NÃO! - Eiri gritou, apertando o corpo de Tatsuha contra o seu. - Tente de novo. Ele ainda respira, o coração ainda bate, então você pode curá-lo...

- Não dá! - Mika o cortou. - Algo está bloqueando os meus poderes. A adaga que o feriu provavelmente era enfeitiçada. - mas a perda de controle de Mika não me surpreendeu mais do que a de Eiri.

Em um minuto o escritor mirava a irmã com ódio diante da incapacidade dela de cumprir a sua função de anjo da guarda, no minuto seguinte ele soltou um soluço estrangulado e escondeu o rosto nos fios molhados do cabelo de Tatsuha, o abraçando mais contra si.

- Temos que levá-lo para a Escola de Magia, talvez haja algo lá que possa... - qualquer teoria que Mika fosse explanar foi interrompida pelo olhar enraivecido que Eiri deu à ela.

- Ele já está entrando no último estágio de um trauma causado por hemorragia intensa. Quando chegarmos lá ele estará morto. Tente de novo! - ordenou e Mika mordeu o lábio inferior com força e eu pude ver em seus olhos que ela queria protestar, queria ser a criatura racional naquele momento, o problema era que a vítima era o seu irmão caçula.

Quanto a mim? O meu peito parecia ser comprimido por uma força externa, o que me fazia perder o ar. Com certeza estaria chorando, mas tenho a sensação de que dragões não tinham dutos lacrimais, mas o terror e a dor que eu sentia percorrer o meu ser diante do que presenciava era mais do que suficiente e me fazia pensar que eu terminei com o Caçador precipitadamente. Eu deveria ter primeiro o estraçalhado com as minhas garras e depois o queimado pedaço por pedaço.

Trinquei os dentes e ouvi o som dos ossos estalando ecoar pela caverna, som este que Mika e Eiri ignoraram, muito mais ocupados em rezar para que, daquela vez, o poder de cura dela funcionasse.

- E se você tentar curar a anemia? - Eiri sugeriu depois de um minuto com as mãos de Mika brilhando sobre a barriga de Tatsuha.

- Não adiantaria nada se o ferimento continuar aberto e sangrando.

- Mas nos daria tempo.

- Não posso ficar o curando da anemia até conseguirmos ajuda. Posso sentir a magia daquela adaga pulsando nele. E a mesma também o está consumindo. Mesmo que eu cure a anemia, quem garante que a minha cura vai permanecer por muito tempo?

Tempo, essa parecia ser a palavra de ordem aqui. Era contra ele que estávamos lutando e se ao menos pudéssemos...

Soltei um rosnado que fez Mika e Eiri pularem no lugar e se lembrarem que havia um dragão com eles naquela caverna.

Ryuichi Sakuma, você era uma anta.

O tempo não era o seu inimigo, era o seu companheiro. Era a história da sua família, era você. Por que correr contra ele ao invés de ao lado dele?

- Se tiver alguma sugestão útil Sakuma, a rosne para nós, somos todos ouvidos. - Eiri debochou e eu soltei um bufo de ar quente sobre ele que fez o cabelos loiros ficarem arrepiados. Em seguida voltei o meu olhar para Tatsuha em seus braços.

Inspirei profundamente, fechando os olhos e buscando dentro de mim aquilo que me compunha, que me fazia ser quem eu era: os poderes dos meus ancestrais. Tatsuha sempre me disse, em nossas aulas, que embora a magia tenha sido bloqueada por anos em meu corpo, ela sempre esteve lá. Adormecida no fundo da minha alma, esperando somente o momento para acordar. E que a mesma sempre sabia o que fazia e que, às vezes, era melhor deixar a racionalidade de lado e confiar nela.

Às vezes era preciso deixar de pensar e permitir que a magia assumisse o controle.

E foi isso o que eu fiz. Parei de lutar contra ela, deixei o tempo assumir e com um abrir de olhos e uma longa expirada de ar, deixei que o meu hálito morno percorresse o corpo de Tatsuha como uma névoa descendo das montanhas em uma manhã fria de Outono.

E então o milagre aconteceu.

O tempo retrocedeu ao nosso favor. O ferimento que antes sangrava foi fechando aos poucos, não como se estivesse cicatrizando de maneira acelerada, mas como se estivesse retornando a um ponto de não existência. Diante dos nossos olhos o sangue parou de escorrer do corte, a pele e carne foram aos poucos se fechando e, por fim, tudo o que sobrou foi um abdômen imaculado como se uma adaga nunca tivesse sido cravada nele.

Tatsuha ainda estava pálido, tremia e tinha o rosto molhado de suor. As suas roupas ainda estavam manchadas de sangue e a sua respiração era extremamente fraca, mas ao menos agora ele tinha uma chance de sobreviver.

- Mika! Cura! Agora! - Eiri pareceu ser o primeiro a acordar do transe que a minha pequena mágica causou.

- Mas ele já está... - Mika começou, mas foi interrompida pelo irmão.

- Seja lá o que o Sakuma fez, somente curou o ferimento e quebrou a magia da adaga. Tatsuha ainda perdeu muito sangue. - Mika assentiu com a cabeça e estendeu as mãos sobre o corpo do irmão.

Vi fascinado o brilho dourado da cura percorrer Tatsuha por completo, trazendo pouco a pouco a cor da vida de volta as suas bochechas e tornando a sua respiração mais forte a cada minuto até que, quando o brilho parou, ele deu uma longa e ruidosa tragada de ar e abriu os olhos em um estalo.

- Alguém anotou a placa do demônio que me atropelou? - Tatsuha perguntou com um grunhido, tentando se sentar, mas Eiri parecia extremamente possessivo naquele momento e permaneceu abraçando o irmão.

Quis rir.

Eles estavam certos. Os irmãos Uesugi tinham a relação mais desfuncional que eu já vi, o que me fez questionar como eles faziam os Encantados darem certo. Mas agora percebi que era assim que eles funcionavam: com Eiri ainda temeroso em soltar o irmão, com medo de que a próxima inspirada de ar de Tatsuha pudesse fazê-lo perder o caçula. Com Mika abrindo e fechando os dedos das mãos, como se hesitasse em levá-los até Tatsuha e lhe dar mais uma dose de cura só por garantia. E com ambos os irmãos Uesugi mais velhos ainda possuindo reminiscências dos olhares de pânico de mais cedo.

- Onde está o Caçador? - Eiri finalmente soltou Tatsuha que pôde se sentar, olhando a sua volta a procura do demônio. Soltei outro bufo, o que trouxe a atenção dele para mim. - Lembrei. - Tatsuha falou em um tom que me pareceu que ele não tinha gostado de eu ter me livrado da ameaça. - Claro que não gostei. Quando para nós é preciso o Poder dos Três para derrotar um demônio desses, você só precisou baforar na cara dele para tudo estar resolvido.

Se eu tivesse sobrancelhas, as estaria arqueando. Ele respondeu os meus pensamentos como se os tivesse lido. Como não tinha sobrancelhas para arquear, franzi a testa e fiz um teste. Pensei no nome dele enquanto o via esfregar os olhos e reclamar com Mika de que a cura dela não o livrou da dor de cabeça que sentia. E Mika iria protestar de volta, se defender, quando calou-se ao ver Tatsuha erguer os olhos e olhar para mim.

- Chamou? - arregalei os olhos. Ele podia ler os meus pensamentos. Fiz mais um teste, pensei em um trecho da música Sleepless Beauty, mas a expressão confusa no rosto dele deu a entender que este pensamento ele não captou. - Okay... - falou longamente, pondo-se de pé com a ajuda de Mika e Eiri. - Talvez seja melhor nós voltarmos e – pausou. - não que eu não ache fascinante a sua nova forma, mas acho que ela não irá concordar com as móveis que por gerações preenchem a nossa casa.

Grunhi. Bem que eu queria espertinho, mas não é como se essa coisa de forma draconiana viesse com um manual de instruções.

- Já tentou se imaginar em sua forma humana para assim reverter o processo? - ele me aconselhou e, se eu pudesse, torraria as pontas do cabelo dele só para deixar de bancar o engraçadinho.

Entretanto, sem falta de opções, fiz o que ele disse e ignorei o sorriso superior que Tatsuha me deu quando minutos depois eu voltei a ser simplesmente Ryuichi Sakuma. Cantor, compositor e ator.

- Isso é muito estranho. - murmurei.

Para a minha primeira transformação, eu tinha me acostumado de maneira muito rápida e minha forma de dragão e considerava, agora, a forma humana difícil de me ajustar. Uma vez Tatsuha me explicou que os dragões eram metamorfos e que a forma humana foi a forma que eles encontraram para se esconderem dos seres não mágicos e ao mesmo tempo interagir no mesmo nível que eles, não o inverso. Tanto que chegou a um ponto que eles passaram a se relacionar e procriar nesta forma, fazendo com que os seus filhotes nascessem humanos para depois aprenderem a ter controle da forma draconiana.

E era na forma mágica que eles sempre se sentiam mais à vontade.

Na época eu ri. Vivi por trinta e dois anos como sendo um humano mestiço (metade japonês, metade europeu por parte de mãe) de 1.78 m de altura, olhos e cabelos claros e 70 kg. Jamais que me sentiria à vontade como sendo uma criatura de dez metros de altura, mais de 700 kg e que cuspia fogo do fundo da garganta. Ao que parece, eu estava enganado.

- Bem vindo ao mundo da magia! - Tatsuha me disse com divertimento e um sorriso enorme no rosto bonito, segurando a minha mão logo em seguida.

E ao sentir os dedos mornos dele entre os meus, não pude deixar de sorrir de volta enquanto desaparecíamos em luzes azuladas.

Tatsuha

Fechei o livro em um estalo, apoiando logo em seguida a minha testa sobre a capa de couro.

Depois de dias agitados entre procurar o Caçador, proteger Ryuichi e ensinar o mesmo a controlar os seus poderes, finalmente vinha a paz. Ou quase.

A minha proximidade com a morte deixou Mika histérica a ponto de simplesmente mandar um aviso para a minha escola, informando que por questões médicas eu ficaria uns dias afastados, e me obrigar a empacotar algumas roupas, junto com o Livro das Sombras, e partir com ela para Tóquio.

Quis protestar, óbvio. O Livro das Sombras, por regra, não saía da velha mansão. Aliás, nenhum de nós saía de lá. Sempre havia um Encantado montando guarda. A casa que está em nossa família há gerações fica em um ponto mágico importante, bem no centro do pentagrama formado pelos elementos água, fogo, terra, ar e metal. Era onde abrigava o nexus. E o que era o Nexus? Bem, isto era uma outra história para ser contada uma outra hora. Vamos só dizer que era uma forma de poder neutro que enquanto estava sob a nossa guarda, pendia a balança mágica mais para o lado do bem.

De qualquer maneira, ela simplesmente me arrastou para Tóquio depois de colocar vários feitiços e amuletos de proteção ao redor da casa e disse que alguns dias longe dela não faria nenhum mal.

E eu não duvidava dela. Afinal, os demônios invadiam a mansão para atacar os Encantados. Sem um de nós lá, que graça teria então?

E agora cá estava eu, em Tóquio, contra a minha vontade – o que era um milagre – com deveres de casa acumulados devido a preguiça que me assolou depois de toda essa confusão de Caçador e Dragões.

- Interrompo? - ergui a cabeça e mirei o meu visitante na entrada do quarto, abrindo um sorriso ao ver Ryuichi recostado no batente da porta. - Estava fazendo o quê?

- Tentando adquirir conhecimento por osmose. - falei, endireitando-me na cadeira enquanto o via entrar no quarto de hóspedes da mansão Seguchi e que estava me servindo naqueles dias. - E então? Como foi o retorno ao mundo real? - brinquei e vi um sorriso surgir no rosto dele enquanto sentava na beirada da cama, tocando com as pontas dos dedos a capa do Livro das Sombras.

- Estranho. - ri diante da resposta.

Eu nasci e cresci neste mundo. Para mim a magia era o meu normal. Se alguém amanhã chegar para mim e disser que viu o Abominável Homem das Neves ou o Papai Noel, eu acreditaria, sem pestanejar, no sujeito. Mas para alguém que viveu toda a vida achando que essas criaturas eram apenas frutos de uma imaginação fértil, descobrir que as coisas não eram bem assim e depois voltar a realidade era uma transição difícil de se fazer.

- Já começou a suspeitar que a entrevistadora da TV é algum ser mágico ou que talvez um dos produtores da NG nem seja humano? - provoquei e o vi desviar o olhar da capa do Livro para o meu rosto, os olhos azuis levemente largos fazendo par com a expressão confusa que ele ostentava.

- O quê?

- Mika me contou que logo depois que ela disse a verdade ao Tohma ele ficou paranoico por semanas, achando que todo mundo à volta dele era alguma criatura mágica ou coisa parecida.

- Ele não estava muito errado, não é mesmo? - Ryuichi brincou, apontando para si mesmo, e eu ri. - Mas... - ele hesitou um pouco. - é normal um ser mágico sentir outro ser mágico?

- Sim. Quanto mais poderoso você for, mais sensível a magia você é.

- Então estou safo. Não vou ficar paranoico como Tohma. - assim que terminou de falar isto, o assunto pareceu morrer entre nós.

Devo confessar que estou surpreso com a visita dele pois desde que partimos do covil do Caçador que não nos víamos pessoalmente. Logo que orbitamos na mansão Mika começou a dar ordens, Eiri buscou o Livro das Sombras para fazer os feitiços de proteção enquanto eu estivesse fora de casa, deixando Ryuichi e eu sozinhos no meio da sala. E, para esclarecer uma dúvida, eu perguntei à ele o que tinha acontecido.

Sakuma me olhou estranho por uns minutos, achou que o trauma havia afetado a minha memória, até que eu expliquei que o que eu queria saber era como o meu ferimento foi curado. A adaga era enfeitiçada. Logo, os poderes de cura de Mika não teriam surtido efeito.

- Eu usei o tempo. - ele havia me explicado. - Sobre o seu ferimento. Retrocedi o mesmo no tempo até o ponto em que ele não havia sido criado. - eu arregalei os olhos quando o ouvi. Ryuichi havia usado o poder de controlar o tempo em um ponto específico do meu corpo. Logo ele que dias atrás não conseguia impedir uma pedra de lhe acertar no meio da testa.

O clã dele, ou talvez somente ele por ser o último de sua família, era realmente poderoso.

- Então... - falamos ao mesmo tempo e sorrimos um para o outro diante disto. - Por que você veio? - perguntei e o vi franzi as sobrancelhas. - Não que eu não tenha apreciado a sua visita, mas é que nos últimos dias eu tenho te visto mais pela TV do que pessoalmente e achei que depois de tudo o que aconteceu, você iria querer voltar a sua rotina o mais rápido possível.

As sobrancelhas dele permaneceram franzidas.

- Eu vim falar sobre aquilo que nós conversamos. Sobre bloquear os meus poderes? - oh! Claro! Óbvio que agora que a poeira abaixou, agora que ele voltou ao foco da mídia, não iria mais querer nenhuma associação com este mundo “estranho” da magia. - Mesmo não sendo mais um dragão, ainda poderei vê-lo? - me perguntou enquanto mordia o lábio inferior em um gesto que supus ser de nervosismo.

Agora foi a minha vez de franzir as sobrancelhas.

- Sim. - respondi hesitante e vi que um sorriso começava a surgir no rosto dele, mas esse logo morreu quando eu prossegui. - Mas não é aconselhado.

- Por quê? - soltei um longo suspiro e cocei os olhos com as pontas dos dedos.

- Você viveu poucos dias na minha vida Ryuichi. Aquilo que você presenciou é a minha rotina. E se tentar viver nela é perigoso para mim, imagine para você? Olha... - hesitei mais uma vez, querendo ir até ele e abraçá-lo, consolá-lo. A expressão desolada que Ryuichi fazia diante das minhas palavras era de cortar o coração. Parecia que eu havia tirado dele a coisa mais preciosa que ele tinha na vida. E talvez eu tenha.

Mika me contou, logo assim que chegamos em Tóquio, como Eiri e ela conseguiram me achar e o porquê. Saber que eu era o parceiro predestinado de Ryuichi era tão ridiculamente clichê que levei um tempo para assimilar e aceitar essa verdade. Mas isso também explicava a atração súbita, o fato de que Sakuma conseguia tão facilmente penetrar em minhas barreiras e como eu queria sempre estar perto dele. Mika não soube explicar se a conexão havia começado comigo no momento em que tomei conhecimento da existência do Nittle Grasper e fortalecido assim que Ryuichi tomou consciência da minha existência, ou se o processo começou quando nos encontramos cara a cara. Mas ela admitia que a ligação era bem poderosa.

Mas qualquer relação entre nós dois era impossível.

Vivíamos, literalmente, em mundos diferentes.

- Eu quero ficar ao seu lado, conhecê-lo, explorar essa coisa que surgiu entre nós? Sim, eu quero. Mas ainda sou um Encantado, ainda sou um bruxo do bem e você ainda é um Inocente. Minha missão neste mundo é protegê-lo e se para isso eu tiver que ficar afastado de você, assim o farei. Quando bloquearmos os seus poderes você voltará a sua vida e eu voltarei a minha. Será melhor para todos assim.

Ryuichi apenas ficou me olhando em silêncio durante todo o meu discurso, um olhar penetrante que estava me deixando nervoso. Era como se aquelas íris azuladas quisessem desvendar a minha alma e estivessem conseguindo.

- E se eu não quiser?

- Não quiser o quê? - perguntei.

- Que vocês bloqueiem os meus poderes. - dei mais um suspiro.

- Ryuichi, se você está fazendo isto apenas para ficar comigo, não faça. Essa decisão tem que ser para você e por você.

- Mas é por mim.

- Ryui... - ele ergueu a mão e eu me calei.

- Ficar com você é o que eu quero. Embora esta seja a coisa mais doida que já tenha acontecido comigo. Eu canto em minhas músicas sobre “amor à primeira vista”, mas nunca pensei que os meus antepassados fossem a razão da origem deste termo e que eu, muito menos, experimentaria isto. Mas sempre fui um sujeito de ir atrás do que eu quero. E como eu quero você e a única maneira de nós funcionarmos é se eu mantiver os meus poderes, então que assim seja. Além do mais – ele deu de ombros. - eu me diverti nesses dias. Me senti bem derrotando aquele demônio, ajudando vocês.

Sorri para ele, sacudindo levemente a cabeça em uma negativa.

- Um alívio saber que você mudou de ideia. Porque, sendo sincero, eu não estava certo se o Poder dos Três seria capaz de refazer o que a sua avó fez. - Ryuichi arregalou os olhos diante da minha confissão.

- TATSUHA! - gritou ultrajado por ter sido enganado e em um pulo saiu de sobre a cama e avançou sobre mim, jogando-se em meu colo e sentando-se sobre as minhas coxas, acomodando as suas pernas uma de cada lado da minha cintura.

Gargalhei. Uma risada que logo morreu quando senti dedos percorrerem o meu cabelo e em seguida se fecharem nos fios. O rosto de Ryuichi estava bem próximo do meu e, assim tão perto, tinha a sensação de que podia ver um reflexo dourado dentro das íris azuladas.

Os dedos dele desceram do meu cabelo para o meu rosto, começando a acariciar as minhas bochechas levemente.

- Se vai me beijar, sugiro que faça isso nos próximos segundos ou não respondo por mim. - ameacei em um tom divertido e ele me deu um sorriso matreiro.

- Os seus poderes não funcionam comigo.

- Só o desaceleração de moléculas. O outro... - e para comprovar, criei uma pequena explosão perto da coxa dele, o que o fez pular de susto pois com certeza a sensação deve ter sido a mesma de ser beliscado.

- Sadomasoquismo entre quatro paredes Tatsuha? - agora ele me deu um sorriso safado. - Gostei. - e eu arregalei os olhos para depois fechá-los assim que os lábios dele cobriram os meus.

Com ou sem sadomasoquismo, agora eu tinha do que me gabar com os meus irmãos. Eles poderiam ser todos orgulhosos de terem casado com um rico empresário da música ou estar namorando um cantor em ascensão.

Mas eu? Eu fiquei com o mais poderoso de todos.

Eu fiquei com um dragão.

FIM


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Acho que já posso ouvir o chiar do povo (risos) e as perguntas a se seguirem: "mas teve tão pouco Ryuichi x Tatsuha", "e Shuichi? Shuichi x Yuki, bem que poderia ter tido algo com eles" e eu respondo meus jovens: Charmed terá uma continuação que logo postarei e espero que ela sacie a sede de romance e drama de vocês.
Abraços.