Capítulo 127 - O Olhar da Serpente

Um instante em que Mestre Wong se ausentou da Academia para resolver alguns problemas foi suficiente para um dos invasores aparecer diante de nossos amigos. No caso, uma invasora. Dúshé, uma bela mulher de traços orientais, em todo o charme que seu longo qipao (*) proporcionava. Ao mesmo tempo, tinha olhos ameaçadores, que um melhor observador poderia perceber no vermelho de seu olhar (talvez fosse um tipo de lente de contato ou algo do gênero).

– Ela...tem olhos vermelhos mesmo? - perguntou Alex.

– Oh, isso - disse Dúshé, sem tirar os olhos de Lien e André, que já estavam de prontidão à sua frente - É apenas uma cortesia do poder da serpente.

"Poder da serpente, heim?", pensou Lien. "Se ela tem um dos pingentes...deve ser tão boa quanto aquele cara!"

– Ei, espera aí - Alex insistia - Você veio da China..mas como consegue falar português tão bem?

– Ora, o que você acha que somos? A Meyou Zidan tem sede em quase todos os cantos do mundo. Precisamos estar pronto para falar qualquer idioma.

– Esses caras...não estão mesmo para brincadeira - espantou-se Alex.

Era isso e também o fato do autor da história não estar a fim de esquentar a cabeça com questões linguísticas. De qualquer modo, Lien e André apenas aproveitaram o momento de distração para atacar Dúshé em conjunto. Se a derrubassem logo, teriam mais chance de vencer. Mas mesmo distraída, a mulher defendeu facilmente as investidas dos dois.

"Ela é rápida", pensou André.

– Ora, não é que vocês são rápidos? - disse ela - Mas não é suficiente comigo.

– André...não vacile - disse Lien - Vá com tudo. Esses caras não são qualquer um. Se ficar enrolando por ela ser mulher.

– Entendi - disse o garoto. Em mais uma investida contra a mulher. Mas ela se esquivava facilmente. Não só se esquivou do último ataque de André, como o atingiu nas costas com as pontas dos dedos ao mesmo tempo que desviava. Ela se movia como...como uma serpente?

– Isso parece...um estilo serpente de kung-fu - reparou Lien.

– Oh, reparou? - disse a adversária - Sim. Digamos que...sou flexível como uma serpente. Meus movimentos são fluidos o suficiente para desviar e atacar ao mesmo tempo. Vocês ainda precisam amadurecer muito para me acompanhar.

– Não nos subestime! - gritou Lien. Dessa vez, Dúshé não teve muito sucesso em atingir a garota.

– Já ouvi falar desse estilo - disse a garota - Não vai me pegar tão desprevenida. Ultimamente também tenho treinado bastante a esquiva.

– Ora, ora. Que interessante - disse Dúshé - Mas eu não seria tão boa se fosse me deter apenas com isso.

A mulher atacou Lien com seus melhores movimentos. A menina tinha dificuldades de acompanhar, mas conseguia se desviar. Ao mesmo tempo, André se levantou e atacou novamente. Agora Dúshé tentava ao máximo se desvencilhar dos dois.

– Nada mal. Vocês tem uma boa sincronia - disse a mulher - Certamente, subestimei as pessoas desse país. Devia ter acreditado no Tiaoyue.

– Heh. Eu falei para não nos subestimar - falou Lien.

– Mas... - e agora Dúshé deu um salto para trás em um movimento que deixou Alex boquiaberto.

– Tem mesmo que filmar? Não acho que seja hora para isso! - implicou Ming.

– Acha que vou perder essa luta? - disse ele - Além disso, essa Dúshé é gata demais para deixar escapar das minhas lentes..hihihi.

– Sabem, não queria sujar meu vestido - falou Dúshé - Seria uma honra lutar contra vocês. Mas não estou muito a fim de brincar.

– E quem aqui está brincando? - retrucou Lien.

– Isso mesmo - concordou André - Vamos te enfrentar para valer.

– Que lindos! Vocês realmente ficam bem juntos - disse a mulher - Mas é sério. Não estou para brincadeira. Passem logo o pingente. Vocês sabem que não podem me derrotar. Não conseguiram acertar um só golpe em mim até agora.

– Ah, você acha? - disse Lien, saltando em pleno ar - Desvia disso, bonitona. Yaaahhh!!!

Ela mirava um chute voador bem em cima da adversária. Claro que Dúshé poderia se desviar facilmente.

– Heh! Você não entendeu ainda? Posso me desviar facilmente disso e..

Mas na hora que ela iria dar mais um salto para trás para escapar do chute de Lien, foi atingida por um chute giratório de André. Finalmente, Dúshé foi pega em um ataque.

– Percebi seu ponto fraco - falou André - Você não pode se desviar totalmente em pleno ar. Durante uma cambalhota aérea, o seu corpo está frágil.

– Se nós dois lutarmos juntos você não tem chance - falou Lien - André é realmente ótimo para perceber o ponto fraco dos adversários.

– Entendi - disse Dúshé, agora com um sorriso maligno - Eu não queria precisar usar isso, mas...vocês me irritaram!

Lien e André sentiram algo estranho. Dúshé apenas lançou seu olhar na direção deles e, do nada, sentiram seus corpos paralisados.

– O..que é isso? - falou André.

– Eu...não consigo me mexer - disse Lien.

– Na verdade, eu sinto que posso me mexer...mas é como se o meu corpo não quisesse - comentou André.

– Esse é um dos poderes do pingente da serpente - disse Dúshé, se aproximando do casal - Um olhar capaz de lançar uma onda em frequência invisível forte o suficiente para paralisar um humano.

– Sua... - Lien queria xingar, mas foi interrompida.

– Não tem o direito de falar nada - agora Dúshé, com apenas uma mão, joga Lien para longe - Eu que deveria estar furiosa por ter sujado meu lindo vestido.

– L-Lien! - exclamou André.

– E você, ocidental bonitinho - disse a mulher, acariciando o rosto dele - Até gostaria de conversar mais com você, porém...

Ele foi jogado para longe com a mão novamente.

– ...tenho um trabalho a fazer. Entreguem logo o pingente.

– N-nunca - gaguejou André, se levantando.

– Não me forcem a machucar vocês mais ainda - disse ela. Agora, o olhar dela foi na direção de um balde de água. De repente, a água começou a se moldar sozinha, tomando a forma de uma serpente.

– QUÊ?! Que bruxaria é essa? - Alex até caiu para trás diante disso.

– O que esperava? - reclamou Ming - Ela tem um dos doze pingentes!

– E esse é o segundo poder da serpente - disse Dúshé - Posso ampliar meu ki para controlar qualquer substância fluida. Água, sangue...qualquer líquido pode se transformar numa serpente que eu comande.

"Droga! Não dá pra lutar contra isso!", pensou Lien.

– E agora? - Dúshé faz a "serpente de água" se enrolar na perna de Lien - Será que devo te chicotear até a morte por ter sujado meu vestido? Não me custaria nada fazer isso...aqui tem água suficiente para tanto.

– Lien! - gritou André, mas foi chicoteado pela água na mesma hora.

– Não falei? Vocês estão nas minhas mãos!

– Pare! - gritou Ming.

– Ming? - disse Lien - Por favor..não faça besteira. Você não tem como lutar contra ela!

– Claro que não - disse Dúshé - Aliás, se só ficaram aí assistindo é porque não são mais fortes do que esses dois, são?

– Nem um pouco - admitiu Alex.

– Lutar? - indagou Ming - Quem falou em lutar? Só quero te entregar o pingente!

– Hã?

– Ming! Não! - reclamou Lien.

– Sim - disse ele - Por favor, leve o pingente e vá embora. Mas deixe os meus amigos em paz!

– Não, Ming. O vovô vai nos matar! - insistia Lien.

– Heh! Até que vocês não são tão burros assim - disse Dúshé, libertando Lien da água - Muito bem. Levarei o pingente. Poderiam ter evitado tudo isso se tivessem entregado logo.

– Não - Lien ainda tentou atacar a mulher, mas foi retribuída com uma chicoteada de água.

– Ainda precisam comer muito feijão com arroz antes de enfrentar a Meyou Zidan - disse ela - Adeuzinho.

E Dúshé foi embora, tão rápido quanto veio.

– Eu...sinto muito - disse Ming.

– Sente muito?! Tem ideia do que esses caras podem fazer com esse poder em mãos? - reclamou Lien.

– Eles já tem os outros onze signos - falou Alex - Se quisessem dominar o mundo, já poderiam ter feito isso, não acham?

– Mas e se eles só puderem fazer algo grande com todos os doze? Que droga! Não sabemos nada sobre esses caras? Agora sim...o vovô vai acabar com a gente. Não morremos nas mãos dela, mas vamos morrer nas mãos do vovô! Ai - Lien estava desesperada. De fato, a responsabilidade estava nas costas deles. Será que Ming tomou a atitude certa?

(*): Qipao é o nome dado a vestidos típicos da China. Algo parecido com isso