Entente Cordiale escrita por RedVelvet


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Essa fanfic possui personificações de nações, etc. É Hetalia, leitor, você já deve entender como funciona, certo? Taí um FrUK bem tranquilo pra galera.



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Houve um tempo em que podíamos desfrutar da companhia um do outro, inocentes como crianças. Quase um povo único, bárbaro e primitivo, nós simplesmente não ligávamos para as diferenças. Mas conforme essas cresciam e nos firmávamos como povos, passamos a brigar com nossas mãos, pedras, espadas, arcos-e-flechas, navios, cavalarias, canhões e pólvora. Para que, naquela noite, graças a um pedaço de papel e uma ameaça germânica, passássemos apenas a desferir ameaças infantis com olhares. Pensando agora, não sei se isso é bom ou ruim.

Ele odiava ser o centro das atenções naquelas situações. Ter que parabenizar a sábia decisão de nossos chefes e falar o quanto estava feliz em praticamente se casar com aquele “bloody frog”? Heh, era hilário como o rosto dele corava cada vez mais, envergonhado com a própria situação. Mantive distância. Meu discurso foi rápido e direto, como costumo ser. Do lado da janela eu poderia observá-lo sem problema, sem dar satisfações.

Curioso como, de todas as nações que eu já conheci, Arthur foi a única com a qual eu nunca tive realmente uma noite “especial”. Sim, todo o resto já mostrou pelo menos certo interesse. E qualquer interesse para mim resulta em algo. Mas, com o Arthur… Por mais que acontecessem aqueles curtos momentos fraternais onde ele fraquejava e chorava no meu peito ou, no outro caso, quando ele tentava conversar comigo enquanto eu cuidava dos meus ferimentos, resmungando. Nós temos uma das relações mais antigas do mundo, e ainda assim, éramos distantes demais para nos considerarmos algo além de rivais.

Isso não me impediria de nada, geralmente. Havia algo mais e, por mais cliché que isso soe, creio que o verdadeiro escudo dele está em seus olhos. Qualquer toque, qualquer movimento brusco digno da desaprovação de um britânico tradicional era respondido com aquele olhar que pais usam para repreender uma criança de cinco anos. Um sorriso é sempre a melhor resposta, mas a forma como ele nunca deixava transparecer nada semelhante a prazer ou aprovação me irritava. Eu queria arrancar aqueles olhos, talvez assim ele sentisse algo quando eu o tocasse. E aqueles mesmos olhos, com aquele mesmo olhar, se aproximavam entre a fumaça do cigarro.

Mas é claro que eu fiz aquilo de propósito. Ele tossiu, uma mão no blazer para afastar o cheiro da nicotina. Resmungou algo sobre ser proibido, mas não prestei atenção. Porque ele não calava a boca de uma vez? Parecia forçar algum assunto para se aproximar, ainda envergonhado pela nossa situação. Dei minha resposta pronta, o sorriso cínico sem maiores intenções além de deboche, e pela primeira vez em mais de um milênio e meio, silêncio.

O quê? Acabou? Não iria reclamar? Onde estavam aqueles “idiota” ou “cale a boca”? Ele não havia bebido ainda, estava vestido e seu hálito ainda cheirava à pasta de dente. Um passo para perto. Nada. Dois. Sem reação. Meu rosto estava próximo ao dele, e a única coisa que o interessava era a lata de lixo do lado de fora do parlamento?! Estava doente, ou estava pensando na independência de alguma colônia. Puxei a manga do blazer escuro, apenas para puxá-lo de volta para a realidade quando ouço algo tão aleatório quanto as reações dele.
“Quanto tempo acha que vamos durar?”

Isso podia ter mil interpretações. Quanto duraríamos em relação ao fim do mundo? À guerra? Àquele pedaço de papel com nossas assinaturas. O silêncio foi a melhor resposta que encontrei. Não acho que ele esperava mais de mim. Afastou-se em silêncio, fugindo dos homens de falsos sorrisos e mulheres de falsas seduções. Sei o quanto isso o incomoda, ainda mais quando ele tinha esses pequenos surtos de medo e toques de inocência. Segui meu coelho branco pelo prédio que mal conhecia. Curiosamente ele me levou à sua tão desejada lata de lixo.

Ele parou do lado de fora, respirando fundo algumas vezes. Deixei o cigarro no chão, mais interessado no dilema inglês. Lado-a-lado, o silêncio mútuo não me incomodava ali. Era como se ambos tivessem todos os motivos do mundo para iniciar uma conversa, mas essa não era necessária. Segurou-se em minha camisa, ainda com o olhar cansado, mas não para mim. Me lembrou o fim de seus tempos de pirataria, ou mesmo a morte da Rainha Elizabeth. Ele não tinha mais aonde ir e seu último pilar era o seu primeiro.

Na falta de um diálogo, minha mente vagava num monólogo sem fim, olhando para frente. Logo, ele encostou a cabeça em meu peito. A independência, como foi doce ver os dois tão separados. América seguiria o caminho de seus ideais, sendo bons ou não, e Inglaterra negaria isso até que seu último fio de cabelo caísse. Perguntei-me como algo tão triste para ele me causava uma satisfação tão grande, maior que uma vitória sobre ele em guerra. Ouvi algumas palavras a esmo que me chamaram a atenção. Não o que significavam, mas a forma como elas pareciam um pedido, talvez até estivesse implorando. Havia medo em sua voz.

Se eu ousasse responder, haveria medo na minha também. Eram tempos difíceis e da minha casa eu podia ouvir a construção das máquinas, dos motores, de todas as formas conhecidas de se matar um povo, talvez uma nação. Nós já fomos o centro do mundo, e naquela noite éramos dois ratos assustados, fugindo para a mesma toca. Ele não pensava diferente e talvez ali, longe de todos, poderia temer um pouco pela própria vida. Seu rosto expressava aquilo tão bem… Aqueles olhos me fitavam com um resto de esperança, como se talvez se sentisse seguro ao meu lado.

Até que eles se fecharam. Ele não se afastou, não falou nada, apenas ficou ali, de olhos fechados. Sem barreiras. Eu não levei a sério, é claro. Segurei o rosto dele, murmurando qualquer coisa que seria digna de um tapa que não veio. Só o silêncio, o cheiro constante de chuva e o britânico com quem passei maior parte da minha vida brigando ali, esperando algo além de palavras. Eu não hesito, isso é da minha pessoa, mas ele era Arthur Kirkland e eu era Francis Bonnefoy. Aquele toque de lábios seco e rápido não mudou nada. Ele afastou minha mão, passando a própria para o meu corpo. Entre agressões ou elogios, ele precisava se impor. Tentou até ir mais longe, inclinando a cabeça para o lado, mas o gosto da nicotina o impediu.

Voltou a abrir os olhos, afastando as mãos como se ainda tivesse nojo de mim. Não poderia negar nunca o que fez, eu vi tudo. Meus olhos não poderiam fechar, ou mesmo piscar diante de um acontecimento tão histórico e tão mundano. Ele resmungou algo sobre o gosto e desviou o olhar, logo de volta a si. Mantive os olhos nele, quase que em transe. Logo esqueceríamos daquilo, logo voltaríamos a ficar entre os políticos e convidados, logo Arthur estaria bêbado. Logo, eu estaria imaginando uma forma de entrar no quarto dele no meio da noite sem chamar a atenção dos vizinhos.


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Notas finais do capítulo

desu.



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