“Boa noite, senhor” Disse o velho porteiro acomodado em sua cadeira giratória já desgastada por trás do balcão brilhoso e extremamente bem limpo à já conhecida figura. O jovem de cabelos medianos o respondeu com um simples aceno de cabeça enquanto atravessava o hall em direção aos elevadores. Apertou o botão do décimo quarto andar e esperou pacientemente até que este chegasse, olhou a garrafa que tinha em mãos. Fechou os olhos.

Sentia-se como se as paredes se fechassem e o sufocassem um pouco mais à medida que os números referentes aos andares mudavam, acima das portas metálicas do elevador em que se encontrava. Sentia-se pior a cada milímetro que as portas se abriam em sinal de que havia chego ao andar desejado. Suspirou. Andou lentamente até o fim do pequeno corredor com chão cinza e paredes brancas com pequenos detalhes de madeira e virou à sua esquerda seguindo novamente até o fim. Parou em frente ao apartamento número 513 e suspirou novamente segurando a garrafa com firmeza. Não podia desistir agora. Apertou a campainha e viu a porta escura de madeira polida se abrir revelando a figura rosada por quem viera até ali.

A mulher lhe lançou um sorriso acolhedor e doce enquanto dava-lhe espaço para entrar. Seu sorriso. A atmosfera encontrava-se tensa. O moreno repousou a garrafa que antes segurava com força sobre a mesa, assistindo a mulher que, com movimentos graciosos, pusera as taças de cristal acompanhando a garrafa. Presente de dois anos. Olharam-se por um instante, como se buscassem respostas um no outro. Olhavam tão fundo em seus olhos que acreditavam ser possível enxergar a alma de cada um.

O moreno caminhou até a janela. Uma grande janela de vidro que ocupava toda a parede, dando um ar fresco ao apartamento. As luzes da cidade guiavam seus olhos pela paisagem, fazendo com que se perdesse em seus pensamentos. Surpreendeu-se ao sentir o toque suave da mulher de cabelos rosados que o oferecia uma taça com o vinho que trouxera. Observou o líquido sentindo o aroma tomar-lhe os sentidos. Tomou um gole. Ergueu o olhar e voltou a encarar a mulher que se encontrava observando as flores brancas na mesa baixa. Esticou-se como se pedisse um beijo. O último beijo.

Estava prestes a selar os lábios macios da amada quando sentiu como se sufocasse. Sua respiração foi falhando e, quando o desespero tomou conta de sua mente, sua visão começou a esmaecer lentamente. Sentia seu corpo parecia perder as forças e lentamente, desmaiou. Sua respiração tornou-se como um sopro, um sopro cada vez mais fraco.

Um sorriso se tornou visível no rosto da mulher e seus olhos verdes brilhavam. Observou o anel em sua mão. “Como pode cair em um truque tão ultrapassado?”  Sussurrou para o corpo que se encontrava inerte à sua frente. “Como se pudesse me escutar”  Riu com desdém. Deu mais um gole do vinho enquanto observava o vidro já em suas mãos. 

Sua cabeça começou a girar. Apoiou-se na mesa e quando deu conta de si, já estava de joelhos no chão. Sua visão passou a se tornar embaçada. Desesperou-se. Sabia que só havia colocado veneno na taça do moreno, então porque estava acontecendo tudo isso?

Leu então o rótulo da garrafa, que há essa altura já estava jogada no chão.

BAISER DE LA MORT.*

Em segundos sua respiração também não passava de um sopro.

Não havia mais respiração.

E nem havia sopro.

*Baiser de La mort = Beijo da morte.