Tulpen escrita por Blue Dammerung


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

"Não é verdade que as pessoas se repitam. O que se repetem são as situações" Caio Fernando Abreu ♥33



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/164499/chapter/1

Suspirou, ajeitando o quimono com cuidado para manter a imagem correta diante do seu visitante que, naquele instante, batia à sua porta. Não, não à sua porta, mas batia na porta da sala com uma certa educação velada, entrando pouco depois, o terno contrastando com seu corpo como se estivesse desconfortável em vesti-lo.

Voltou a suspirar, dessa vez mais discretamente, quando o outro bem devagar, passo a passo, avançou na sala aonde somente eles dois estavam, o restante das pessoas conversando ou trabalhando lá fora naquele prédio do governo.

Ele era Kiku Honda, um diplomata recém-formado cujo a primeira missão oficial seria receber e oficializar um acordo comercial entre o Japão e a Holanda, e aquele rapaz (porque ele ainda parecia ser muito jovem) era o representante daquele país em território nipônico.

E porque queria demonstrar a cultura de seu país, pediu que a sala fosse decorada como uma característica casa japonesa, e não um um escritório comum, e como queria enfatizar este aspecto mais ainda, estava de quimono, a postura ereta e os olhos escuros um tanto inseguros.

Agora pensava se não estava exagerando demais.

O rapaz, no máximo 26 anos, se sentou no chão, afrouxando um pouco a gola do terno, assim como a gravata, e colocou um embrulho entre si e seu anfitrião. Era um buquê de tulipas. Kiku fitou as flores e depois o outro diplomata, que olhava para o canto.

-Meu chefe pediu para que eu trouxesse algo... Característico do nosso país.-Disse o holandês, cruzando os braços e então coçando a cabeça.-Desculpe, ainda estou de sapatos...

-Não, tudo bem, você não precisa tirar.-Disse o japonês, temendo estar impondo demais sua cultura ao outro, que apenas deu de ombros e se sentou de maneira mais confortável.-Então... Obrigado pelas flores...

-Não há de quê.-Voltou a dar de ombros, olhando em volta, por vezes levando a mão até o pescoço e sentindo falta do costumeiro cachecol que vestia. Até o teria vestido naquela ocasião, mas seu chefe deixou bem claro que era um encontro diplomático e não uma simples conversa. Suspirou.

-Então...-Kiku começou, a voz um tanto tremida. Tudo tinha que sair perfeito, mas era seu primeiro dia e estava morrendo de medo de errar em alguma coisa, porém, Abel era um tanto mais experiente naquilo.

-Aqui está.-Tirou vários papeis grampeados de dentro do terno e os entregou ao japonês.-A nossa proposta é comercial, como você sabe. Suas taxas de juros para produtos exportados para o nosso país, principalmente produtos eletrônicos e essas coisas que vocês vendem, deverão abaixar cerca de 18% em um ano, e em troca, meu país promete lhe oferecer um apoio maior no turismo e em grandes compras como empresas em nosso território e coisas assim. Está tudo nesse papel aí.

O japonês folheou os papeis rapidamente, lendo os tópicos mais importantes e assentindo com a cabeça, as flores em certos momentos lhe tirando a atenção. Tinham um cheiro engraçado, e as cores também eram engraçadas, bonitas.

-Meu país adoraria realizar este acordo com o seu.-Disse Kiku, sorrindo muito pouco, mas sorrindo, apertando então a mão do outro, que se pôs de pé sem cerimônias e de dentro de um dos bolsos do terno, tirou um cachimbo e um fósforo, caminhando até a janela daquela sala improvisada.

-Sua cidade é muito cinza.-Disse, inspirando a fumaça com gosto.

-O senhor não pode fumar cachimbo aqui.-Disse, se pondo de pé, as mãos cordialmente juntas na frente do corpo, temendo estar sendo rude, mas aquelas eram as regras.

O holandês se virou, deu de ombros e apagou o cachimbo, voltando a colocá-lo dentro do terno mas então fazendo aparecer um cigarro, logo aceso.

-Então cigarro pode?

-Também não.

-Que merda.

Um silêncio estranho se instalou no ar, o holandês ainda fumando, olhando pela janela, e o japonês sem saber exatamente o que fazer. Só precisava dar uma última olhada no papel e então passá-lo ao seu chefe, que finalmente o aprovaria, então eles tinham praticamente terminado ali. As flores morriam no canto.

-Você tem que pô-las na água, senão morrem, as tulipas.

-Ah, sim.

-Quero dizer, agora, você tem que pô-las agora. Se eu lhe trouxe flores, deve ao menos cuidar delas com apreço.

-Vou colocar... Mas não sei aonde teria um vaso aqui por perto.

-Uma garrafa com água serve, não precisa ser nada muito caro. São flores, não pessoas. Elas não vão olhar para o seu dinheiro.

Voltou a tragar o cigarro, uma das mãos então nos bolsos enquanto o japonês o fitava. Seu convidado tinha um porte alto, os cabelos loiros numa espécie de moicano, levantados, os olhos verdes e uma cicatriz curiosa na testa. Pensou em como a teria conseguido, e certamente não comprando flores.

Abel Parlevliet tirou o cigarro da boca e o amassou contra a janela, depois deixando que caísse no chão, a mão então livre indo novamente até o pescoço, sentindo falta do cachecol.

-Devo ir, então. Muitos acordos ainda, foi bom falar com você.-O holandês limpou a garganta, fazendo uma mesura tipicamente japonesa e caminhando até a saída da sala, desaparecendo então, deixando para trás Kiku e as flores morrendo, logo colocadas dentro de uma garrafa de água mineral.

Tinha ido bem para sua primeira missão, não tinha? Provavelmente. Passou o restante da tarde pensando naquilo, falou com seu chefe e foi para casa, o ar soturno caminhando nas calçadas lotadas à noite.

Dentro de uma sacola, mais especificamente ainda na garrafa de água, levava as tulipas do holandês como uma espécie de presente. Quem sabe, quando fizesse um acordo com o Brasil, não ganhasse uma bola de futebol.

Estava caminhando pelas iluminadas e barulhentas ruas de Tóquio quando passou em frente à um restaurante pequeno e qualquer, as portas de vidro mostrando, além delas, o mesmo diplomata de horas antes comendo sozinho, ainda vestindo o terno, mas desta vez com um cachecol listrado azul e branco.

Kiku o fitou por alguns instantes. Deveria entrar ou prosseguir até sua casa como se não tivesse visto nada? E se entrasse, falaria com ele? E o que diria? Sobre o que conversariam? Nunca fora muito bom em falar, mesmo tendo escolhido a diplomacia. Suspirou, e quando estava escolhendo continuar andando até sua casa, se deparou com o holandês já fumando à sua frente, os olhos verdes impassíveis.

-D-Desculpe, eu não quis ser indiscreto, eu...-Kiku começou, mas o outro deu de ombros.

-Não foi, eu não estava fazendo nada de importante mesmo. Você mora aqui perto?

-S-Sim...

-Meu hotel também é por aqui.

Um silêncio constrangedor pairou no ar, e Kiku não sabia se encerrava a conversa e ia em frente ou se convidava o outro para jantar em sua casa, o que seria mais educado de fazer. Mas antes que respondesse, sentiu seu pulso puxado pelo holandês e antes que desse conta, quase corriam entre a multidão das calçadas, por fim parando num beco escuro, desolado, o cheiro de lixo no ar.

A sacola com as flores caiu no chão ao lado de Kiku, que fora prensado contra a parede pelo holandês, que olhava em seus olhos não mais tão impassíveis.

-O-O que está havendo?!-O japonês perguntou, sem entender, mas logo foi calado pelo mais alto, que segurou-lhe o queixo quase com violência e beijou-lhe forçadamente, fazendo-o abrir a boca para permitir a passagem de sua língua, os dentes se chocando e o mais baixo se debatendo para se soltar, esmurrando-lhe como podia, em vão.

Conseguiu virar o rosto para o lado, respirando fundo, sem fôlego, o coração batendo muito rápido porque aquele tipo de coisa ele nunca iria esperar, e agora sentia-se tão... Usado, violado, sujo. Queria correr para longe dali e se trancar em casa quem sabe por uma semana antes de sair na rua novamente.

-Não pude evitar.-Abel disse, levando a mão livre até o peito do japonês para mantê-lo pressionado contra a parede daquele beco escuro e esquecido na cidade.-A prostituição aqui não é legal, você não sabe o quanto foi difícil para mim passar uma semana entre gente tão perfeita. Então você procura por mim, me acha e eu vejo o momento perfeito.

-E-Eu n-não estava p-procurando por você! Eu estava indo p-para casa!-O japonês tentou se justificar, suando frio com a proximidade do outro.

-Mas, de qualquer forma, eu estava, indiretamente, procurando por você.

-Me solte...!

-Não, e se você ousar gritar, juro que desfaço o acordo que fizemos horas atrás, e tenho certeza que isso vai prejudicar sua carreira, não vai? O primeiro acordo sendo desfeito é algo horrível para se ter no curriculum.

-Pare!

O holandês levou uma das mãos até o rosto do japonês novamente, beijando-lhe com volúpia enquanto a outra, além de prensá-lo contra a parede e parar suas constantes investidas para se soltar, entravam debaixo de suas roupas e tocavam sua pele sem puder, apavorando mais e mais o japonês, que sentia como se fosse desmaiar.

Abel, quando finalmente parou de beijar o mais baixo, desceu os lábios até seu pescoço e o mordeu e chupou em seguida, a mão subindo e descendo no peito do japonês apertando de vez em quando seus mamilos, fazendo-o, por sua vez, querer chorar. Se era prazeroso, podia até ser, mas apenas do ponto de vista físico. Do emocional e mental, nunca experimentou choque maior do que aquele.

Se segurava para não gritar, as mãos grandes do outro vasculhando seu corpo cada vez mais, as flores dentro da garrafa com água caídas no chão, morrendo, e Kiku chorando, já chorando porque essa era então a única coisa que podia fazer.

E quando o outro roçou sua perna contra o membro do japonês, este último simplesmente desmaiou, desfaleceu, perdeu os sentidos porque seu cérebro julgou aquela experiência destrutiva demais e preferiu desligar o sistema todo.

E vendo o outro desfalecido por sua causa (teve que segurá-lo para que não caísse no chão), a única coisa que Abel pensou foi “puta merda, o que foi que eu fiz?”. Já não tão mais excitado assim (porque uma experiência dessas broxa qualquer um, né), deixou o beco e pediu por ajuda, e em questão de minutos, Kiku estava no hospital.

E tudo que ficou para trás foram as tulipas mortas.

--------------------------------------------------------------------------------------------------------

Dois dias depois, lá estava ele, Abel, de pé segurando a mala, no aeroporto de Tóquio com uma expressão impassível e insensível. Não tivera mais notícias do japonês depois que o deixara no hospital, e em parte, sentia-se culpado.

E rezava para que ele não tivesse contado para ninguém sobre o pseudoestupro, mas achou que não. Não pegaria bem para alguém que estava começando a carreira. Enfim, estava prestes a partir. Não voltaria para seu país, desta vez iria ao Brasil fazer outros acordos.

Na verdade, já estaria dentro do avião se o costume não fosse que, no final, os diplomatas selassem o acordo antes que um deles partisse, e este selar significava apenas um aperto de mão amistoso. Abel suspirou, olhando em volta e não reconhecendo ninguém na enorme multidão, os olhos um tanto cansados por não ter dormido na noite anterior.

Até que duas pessoa se aproximaram e chamaram sua atenção, uma delas reconheceu por ser o chefe do Departamento de Relações Exteriores e o outro era apenas Kiku com um olhar muito amedrontado no rosto, desta vez vestindo um terno comum e não o quimono.

-Obrigado por vir até nós, senhor Parlevliet, espero que sua estadia aqui tenha sido agradável.-Disse o chefe, apertando na mão do holandês e dando um sorriso amistoso.

-Foi sim, meu país ficará muito feliz com este acordo.

-Pois muito bem, Kiku, dê adeus ao nosso visitante agora, sim? Vou deixar você sozinho, vai servir como treinamento, precisa fazer mais coisas sozinho. Estarei esperando no carro.-E dizendo isso, o chefe do japonês saiu, deixando o mesmo fitando o chão com um ar constrangido.

Mais um silêncio constrangedor pairou no ar, Abel fitando o japonês com certa gravidade e o outro fitando o chão, querendo sair dali. O holandês suspirou, sabendo que Kiku dificilmente diria alguma coisa, então tomou a iniciativa.

-O acordo diplomático foi aprovado com sucesso, não se preocupe com sua carreira...-Levou uma das mãos até a cabeça, mexendo nos cabelos, sem realmente saber o que dizer. Então uma voz feminina soou nos alto falantes do aeroporto, dizendo que o próximo voo direto para o Brasil sairia em minutos.

Abel fitou o japonês a sua frente e estendeu uma das mãos apenas para ver Kiku estremecer, as mãos fechadas em punhos com tanta força que os nós dos dedos estavam brancos. O holandês talvez tivesse estragado toda e qualquer possibilidade de se ter uma relação amistosa com o outro.

Abel se virou para ir embora então, mas não poderia partir de consciência pesada. Voltou a se virar para o japonês e, de dentro do terno, tirou uma tulipa um tanto amassada, mas viva ainda porque sempre levava muitas consigo dentro de garrafas d'água, e aquela fora a única que ficara sem garrafa, então ele decidiu, pelo menos até chegar ao Brasil, levá-la consigo no lado esquerdo do peito, e agora a estendia ao japonês.

-Me desculpe.-Disse apenas, se aproximando rapidamente e dando um beijo na testa do japonês, mesmo que este tenha fechado os olhos com força e estremecido, porém com a tulipa em mãos, aceita com apreço.

E Abel partiu em direção a outro continente, deixando para trás um japonês de olhos escuros com uma expressão, não de medo nem de dor, mas de uma súbita saudade, apesar de tudo, segurando a tulipa com força para que não morresse.

-------------------------------------------------------------------------------------------------------

-Kiku, seu próximo trabalho será no Brasil.

-O quê?!

Fim.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E aí?! Espero que tenham gostado porque escrever o Holanda é MUITO complicado. Ele, por não aparecer muito nem no anime nem no mangá, fica deixando a desejar sobre detalhes de sua personalidade e tals, mas sobre o que eu pesquisei e sobre como ele me parece, é mais ou menos assim.
Enfiem, sugestões, reclamações e etc etc etc mandem reviews, okay? Não dói e ainda me deixa feliz, olha que legal!
(estou certa em pensar que esta é a primeira fanfic Holanda x Japão deste fandom? Isso é só uma pergunta)
Enfiem, espero que tenham gostado mesmo (se leram até o final é porque não tava tão ruim, né?)
KISSES ♥3