O Adeus De Um Amigo escrita por alinka


Capítulo 1
Capítulo único




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O adeus de um amigo

A chuva que caía fina molhava meu cabelo. Já fazia um bom tempo que eu estava ali sentado na terra molhada. Meus joelhos havia cedido após algumas horas em pé. Ninguém sabia que eu estava ali ou mesmo que eu estava na vila. Fui sorrateiro e aproveitei o vento forte antes da chuva para me mover rápido e sem ser percebido. Ainda não acreditava que aquilo tudo tinha acontecido, parecia mais um pesadelo, um absurdo.

Fechei meus olhos para rezar, era o mínimo que eu podia fazer por ele, mas a única coisa que vinha em minha memória era o passado. As únicas imagens que surgiam em minha mente eram de destruição e morte. A dor estampada no rosto de todos os shinobis que eu fitava, mas no final a dor dela era superior a qualquer coisa que alguém ali pudesse estar sentindo. Os gritos de horror de batalhas diferentes se misturavam em minha mente e me fizeram abrir os olhos novamente antes mesmo de começar a oração.

Já fazia um bom tempo que eu não conseguia dormir direito. As primeiras noites foram terríveis, não pela insônia, que para mim já era normal, mas pelos pesadelos que eu tinha acordado. Demorei mais tempo ainda para vir aqui que o imaginado. Ele era meu amigo. Meu primeiro amigo. O único que conhecia minha dor, minha fúria, meu vazio.

Da mesma maneira que cheguei em seu túmulo eu voltei para minha vila. No escuro do meu quarto deixei meus pensamentos vagarem. Eu sabia para aonde eles iriam. Sabia que não iria ser agradável, mas mesmo assim eu deixei e libertei todos os sentimentos submersos e esquecidos no fundo de minha alma. As primeiras imagens eram distorcidas, imagens do momento da grande explosão. Então tudo voltou para trás. A explosão regrediu, os corpos espalhados pelo forte vórtice voltavam para o local de origem, tudo indo de trás para frente. Então parou.

Seus olhos azuis cansados me fitavam. Sua expressão era ameaçadora, implacável. Ele estava disposto a acabar com a guerra de qualquer maneira. Eu queria discutir o porquê dele estar ali. O porquê dele não estar protegido. Mas apenas o seu olhar me intimidou e eu recuei. Quando ele falou sua voz não condizia com seu rosto. Era uma voz suave, calma. Foi então que eu percebi que era o fim. Aquela seria a última conversa que teríamos e eu não iria desperdiçá-la com coisas menos importantes.

- Gaara... Obrigado por tudo que fez. Agora é minha vez de retribuir o esforço de todos. Deixe comigo.

Mais uma vez ele não conseguiu erguer a mão para me cumprimentar. Mais uma vez eu usei minha areia e a trouxe para o encontro da minha. Mais uma vez a surpresa nos seus olhos surgiu. É, algumas coisas não mudam.

- Naruto. Só fiz o mínimo que deveria. Não me agradeça ainda. Vamos, temos trabalho a fazer.

Eu já virava para caminharmos na mesma direção quando ele segurou meu ombro. Eu sabia o que aquilo queria dizer. Eu sabia o que ele ia dizer e, embora eu não quisesse ouvir, eu não tive forças para impedi-lo de falar.

- Só tem um jeito de acabar com isso Gaara... E você sabe.

- Naruto...

- Por favor, pode guardar isso para mim? Por favor.

Ele sorriu. Um sorriso cansado. O último sorriso de Naruto. Ele me deixou com o objeto na mão antes de sumir e deixar em minha mente um "Adeus".

Voltei para o presente no momento em que abria minha mão e olhava o objeto que ele havia me dado. O colar com o pingente sempre estava comigo. Por muitas vezes pensei em deixar em seu túmulo, ou deixar com "ela". Mas toda vez eu o guardava novamente como se fosse traí-lo se eu me desfizesse dele. Era a minha lembrança. Era a minha dor.

- Quando vai se despedir?

Somente uma pessoa seria impertinente o suficiente para entrar em meu quarto sem permissão prévia. Eu podia ser o Kazekage, mas ele era meu irmão mais velho, por isso podia entrar assim sem ser chamado.

- Eu já me despedi. Fiz isso hoje.

- Não me refiro a ir ao seu túmulo. Me refiro a dizer adeus a essa lembrança que carrega consigo e que se tornou um fardo.

- Como sabe...? Deixa pra lá. Eu pensei em entregar para ela, mas não consigo me desfazer dele.

Minha voz fica falhada. Minha visão fica turva. Então sinto a tristeza escorrer quente pelo meu rosto. As lágrimas molham o pingente em minha mão. Num súbito desespero, sinto minhas forças se esvaírem e eu ir de encontro ao chão. Braços me sustentam. Os braços de meu irmão. E é nos braços dele que eu finalmente desmorono e choro.

Lembro que chorei dessa maneira somente quando era criança. Por muito tempo imaginei que meu propósito nesse mundo era matar. Quando conheci Naruto isso mudou. Eu percebi que tinha um propósito, eu percebi que poderia ter um futuro, eu percebi que poderia ser querido. Não foi fácil chegar onde cheguei, mas se tive força para lutar, eu devo isso a ele. Fui eu que percorri o caminho, mas foi ele que o indicou e me incentivou a caminhar. Devo minha vida a ele. E nem pude agradecer.

Acordei em minha cama na manhã seguinte sem saber ao certo como tinha terminado a conversa com meu irmão, sem saber o que fazer ainda. As lágrimas estavam secas, mas a vontade de chorar ainda não tinha cessado. Fiquei deitado por um tempo antes de estranhar ninguém me chamar para o dever. Estranho... Ou talvez apenas mais um gesto de carinho de meu irmão. Isso é típico dele. Aproveitei minha manhã de folga forçada e descansei. O sono veio rápido. E com ele veio o sonho. A batalha.

Novamente a explosão de trás para frente. Os corpos voavam de volta para o centro da explosão. E tudo parou, voltando a caminhar para frente daquele ponto. Sempre o momento da explosão... O que eu não estou percebendo? O que eu estou deixando passar? Vejo Kakashi tentar conter a explosão com seu sharingam, mas é quase em vão, a explosão é muito grande e vaza através das fendas do tempo espaço que ele cria. Um paredão de areia é feito por mim para tentar proteger os sobreviventes, também em vão. Então a grande explosão arremessa todos para longe.

Só então percebo uma coisa: não deveríamos estar todos mortos? Sim deveríamos. Mas então por que não estamos? Foi quando tudo fez sentido. E pensar que tudo tinha sido tão bem calculado por ele. Ele que era considerado o mais impaciente e intempestivo de todos os ninjas, o ninja hiperativo. Naruto não causou uma explosão. Naruto causou uma implosão, mas a quantidade de chakra era muito grande para ser contida. O chakra da Kyuubi não poderia ser contido, mas ele fez o máximo. E o máximo foi uma centena de ninjas sobreviventes que deveriam estar mortos na guerra. Ele não morreu em vão.

O sonho acabou, mas eu não abri meus olhos. Pela primeira vez em anos eu pude realmente dormir e descansar. O que atormentava minha mente nos últimos meses se esvaiu e eu pude finalmente descansar.

Os dias passam e eu volto para o mesmo local que fora antes, mas que não tivera coragem de fazer o que deveria. Diante do seu túmulo eu rezo e peço perdão. Perdão por não ter agradecido tudo o que ele me fez. Espero que ele ouça de onde quer que ele esteja. As horas passam preguiçosas nesses momentos, como que para perpetuar seu sofrimento. O sol já começava a nascer quando senti sua presença. O cheiro era inconfundível: flores e lamen.

- Por favor não comente com ninguém que estive aqui.

- Não é a primeira vez que o vejo aqui, Gaara-sama.

Minha surpresa era visível quando ela revelou isso. Então ela era muito discreta. A garota de cabelos rosa estava mais envelhecida que o natural, como se para ela anos tivessem passado ao invés de meses. A dor muda até mesmo a fisionomia das pessoas. Ela sofreu muito, isso podia ser visto em seus olhos. Esmeraldas apagadas pela dor da perda.

- Ele foi meu amigo. Devia estar aqui durante o funeral...

- Não tinha como, Gaara-sama. Estava hospitalizado e sem chakra quase. Um pouco mais e estaria morto. Kakashi-sensei também não pôde ir.

- Como foi? O funeral...

- Digno. Tsunade-sama o nomeou Rokudaime Hokage. Mesmo em morte acho que ainda é válido... Você acha que ele viu?

- Tenho certeza que sim. Poderia me ajudar em uma coisa? Procuro uma pessoa...

Deixei Sakura no túmulo de Naruto e fui atrás da pessoa que procurava. Os portões eram majestosos. Os muros eram altos. Não sabia como chamar. Já dava meia volta quando vi um vulto no jardim. Sua beleza e simplicidade se confundiam com as pequenas flores do jardim. Uma leve brisa me levou até perto dela, mas não a surpreendi.

- Bom dia.

Sua voz era suave como a brisa, mas seus olhos eram arrasadores como a tempestade.

- Bom dia Hinata. Desculpe a intromissão. Mas precisava lhe falar.

- Venha, ainda não fiz meu desjejum. Gostaria de tomar uma xícara de chá comigo Kazekage-sama?

- Gaara. Me chame de Gaara.

Era como Naruto me chamava. Ela tinha esse direito também. Nos sentamos numa mesa perto do jardim. Enquanto ela pegava o chá eu fiquei observando suas mãos... Tão delicadas, tão frágeis. Mas era apenas aperencia, ainda lembro do que aquelas mãos foram capazes de fazer com nossos inimigos. Fortes. Implacáveis mãos. Não foi fácil começar o assunto, mas era inevitável.

- Gostaria de lhe entregar algo que está comigo. Algo que pertenceu ao Naruto.

Senti que ela vacilou por um instante. O leve tremor na mão que segurava a xícara mostrou que a tragédia ainda não havia sido superada.

- Tenho tudo que pertenceu a Naruto aqui.

Ela disse apontando para o próprio coração. Ela tinha razão. Então eu apenas concordei e retirei o colar com pingente de dentro do meu bolso.

- É algo material. Algo que pertenceu a ele. Acho que deve ficar com você.

Ela olhou para o pingente e sorriu. Suas mãos delicadas foram de encontro com a minha e tocou de leve no colar. Ela olhou para mim novamente.

- Esse pingente foi considerado amaldiçoado por muita gente. Prove que estavam todos errados. Use-o, como Kazekage. Esse é o pingente de um kage!

Me surpreendi com as palavras dela. E pela primeira vez eu realmente me senti dono daquele colar, daquele presente. Meu presente. Ouvi passos se aproximando, passos femininos.

- Minha senhora, desculpe aparecer assim, mas ele tem fome.

A mulher entregou um embrulho para Hinata e saiu. Ela olhou para mim e gesticulou. Me levantei e fui ver o que era.

- Esse é meu filho Aiko.

Não era preciso dizer nada. Aqueles olhos azuis disseram tudo para mim. Assim como o oceano banha a areia da praia, eu fui banhado e inundado por aqueles azuis. E foi assim que minha dor se esvaiu e escorreu de meu coração para sempre. A saudade sempre iria estar presente, mas agora o remorso não seria mais um fardo a ser carregado. Mais uma vez a luz de Naruto me salvou. Eu teria minha chance de agradecer tudo o que ele fez por mim em vida através de seu filho. Eu não iria desperdiçar.

O chá com Hinata e Aiko foi agradável. Depois de agradecer eu me despedi e saí. Eu já estava quase no portão quando senti algo diferente no ar. Não sabia dizer o que era até que o senti ali... Sua presença era forte e tranqüila. Trouxe-me paz. Dessa vez foi ele que estendeu a mão para mim, e eu, assim como ele antes, hesitei. Minha mão não se moveu, mas a dele veio até a minha. É, parece que algumas coisas mudam...

 

"Watashi no yūjin arigatō”.

Fim.

Watashi no yūjin arigatō: Obrigado meu amigo


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Notas finais do capítulo

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