Carnage Coffee escrita por Ana Bela


Capítulo 5
Chuva com Café




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Hyde chegou em casa se sentindo melhor, foi direto para o chuveiro e aos poucos descansando daquele dia chuvoso. Depois de tomar banho, colocou uma roupa leve e antes de ir fazer o seu chá de rotina, ligou para aquele número que preferia nunca precisar um dia ter que realmente ligar. Sequências de números malditos.

Logo aquela voz já conhecida atendeu, e Hyde no seu jeito frio fez a mesma pergunta que sempre fazia ansiando por uma resposta diferente do que as sempre ouvia. Sabia que deveria esperar alguém ligar e contar as novidades, mas antes de viajar queria ao menos saber de algo para acalmar ou fazer seu sangue novamente ferver.

- Ah Hideto, pensei que você disse para eu ligar para você quando tivéssemos novidades.

- Eu sei disso, mas eu quero saber. Não sei quando vocês estão falando a verdade.

- Está na mesma. – Aquela voz feminina soltou um suspiro. – Segunda fizemos algumas perguntas para os vizinhos, mas a reposta é sempre a mesma. Ninguém viu nada.

-... Quando vão começar a agir de verdade?

- Do que está falando, Hideto?

- Eu sei que vocês estão enrolando. Por quê? Qual é a graça de ficar enrolando com um caso que já deveria ter avançado ao menos um pouco?

- Já disse que não estamos enrolando com nada. Eu sei que é uma situação difícil, já conheci várias pessoas que ficavam agoniadas com situações similares, mas não podemos fazer nada enquanto não aparecer algo que possa nos ajudar.

- Vocês estão esperando que o assassino bata na porta de vocês pronto para ser preso e condenado então? – Já falava nervoso, aquela mesma situação.

- Claro que não, mas também não esperamos que a luz da esperança caia do céu. – Dizia cansada daquele mesmo discurso.

- Ótimo, depois não reclamem.

 - Do que está dizendo, Hideto?

- O que você entendeu... Se vocês não agirem eu mesmo vou agir. – Estava quase certo disso, mas esperava que se ameaçasse talvez eles se mexessem.

- Será pior para você, arriscar sua vida enquanto nós procuramos por respostas é algo idiota.

- Se pelo menos eu perder a vida, mas também colocar o culpado atrás das grades...

- Não pense nisso.

- Até breve. – Desligou sem esperar a reposta do outro lado, aquilo estava cada vez mais empoeirado. Não aguentava esperar tanto e só decepcionar com os resultados, que sempre eram os mesmos.

Resolveu espantar os pensamentos e fazer o chá de valeriana. Se ao menos conseguisse dormir tranquilo a dor de cabeça que havia passado desaparecia no dia seguinte e nem mais estaria pensando naquilo, ou pelo menos tentaria. Quando já estava preparado para tomar o seu chá o maldito telefone começou a tocar na sala. Pensou que fosse novamente incômodo, perderia totalmente a paciência daquela vez.

Foi até a sala e atendeu o telefone irritado, mas logo sua irritação passou. Era o seu pai que havia ligado apenas querendo saber como andava a sua vida. Respondeu como sempre respondia quando seus pais faziam aquelas ligações repentinas. Não contou sobre o fato de dias atrás ter enchido a cara e ter parado na casa de um desconhecido, seria algo que só geraria polêmica e surpresa.

Mas aquela conversa casual chegou a um ponto crítico. Aquela pergunta sobre como andavam as investigações que o pai havia feito ao filho, fez com que Hyde soltasse um longo suspiro e o outro ouviu mesmo do outro lado da linha. Hyde perguntou se haviam feitos perguntas à vizinhança, mas a resposta foi negativa, fazendo com que o sangue fervesse muito mais do que antes. Ela havia mentido.

Hyde depois apenas disse que talvez algum dia eles passariam por lá para perguntar às pessoas e logo mudou de assunto antes do pai fazer mais perguntas sobre aquele delicado assunto. Não poderia deixar tanto a raiva transparecer e os pais não mereciam ficar com tanto desgosto como estava. Se por lá eles aos poucos estavam se recuperando e acreditavam que as investigações estavam normais, que eles continuassem assim.

Após uma pequena conversa sobre coisas alheias da antiga casa de Hyde, este desligou e junto veio um suspiro cansado, não gostava se fingir sobre aquele assunto. Queria que tudo o que dissesse fosse verdade, que logo o culpado estaria atrás das grades. Mas não sabia até aonde a a  polícia iria enrolar com o caso, algumas vezes pensava que eles estavam do lado do assassinado e não da lei.

Finalmente conseguiu voltar para cozinha para tomar o chá, mas já estava frio. Não se importou, tomou frio da mesma forma e foi se preparar para dormir. Não queria pensar em nada ao menos naquele momento, sabia que no dia seguinte teria que esquentar a cabeça com muita coisa.

***

Hyde acordou no horário normal, mas ao sair de casa estava cinco minutos atrasado, enrolou demais ao se arrumar. Saiu em passos rápidos e resolveu pegar o elevador, maldita ideia. Pensou que estaria vazio, mas pelo contrário estava bem mais cheio. Chegou ao térreo xingando o primeiro que tentasse puxar conversa.

O caminho todo foi chutando pedras, mas quando chegou finalmente ao jornal já havia se acalmado do incidente. E chegou no horário, as mesmas pessoas chatas que costumava pegar elevador estavam lá esperando também. E naquele dia parecia que mais pessoas vinham o cumprimentar, ignorava todas, algumas até cochichavam algo na forma de insultar Hyde, mas como sempre ele tampou os ouvidos.

Chegou próximo da sua mesa e viu que alguém havia mexido ali, seus papéis estavam desorganizado e sempre antes de ir embora arrumava tudo para no dia seguinte não se perder, ao contrário dos outros colegas de trabalho. Quando chegou mais perto viu que eram papeis sobre a sua viagem.

Fechou a cortina e olhou para estes nem um pouco animado. Em poucos segundos várias pessoas vinham em sua mesa perguntar sobre exatamente o assunto que estava tão indiferente. Não queria responder, mas não conseguia, eram muitas as pessoas que vinham ás vezes até em bando, e caso não respondesse não conseguiria trabalhar. Então respondia com palavras monossílabas querendo espantar logo os urubus.

Quando finalmente a maioria saiu, começou a trabalhar, mas dando pouca atenção para tudo aquilo. Por dentro na verdade se sentia cansado, talvez as duas ligações do dia anterior lhe fizeram mal. Uma não deveria ter feito e a outra de qualquer forma receberia, mesmo que tentasse fugir.

No horário do almoço não conseguiu sair por dois motivos. O primeiro foi que tinha que adiantar muito trabalho já visando que quando voltasse teria mais uma pilha para tratar, então já tentando evitar o mal fez o que poderia. E o segundo motivo era porque novamente estava chovendo e até mais que no dia anterior. Parecia que o céu iria realmente desabava sobre Londres.

Os minutos se passaram muito lentos, Hyde a cada momento de olhava para o relógio e via que olhava de dois em dois minutos, mesmo muito concentrado no que fazia. Mas gostava daquele silêncio, sem ninguém fofocando, conversando, enchendo o saco, só ele e seu trabalho. E pensar que no dia seguinte não veria os colegas por uma semana, trataria de aproveitar muito bem a sua viagem.

Quando sua paz acabou tratou de nem olhar para os lados. Parecia que a cada olhar que dava para fora de sua mesa era motivo de alguém vir perguntar algo que não tinha nada a ver com a sua vida, sempre era assim. Não tinha nada a ver com o sumiço de papeis da mesa de um, da caneta estourada de outro ou muito menos xerox para entregar para o outro andar. Mas pareciam que não entendiam.

No final da tarde estava com vontade de tomar café, uma vontade extremamente grande. Mas se levantasse dali sabia que lhe encheriam o saco. Porém como sempre a vontade de beber era maior. Foi se arrastando até aquela mesa grande onde ficavam os bules com as bebidas. Não gostava muito de chá, não sabia se era todos em si ou se eram os chás da empresa.

Quando já estava saindo de perto com uma grande careta foi abordado por mais um chato daquele jornal. Hyde contava até mil para não sair correndo até sua mesa.

- E aí Takarai, ansioso para viagem?

-Não. – Respondeu seco andando disfarçadamente com um copo de café morno na mão, começou o inferno.

- Como não? Aposto que deve tá amando ir para outro lugar conhecer gente diferente. Você é tão sortudo...

- Se eu estou indo é porque eu fiz por merecer.

- Nem parece, você é sempre tão frio com as pessoas.

-Mas aqui ninguém quer saber como eu trato as pessoas e sim como eu trato o trabalho.

- Aí, você é tão chato ás vezes.

- Então não deveria conversar comigo. – Saiu de perto irritado, aquele último dia no jornal tiraram pra lhe encher a paciência de vez.

O resto do ia ali só rendeu respostas mal educadas e olhares assassinos. Quando saiu do jornal resolveu ir novamente ao café, aquele horário ao menos era vazio. A chuva já tinha parado há uma hora então Hyde agradecia novamente por ter sorte, não era todo dia que acontecia isso. Na maioria das vezes pegava algum resfriado ou algo assim.

Chegou ao café e apenas o dono lá como sempre. Lia uma revista. Entrou silenciosamente, não queria atrapalhar a leitura do outro, odiava quando interrompiam a sua. Mas para Ken, notou a presença do outro ali e sua atenção já tinha mudado, não importava o quanto tentasse não dar atenção, sempre quando Hyde estivesse ali sempre daria atenção para ele.

- Em dias chuvosos só vem este horário, né? – Sorriu enquanto guardava a revista.

- Na verdade, hoje estava mais adiantando trabalho do que preocupado com a chuva. – Respondeu se sentando em um dos banquinhos. – Eu quero café.

- Certo... Ah é, amanhã você viaja, então prefere deixar as coisas organizadas, creio eu.

- Sim, odeio deixar tudo bagunçado como o pessoal lá faz.

- A maioria das pessoas são assim.

- Eu não consigo ver minha mesa desarrumada, dá um ar de pouco caso.

- Entendo. Você é tão responsável. – Riu um pouco. – Não é para menos que estejam te mandando para outro país...

- Sim, por um lado é ótimo, sem ver a cara daquelas pessoas, sinto que estou na liberdade por uma semana.

- Algumas vezes as pessoas não fazem isso por maldade, mas sim por querer conversar. – Entregou a xícara de café para o outro logo voltando a apoiar os cotovelos no balcão.

- Não, algumas sei que fazem de propósito... Mas o importante é que por uma semana tentarei deixar rolar, sem me preocupar tanto.

- Isso mesmo, faça isso é uma das melhores coisas a se fazer. Mesmo que esteja viajando a trabalho é um modo de descansar.

Naquele momento a conversa foi cortada pelo som das gotas novamente caindo do céu. Hyde suspirou pesadamente, aquele não era seu dia, definitivamente.

- Droga...

- Está sem guarda-chuva? – Ken perguntou já esperando uma resposta positiva.

- Sim. Logo hoje. Não posso ficar resfriado se não amanhã não agüento ir viajar. Droga. – Deu um último gole no café e tirou o dinheiro da carteira. – Bem vou indo antes de isso piore.

- Espera. – Agachou procurando algo ali no meio das coisas atrás do balcão deixando Hyde confuso, mas logo entendeu quando o outro levantou com um guarda-chuva negro em mãos. – Pode usar emprestado, sei que realmente essa viagem é importante para você,

- Mas e você? Vai voltar como para casa?

- Eu moro do outro lado da rua, Hyde. E além do mais sempre tenho pelo menos dois guarda-chuvas aqui, no caso de um quebrar. – Mentiu novamente, na verdade aquele era o seu único e era super cuidadoso para que ele não quebrasse.

- Ah, arigatoo. – Hyde respondeu pegando o objeto estendido em sua direção. – Quando eu voltar de viagem eu te devolvo sem falta.

- Está certo, mas nem se preocupe com isso.

- Mesmo assim. Obrigado e até mais. – Hyde saiu do estabelecimento logo abrindo aquele enorme guarda-chuva, foi sua salvação.

Ken observou Hyde ir embora praticamente correndo e vendo a chuva engrossas cada vez mais lá fora. Pegou sua revista novamente e voltou a ler. Mas não conseguia se concentrar direto na leitura. Agiu por instinto emprestando seu guarda-chuva, agora não tinha mais volta, só queria entender por que com Hyde agia assim, mais por impulso. Talvez o baixinho realmente fosse especial para si.

***

Hyde chegou em seu apartamento muito menos molhado do que se estivesse sem o guarda-chuva emprestado, foi sua salvação mesmo, pensou que naquele dia tudo estava indo contra seu favor, até mesmo a natureza. Mas no final das contas não era tudo aquilo que esperava.

Largou o objeto molhado de lado, foi até a cozinha e preparou seu chá. Enquanto esfriava foi tomar banho, queria dormir bem cedo para não se atrasar no outro dia. Estava extremamente cansado e sua cabeça latejava até, se o fato não fosse viajar duvidava que no dia seguinte, num sábado sairia de casa.

Quando vestiu seu pijama foi até a cozinha e bebeu seu chá com um pouco de pressa. Ouvia o barulho da chuva forte, havia piorado ainda mais, torcia para que no dia seguinte não estivesse chovendo como estava no momento, só atrapalharia sua vida, teria que de manhã comprar algumas coisas para levar.

Em poucos minutos já estava deitado na cama esperando o sono vir. Mas odiava dormir ouvindo o som da chuva, era irritante demais. Ficou pensando em seu dia e percebeu que não poderia esquecer-se de devolver o guarda-chuva de Ken. Ele era uma pessoa muito gentil por emprestar sem se importar o objeto, mas também tinha outro guarda-chuva então não tinha tanto problema assim.

Não gostava de pegar coisas emprestadas, quase nunca pegava algo realmente emprestado, mas no dia se não pegasse de alguma forma iria se dar mal e se xingaria depois da própria burrice. Como odiava depender dos outros.

Quando a chuva começou a diminuir, sentiu-se adormecendo, finalmente aquele dia de cão havia chegado ao fim.

***

Ken dormia tranquilamente, mas do lado de fora de seus sonhos ouvia um barulho irritante, cada vez mais alto. Acabou abrindo os olhos e associando o som, era seu telefone tocando. Não sabia que horas eram, mas deveria ser cedo, seu despertador nem havia soado ainda, se irritou, havia naquela sexta chuvosa fechado mais cedo o café mais cedo para dormir mais, entretanto pelo telefone seu plano não deu certo.

Arrastou-se até a sala esbarrando em algumas coisas que estavam no caminho. Foi até a estante onde estava o telefone e atendeu com a voz extremamente sonolenta. Mas acordou com quem era do outro da linha, uma empresa que devia muito. Seu sábado não havia começado bem. Mas logo todos seus pensamentos negativos se transformaram em esperança novamente, queriam fazer outro acordo da dívida.

Com essa empresa já tinha feito vários acordos, mas com o tempo com mais dívidas surgindo  e a tal a mais cara não pôde continuar pagando fielmente e as outras por serem mais baratas dava um jeito de pagar. Mas no fim, quando quitou algumas, ainda tinham outras com valores mais acessíveis e esta foi esquecida.

Não pensou duas vezes e falou que iria ao mesmo dia, mas se assustou em saber que era em outra cidade, teria que viajar e nem condições para isso tinha, mas mesmo assim disse que iria, daria um jeito como sempre fazia. Precisava pagar aquela dívida era uma das mais caras que tinha.

Mas antes de arrumar as malas teria que ir até o mercado comprar algumas coisas para levar. Arrumou-se apressadamente e saiu a toda velocidade de seu apartamento, teria que ter sorte de pegar algum avião para chegar o quanto mais cedo na outra cidade. Esperava que tudo desse certo ao menos com as dívidas.


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Notas finais do capítulo

A cobra vai fumar. Sem mais 8D



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