She was Innocent. escrita por Cibelly H


Capítulo 8
Sou um ótimo imã para coisas que quero repelir


Notas iniciais do capítulo

Feliz natal atrasado leitores. Fiz esse capítulo rápido demais, tenho medo que fiquei ruim. Sejam sinceros.



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Eu não consegui dormir aquela noite. Assim que cheguei, Kate me abraçou e não desgrudou por alguns minutos, quando disse que estava a ponto de esganar Afrodite, mas foi impedida por mamãe, que disse que ela era "amiga", que "amigos" não te levavam para outro país do nada sem nem avisar seus responsáveis, que eu ainda era menor de idade, etc. Mas depois de tudo isso ela só começou a me abraçar mais e dizer que caso eu resolvesse fazer isso de novo poderia me considerar um cadáver. Zoe me viu e apenas murmurou “aí está você", o que, considerando nossa falta de intimidade, era um progresso. Em geral ela não se manifestava a não ser quando era pedida. Ou quando havia uma liquidação. Edward suspirou de alívio e me abraçou forte, mas depois observei que mamãe ligou para ele assim que cheguei, mas ele não largou o trabalho para me ver. Não era a primeira vez que eu era a terceira ou quinta prioridade. Maria de Lourdes, que costumava ser minha babá e agora era a governanta, falou muita coisa. Pena que na escola eu tinha optado por francês em vez de espanhol. Depois de todo alvoroço, perguntei quando Marvel tinha ido. “Assim que você deu sua saída dramática. Ele precisava saber se aceitaram sua matrícula, mesmo estando muito atrasada. E você vai para a escola amanhã, faltou seus dois primeiros dias de aula." eu apenas assenti e depois de jantar fui para o meu quarto. Insone.

Por mais que um turbilhão de informações novas tivesse entrado no meu cérebro em um período tão curto de tempo, eu só conseguia pensar em uma: Rife. Eu não conseguia compreender o porquê de ele não me chamar a atenção quando eu o conheci na festa beneficente, há dois anos. Ele só parecia desajustado e entediado em um smoking. Do mesmo jeito que eu me sentia uma árvore de natal com o vestido longo verde que vesti naquela noite. Eu não era rebelde o suficiente quanto Kate, que disse que não iria, mas apareceu de surpresa, vestindo jeans rasgados e jaqueta de motoqueiro. Sim, isso era não se deixar dominar pela burguesia hipócrita. Mas meus protestos ficavam guardados para mim na mente, então eu estava lá, vestindo o ridículo vestido de quatro mil dólares que seria esquecido depois da ocasião. Mas para não ficar com a consciência pesada, eu secretamente vendi o vestido no Ebay um dia depois e doei anonimamente o dinheiro para a fundação criada para crianças com câncer do próprio hospital. Ninguém sabe disso.

Assim que cheguei à escola, fui chamada a diretoria. Estava sentada na secretaria pronta para tentar explicar de um jeito lógico minhas faltas para a diretora Cowell quando pulo do confortável sofá de veludo de susto.

— O que vocês estão fazendo aqui? — gritei.

Todos me olharam assustados: Bonnie, a secretária de meia-idade. Rife. Marvel. E até a diretora, que ouviu o grito da sua sala.

— Você o conhece? — perguntou Marvel, franzindo o cenho e apontando para Rife.

Eu não sabia exatamente o que responder ainda chocada com a triste coincidência da situação. Para minha salvação, Rife percebeu isso e respondeu antes que eu começasse a gaguejar.

— Nossos pais são amigos. — ele resumiu.

Dei a Rife um olhar de agradecimento. Eu não falava para Marvel sobre garotos e Marvel nunca me contou nada sobre garotas. Ambos sabíamos que não seria confortável. Mas não interprete mal. Nunca houve, não há e não haverá nada entre mim e Marvel que passe de uma linda amizade um pouco conturbada, mas forte. O tipo de amizade que não acaba quando a outra pessoa se muda por quatro anos para outro país. E nunca vai acabar.

— Eu vim pegar meu horário e Bonnie, essa simpática senhora aqui — Marvel apontou para a secretária — fez uma pequena proposta. E eu estava prestes a rejeitar quando você começou a histeria.

Franzi o cenho.

— É uma nova técnica pedagógica adotada pela escola. — se explicou Bonnie — um programa para que novos alunos se enturmem e façam atividades curriculares.

— Oh. — murmurei. Esse era exatamente o tipo de coisa que Marvel precisava evitar. E evitava.

— Bem, vou ter que rejeitar sua proposta, ou diria aposta? Se eu estivesse na escola para me enturmar eu não estaria carregando essa mochila cheia de livros nas minhas costas. E quanto às atividades curriculares, não estou disposto a fazer nenhuma. — a media que ia falando, Marvel aumentava o seu tom de voz. Bonnie estava cada vez mais assustada e jurei que ela estava a ponto de chorar quando ele acabou.

Marvel não era calmo ou simpático em geral. Mas ele esse não era o colégio do seu padrasto e ele não podia tratar as pessoas como se fossem inferiores a ele.

O que foi? Queria roubar toda a glória?” Foi o que ele disse, sobre ser semideus. Uma brincadeira que pode ter muitos outros sentidos.

Ele foi embora numa saída tão dramática quanto a minha no dia anterior, deixando uma Bonnie assustada e chorosa, uma June boquiaberta e furiosa e um Rife preocupado com Bonnie, lhe entregando lenços e dizendo que era só um garotinho imaturo, que iria ficar tudo bem.

— Ele não tinha o direito. — falei, com os punhos cerrados.

— Concordo. Bastava dizer que recusava. — falou Rife, já tendo controlado Bonnie.

— Depois você vai me explicar tudo o que aconteceu. — sussurrei.

Ele assentiu e sussurrou “depois”.

Bonnie assuou o nariz em um lenço.

— A diretora Cowell quer ver os dois. E depois, quero que conduza nosso novo aluno para o laboratório de física e lhe mostre o seu armário. Qual o seu nome mesmo, querido? — ela falou com a voz embargada.

Novo aluno. Rife Allen estava se transferindo. Para a minha escola.

Foi com grande dificuldade que voltei para o mundo real.

— Rife Allen, senhora. — ele falou de um modo gentil. Eu gesticulei para a sala da diretora e ele me seguiu.

A diretora Cowell era asiática e gordinha, tendo fama de durona. A verdade é que atrás de toda essa hostilidade existe uma simpatia enorme. Quando eu entrei na escola, depois de ser “convidada a não regressar ao próximo ano letivo” da minha antiga escola, a qual o padrasto de Marvel era o diretor, ela viu que minhas notas não eram muito boas e sugeriu que eu entrasse para o time de hóquei feminino, já que as faculdades do Canadá às vezes se guiam mais pelas atividades curriculares do que pelas próprias notas, em casos especiais — quando a família do aluno em questão geralmente doa milhões para uma nova ala da biblioteca da faculdade, ou uma enorme quantia por fora está em jogo. Foi assim que eu entrei para o hóquei. E me saí tão bem que na temporada seguinte fui eleita capitã.

— Oh, sentem-se. — ela disse visivelmente animada.

Sentamos em duas poltronas que ficavam defrontes a mesa de Cowell.

— Devem estar se perguntando por que chamei os dois juntos aqui. — falou.

Assentimos.

— Como já deve ter sido informada, o senhor Allen é o nosso mais novo aluno. Ele vem da nossa forte concorrente, a St. Anderson e tinha uma das melhores médias de lá, mas nenhuma atividade extracurricular consta no seu histórico, Rife. — começou ela. St. Anderson era uma das escolas mais caras e de prestígio de Edmonton, onde Zoe e Kate estudaram. Não é preciso acrescentar que eu só fui parar aqui na Colista por que não era competente o suficiente para a St. Anderson. Não comentei para a diretora que a St. Anderson não era de forma alguma nossa mais forte concorrente por que não estávamos num nível tão alto para não magoá-la. — Brooks, você é uma esportista nata. Nosso time de hóquei feminino não perde nenhum jogo desde que você virou capitã, mas vamos ser honestas, suas notas mal chegam a nossa média.

Antes que ela terminasse de falar, eu já havia adivinhado o que ela iria falar.

— Vai propor que ajudamos um ao outro. Eu conseguindo que ele entre em algum time ou clube. Ele melhorando minhas notas. — terminei para ela.

Ela sorriu e assentiu. Como se aquilo fosse simples, fácil e sem consequências. Claro, para ela seria ótimo. Para Rife também, talvez. Mas para mim não. Por que eu sabia que se aquilo acontecesse eu estaria perdida.

Por que eu irreversivelmente iria me apaixonar por ele.

— Quase isso. Talvez você não esteja atualizada, mas a escola decidiu criar mais um time. Um time de hóquei misto. E o plano é juntar os melhores jogadores de ambos, o masculino e feminino, juntos de novas revelações. E estou disposta a acreditar que o senhor Allen pode ser uma de nossas revelações. — ela disse.

— Nunca joguei hóquei na vida. A verdade é que eu nunca joguei nada. — Rife disse, dando de ombros.

— E você não deve saber patinar. — acrescentei. Ele estava facilitando. Ótimo.

Ele balançou a cabeça em negativa.

— Sei patinar. Muito bem. — disse, olhando firmemente nos meus olhos. Eu senti que ele percebeu minha animação em derrubar a proposta. Ele levantou uma sobrancelha para mim, depois se virando para Cowell — o quão abaixo da média estamos falando?

— As notas da senhorita Brooks? — ele respondeu — As maiores são D+.

Ele pareceu assustado, depois passando para um estado confuso, então para um pensativo e por ótimo, pude ter certeza de que ele estava com um plano. E que esse plano definitivamente não iria colaborar muito.

— Proposta brilhante. Ela e eu estamos totalmente de acordo. — ele disse com um sorriso triunfante.

Eu estava pronta para protestar, mas ele perguntou a diretora Cowell se havia mais alguma coisa que ela precisasse, ela negou e ele foi embora. E graças a Bonnie eu perdi o que restava da minha dignidade sendo obrigada a segui-lo.

— Você é esquizofrênico? Imagina escutar vozes? Por que em nenhum momento eu disse que concordei. — eu estava brava e um pouco ofegante, correndo para alcançar seu ritmo rápido.

— Acontece que você não tem opção.

Fiquei mais brava ainda.

— A proposta não envolvia só você, Senhor megalomaníaco. E eu estava prestes a recusar a sua proposta quando você resolveu que era meu porta-voz. — cuspi.

— Por que iria recusar? Pareço tão patético ao ponto de não conseguir jogar o esporte nacional? — ele retrucou.

Isso me pegou desprevenida, mas continue com a pose brava.

— Não. É só que não tenho tempo para virar treinadora pessoal. Eu arranjei um emprego nada convencional, vou precisar ser treinada para ele além do reforço extra que vou precisar para esse ano.

— Eu posso te ajudar com as notas. A verdade é que esse foi o único motivo de eu ter aceitado isso tudo. Se quiser eu peço para outra pessoa me ajudar com o hóquei, eu só... Preciso te ajudar. — seu tom era sério, mas seus olhos eram urgentes.

— Por quê? Quer dar uma de bom samaritano? — zombei.

— Sua caminhonete. — ele disse rapidamente — ela está perdidamente apaixonada por mim, certo? Seria covardia minha não vê-la. Você sabe, preciso suprir toda a sede de mim que ela tem.

Nós rimos e eu me rendi. Simples assim.

— Agora você vai ser simpática e me levar até o laboratório de física, e eu vou contar sobre a proposta-aposta da secretária. — ele disse, andando em ritmo normal agora.

Depois que a última aula acabou, percebi que Rife conversava alegremente com os garotos do time de Rúgbi. Enquanto isso, Marvel estava no final do estacionamento, me observando atentamente. Ele não tinha carro, o que significava que estava esperando alguma coisa no estacionamento. Por mim. Ele faria o ritual do primeiro dia de aula que críamos há tantos anos. Pareciam décadas agora. Fui até ele, sorrindo tristemente.

— E começou... — falei, quando estava a dez metros dele.

Ele andou até mim, segurando uma vela diferente esse ano. Era daquele tipo que soltava estrelas e faíscas douradas. Ele pegou um isqueiro do bolso da calça surrada e a acendeu.

—... A temporada de caça... — falou, com um brilho louco nos olhos.

Eu me aproximei mais ainda e estávamos a centímetros de distância, com a vela ardente soltando faíscas quentes em nossos rostos.

—... Aos idiotas. — terminei.

Assopramos a vela ao mesmo tempo e fechamos os olhos, sentindo, guardando, mapeando aquele momento. Quatro anos sem aquilo e muito mais. Muita coisa fora roubada de mim. E eu realmente estava disposta a recuperar.

Quando abri os olhos a vela já não estava lá e ele segurava uma espécie de folheto laranja. Levantei uma sobrancelha.

— Só leia. — ele disse.

ACAMPAMENTO MEIO-SANGUE era o título do folheto. Havia diversas fotos de crianças e adolescentes em blusas laranja parecendo felizes. Em uma, lutavam com espadas. Em outra, treinavam arco-e-flecha. Em algumas, montado em cavalos com asas. TEMOS SÁTIROS DISFARÇADOS EM VÁRIAS ESCOLAS, PROCURANDO POR VOCÊ a frase era acompanhada pela foto de um garoto aparentemente normal, a não ser por que a partir da sua cintura ele era metade bode. Olhei para Marvel e percebi que a camisa que ele usava era exatamente a que as crianças do folheto usavam.

— Então foi lá que você esteve durante todos esses anos? — perguntei. Não havia nada de acusador, mas percebi sua dor.

— Eles te treinam. Contra os monstros. — ele murmurou — É um refúgio.

— Então existem muitos? Digo, semideuses?

Ele assentiu.

— Mais do que você pode imaginar. Eu tenho quatro irmãos. — ele disse.

Imaginei se eu teria irmãos.

— Você conhece algum filho de... Eros? — um nó cresceu na minha garganta a falar o nome dele.

Ele assentiu lentamente.

— E... Como eles são?

Ele engoliu a seco.

— Não são os caras mais humildes que eu já vi. — foi à única coisa que ele disse e eu realmente me arrependi de ter perguntado. Mas prossegui deixando a curiosidade vencer.

— Eles são... Bonitos?

Ele franziu o cenho.

— As garotas são iguais a você. Olhos dourados, cabelo chocolate. Os garotos são loiros e tem olhos violeta. — ele deu de ombros.

— Você não me respondeu.

Ele suspirou.

— São todos artificiais. Sedutores e charmosos, mas com a mente repleta de futilidades. Extremamente narcisistas. Fim do relatório, mas alguma pergunta? — ele parecia nervoso.

— Não. — falei, satisfeita. — Definitivamente nada parecidos comigo.

— Como vai para casa? — ele perguntou.

Sorri.

— Ônibus. — respondi triunfante.

Ele parecia orgulhoso de mim, então bateu palmas.

— Essa é a minha garota. Vamos.

Estávamos saindo quando meu telefone vibrou e eu havia recebido uma mensagem de Meena. Ela iria faltar toda a semana por que estava com uma gripe forte. Respondi desejando melhoras.

— Quem é? — perguntou Marvel.

— Você não era tão curioso. — observei.

— Você não tinha celular. — observou.

Dei de ombros.

— Minha mãe me obrigou a ter um.

— São placas neon para monstros. — ele disse.

— Como assim? — perguntei confusa.

— Aparelhos celulares. Internet. Nada bom para semideuses. Fazem os monstros nos encontrarem mais rápidos. Eles meio que leem ou capitam o sinal. — ele explicou.

Sorri, exultante.

— Finalmente tenho uma boa desculpa para dar um fim nesse troço. — falei, arremessando o celular que se espatifou na pista.


Tratei de me ocupar de todos os jeitos possíveis. Até impedi a empregada de arrumar meu quarto, eu iria fazê-lo eu mesma. Distrair-me era a melhor maneira de parar de pensar em Rife, mas não era tão eficiente quanto eu pensei que seria. Mas eu consegui dormir de noite.

E isso já é um pequeno grande progresso.



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Notas finais do capítulo

Certo. Isso definitivamente era de esperar, não era?
Alguém acha que as faltas de Meena são suspeitas? Não vi nada demais nisso, mas não sei. Descubram no próximo capítulo.



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