Capítulo 39

Pov Percy

– Não é Peggie, seu nome é Paige. Como se sente agora? – eu perguntei à minha irmã recém liberta de uma magia equivocada. Ela ainda estava pálida e com leves olheiras que destacavam os olhos inchados pela quantidade excessiva de horas que dormiu.

– Acho que estou melhor. Sabe, eu estava cansada de dormir e queria poder abrir meus olhos, mas eu simplesmente não conseguia. Eu me senti como se estivesse presa em um aquário... Não quero dizer que ficar em um aquário seja ruim, principalmente se ao redor tiverem muitos peixes coloridos e nas rochas houvesses corais esponjosos junto com ramificações de algas bonitinhas e... – ela começou a tagarelar. Por incrível que pareça, eu senti falta disso, mas precisava interromper, caso contrário, vocês sabem, ela falaria por toda a tarde. (n/a: quem sentiu falta dos discursinhos da Paige?? hehehehe)

– Okay maninha, já entendemos. Que bom que você está bem... Quer comer alguma coisa? – perguntei e ela assentiu sentando ao nosso lado.

Annabeth começou a procurar algo para Paige comer, mas todas as sacolas de mantimentos que tínhamos estavam vazias, o que era muito estranho já que quando começamos nosso café da manhã, eu notei que havia comida suficiente para mais duas refeições. Mais alguns segundos se passaram até que Annie se cansasse de procurar. Ela olhou furiosa em minha direção oposta, e eu acompanhei suas vistas. Grover estava lá, com as mãos ainda sujas de bolacha, tremendo de medo de minha namorada.

Sem hesitar nem mais uma fração de tempo, Annabeth rosnou:

– Menino-bode, abra essa mochila agora! Não ouse me desafiar! – ele mais do que depressa pegou a mochila e abriu.

Lá dentro jazia dois pacotes médios de pipoca doce. A Sabidinha andou até ele pisando fundo, que sentia um arrepio a cada passo que ela andava em sua direção. Paige e eu nos segurávamos para não gargalhar, mas um mísero momento depois isso foi inevitável. Annabeth deu um peteleco em Grover e retirou os pacotes da mochila. Jogou um em minha direção e eu aparei, entregando-o para Paige se alimentar. O outro pacote Annie guardou em sua mochila.

– Esse daqui é pra alguma emergência em nossa viagem. – e então olhou para Grover – Espero que não aconteça de novo!

Em estado de quase desespero, o sátiro chacoalhou a cabeça com força. Annabeth terminava de organizar mais algumas coisas, já que em breve partiríamos, e pediu que a ajudasse. Nico ressonava com a cabeça apoiada em sua quase namorada Julie, que olhava por ente as árvores. Stormie se arrumava dentro da barraca, que logo seria desmontada por ela. Enquanto isso Paige comia, inesperadamente quieta.

Pov Sean

Massageei um pouco meu pescoço. Fui jogado com tanta força nessa jaula que senti boa parte dos meus ossos estralarem. O ambiente é sujo e fétido, parece que isso aqui não vê uma vassoura e um espanador a pelo menos dois séculos.

Parei pra pensar em minha situação nesse momento. Por uma garota, eu praticamente declarei guerra aos que ironicamente eram meus aliados nessa história toda. Eu deveria serví-los sem contestar qualquer uma de suas atitudes, mas não fui capaz de fazê-lo quando ameaçaram a vida de Thalia. Poderiam ter me matado até, eu não me importaria, porém, eu não iria admitir que fizessem mais algum mal a ela.

Não sei ao certo, mas sinto uma coisa estranha quando estou perto da filha de Zeus. Ela tem uma espécie de magnetismo, que puxa toda a minha atenção para si, quase que contra a sua vontade, pois seu olhar denuncia que ela não me suporta. Afinal, quem gostaria de um garoto que está no meio de um bando de sanguinários malucos que visa destruir os deuses, e o mais poderoso deles sendo seu próprio pai? Ela está certa, mas eu não digo que faria o mesmo se estivesse em seu lugar, pois na verdade, eu nunca tive e nunca terei a oportunidade de lutar do outro lado, do lado olimpiano.

Só sei que se hoje estou aqui, não foi por escolha própria. Eu fui destinado a servir alguém que nem conhecia, e em meu âmago eu sentia a imensa necessidade de saber quem eram.

Por muito tempo eu até pensei em buscar a resposta no lugar que mais temia, mas o medo abraçava e me segurava, amarrando a coragem e cerrando fortemente seus dentes para que não dissesse ao mundo o que tinha descoberto: que o lado certo não era o que eu estava, mas sim, onde eu nunca estaria.

Um barulho me fez despertar. Acho que o efeito da magia estava acabando, e ela acordava lentamente. Eu sentia meu cérebro atrofiar-se a cada vez que eu olhava para os cadeados.

Olhei para Thalia. Agora com as costas arqueadas e encostadas na parede, ela tinha os olhos cheios de água, lágrimas que teimavam em não escorrer pelo seu rosto. Acho que a garota é durona demais pra isso. Escapava mini faíscas da frestas da jaula perturbadora e sombria da Caçadora.

Acho que ela ainda não tinha me visto ali. A luminosidade era quase inexistente, deixando aquela masmorra ainda pior do que já era.

Eu circundava o local com o olhar buscando alguma mínima falha na estruturam para que tivéssemos alguma chance de escapar, já que magia eu não poderia usar ali. Sim, eu já havia tentado, mas essa masmorra é vedada à magia, e eu não poderia esperar outra coisa dentro de um castelo de pedra bruta cuja a dona é uma feiticeira, por acaso, minha irmã.

Traçava planos incompletos que esboçavam a preocupação de se manter isolado do convívio, trazendo à tona o medo, o famigerado medo que acabava nos trancando também no cativeiro psíquico.

– O que você faz aqui? Não devia estar lá em cima com os outros, planejando minha morte e a dos outros quando chegarem? – Estremeci. Thalia falou com uma voz extremamente odiosa, eu senti algo queimar por dentro. Deduzi que estava gostando de alguém que me repudiava.

“O que eu responderia a ela agora?” Pensei por um longo tempo, até que me decidi: falaria apenas a verdade.

– Estou aqui por sua causa. – eu disse em tom firme e audível.

– Por minha causa? Não coloque a culpa em mim seu monstro! Deve estar aqui para me vigiar. Fico imaginando como um garoto como você poderia ter se envolvido em algo tão torpe. – ela falou com a brutalidade estampada nas palavras.

– Eu falei a verdade. E não escolhi me envolver nisso, e se estou trancafiado nessa jaula, é porque finalmente criei coragem para me rebelar contra tudo isso, e não para te vigiar. – eu disse com minha voz morrendo aos poucos.

– Como? Não estou acreditando que o garoto mágico das trevas resolveu trair a trupe de vilões... o que te fez mudar de ideia?

– Eles iriam te matar se eu não fizesse alguma coisa. – eu murmurei relutantemente.

– Agora então eu devo te agradecer por salvar minha vida. Há – há - há. E você quer que eu acredite nisso?

– Sim, pois é a verdade Thalia. – ela se mexeu quando eu disse seu nome. Alguma coisa mudou depois de minhas últimas palavras, e novamente o silêncio virou o protagonista.

Minha mente está em um debate ferrenho sobre o que devo fazer ou de qual lado devo ficar. A resposta está, aos poucos, ganhando força dentro de mim.

Ficamos mudos por uma hora, até que ela ceifou a monotonia e o barulho do vento tilintando as grades.

– Eu não morreria. Lembra-se, sou Caçadora de Ártemis, portanto, imortal. Só morro se for derrotada em alguma luta, e eu estava desacordada naquele momento. Quem quer que tivesse tentado, não conseguiria. – Thalia disse confiante.

Eu realmente não sabia dessa tal imortalidade, e mesmo que soubesse, não voltaria atrás com minhas atitudes. Eu estava convicto de meus novos princípios, e os defenderia mesmo que isso me custasse a vida.

– Você não sabe quem está por trás disso. Phobos e Deimos você já deve ter deduzido que estão metidos até o pescoço. Ainda há as deusas Hebe e Nemesis, mas a chefe do bando é Medéia, e ela não é uma criatura qualquer. Foi Medeia quem tentou te matar. Quando percebesse que você não morreria facilmente, ela iria esperar que você acordasse para te desafiar. – Decidi abrir o jogo a ela.

– E eu não me esquivaria do desafio. Ela não me venceria, pode apostar.

– Não estou querendo te subestimar Thalia, mas Medéia é astuta. Não gastaria suas forças lutando e sim com truques de magia. Como feiticeira habilidosa e experiente que é, ela com certeza jogaria pesado contigo. – expliquei com cuidado para que ela não entendesse errado, isso seria fatal.

– Ainda estou intrigada com essa sua mudança de lado garoto. Talvez isso seja mais um plano sujo de vocês para retirarem de mim alguma informação. – ela falou, cética.

– Não sei o que dizer para que acredite, mas se estou aqui, é porque estou contra a todos lá em cima. Estou aqui porque fiquei do seu lado.

Ela pareceu se convencer, mas não totalmente.

– Então me diga, qual será o próximo passo?

–Esperar que seus amigos venham te buscar. Stormie com certeza virá junto e obrigatoriamente trará o livro. Medeia quer te sacrificar diante dos outros, que ficarão tão fragilizados que abrirão guarda. E tudo estará acabado..

– Tem chances de funcionar? - ela me perguntou nervosa e tremula.

– Infelizmente sim, muitas.

– E você não vai fazer nada para nos ajudar? Como então você diz que mudou de lado, se quando estiverem de posse do livro e nós estivermos mortos você voltara correndo para eles! – ela me acusou. E eu me exaltei.

– Claro que não Thalia! Acho que existe um jeito de ajuda-los, e eu farei o que estiver ao meu alcance para conseguir. Só que você precisará confiar cegamente em mim.

– Daqui a quanto tempo tudo começará?

– Se eu estiver certo, daqui a pouquíssimas horas. E então tudo será decidido.