She was Innocent. escrita por Cibelly H


Capítulo 14
Filho do fogo


Notas iniciais do capítulo

Bem vindos de volta a She Was Innocent



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Rife

Há muito tempo atrás, quando eu deveria ter cinco ou seis anos, alguém me perguntou o que me lembrava a palavra "casa". As pessoas normalmente responderiam "pais", "chocolate quente no natal", "abraço da mamãe". Eu respondi "Fogo". As pessoas só riram e comentaram o quanto eu era maluco, mas elas provavelmente não entenderiam por que não sabiam nada. Por que não sabiam que minha mãe costumava me ninar em uma lareira, que enquanto brincavam com carrinhos e bolas eu passeava por aí admirando um isqueiro.

Elas nunca enxergaram que eu sou fogo em minha essência, que eu nasci do fogo e que mesmo meu nome é um jogo com o fogo.


É nisso que estou pensando quando gotas de chuva se suicidam do céu até meu moletom, colorindo de cor nenhuma meu cabelo e em seguida realizando o grande final se despedaçando no asfalto sujo de neve, lixo e poeira que atravesso em direção a não-familiar casa geométrica demais do meu pai. Até em meus pensamentos o nome soa inapropriado, desbotado. Ele não é meu pai, mas ele é meu pai, e não, ele nunca será meu pai. A verdade é que p-a-i é o que posso de oferecer de melhor para Carl, então é isso que o dou. Ele sempre quis ser isso, mesmo sabendo que seria difícil. Mesmo sabendo que não tinha a mínima participação em mim — ou que não deveria ter. Nunca vou saber realmente o quanto, o quê herdei dele.

Tenho medo de admitir que tenho medo que a resposta seja nada, e tenho medo que ele também tenha medo disso. Por isso ambos deixamos questionamentos para trás e apenas tentamos ser ligados. Por isso eu viro um pinguim em festas beneficentes. Por isso eu ignoro os olhares de horror de Karmen e dos verdadeiros filhos de Carl — Melissa e Jason. Por isso Carl aguenta todas as perguntas sobre quem era a minha mãe e como ela era uma pessoa má por me "abandonar".

Por isso eu estou entrando nesta casa que não é minha, escutando Melissa tagarelar sobre qualquer festa ou garoto ou sapato e ignorando Jason falar sobre quantos quilos levantou na última vez que foi na academia. É por isso que finjo que moro aqui quando na verdade vou para minha verdadeira casa com uma mãe de verdade e fogo de verdade e comida de verdade e, mais do que tudo, amor de verdade.

Olho indiferente para uma Karmen histérica gritando que se eu prezasse seu "amor de mãe" eu não entraria em sua casa encharcado como um pano de chão. Melissa responde que eu daria um ótimo pano de chão e eu juro que algum dia irei transformar a cara dela em um pano de chão, mas a calma me envolve como as labaredas de uma fogueira e eu apago o pensamento da minha mente. Só garotos como Jason machucariam garotas.

Encontro meu pai na cozinha junto com Komin, o gato. Ele parece estar convencendo Carl a deixá-lo comer outro sachê de comida.

— Ah, aí está você. — me cumprimenta com um sorriso caloroso — você sabe, precisa passar mais tempo em casa, garoto. Não quero que me troque por aquela cabana.

Meu coração se aperta um pouco. Carl nunca foi totalmente cego pela névoa, mas ele não sabe que Héstia ainda está aqui. Comigo. Cuidando de mim. A poucos quilômetros de distância. Para ele a cabana é só uma propriedade privada minha — a realização de qualquer adolescente.

— A cabana é meu, hm, QG — dou de ombros.

Ele suspira.

— Queria ter tido um quartel general na sua idade. Você tem sorte, garoto.

Dou um sorriso amarelo e abro a geladeira repleta de coisas-que-não-são-comida que Melissa e Karmen engolem. Eu nunca comeria um amontoado de folhas roxas como almoço, mas não posso julgar. Acabo esbarrando com uma maçã e a como com casca e tudo.

Você sabe, Katherine Brooks me ligou essa semana.

O nome Brooks quase me faz engasgar com a maçã. Me viro bruscamente para encarar Carl e seus olhos castanhos e bondosos.

— O que ela queria?

— Convidar todos nós para um chá com os Brooks, próxima semana e disse que você "não pode faltar nem que o céu desabe". — ele tenta disfarçar a ironia com que diz "chá" — Rife, por tudo o que é sagrado, o que está acontecendo entre você e os Brooks?

Mordo o lábio e me recosto na bancada de mármore. Certo, eu realmente tenho evitado isso.

Na verdade eu meio que queria falar sobre isso com você —mentiroso. Não quero falar sobre isso em mil anos, é a situação mais constrangedora de todos os tempos e céus eu estou agindo como uma garotinha de 10 anos falando com o pai sobre uma festa — Você conhece a filha de Edward, certo?

— Qual delas, Rife?

Eu sei que estou corado e June teria vergonha de mim agora.

June.

Carl está atônito. É a única forma precisa de descrevê-lo.

— June? A mais nova?

Franzo o cenho e digo que sim.

— Algum problema com ela?

Carl dá de ombros.

— Achei que você naturalmente se apaixonasse por Zoe. Todos fazem isso, afinal. E ela é muito bonita. Não que as outras não sejam, você sabe que todos são bonitas, mas

— Nunca fui com a cara dela. — eu o interrompo — E eu não sei se você se lembra, mas ela namora o único amigo que eu tenho.

Ele apenas dá de ombros e me joga alguma coisa que eu apanho por reflexo.

Estou me deparando com uma chave de carro ou enlouqueci?

— Pegue meu carro. Vá dar uma volta com a sua garota — é a única coisa que diz.

Eu o agradeço com algo similar a um abraço e corro dali.

Sou recebido por uma família Brooks em caos, alguém vestido com um macacão de fórmula Indy e tendo que explicar a Zoe Brooks que não sou seu jardineiro. No exato segundo em que atravesso a portaria, a Sra. Brooks praticamente me arrasta para a casa e fala sobre como está aliviada que eu esteja aqui, na cidade, vivo.

— Mas o que está acontecendo aqui? — pergunto, me desvencilhando de seu aperto no meu braço.

Ele suspira profundamente e coloca uma mexa do cabelo chocolate atrás da orelha. Percebo que ela tem as mesmas sardas que June, mas em uma tonalidade mais escura. Quase tudo nela é mais radiante que nas outras pessoas — seus olhos, seu cabelo, suas sardas, seu sorriso. Meu Deus, eu amo essa garota.

Ela sumiu. De novo. E dessa vez junto com a melhor amiga e aquele garoto — apenas pela forma que pronuncia a palavra "garoto" sei que ela está falando de Marvel King. Marvel. De novo.

É constrangedor admitir que estou com ciúmes de Marvel king.

— June? Sumiu como? — tento estar menos revoltado e mais preocupado.

— Meena a levou. Junto com o carro que ela não deveria saber que tinha. Bem, mas o que eu poderia esperar de alguém que decide namorar Marvel King?

— Sra. Brooks, mais respeito quando fala da minha irmã. E King é um bom garoto. — se manifesta o cara com macacão de fórmula Indy. Rapidamente catalogo suas semelhanças com a irmã: olhos azuis amendoados, lábios finos e maçãs do rosto proeminentes.

Marvel e Meena. Meena e Marvel. Namorando.

Isso deve ter sido um golpe e tanto para June.

Zoe desce as escadas rapidamente falando com alguém ao telefone e para quando seu olhar passa por mim. Ela interrompe a conversa no telefone por um instante.

— Você é o novo jardineiro? Por que acho que passa tempo demais dentro de casa para um jardineiro. — fala inocentemente.

Talvez seu tom fosse de uma falsa ingenuidade, mas seus olhos tinham um brilho massacrante.

— Na verdade, não. Eu estudei com você desde a primeira série até ano passado, mas acho que você não lembra. E a propósito, eu sou amigo da sua irmã. — tento não parecer tão sarcástico como estou internamente.

Seus olhos me escaneiam e ele franze o cenho.

— Kate não costuma ter amigos, então isso é uma evolução.

Suspiro de frustração. Por que as pessoas sempre pensam em Zoe ou Kate quando pensam em uma Brooks? Por que June é sempre esquecida, sempre subestimada, sempre deixada de lado. Como eu.

" Mas você não pode. Você realmente não quer." falou quando eu falei sobre mostrar quem ela realmente era. Ela pensa que não é nada.

Do mesmo jeito que eu.

E é por isso

E é por isso

E é por isso que eu a amo.

— Não Zoe, Kate não. June. Sua outra irmã, lembra? A mais nova. A mais doce e humilde de vocês. Ah, desculpa. Esqueci que você deve estar tão ocupada olhando para o próprio nariz que não deve perceber os outros. Que indelicadeza minha, não? — suspiro de falsa frustração e dou um tapinha suave no seu ombro.

Me retiro deixando uma Zoe boquiaberta, um irmão de Meena estranhamente admirado e uma Sra. Brooks que só poderia ser caracterizada por uma palavra um tanto baixa em direção a qualquer lugar, mas acabo desaguando na casa de Chance. Eu sei que longas partidas de copas e dominó virão pela frente, então desfaço qualquer plano mental de voltar para casa.



*****


Adentro a cabana com um coração que parece carregar arranha-céus. Héstia não está aqui. A lareira se acende com meu estralar de dedos e vou em direção ao meu precário quarto favorito. Uma espécie de porão frio e ás vezes úmido que eu não trocaria pelo confortável quarto na casa de Carl. Pego alguns pedaços de carvão amontoados no canto e com outro estralar de dedos acendo chamas suaves que acolhedoras que me transportam até um mundo de sonhos em uma cama/sofá tão confortável quanto um abraço de mãe. Tenho um último pensamento antes de apagar.

"Tentar manter June segura e por perto não vai ser fácil"









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Notas finais do capítulo

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