Taurus-sobre o Tempo, a Vida e as Estações escrita por Seiko Yoroi


Capítulo 5
Obrigações


Notas iniciais do capítulo

***para notas referentes às garantias de autor e direitos comerciais, checar o prólogo***



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/1680/chapter/5

Na sala luxuosa do palácio ancestral, o homem pálido contemplava a tranqüilidade do entardecer pela janela, uma vida de calma e luz mediterrânea que o rodeava naquele momento. Se fosse apenas por aquela imagem, poderia até acreditar que não existiam problemas no mundo, nenhum lugar sofrendo com guerra e tumulto, apenas a paz. Uma ilusão doce.

—Shion, tudo acertado. Nosso oficial já chegou em Yerevan, agora é ver se cumpre a parte dele.

Lentamente se virou para a pessoa que havia entrado sem pedir licença na sua sala, e, cúmulo da ousadia: ignorando seu posto de Mestre do Santuário, lhe chamando pelo nome, coisa que não permitia a quase ninguém. Não se aborreceu.

—Ele cumpre, Péricles. Se não de um jeito, de outro. Agora é uma questão de tempo.

O intruso em armadura dourada ergueu a sobrancelha do olho bom, ar de quem ainda não confiava. Sacudiu a cabeça.

—Vai valer a tentativa, mas acho que não chega. É um moleque que mal ganhou uma armadura de Bronze. No mínimo vai virar comida de monstro antes que consiga achar o que realmente importa.

Shion sorriu. Estava acostumado com o jeito cético de Péricles, ancorado sempre em razão mordaz e sólida, e nos anos e anos de vida em combate, escritos nas cicatrizes de seu corpo e face como brutais certificados de experiência. Terceiro mais velho dos Cavaleiros de Ouro de Atena, o espanhol de cabeleira branca e tapa-olho quase nunca errava no que dizia. Quase nunca.

—Isso que você afirma é bem possível. Mas antes, ele cumpre a missão ou passa para alguém. De qualquer modo, o que nós queríamos vai dar certo.

Péricles deu uma risada entre dentes, cínico. O velho à sua frente era sempre assim.

—Vai dar certo...É como diz o ditado: " no amor, na guerra e na manutenção da ordem, vale tudo".

—Não diga isso, eu fui bastante consciencioso. Você sabe muito bem.

O sorriso de Shion parecia ter se apagado. Uma pena. Era um fato a se constatar: o homem ainda queria ser duro, mas estava sentindo o peso da idade. Mestre do Santuário desde tempos quase imemoriais, nos últimos anos parecia mais cansado e menos prático, a chama de seu vigor soberbo lentamente dando lugar ao reflexo baço da real velhice. Em outros tempos apenas concordaria com a frase: afinal tropas, oficiais, cidades, pessoas não tinham direito de existência para se interpor aos objetivos. Mas agora...

—Estou estranhando essa misericórdia toda. Você mesmo dizia que ter pena dos outros não serve pra nada.

—Isso não é misericórdia—e o velho de negro saiu caminhando pela sala, calmamente—Apenas a solução mais eficiente nesse caso. Pensamos muito e estudamos as alternativas, não?

O Cavaleiro de Ouro parou, meditativo, dedos torcendo os fios claros de barba:

—Pensamos um bocado. Desta vez, não vai dar para fazer toda a coisa e sair limpo.

Shion prosseguiu:

—Estou só tentando minimizar o dano: evitar baixas de valor no nosso Exército e dar pouca lenha pra atiçar o fogo da curiosidade de quem sobrar após a confusão. Olhe que ainda vamos fazer um belo de um estrago, duvido que Yerevan volte a ser a mesma depois. Por mais que a gente consiga pegar habitante por habitante e apagar-lhes as memórias do incidente, vamos ter um mínimo de raio de uns dez, doze quilômetros de devastação absoluta, quem estiver nessa área vai sumir junto. Isso não vai dar para explicar.

—Casualidades de desastre natural. É como a mídia está tratando o assunto até agora, como "terremotos seguidos, vendavais e uma nevasca fora de tempo". Clima enlouquecido, culpem o Efeito Estufa. Bom que a nossa turma fez a lição de casa.

Era verdade. Até o momento, haviam tido sucesso em camuflar o incidente usando poderes de controle de clima, tentativa de impedir que a situação de pânico se tornasse global e descontrolada. Ainda assim, havia que se temer pelos dias seguintes: buscas de desaparecidos movidas pelo povo comum poderiam se tornar verdadeiras guerras após a batalha. Quanto a isso, não tinha nada a ser feito.

—Só espero que tenha pouca gente lá. Quanto menos para ficarem bisbilhotando, melhor. Você se comunicou com as tropas?

Péricles ajeitou o tapa-olho, despreocupado.

—Já dei a ordem de evacuar a área. Os comandos A, B e C já devem estar se retirando. Kersakian vai se encarregar do resto: mandei mensagem cifrada para ele há alguns minutos, avisei sobre o que está acontecendo. Deve reunir quem puder e cair fora de lá. Claro, de resto não temos como saber de tropas perdidas, mas isso não tem como resolver.

—Oficiais desaparecidos?

—Quatro Cavaleiros de Bronze. Um deles, a Amazona de Tucano, tenho quase certeza que está morta já que era a chefe das tropas emboscadas no Centro Financeiro. Os outros estão apenas desaparecidos, mas várias unidades perderam a comunicação. A região está saturada de energia estranha, nem via cosmos dá pra achar.

Shion suspirou. Tamborilou os dedos ossudos na mesa.

—É isso que eu digo. Apenas uma solução prática. Após o fim dessa coisa toda, dê um prazo de 48 horas para esses oficiais se comunicarem. Se não tiver nada, dê baixa dos nomes nos quadros de efetivo e encomende honras fúnebres. Isso ainda é o melhor: vamos perder menos de dez oficiais. De outro modo, isso não ia ter fim.

E arrematou:

—Ainda, pra piorar, mais um detalhe: íamos acabar com uma baixa de Alto Comando. É: se o oficialzinho de Bronze nas fraldas não conseguir fazer a parte dele antes que as coisas saiam do controle de vez...você vai ter que ir. E é como a gente sabe: ir pra não voltar mais.


***

Lembranças de obrigações cumpridas: décimo oitavo dia de marcha. A boiada dormia tranqüila, a luz fraca da lua nova fazendo brilhar os pelos dos animais sobre o mato ralo da clareira. Os buracos na mata abertos à fogo pelos grileiros eram pouso bom para a noite, quando não se tinha abrigo ou teto de acordo. Cuidado só, o com onça e cachorro do mato, que se metiam pouco onde homem bulia.

Em torno da chiculateira, os peões repousavam, aquecendo o corpo com o mate e as modas de viola pantaneira. Januário cochilava com o chapéu sobre os olhos, se refazendo do caminho, o filho, cansado da marcha e alheio aos folguedos, contava estrelas no céu. Tudo em paz, mais dois dias de viagem e os bois iam estar no destino, paga feita, daí só retornar. Ia certo até um peão apontar visagem na distância.

—Alguém viu ali no canto? Parece que tinha alguém...

—Não vi nada, Nicanor...Deve de tá variando...

—Mas vi, não doidei. Era criança, pequenim assim. Eu vi. Tava ali no canto, embaixo do pé-de-pau ali. E riu, tinha jeito que achava graça...

—Tinha cabeça de fogo?—roncou Davino, que parecia meio adormecido, distante da prosa.

Nicanor empacou

—Não...Tinha não. A cabeça era branca, branquinha, igual cabeça de velho. Mas era criança, vi a cara e era criança sim. Era estranha, o olho vermelho que nem de brasa, na testa tinha alguma coisa. Cês num viro não?

A peãozada calou, se entreolhando. Davino seguiu no seu canto, o cigarrinho de palha no beiço banguela. Nicanor esperava resposta na cara dos outros, ansioso. E a resposta veio:

—Nicanor, vai devagar com a pinga, que assim não dá!—a gargalhada era de todos, na maior troça do desatinado—Daqui a pouco vai dizer que viu mula-sem-cabeça, saci, curupira...Olhe lá, que Mestre Januário...

—Curupira não era—e Davino roncou de novo, interrompendo a graça—Curupira e caipora tem cabelo de fogo, então não podia de ser. Mas branco...

Demorou-se um pouco, pensativo e sério, a cara enrugada com o os olhos secos perdidos na relva, distantes.

—...branco é Anhangá.

Todos fizeram silêncio. Davino tossiu um pigarro.

—Nicanor não andou fazendo mal a bicho não? Matou passarinho, matou cotia, pos timbó em corixo?

—Fiz nada não...Mais das vez espanto os macacos que vem bulir no meu jirau, e de garoto brinquei de bodoque...mas parei, que mãe não aprovava. Por que?

Davino franziu a testa. Deu mais uma pitada e seguiu a história

—Anhangá é vingador. Das matas do norte, se diz que traz o diabo montado no lombo, e entrega pra perder a vida de quem maltrata bicho ou tira a casa deles. Não tem piedade: se pega cisma de alguém, não descansa até fazer o pobre pagar. Quem vê o Anhangá tem dois caminhos: fica louco, vendo os olho de brasa dele cada vez que se deita...ou morre mesmo, das armadilha que ele mais o diabo monta. É o que acontece.

Nicanor ficou pálido, deixou cair a guampa. Tremendo, começou a rezar pelos-sinais um atrás do outro, em desespero.

—Deus que me livre e guarde, valei-me anjo Gabriel, que sou moço ainda, não quero morrer agora! Mas não fiz nada pra esse cramulhão, que deu nele de cismar comigo?? Se é dos passarinho e do bodoque eu peço desculpa, eu era menino, não sabia o que estava fazendo...Não quero morrer!!!

Davino tossiu mais um pigarro.

—Assossegue, Nicanor, que não deve de ser pra ti. Anhangá tem disfarce, e quando se mostra de gente, é raro de ter intenção de matar. Eu mesmo já vi. Anhangá de gente, Mira-Anhangá, que é como chamam os bugres, cabeça branca e olho de fogo. Passou por mim perto de Nhecolândia, me pediu fumo de corda, pinga e bolo de milho pra comer, eu dei. Ele comeu o bolo, levou a pinga e o fumo para a "mãe"...que devia de ser mesmo é as saci-matitaperêra, coisa-ruim preta feito jacarina, que gosta de pitar em cachimbo, passa a brasa num furo da mão. Eu já vi...

Debaixo do chapéu, Januário meio acordado se esforçava para segurar o riso. Criatura de outro mundo, pois sim: muito mais o filho menino de uma alemoa que se mantinha de viração na beira da cidade, conhecida que era a tal naquelas bandas. Que Deus perdoasse Davino e sua vista arrevesada: por mais que fosse cria sem batismo de mulher da vida, daí para ser chamado de alma do diabo, filhote de saci-da-mão-furada, o moleque não merecia.

—Pra quem tem assunto mesmo com o tinhoso...Anhangá vem de suaçu. Galheiro grande, branco, da cor do sal. Os chifre são enorme assim, pro alto, feito galho de aroeira. Dizem até que é de aroeira mesmo, e faz doença do sangue em quem olhar pra eles. Os olho são duas brasa, na testa tem uma cruz. Não vi esse não, quem viu não é mais desse mundo. Anhangá não perdoa. Tira o juízo e definha a vida, busca os homens pra levar pro inferno. Quem viu não vê mais nada...

Os homens fizeram silêncio, de respeito e impressão. Januário apenas ajeitou mais o chapéu sobre o rosto e voltou para seu sonho com bois. De longe o garoto matutava, divertido: sem querer dar contra em Davino, como podia ser que ele soubesse como era o bicho, se ninguém que o viu saiu vivo e são da cabeça para contar? De verdade, histórias de mateiro tem dessas coisas. Rolou-se para o lado, buscando cair de vez no sono que já havia chegado.

—...acreditem...eu sei...Sei de muita coisa...

A voz rouca de Davino soou como melodia de ninar criança. Foi fechando os olhos: por um segundo jurou ver, no cantinho da mata a figura branca de que ele falava tanto, embaçada demais para dizer se era gente humana ou galheiro de Satanás. Na certa, só um jaburu caído do ninho, nada que merecesse atenção.


***

A marcha prosseguia sob a alameda, a copa das árvores ora ou outra mostrando montes de galhos quebrados, sinal de que ainda havia algo ali para se preocupar. O complexo de Rádio e TV ficava para trás, as vielas desembocando em grades arrebentadas e num monte de ruas estreitas e caóticas, casinhas de alvenaria misturadas a galpões de zinco rodeavamo caminho. Jacira parecia ansiosa.

—Quadrante nove, logo depois dessas ruas. Se passarmos sem problemas vamos finalmente saber o que aconteceu.

O ar parecia dominado por um odor estranho, nem o ácido do wyvern, nem o cheiro das aves carniceiras. Algo que parecia muito mais com sopa de galinha e botas velhas ou algo parecido. O gigante em vermelho deteve o passo, o nariz captando no odor algum aviso de perigo:

—Alto! Estamos com problemas! Melhor contornar!

A Amazona parou, a tropa ficou em silêncio. Estava impaciente, queria saber o que havia acontecido no quadrante nove. Mas conhecia de longa data o amigo, sabia que suas afirmações sobre caminhos e armadilhas raramente estavam erradas. "Ex- mateiro e peão, isso conhece mais de terreno até que meus velhos companheiros de tribo". Com certeza havia alguma coisa ruim adiante.

—E agora? Que vamos fazer?

O gigante parecia apreensivo, um fio de suor gelado descendo por sua fronte.

—Rede de esgoto...só pode ser isso...

Kimball atalhou, nervoso:

—Descemos...pela rede de esgoto, Comandante?

—Não! De jeito nenhum! Soldados, tenham os olhos no chão, procurem onde tem galeria de esgoto aqui e FIQUEM LONGE! Peguem as ruas da direita, se for o caso abram caminho!!! Rápido!!!

Jacira engoliu em seco. Sem contestar uma palavra, foi arrebanhando a tropa e pondo a soldadesca em disparada pelo lado direito, pelas entradas de galpões e fábricas. Se pôs a correr junto dos outros, ainda sem entender muita coisa, enquanto o colega em vermelho berrava ordens.

—Mantenham o cosmos reunido no máximo que conseguirem, mas não reduzam passo!!!

— Tuivaé-Ryankã, mas que é que está acontecendo?! Que é que você achou aqui?? Se a gente vai pra direita se afasta!!!

Ele sacudiu a cabeça. Mesmo numa hora daquelas, Jacira ainda se lembrava de chamá-lo daquele nome. Bom, não havia tempo pra brigar com ela:

—Até onde for seguro, Jacira! Até onde for seguro!

—Mas e a Suni?

—Se estiver viva é milagre, a coisa complicou MESMO!

A moça já começava a perder a paciência:

—E é por isso que temos que ir lá! Se estiver viva a gente salva!!

—Não salva se a gente estiver morto! Não dá pra enfrentar! Anda!!!

Jacira empalideceu debaixo da máscara. Seu amigo, colega de treinamento nunca foi de fugir de nada, encarava as coisas mais perigosas com um sorriso nos lábios. Para estar fazendo aquilo, é que as coisas estavam mal de vez. Sem dizer palavra tentava acompanhar o passo veloz das pernas compridas do outro, o coração disparando. Fosse o que fosse, melhor correr primeiro e perguntar depois.

Cruzaram umas três ruas, mais ou menos em linha reta. Explodindo paredes de galpões e carretas abandonadas, procuravam avançar, ir para algum lugar seguro, longe da ameaça desconhecida. Tentativa. O cheiro nauseante de sopa aumentou, uma estranha vibração se fez sentir abaixo dos pés dos soldados, sacudindo os ramos das flores na beira das calçadas. O rosto do gigante moreno se congelou numa expressão tensa.

—Acharam a gente!

E na mesma hora, deteve a tropa:

—FORMAÇÃO EM CÍRCULO, PODE VIR DE QUALQUER LADO!!! OLHO NO CHÃO!!!

Na pressa, uma das moças da equipe se desgarrou. Ainda deu meia-volta após avançar além dos outros, quis retornar. Sem tempo. Perto demais de uma boca-de-lobo, o corpo da moça explodiu em chamas, enquanto uma cabeça enorme arrebentava o chão, puxando o cadáver para dentro da galeria:

—MONSTROS!!!

—TEM MAIS AQUI!!!

De outra boca-de-lobo, uma outra cabeça gigantesca surgia, jogando um hálito de puro fogo contra os soldados. Um animal cheio de escamas acobreadas, aparência estranha que misturava presas e corpo de serpente, braços finos com garras e uma cabeça disforme, que parecia de cão ou símio. Outros seres iguais foram aparecendo ao redor, alguns de ruas vizinhas, outros quebrando o chão, saindo das galerias de água, entre nuvens espessas de vapor escaldante. A maioria vinha do lado do quadrante nove: aos poucos tentavam se por ao redor dos soldados, fechando um cerco. Disparando os poderes de cosmos reunidos, os integrantes da tropa tentavam bloquear o ataque.

—São muitos!!! Não vai dar!!!

Jacira tentava resistir a todo custo: de suas mãos brotavam feixes de luzes de cores vibrantes, resultado da invocação feita às estrelas, nas quais tentava se concentrar.

—AURA PRISMA!

Atingidas pelas luzes, os monstros se atordoavam, recuavam um pouco, mas não caíam. Repetiam o avanço mais e mais irritados, incendiando as casas e galpões ao redor. O gigante de vermelho também usava de suas forças cósmicas, afastando as criaturas como conseguia:

—FOICE DO BOIADEIRO!

Com as lâminas de energia que lançou, conseguiu ferir duas criaturas, uma delas veio ao chão com os longos braços cortados. O resultado bom durou pouco: o monstro não havia morrido, apenas se desestabilizou das patas da frente: agora avançava serpenteando no chão, obrigando a tropa a baixar a pontaria. Jacira se desesperava:

— Anda, usa logo aquela porcaria de poder que você tem, o mais forte deles! Ou a gente não sai daqui!!!

O gigante rechaçou a idéia, sem cessar fogo:

—Se eu usar, aí é que a gente não sai!!! Não tenho ângulo pra disparar aquilo sem quebrar o chão! O esgoto está fervendo, esses bichos estão lá, se eu abrir o resto das galerias em volta da gente aí é que vai ser o fim!

—Pelo menos derruba alguns!!!

—Um ou dois na minha frente, vem o resto e nos mata!!Vamos ter que resistir!!!

—Certo, mas como?!!?

Tal e qual atendendo às aflições de Jacira, o pipocar de fuzilaria mecânica repetida se fez ouvir ao longe, acompanhada de uma voz quase esganiçada:

—TROPAS DE ATENA, CESSEM ATAQUE, SÓ SE PROTEJAM! O RESTO EU CUIDO!

As criaturas, atingidas por inúmeras balas se voltaram, irritadas. No fundo de uma ruazinha estreita e longa, um rapaz vestindo uma couraça em frangalhos, visivelmente ferido, atirava furiosamente com uma metralhadora.

—VENHAM ME PEGAR!

Os dois oficiais no cerco trataram de fazer os soldados parar o ataque, mantendo só as defesas místicas que ergueram. Da ruazinha estreita, o rapaz ferido não interrompia os tiros: ia sem derrubar criatura nenhuma, apenas as trazia para si, aos rebanhos.

—E AÍ, VÃO ME ENCARAR, MACACOS DE ESCAMA???

—Ele é louco!!! Vai acabar se matando!!!

O Cavaleiro de vermelho saiu de junto do grupo, correndo atrás do último monstro que ia se alinhando na rua.

—Não se eu puder impedir: agora dá pra fazer mira como se deve!

Ligeiro, subiu no baú de um caminhão semi-incendiado, alertando como podia o colaborador repentino:

—VOCÊ, AÍ NA RUA, SAI AGORA!

E ergueu os braços: num gesto, trouxe das estrelas seu poder mais devastador:

—SEPARADOR DE TERRAS!!!

Uma bola de energia se formou diante de suas mãos, e explodiu num disparo em linha reta, levando muros de casas, veículos, postes, grades, tudo que havia no caminho. E acertando de cheio os monstros alinhados, decepando-lhes cabeças e patas. A energia foi se arrebentar finalmente no canto de um muro, quase no chão, rachando fundo o asfalto. Do alto do caminhão, o gigante ordenou:

—Todo mundo por essa rua mesmo, rápido!!! Cuidado com os monstros, que os corpos queimam!

Avançando pela rua, sobre os pedaços arrebentados e fumegantes das criaturas mortas, a tropa chegou na outra ponta. Acharam o rapaz que os ajudou sentado no chão, recostado em uma lata de lixo, com a metralhadora descarregada sobre o colo. Não havia saído sem danos no combate: tinha severas queimaduras no rosto e braços. O ombro, lacerado pelas presas de algum outro monstro, ia quase expondo os ossos. O sangue que corria se aglutinava sobre o metal da armadura.

—Um Cavaleiro de Bronze?!

O rapaz sorriu para Jacira, os olhos quase sem brilho.

—...Roan de Unicórnio...Guarda Palaciana...em missão especial enviado pelo Mestre. Me perdoem pela metralhadora, é uma vergonha...peguei num carro de polícia...eu...eu tinha que achar vocês de qualquer jeito.

Jacira ordenou à tropa que fosse saindo em frente, indo embora do lugar depressa antes que chegassem mais monstros. Ela e o colega em vermelho ainda se detiveram, erguendo Roan nos braços, tentando levá-lo de lá. O oficial, com voz sumidiça, declinou do auxílio:

—...Não me ajudem...não percam mais tempo. Só me escutem os dois.

Estava muito fraco, o lado ainda inteiro do rosto já exibindo uma palidez de morte.

—...Vocês são oficiais do Santuário como eu...Há uma missão importante, muito importante. Precisa ser cumprida. Eu não vou chegar lá...então vou deixar com vocês. Mas eu imploro, completem a missão...Por favor, pelo amor de Atena...isso não pode falhar...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Taurus-sobre o Tempo, a Vida e as Estações" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.