Orphan escrita por thaiisz


Capítulo 1
Nascimento.




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Dos diários do Dr. Varava Scherbítsky, 25 de abril de 1976.


A senhora Klammer permanecia imóvel em frente à janela de sua casa, enquanto as gotas de chuva caíam do lado de fora e o vento soprava, varrendo as folhas e flores de seu jardim. Leena Klammer, sua filha, nascera há alguns dias naquele aposento. Todos avisavam à senhora Klammer dos riscos presentes quando se decide fazer um parto em casa, mas ela insistia. Mais do que ninguém, era uma pessoa extremamente caseira. Nunca saía, ou raramente, apenas para ir ao mercado e a floricultura. Desde a morte de seu marido, cinco meses atrás, a senhora Klammer havia se tornado uma pessoa fria e calculista, de muito difícil convívio. Vivia sozinha desde então. Seu aposento ficava em uma planície central, a noroeste da Estônia. Tinha um aspecto simples, se me permitem dizer. Era uma casa vitoriana de telhado com mansarda, enquanto outras casas de mesmo aspecto a rodeava. Havia, na mesma rua, um mini-castelo em estilo Tudor, imponente e sombrio, com um muro alto ao seu redor. Atrás, uma construção ampla combinava pedras cinzentas à elegância do granito, outrora destinada a manter os pacientes seguros. Era um sanatório para doentes mentais altamente perigosos, chamado Instituto Saarne. A senhora Klammer pouco sabia sobre aquele lugar, mesmo estando a um fio de por os pés lá. Era uma mulher muito cruel e arrogante, tendo seus acessos de raiva com mais frequência enquanto o tempo passava. Muitos diziam que ela não sobreviveria ali, com apenas uma criança para lhe fazer companhia e a ajudar a esquecer das dores do passado, eu parara de visita-la após o nascimento da menina. As memórias de seu marido ainda assombravam sua mente, e a cada vez que fechava os olhos, era como se estivesse novamente com ele embaixo de uma grande árvore no parque aonde se viram pela primeira vez, os galhos de outono balançando enquanto a leve brisa bagunçava seus cabelos. Outras pessoas diziam que ela acabaria por passar essa loucura à sua filha. Nunca se soube como a senhora Klammer conseguira sobreviver por tantos anos a um casamento instável. Todos os dias à noite ela aparecia na varanda, chorando e suplicando ao vento que soprava e congelava sua alma para trazer o senhor Klammer de volta, em vão. Nós sempre a avisávamos, “Vá Marie, saia desta casa, faça aquela viagem com a qual sempre sonhou, vá a Veneza na primavera e a Roma no outono. Viva!” Mas quando o dizíamos, ela nos olhava com pena, rindo. Não uma risada alegre, não, a alegria a desconhecia. Era uma risada fria, dura, desprovida de qualquer sentimento que não fosse o ódio. Nos olhava como se fossemos crianças travessas que não entendessem a verdadeira realidade cruél do mundo que rastejava naquela época. Bom, sobre isso, eu posso lhe assegurar, a senhora Klammer entendia muito bem.



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