Merry Christmas, My Dear Love escrita por Mali


Capítulo 1
Merry Christmas




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Minha história e a do meu irmão se passa no fim do século XIX. O ano exato não interessa. Mas ressaltar que meu irmão não é bem meu irmão interessa.

Meu nome é Juka e me mudei para Londres há uns quinze anos atrás e junto comigo veio meu "irmão" Kamijo. Na verdade ele é meu namorado, mas falamos para todos que somos irmãos vocês já sabem o porquê, não?

Antes de Londres, nós morávamos num vilarejo muito pobre que estava sofrendo de uma epidemia muito grave. Aconteceu que nós dois perdemos nossos pais nessa e foi aí que nosso laço ficou estreito. Estávamos sem eira e nem beira e decidimos que íriamos para Londres para ter um vida um pouco melhor. Mas nem tudo é tão simples assim, não é? Conseguimos um emprego, mas o que ganhávamos era muito pouco e no fim a gente não conseguia mudar muito a situação; o pouco que conquistávamos dava na risca para nossas necessidades. 

Kamijo gostava muito de ler. Ele conseguia passar horas a fio lendo sem erguer os olhos. Um viciado completo! Antes de Londres, Kamijo me mostrou uns livros que ele guardava em um pequeno baú e me disse:

- Juka, esses livros são de um autor muito importante! Meu pai conseguiu todos eles, mas falta apenas um para completar a coleção! E ao que parece, a coleção completa vale uma fortuna! E quando chegarmos em Londres, eu vou comprar o último e em seguida vou vender a coleção! E então a gente vai ter condições de começar uma vida melhor, não é mesmo?

Não, não é mesmo. Até hoje Kamijo não conseguiu o último livro, mas ele não cansava de procura-lo. E enquanto ele procura loucamente, eu ficava compondo músicas no meu violão. Antes de Kamijo, meu violão era minha única companhia. Ele estava um pouco velho, cheio de arranhões, mas eu só tenho esse violão por que o padeiro do vilarejo de onde vim ia joga-lo fora. Não sabia tocar quando ganhei ele, mas aos poucos eu fui treinando e treinando e hoje consigo tirar músicas de ouvido.

Eu trabalhava com um rejoalheiro como seu ajudante. Eu era um desastre e creio que o ele não me pôs no olho da rua porque gostava muito de mim. Acho que ele me tinha como um filho e o que ele me pagava era o valor do aluguel. Eu rezava todo dia para que os proprietários não parecessem e aumentassem o valor. Enquanto isso, Kamijo trabalhava com um dos artesões mais renomados de Londres. Apesar do grande título, o salário não era lá essas coisas, mas Kamijo parecia realmente gostar do trabalho.

Definitivamente nossa condição era praticamente miserável. E o que mais me partia o coração é que nunca consegui comprar um presente para Kamijo. Nem em seu aniversário, nem no dia dos namorados e muito menos no Natal. Ele dizia que não se importava, que só estar comigo bastava, mas sua situação não era muito diferente da minha.

Mas eu tinha feito uma promessa! Uma promessa para mim mesmo, mas não deixava de ser uma promessa, não? Havia prometido que conseguiria comprar alguma coisa para ele e que seria uma surpresa que ele jamais se esqueceria!

Acontece que Dezembro estava no seu início e eu ainda não tinha dinheiro sobrando. Foi quando pensei em pedir um aumento pro rejoalheiro, mas antes de eu abrir minha boca, ele veio desabafar que os negócios da rejoalheria esta indo de mal a pior e que ele faria de tudo para não baixar o meu salário. Droga! Não podia pedir o aumento! Ainda mais com uma pessoa tão gentil... E pra piorar eu não tinha como ajuda-lo. Quando terminei o espediente, voltei me arrastando para casa, arrasado por perceber que não seria neste natal que eu daria um presente para aquela pessoa que eu tanto amava. 

Os dias foram passando, e passando, e passando. E nada de eu conseguir um dinheiro a mais e já era véspera de Natal. Nesse dia eu não precisei trabalhar, mas Kamijo não teve como fujir. Assim que almocei, peguei meu violão. Toquei meia música e tive um ideia...

*******************************************


E por fim era manhã de Natal. Lá fora nevava muito e fazia um frio que deixava a desejar sair de casa. Não que eu fizesse questão disso, pois queria ficar o Natal com Kamijo.

Como de costume, acordei depois de Kamijo. Dormíamos juntos num colchão apenas; não tínhamos condições de comprar uma cama e todos os móveis que tínhamos lá eram dos proprietários. 

Acordei, mas não levantei logo em seguida. Fiquei enrolando até não poder mais. Estava com fome e aquele cheiro estava me matando. Era aquele cheiro que vinha daquelas casas grandes em que residiam famílias felizes quando se preparava a ceia do Natal. É lógico que não poderia ser ali em casa, mas parecia tão perto... Deveria ser no vizinho.

Depois de enrolar quase um hora, decide levantar. Mais um pouco iria babar no travesseiro. Tirei a minha roupa velha de dormir e coloquei uma menos velha que era a menos pior para se usar nesse dia. À medida que me aproximava da cozinha, aquele cheiro ficava mais evidente. Não podia ser verdade... Mas era! Quando entrei na cozinha, Kamijo estava tirando um peru enorme do forno.

- Oh, Juka, seu dorminhoco! Já ia te chamar para almoçar! O meu chefe deu esse peru pro Natal! Muito gentil ele, não? - disse vindo na minha direção e por fim me dando um selinho.

- Sim, mas não deveríamos comer isso na janta? - perguntei achando tudo meio estranho. Estava meio que dormindo ainda.

- É que a geladeira estragou, então resolvi fazer o quanto antes para o peru não estragar.

E durante nossa breve conversa, ele ia arrumando a mesa para nós dois. Acho que nenhum de nós estávamos acreditando que finalmente teríamos um Natal com comida... e presentes! Enquanto ele terminava de por algumas frutas à mesa, eu aproveitei o momento para fazer minha surpresa. Quando voltei para a cozinha, fiquei parado e quieto atrás de Kamijo apenas esperando ele se virar. Assim que ele o fez, eu estendi minha duas mãos segurando um pacote:

- Feliz Natal, Kamijo! - ele me olhava incrédulo e enquanto assimilava as ideias eu continuei - Prometi que nesse Natal eu te daria um presente e aí está! - concluí sorrindo. 

- M-mas, Juka... Como que... - então ele pegou o pacote da minha mão e começou a abrir.

- Espero que goste! - sorri.

Ele terminou de abrir e seus olhos de curiosidade se transformaram em olhos que não queriam acreditar no que viam.

- Juka, isso é...

- É o último livro da sua coleção! Achei em um sebo bem no centro de Londres.

- Mas como você conseguiu comprar? Quer dizer, seu salário é o valor exato do aluguel... 

- Eu vendi meu violão.

Me doeu falar aquilo, me doeu vender meu violão, me doeu ver a expessão no rosto de Kamijo.

Ele colocou o presente em cima de uma das cadeiras e disse que já voltava. Mas como assim?! Kamijo tinha revirado Londres de cabeça pra baixo para achar o último livro e quando ele o tem... não fazia sentido. Quando ele voltou, trazia um pacote improvisado.

- Comprei isso para você ontem antes de chegar em casa, mas... 

Ele abaixou a cabeça e não terminou a frase. Eu apenas peguei meu presente e agradeci. Estava feliz, mas por que me sentia estranho? Por que Kamijo parecia triste?

Eu abri lentamente o pacote. Minha mãos tremiam. E então eu compreendi tudo.

- Você andava reclamando das cordas do seu violão e estava com medo que elas arrebentassem. Então resolvi te dar cordas novas, mas como também estava sem dinheiro, resolvi vender minha coleção de livros. Mas quando cheguei no sebo aqui perto, o senhor de lá disse que minha coleção já não tinha tanto valor, pois o autor foi metido em um escândalo e suas obras foram depreciadas.

Passei as cordas pelos meus dedos e tentava pensar em alguma coisa para falar e rápido.

- Juka, por que você fez isso? - Kamijo disse colocando a mão no meu rosto.

- Eu só queria ver você feliz...

- Mas e suas composições? Você gostava tanto de tocar e quando você tocava eu me sentia tão bem.

- Mas agora você está sem seus livros também.

Nós dois ficamos completamente sem saber o que falar ou fazer. Tivemos a melhor das intenções, mas o que poderia fazer então?

- Escuta, Kamijo... - eu o abracei e continuei - Ainda estamos juntos. E se você continuar aqui comigo, não há valor que pague isso.

Eu pude sentir ele sorrindo de uma forma meiga querendo afastar a tristeza pra bem longe. Ele então me soltou e deu um sorriso de orelha a orelha e falou:

- Eu prometo que ao menos enquanto viver eu vou ficar aqui com você! 

Nos beijamos. Nos beijamos ali mesmo por um tempo. Kamijo era uma pessoa tão doce e gentil... Às vezes me sentia culpado por não poder retribuir tudo que ele fazia e sentia por mim. Mas eu estava disposto a melhorar e fazer Kamijo, aquele que me é mais importante, a pessoa mais feliz do mundo.

- Feliz Natal...

- Feliz Natal, Kamijo.


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